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sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

FOTO: Fuzis SKS capturados

Foyer (cantina) da 1ª companhia do 2e RPC na Argélia, adornado com dois fuzis SKS capturados dos egípcios na crise de Suez de 1956.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 1º de janeiro de 2020.

Os fuzis SKS egípcios capturados na operação de 1956 (Operação Mousquetaire) foram os primeiros exemplares do SKS capturados por forças ocidentais, e fotos mostram os paraquedistas franceses usando esses SKS com as baionetas caladas para controlar prisioneiros egípcios.

A placa tem os dizeres "Souviens toi.." (lembrem-se) com os nomes dos mortos da companhia na Guerra da Argélia. O Sargento Victor Bellon está marcado como morto no Porto Said, no Egito. O Sgt. Bellon saltou na Normandia em 1944 como parte do SAS francês.

Sargento Victor Bellon, morto ao chegar ao solo no salto de 5 de novembro de 1956.
Ele usa as asas francesas livres da época do exílio.

Paras franceses do 2e RPC (Régiment de Parachutistes Coloniaux), que saltaram no Porto Fouad, na região do Porto Said, inspecionam um fuzil SKS capturado dos egípcios, 1956.

Prisioneiros egípcios capturados pelo 2e RPC no Porto Fouad, novembro de 1956.

Noticiário inglês sobre a invasão do Porto Said em 1956


Bibliografia recomendada:

Histoire des Parachutistes Français:
La guerre para de 1939 à 1979.
Henri Le Mire.

Leitura recomendada:


FOTO: IS-3 no Egito de Nasser8 de novembro de 2020.

segunda-feira, 14 de dezembro de 2020

Armas vietnamitas para a Argélia

Atores Alain Delon e Anthony Quinn armados de MAT-49 no filme Lost Command (1966), adaptação do livro Os Centuriões.

Por Ian McCollum, Forgotten Weapons, 18 de outubro de 2016.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 14 de dezembro de 2020.

Fui apontado para este trecho interessante de um documento sobre um carregamento específico de armas para os rebeldes argelinos que lutavam contra a ocupação colonial francesa na década de 1950 - proveniente do Vietnã. Não posso dizer que teria pensado nos vietnamitas tentando fornecer exportação de ajuda militar na época! As armas em questão eram submetralhadoras francesas MAT-49, o que também é um detalhe interessante - armas francesas capturadas no Vietnã enviadas para complementar o mesmo tipo de armas francesas capturadas na Argélia, enquanto as forças militares francesas com seus próprios MAT-49 eram a oposição. Faz sentido, e certamente seria conveniente.

Soldado vietnamita em serviço francês trabalhando na sua submetralhadora MAT-49. (ECPAD)

Transcrição do documento:

23 de junho de 1958

Implementando as instruções recebidas do Comitê Militar Geral do Partido[1] e do Ministério da Defesa, o Departamento de Material Bélico providenciou para que uma grande quantidade de submetralhadoras Tulle (armas capturadas por nossas forças durante a guerra de resistência contra os franceses)[2] fossem embaladas e empacotadas para que pudessem ser fornecidas ao povo argelino para ajudá-los em sua guerra de resistência contra os colonialistas franceses.

Este era um programa especial e ultrassecreto, então o Departamento de Material Bélico providenciou para que fosse executado de maneira muito cuidadosa e segura. Uma equipe técnica foi selecionada para realizar esta missão. Esta equipe era chefiada pelo camarada Nguyen Quang Thanh e incluía Phung Thanh Toan, Ha Vien, etc.

A preservação, padronização e embalagem das armas foram feitas no Armazém 560 em Bach Mai, após o qual as armas foram secretamente transportadas para um local de teste no Armazém Kha Lam em Kien An para serem mantidas lá para serem carregadas a bordo de um navio polonês que as transportaria para nossos amigos [argelinos] sob o pretexto de mercadorias comerciais.

Este plano foi executado sob a orientação e estreita supervisão do Secretariado do Partido, do Comitê Militar Geral do Partido e do Ministério da Defesa. Esta operação teve início a 23 de junho e foi concluída a 24 de julho de 1958, sendo mantida total segurança e sigilo durante a implementação do plano.

Digitalização do documento original em vietnamita.

Notas de Merle Pribbenow:

[1] O Comitê Militar Geral do Partido (Tong quan uy) era um comitê composto por um pequeno número de membros do Politburo do Partido Comunista que era responsável por supervisionar e dirigir as forças armadas vietnamitas. Este comitê foi chefiado pelo General Vo Nguyen Giap.

[2] A submetralhadora Tulle mencionada é a MAT-49, uma submetralhadora francesa de 9mm que foi usada pelo exército francês durante a guerra na Indochina. Os vietnamitas capturaram grandes quantidades dessas armas durante a guerra, especialmente na Batalha de Dien Bien Phu. O termo Tulle vem do nome do fabricante francês: Manufacture Nationale d'Armes de Tulle (MAT) [localizada na cidade de Tulle].


Vídeo recomendado:


Bibliografia recomendada:

Les pistolet-mitrailleurs Français.
Jean Huon.

Leitura recomendada:


sexta-feira, 16 de outubro de 2020

GALERIA: Retomada do rochedo de Ninh-Binh pelos Tirailleurs Argelinos

Os soldados do 2e BM/1er RTA avançam em direção ao rochedo de Ninh-Binh, no Tonquim em maio de 1951.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 16 de outubro de 2020.

Após a captura do rochedo de Ninh-Binh pelas tropas Viêt-Minh durante a ofensiva no Rio Vermelho (Rio Day), o General de Lattre de Tassigny ordenou aos tirailleurs argelinos que contra-atacassem; o que eles fizeram apoiados por morteiros leves. Durante a progressão para o rochedo, os homens assumiram posições e protegeram-se mutuamente por fogo e movimento ao atravessar o arame farpado.

O rochedo foi retomado pelo 2e BM/1er RTA (2e bataillon de Marche du 1er Régiment de Tirailleurs Algériens/ 2º Batalhão de Marcha do 1º Regimento de Tirailleurs Argelinos). Um tenente, seguido por sua seção, chegou ao local onde descobriria o corpo do Tenente de Lattre, filho do General de Lattre de Tassigny. Os últimos defensores se renderam quando a bandeira francesa foi hasteada no topo do pico rochoso.

Um campo de pouso foi montado para o helicóptero médico Hiller H-23. Um dos objetivos dos tirailleurs era recuper o corpo do Tenente Bernard de Lattre, filho do general comandante das forças na Indochina, para evitar que caísse nas mãos do inimigo, que o poderia usar para fins de propaganda. O resgate do corpo fora realizado pelo Comando 24 "Tigres Negros".

A unidade ali se manteve apesar de vários ataques noturnos do Viêt-Minh e irradiou na zona durante um mês e meio, infligindo graves perdas ao adversário, ao custo de cerca de cinquenta mortos e feridos. Uma vez substituído, o 2e BM/1er RTA retornou a Hanói para desfilar ali no 14 de julho de 1951.

Um tirailleur da 5ª companhia do 2e BM/1er RTA observa com binóculos o delta do Rio Vermelho de um dos rochedos de Ninh-Binh. 

Os tirailleurs se lançam em direção ao rochedo em lances sucessivos por fogo e movimento.

Um tirailleur fornece apoio de fogo com o fuzil-metralhador Châtellerault 24/29.

Um segundo-tenente seguido por sua seção avança com cautela no local retomado das tropas Viêt-Minh, eles vão descobrir o corpo do Tenente Bernard de Lattre de Tassigny, filho do general.

Um quadro da 5ª companhia aproxima-se da entrada com cuidado em uma entrada das muitas cavernas que trufam o local. É em uma delas que a seção do Segundo Tenente Lempereur encontrará o corpo do Tenente Bernard de Lattre de Tassigny, ali escondido para que não caísse nas mãos do inimigo.

Os escaramuçadores da 5ª companhia sobem ao topo de um dos rochedos. Os postos chamados de "rochedo" e "pequeno rochedo" serão tomados em três minutos. O Viêt-Minh, surpreendido com a forte reação francesa, perdeu ali uma centena de mortos e quinze prisioneiros, 101 fuzis, 26 submetralhadoras, 3 morteiros, 6 fuzis-metralhadores e uma metralhadora.

Os "Turcos" (apelido tradicional dos tirailleurs argelinos) do 2e BM/1er RTA avançam sob cobertura durante o contra-ataque a Ninh-Binh. À frente, um soldado armado com um fuzil MAS 36.

Em meio aos tiraulles está o Tenente Marengo, ao comando da 5ª companhia, e identificável graças à bengala que os seus soldados apelidaram de "mansuétude" e da qual nunca se separada. Em 14 de julho de 1951 em Hanói, ele foi premiado com uma citação à Ordem do Exército pelo General de Lattre de Tassigny.

Os últimos defensores Viêt-Minh no rochedo de Ninh-Binh são capturados pelos tirailleurs do 2e BM/1er RTA.

Bibliografia recomendada:


Leitura recomendada:


sexta-feira, 2 de outubro de 2020

GALERIA: Ratissage dos Tirailleurs Argelinos na Indochina

Soldados do 22e BTA são subitamente "accrochés" ("fisgados") pelo Viet-Minh. Os tirailleurs ripostam (no centro, o atirador com um fuzil-metralhador Châtellerault 24/29 e seu municiador). O combate é tão brutal quanto rápido e terminará à arma branca, o oponente tentando romper a posição com um ataque frontal.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 2 de outubro de 2020.

Operação de “limpeza” dos Giongs realizada pelo 22e BTA (22e Bataillon de Tirailleurs Algériens/ 22º Batalhão de Atiradores Argelinos), de 6 a 8 de outubro de 1950, lançada seguindo os passos de uma formação inimiga que massacrou a guarnição de um posto de observação na região de Tra Vinh, na Cochinchina.

Na região de Tra Vinh, os tirailleurs do 22e BTA revistam as ruínas de um pequeno posto de observação destruído durante a noite pelo Viet-Minh. Em primeiro plano, um tirailleur armado com a submetralhadora MAS 38.

Tirailleurs argelinos procedem à escavação dos escombros do pequeno posto de observação. Os soldados, armados com fuzis MAS 36, espetam a baioneta no chão para sondar o solo e remexer as cinzas cuidadosamente, pois a presença de armadilhas é provável.

O Major Chateaureynaud (à esquerda), chefe do 22e BTA e um dos seus quadros examinam tochas usadas pelo Viêt-Minh para incendiar a infraestrutura e encontradas intactas nas ruínas do pequeno posto ao redor de uma torre de vigia cuja fraca guarnição foi massacrada durante a noite.

Folhetos de propaganda vietnamita abandonados por um "Can Bo" (comissário político encarregado da doutrinação da população) são apreendidos pelos soldados do 22e BTA nas ruínas de um pequeno posto de observação na região de Tra Vinh, para ser encaminhado ao oficial de inteligência do batalhão.

O batalhão realizou a escavação das ruínas das torres do posto que os Viet-Minh explodiram, encontrando folhetos políticos do comissariado Viet-Minh. O batalhão avançou por arrozais e matagais até um ponto suspeito, onde teve início uma emboscada Viet-Minh violenta e muito próxima mas que foi parada de forma abrupta pela resposta dos tirailleurs, terminando em combate corpo-a-corpo. O batalhão se reagrupou, o atendimento aos feridos, investigando cadáveres Viet-Minh, e interrogando guerrilheiros Viet-Minh feitos prisioneiros. Após um momento de descanso, o batalhão fez seu penoso retorno por terreno difícil até realizar a junção com um dos REC (Régiment Étranger de Cavalerie/ Regimento Estrangeiro de Cavalaria) equipado com veículos anfíbios Weasel M29C chamados "Crabes" (Caranguejos), e finalmente seu respectivo retorno ao seu acantonamento.

Uma companhia de tirailleurs argelinos do 22e BTA avança com dificuldade por um arrozal durante a operação.

A base de fogo do grupo de combate, armada com um FM Châtellerault 24/29, despeja fogo supressor para quebrar o assalto dos Viet-Minh.

Os tirailleurs repelem um ataque frontal de elementos Viet-Minh. Um projétil (uma granada de fuzil) explode no arrozal, levantando uma coluna de água.

Os tirailleurs são assaltados frontalmente e abrem fogo para interromper o ataque dos "Du Kich" (guerrilheiros do Viet-Minh).
Uma granada de fuzil francesa explode pouco antes do início do combate corpo-a-corpo.

No final do breve porém violento confronto com o Viêt-Minh, um tirailleur do 22e BTA mata a sede de um dos seus companheiros feridos. Este, deitado em uma maca e enfaixado rapidamente, conservou sua submetralhadora MAS 38 consigo.

Enquanto seus camaradas contemplam a extensão dos danos, um tirailleur do 22e BTA, armado com um fuzil MAS 36, permanece coberto e abrigado nas ruínas do pequeno posto de observação destruído, cuja fraca guarnição foi massacrada e as infraestruturas dinamitadas ou incendiadas.

Bibliografia recomendada:

Street Without Joy:
The French Debacle in Indochina,
Bernard B. Fall.

Leitura recomendada:

GALERIA: Blindados Anfíbios do 1er REC na Indochina2 de outubro de 2020.

GALERIA: Largagem paraquedista em Quang-Tri durante a Operação Camargue2 de outubro de 2020.

GALERIA: Bawouans em combate no Laos28 de março de 2020.

GALERIA: Operação Chaumière em Tay Ninh com o 1er BPVN16 de junho de 2020.

GALERIA: Operação de limpeza com blindados em Tu Vu25 de abril de 2020.

FOTO: Um M24 Chaffee no Tonquim9 de julho de 2020.

O que um romance de 1963 nos diz sobre o Exército Francês, Comando da Missão, e o romance da Guerra da Indochina12 de janeiro de 2020.

segunda-feira, 13 de abril de 2020

Os Centuriões: 10 passagens que farão você refletir sobre guerra e liderança


Por Joe Byerly, From the Green Notebook, 17 de janeiro de 2020.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 13 de abril de 2020.

Recentemente, li Os Centuriões, de Jean Lartégy. O romance segue um grupo de paraquedistas franceses durante sua turnê no Vietnã, tempo como prisioneiros de guerra, seu retorno à França e sua subsequente mobilização na Argélia.


Embora tenha sido escrito há 40 anos, está repleto de lições poderosas sobre guerra e liderança que permanecem válidas hoje. Uma das minhas passagens favoritas do livro é a descrição de dois exércitos:

“Gostaria que a França tivesse dois exércitos: um para exibição, com armas adoráveis, tanques, soldadinhos, fanfarras, estados-maiores, generais distintos e trêmulos, e queridos oficiais regimentais que ficariam profundamente preocupados com os movimentos intestinais dos seus generais ou das hemorróidas do seu coronel: um exército que seria exposto por uma taxa modesta em todas as feiras do país.

O outro seria o real, composto inteiramente por jovens entusiastas em uniformes de batalha camuflados, que não seriam colocados em exposição e de quem seriam exigidos esforços possíveis e para quem toda sorte de truques seriam ensinados. Esse é o exército no qual eu gostaria de lutar."

Atores Alain Delon e Anthony Quinn no filme Lost Command (1966), adaptação do livro Os Centuriões.

Trailer do filme Lost Command


Enquanto lia essas palavras, não pude deixar de refletir sobre o nosso exército hoje, imaginando qual força armada representamos: aquela que está em exibição ou aquela para a luta. Os líderes em que investimos e elevamos através das fileiras são os que contribuem e se destacam no exército em exibição ou podem se destacar nos requisitos do campo de batalha moderno? Damos grande valor à aderência a regulamentos, costumes e cortesias, ou promovemos uma cultura combatente de guerra? Nós treinamos nossas formações para a guerra que queremos combater ou as guerras que estamos travando agora? Sinceramente, não sei a resposta.

Abaixo estão algumas das outras passagens que achei que mereciam ser destacadas. Espero que, ao ler este post, se você já não o leu, você pegará uma cópia d'Os Centuriões e pense no tipo de soldado e líder que deseja ser.

Os Procedimento Operacionais Padrão (POP) e Regulamentos, sozinhos, são limitados...

"Olhe aqui, coronel, notei que seus homens não usam capacete de aço. Os regulamentos...”

"Os regulamentos estão muito bem, coronel, mas eles ignoram um ponto importante."

"E qual seria?"

"Que primeiro precisamos vencer. Agora, ninguém pode lutar adequadamente e vencer enquanto caminha pesadamente sobre as montanhas no mês de julho com um capacete pesado na cabeça. Dei aos meus homens ordens para deixarem seus capacetes no Camp des Pins, mas para levar duas garrafas de água cada um.”

Paraquedistas franceses e vietnamitas do 6e BPC em marcha forçada de Tu Lê ao Rio Negro, no Tonkin, em outubro de 1952.

Quando a guerra entra em conflito com a tradição

“Na guerra moderna, todos esses ritos eram ridículos; não bastava ser bem-nascido, elegante e limpo; primeiro de tudo você tinha que ganhar.”


A necessidade dos líderes entenderem a natureza da guerra

"Toda guerra é destinada a se tornar política, coronel, e um oficial sem treinamento político logo se mostrará ineficaz. Com frequência, a palavra "tradição" serve apenas para ocultar nossa preguiça."

A realidade da vida militar

“... A vida militar se encaixa com uma certa forma de preguiça. A existência de um oficial é dividida de maneira muito desigual entre momentos de dificuldade, fadiga e perigo e períodos mais longos de inatividade e lazer. Nesses momentos de esforço supremo, um oficial pode ser levado, apesar do medo, da fome e do cansaço, a realizar feitos extraordinários que o transformarão, mas apenas por um instante, em alguém maior, mais desinteressado e mais intrépido do que outros homens. Durante períodos de inatividade, ele se move com a lentidão de um urso sonolento em um mundo próprio, pequeno e fechado. Todo esforço é banido dele, ou é de qualquer maneira extremamente restrito por regulamentação, ritual e costume.”

Oficiais do 13º Regimento de Dragões Paraquedistas (13e RDP) acompanhando a Princesa Alix Bonaparte, madrinha do regimento, na Argélia.

O tipo de homens e mulheres que precisamos para a guerra moderna

“Para o nosso tipo de guerra, você precisa de homens perspicazes e astutos, capazes de lutar longe do rebanho, que também tenham muita iniciativa - uma espécie de civis que podem virar a mão para qualquer profissão, caçadores ilegais e missionários também, que pregam, mas mantenham uma mão na coronha de seus revólveres, caso alguém os interrompa... ou que venha discordar.”

Sobre liderança

“Os homens devem ter seus líderes muito próximos; não, eu não sei como explicar, mas deve haver uma comunhão branda de sofrimento, perigo, e morte. Cada vez que o menor de seus soldados for morto, o líder deve sentir que perdeu algo de si mesmo; deveria machucá-lo até ele sentir vontade de gritar. Eu não acredito em bucha de canhão humana; Eu sou mesmo contra, muito contra."


Sobre leitura profissional

"Não sei como foi em Verdun. Mas eu já li alguns livros, vários livros. Eu não digo o que li; esse é o meu segredo. Eu leio e aprendo às escondidas. Um homem não pode descobrir tudo sozinho. Então, um belo dia, os estrelados olham surpresos com o que lhes digo e acreditam que pensei em tudo sozinho. Ou foi em César, ou ainda em Clausewitz."

Liderança e lealdade

"Não concordo com os métodos de comando de Raspeguy. Eles te comprometem muito profundamente. Só porque mandei um soldado raso para a sua morte, não me sinto obrigado a convidá-lo para tomar café na sala de estar e ouvi-lo falando sobre sua mãe ou expondo suas opiniões sobre o mundo. Unidades como a comandada pelo seu Raspeguy provavelmente se transformarão em seitas que não mais lutarão por um país ou um ideal, mas apenas por si mesmas.”


Lutando nos limites do Império

“O que passou pela cabeça dos centuriões romanos que foram deixados para trás na África e que, com alguns veteranos, alguns auxiliares bárbaros sempre prontos para se tornarem traidores, tentaram manter os postos avançados do Império enquanto o povo de Roma se afundava no cristianismo, e os césares em devassidão.”

Centurião romano comandando seus legionários no assalto anfíbio da Bretanha. (Ilustração de Angus McBride)

Leitura recomendada:


O Estilo de Guerra Francês12 de janeiro de 2020.









GALERIA: Bawouans em combate no Laos28 de março de 2020.

sexta-feira, 27 de março de 2020

"A tortura se justifica quando pode evitar a morte de inocentes"

"A tortura se justifica quando pode evitar a morte de inocentes".

Por Leneide Duarte-Plon, Folha de São Paulo, 04 de maio de 2008, de Paris.

Seleção de imagens Filipe do A. Monteiro, 27 de março de 2020.

General francês, que ensinou tortura a militares brasileiros, confirma atuação do país em golpe contra Salvador Allende.

O general francês Paul Aussaresses, 89, é a memória viva dos atropelos aos direitos humanos praticados durante a ditadura brasileira (1964-1985). Ex-agente do serviço secreto da França, veterano das guerras do Vietnã e da Argélia, Aussaresses colaborou com o regime militar no Brasil, ensinando aos oficiais técnicas de tortura e também de combate à guerrilha.

Je n'ai pas tout di: Ultimes révélations au service de la France.
General Paul Aussaresses e Jean-Charles Deniau.

"No curso, os estagiários representavam o papel dos torturadores e dos torturados", afirmou o militar reformado, no livro "Je N'ai Pas Tout Dit - Ultimes Révélations au Service de la France" (Eu não contei tudo - últimas revelações a serviço da França), que acaba de ser lançado em Paris. A obra é uma série de entrevistas concedidas ao jornalista Jean-Charles Deniau. Em suas revelações, Aussaresses revelou que o governo Médici forneceu armas e aviões para o golpe militar que derrubou o presidente chileno Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973. E vai além, ao relatar que o ex-presidente João Baptista Figueiredo, então chefe do SNI (Serviço Nacional de Informações), o telefonou para dizer que seus homens haviam torturado e matado um "francês subversivo", em referência a Laurent Schwartz. Aussaresses recebeu a Folha para uma longa entrevista na casa que tem na Alsácia. Não se furtou a reiterar tudo o que disse no livro e acrescentou que não se arrepende de nada, mesmo que seu livro anterior o tenha levado a responder a um processo por "apologia de crimes de guerra". "Acho que Figueiredo apreciou minha conduta em relação aos brasileiros. Minha colaboração foi frutuosa para eles e para nós", disse.

FOLHA - O senhor viveu no Brasil entre 1973 e 1975. Qual sua missão junto à embaixada francesa?

PAUL AUSSARESSES - Eu era adido militar.

FOLHA - O sr. fazia trabalho de informação?
AUSSARESSES - É isso que os adidos militares fazem. Todos eles se informam sobre o que pode interessar a seus países e sobretudo as necessidades do país no qual servem, do ponto de vista do que podemos vender a eles.

Services Spéciaux: Algérie 1955-1957.
Pour la France: Services Spéciaux 1942-1954.

FOLHA - Naquela época, a França já vendia armas ao Brasil?
AUSSARESSES - Claro. Havia muito tempo existiam adidos militares no Brasil. O chefe era do Exército, mas havia um da Aeronáutica e um oficial de Marinha. O Brasil tinha se interessado pelos aviões franceses fabricados pela Société Dassault. O Mirage.

FOLHA - Em seu livro, há um capítulo em que o senhor narra os cursos de interrogatório e informação a oficiais no Centro de Instrução de Guerra na Selva, em Manaus. Quais eram suas atribuições?
AUSSARESSES - Eu dava aulas nessa escola militar porque tinha sido instrutor das Forças Especiais do Exército Americano no Fort Bragg. Fui nomeado instrutor dos pára-quedistas da infantaria americana em Fort Benning, na Geórgia, e me pediram para ser também instrutor em Fort Bragg, na Carolina do Norte. Isso foi nos anos 60. Nessa escola, encontrei oficiais estagiários das forças especiais de vários países da América do Sul.

FOLHA - Inclusive do Brasil?
AUSSARESSES - Exatamente.

A onça, o símbolo do CIGS.

FOLHA - Quem eram esses oficiais?
AUSSARESSES - Não me lembro de seus nomes. Lembro de Umberto Gordon, que se tornou chefe das Forças Especiais do Chile, a DINA, o serviço secreto de Pinochet. Éramos muito amigos.

FOLHA - O senhor chegou ao Brasil em outubro de 1973, pouco depois do golpe militar do Chile. O Brasil participou ativamente no golpe contra Allende?
AUSSARESSES - Que pergunta! Você pensaria que sou um idiota se não estivesse a par. Claro que o Brasil participou!

FOLHA - O senhor conta no livro. Gostaria que repetisse. O Brasil enviou aviões e armas?
AUSSARESSES - Mas claro, armas e aviões.

FOLHA - E enviou oficiais também?
AUSSARESSES - Sim, claro. As armas não sei dizer exatamente quais. Mas os brasileiros enviaram aviões franceses com projéteis fabricados na França pela sociedade Thomson-Brandtà.

FOLHA - Para a qual trabalhou depois, quando saiu do Exército.
AUSSARESSES - Exatamente.

General Paul Aussaresses.

FOLHA - O senhor foi muito amigo de João Baptista Figueiredo, chefe do SNI e último presidente militar. Ele e o delegado Sérgio Fleury eram os responsáveis pelos esquadrões da morte brasileiros, como o senhor escreveu?
AUSSARESSES - É uma maneira de falar. Nós não chamávamos assim. Sérgio Fleury era o responsável pelos esquadrões da morte e Figueiredo, pelo SNI. O embaixador Michel Legendre não podia ouvir falar de esquadrões da morte.

FOLHA - O sr. diz que o embaixador não suportava Sérgio Fleury. E de Figueiredo, tinha melhor impressão?
AUSSARESSES - Um dia o embaixador me disse: "Você tem amigos estranhos". Eu respondi: "São eles que me permitem manter o senhor bem informado". Ele não disse mais nada.

FOLHA - Como seu trabalho era importante para a França?
AUSSARESSES - Todas as informações são importantes. Mas era sobretudo para mostrar que a França era um país amigo. Os brasileiros tinham a necessidade de tal material, estávamos dispostos a vender. Tinham necessidade de fabricar.

FOLHA - De quais materiais?
AUSSARESSES - Materiais de aviação. Tínhamos conhecimentos técnicos, mas o que era importante é que podíamos ir aos nossos superiores pedir informação para os brasileiros.

FOLHA - No livro o sr. narra o episódio de tortura de uma mulher que veio ao Brasil para, segundo o general Figueiredo, espionar o senhor. Figueiredo o fez vir de Manaus às pressas para mostrar a moça, já irreconhecível depois das sessões. Ele depois o informou que ela morrera no hospital. Nunca questionou o método bárbaro usado para obter informações daquela mulher?
AUSSARESSES - De jeito algum! A morte dessa mulher era um ato de defesa.

Marechal Humberto de Alencar Castello Branco (esquerda) e o General Charles de Gaulle (discursando) durante a visita do presidente francês em outubro de 1964.

FOLHA - Qual é sua impressão sobre os presidentes militares: Ernesto Geisel, João Figueiredo e Garrastazu Médici?
AUSSARESSES - Ernesto Geisel era um homem racional, de uma profunda moralidade. Era um homem que tinha uma fé religiosa e respeitava as regras da moral cristã que considera que os homens merecem viver numa atmosfera de ordem que lhes permite trabalhar, cuidar da família. De Emilio Garrastazu Medici tenho boas lembranças. Conheci-o na embaixada da França, conversamos em português. João Figueiredo era adorável, sedutor. Era o chefe do SNI quando eu cheguei como adido. O representante francês dos serviços especiais no Brasil me disse: "Todo mundo sabe que você fez parte do serviço de inteligência francês, principalmente do "Action", logo, não deve esconder. Você vai encontrar Figueiredo, chefe do SNI, não esconda que você pertenceu ao serviço equivalente na França".

FOLHA - E vocês ficaram amigos?
AUSSARESSES - Muito amigos. Acho que Figueiredo apreciou minha conduta em relação aos brasileiros. Minha contribuição foi apreciada. Minha colaboração foi frutuosa para eles e para nós.

FOLHA - Quais são os fundamentos que justificam o uso da tortura numa guerra ou como no caso do Brasil, nos anos 60 e 70?
AUSSARESSES - Acho que, se podemos evitá-la, nada a justifica.

FOLHA - E quando é que não se pode evitá-la?
AUSSARESSES - Quando a ação terrorista adversa quer ter efeitos de propaganda e tem por vítimas sobretudo mulheres e crianças. Penso que, se a tortura pode evitar a morte de inocentes, ela se justifica. É meu ponto de vista. Não a aprecio, não a aprecio, não a aprecio.

Aussaresses usando o brevê paraquedista francês livre da Segunda Guerra Mundial.

FOLHA - Na Argélia, o sr. e o general Jacques Massu estavam de acordo com todos os métodos de informação, inclusive a tortura?
AUSSARESSES - Totalmente de acordo. Mas quando houve o ataque de Philipeville, Massu ainda não estava comandando os pára-quedistas. Descobri que ia haver um ataque porque havia compras diárias de uma enorme quantidade de farinha de cuscuz num armazém. E tudo era comprado em dinheiro. E as notas de dinheiro vinham da França, do salário dos operários argelinos. Foi meu serviço de informação que descobriu tudo.

FOLHA - Parece que foi por causa de compras em uma aldeia que Che Guevara e seu grupo de guerrilheiros foram descobertos na Bolívia.
AUSSARESSES - Penso que Che Guevara era um homem brilhante, muito inteligente mas ambicioso. Ele queria substituir Fidel Castro, mas Fidel não estava apressado em deixar o posto de chefe de Estado de seu país e enviou-o em missão à Bolívia com outro homem muito brilhante que ainda está vivo, Régis Debray. Então, Fidel Castro quis dar uma ocupação a esses homens brilhantes e enviou-os em missão à Bolívia.

FOLHA - O sr. pensa que Fidel Castro armou uma cilada?
AUSSARESSES - Eles eram brilhantes, mas bebiam muito e os espiões de Fidel Castro ouviam o que eles diziam. E eles escreviam também, escreviam demais e quando foram para a Bolívia as forças de segurança bolivianas sabiam de todos os detalhes dos deslocamentos deles. Debray foi capturado rapidamente e depois encontraram sua agenda, uma bela agenda Hermès, de couro.

FOLHA - E quem os denunciou?
AUSSARESSES - A tagarelice deles.


FOLHA - Mas a CIA [serviço de inteligência dos EUA] estava na Bolívia.
AUSSARESSES - Claro, que dúvida!

FOLHA - O senhor foi sempre anticomunista?
AUSSARESSES - Sempre. Não me vanglorio disso, mas também não nego.

FOLHA - Hoje, após a queda do Muro de Berlim e o fim da União Soviética, qual seria o grande perigo para um país como a França?
AUSSARESSES - A organização terrorista maometana, árabe, os islâmicos.

FOLHA - A maioria dos militares pensa que o dever é manter o silêncio. Por que o sr. resolveu falar?
AUSSARESSES - Porque penso que era meu dever falar.

FOLHA - Mesmo arriscando a sua reputação?
AUSSARESSES - Há regras de vida e da carreira militar que tratam do dever. Eu fiz o que era meu dever.

Les escadrons de la mort, l'école francaise - Marie Monique Robin


FOLHA - No livro anterior, "Services Spéciaux - Algérie 1955-1957" (Serviços especiais - Argélia 1955-1957), o sr. contou a participação na guerra da Argélia, inclusive o uso da tortura. Em 2003, foi processado por apologia a crimes de guerra, mas não houve condenação. Os crimes estavam prescritos e anistiados. Por que agora esse livro de entrevistas?
AUSSARESSES - Fui levado à Justiça por apologia à tortura. Disse que não era verdade e que escreveria outros livros para me justificar de tudo o que tinha feito em missões fora da França. Escrevi um outro livro depois, que era uma resposta aos ataques injustos contra mim. O livro é "Pour la France, Services Spéciaux, 1942-1954" (Pela França, serviços especiais)

FOLHA - O senhor se arrepende de algo que fez?
AUSSARESSES - Não me arrependo de nada. E recusei uma proposta que me foi feita no tribunal, quando fui acusado de fazer a apologia da tortura, o que não é verdade. Meu advogado e meu editor me propuseram declarar que eu me arrependia do que fizera e do que escrevera. Não posso, não me arrependo, eu seria desprezado por minha mulher. Minha falecida esposa era uma heroína da Resistência Francesa antinazista, foi ferida em combate. Fomos casados por mais de 50 anos. Ela morreu e depois me casei novamente. E, se eu escrever que me arrependo, merecerei o desprezo de minha atual esposa. Recusei o arrependimento que me propunham e fui condenado.

Liberdade Vigiada -
As relações entre a ditadura militar brasileira e o governo francês: do golpe à anistia.
Paulo César Gomes.

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