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sábado, 2 de abril de 2022

FOTO: Treinamento iraquiano com o tanque T-55

Tanque de batalha principal T-55 iraquiano durante um exercício no Campo de Taji, no Iraque, 24 de janeiro de 2007.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 2 de abril de 2022.

Soldados iraquianos do 3º Batalhão, da 3ª Brigada, da 9ª Divisão do Exército Iraquiano, muitos dos quais são recém-formados em treinamento básico, praticam a evacuação da tripulação e exercícios de rolagem durante a parte de condução de tanques de um exercício em Campo de Taji, no centro do Iraque, em 24 de janeiro de 2007.

Em 1958, o Iraque encomendou 250 carros T-54 da União Soviética, que foram entregues entre 1959 e 1965. Mais 50 T-54 foram encomendados em 1967 da União Soviética e entregues em 1968. O Iraque enviou uma força expedicionária com 700 tanques T-54 para enfrentar Israel na frente síria na Guerra do Yom Kippur, perdendo entre 80 e 120 T-54 em ação. Após a guerra, 300 T-55 foram encomendados em 1973 da União Soviética e entregues entre 1974 e 1975. Em 1980, 50 T-54 e T-55 foram encomendados da Alemanha Oriental; os veículos estavam anteriormente em serviço na Alemanha Oriental e foram entregues no ano seguinte. Mais 400 T-54/55 foram encomendados em 1980 da Polônia e entregues entre 1981 e 1982 (os veículos provavelmente estavam anteriormente em serviço polonês). 250 T-55 foram encomendados em 1981 do Egito e entregues entre 1981 e 1983, tendo sido retirados do serviço egípcio. Mais 150 TR-580 (versão romena do T-55) foram encomendados em 1981 da Romênia e entregues entre 1981 e 1984 (os veículos foram entregues via Egito). Outros 400 T-55 foram encomendados em 1981 da União Soviética e entregues entre 1982 e 1985; os veículos eram da linha de produção da Checoslováquia. Cerca de 200 T-54/55 foram atualizados para o padrão T-72Z.

O Iraque também adquiriu 250-1300 Tipo 59 entregues pela China de 1982 a 1987 e cerca de 1500 Tipos 69-I e 69-II entregues de 1983 a 1987.

1.500 T-54, T-55 e TR-580 estavam em serviço com o Exército Iraquiano em 1990 e 500 em 1995, 2000 e 2002. 406 T-54/55 estavam em serviço com o Exército Iraquiano em 2003, todos sendo destruídos ou sucateados, exceto por 4 T-55 que agora estão em serviço com o Novo Exército Iraquiano. Veículos foram recuperados e 76 T-55 estavam em serviço com o Novo Exército Iraquiano em 2004. Em 2005, 4 VT-55A foram encomendados da Hungria e entregues no mesmo ano como ajuda; os veículos estavam anteriormente em serviço húngaro. O Iraque também recebeu 2 JVBT-55A da Hungria em 2005.

O Exército Iraquiano adquiriu tanques M1A1 Abrams e T-90 nos últimos anos, mas o velho T-55 ainda é bastante numeroso na região, servindo em segunda linha. Muitos exemplares foram capturados pelo Estado Islâmico em 2014, e ainda se encontram em uso nas batalhas que ocorrem pelo Oriente Médio.

Bibliografia recomendada:

Soviet T-55 Main Battle Tank.
James Kinnear e Stephen L. Sewell.

Leitura recomendada:

sexta-feira, 25 de março de 2022

FOTO: A Filha do General

Formandos de um curso de oficiais da Força de Defesa de Israel, 1º de agosto de 1957.
A primeira à direita é Yael Dayan, filha do General Moshe Dayan.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 25 de março de 2022.

Yael Dayan nasceu em Nahalal, atual Israel, durante a era do Mandato Britânico da Palestina em 12 de fevereiro de 1939. Ela era filha do famoso general israelense Moshe Dayan e neta do sionista Shmuel Dayan, ambos pais fundadores do Estado de Israel.

Yael está portando um fuzil Mauser durante a cerimônia, armamento típico da Força de Defesa de Israel de 1948 até a padronização com o FAL nos início dos anos 50, relegando o fuzil a funções cerimoniais. Os israelenses conseguiram muitos fuzis Mauser da FN Herstal, o blog tratou desse assunto aqui.

Na Guerra dos Seis Dias (1967), a Tenente Yael Dayan serviu na unidade de comunicação social do estado-maior da divisão de Arik Sharon e escreveu um diário da sua guerra no Sinai contra os egípcios. Ela publicou cinco romances, bem como uma biografia de seu pai chamada My Father, His Daughter (Meu Pai, Sua Filha). Ela escreveu um livro de memórias da Guerra dos Seis Dias chamado Israel Journal: June 1967 (Diário de Israel: junho de 1967), também intitulado como A Soldier's Diary e traduzido no Brasil como "Diário de um Soldado".

Yael Dayan ao lado do seu pai Moshe Dayan nos dias que antecederam a ofensiva do Sinai, 1967.
O General Moshe Dayan era então o Ministro da Defesa.

Embora ela mesma não tenha entrado em combate, pois esta não era a sua função, ela esteve próxima da ação e observou as operações de perto, ao lado dos militares que comandavam as ações. De particular importância foi a tomada da fortaleza de Umm Qatef em Abu Agheila, a noz dura que ancorava o sistema de defesa egípcio. O exército de Nasser então passou à debandada em pânico em direção ao Canal de Suez, uma catástrofe militar para o Cairo. A tão a
lardeada "Força Shazly", que deveria ter atuado como reserva estratégica, deu as costas e fugiu para o Egito africano ao invés de contra-atacar o rompimento em Umm Qatef-Abu Agheila.

Os egípcios tinham 80 tanques T-34 defendendo a fortificação, e tanques Sherman e Centurion espalhados pelo Sinai. Havia também os pesados tanques IS-3, que eram impermeáveis na blindagem frontal. O Egito ainda possuía os então novíssimos T-55, muito mais modernos que os tanques israelenses. Ainda assim, a manobra e violência da ação dos israelenses nocauteou os árabes. O exército egípcio no Sinai esfacelou-se, com grandes números de soldados zanzando pelo deserto e sendo feitos prisioneiros pelos israelenses. Yael descreve a situação em Nakhl, no centro do deserto do Sinai:

"Nakhl é uma região esquecida por Deus, não obstante possuir abundância de água. Vocês precisavam provar a água! É malcheirosa, enjoativamente adocicada e oleosa. Arik e Dov conheciam Nakhl de trás pra frente pois tinham estado lá na última guerra [1956]. Poucas casas, um acampamento militar, uma colina ou duas em volta, e a estrada para o Passo de Mitla e o Canal que ali faz uma esquina em ângulo reto. Na vez passada, tomáramos a localidade em poucos minutos, antes de avançar para Mitla.

[...]

De súbito, fomos informados pelo rádio de que a Fôrça Aérea ia dar-nos apoio. Paramos o jipe na ladeira e galgamos a parte lateral da colina. Pudemos, então, divisar seis tanques Centuriões egípcios na estrada. Pareciam maciços e bem protegidos, em meio aos demais veículos. Seria tolice expormo-nos, em carros de meia esteira ou jipes, aos canhões dos pesados Centuriões.

[...]

A Fôrça Aérea surgiu no céu azul. Quatro Super Mystères voaram baixo, despejando bombas incendiárias sôbre os tanques [egípcios]. Estávamos todos muito nervosos, com exceção de Dov que, com a maior calma, ficou de pé e filmou tôda a cena, com uma câmera Canon 8 mm. 'Como nas manobras', comentou alguém.

Os aviões mergulharam duas ou três vêzes. Esperei que nos reconhecessem. Seus ataques eram por demais precisos para nos arriscarmos a não ser identificados. Achávamo-nos bem próximos aos alvos. No seu quarto círculo, acenaram Shalon para nós, pendendo as asas. Poucos dias depois, encontrei-me com um dos pilotos - Arik, meu colega de classe em Nahalal. 'Eu sabia que um dia nós dois iríamos trabalhar juntos', disse-me. Quando êles se afastaram pelo nordeste, embarcamos no jipe e dirigimo-nos a tôda velocidade para a estrada abaixo. Aproximamo-nos arriscadamente dos tanques que se incendiavam. Munições explodiam em tôdas as direções.

[...]

De repente, escutamos tiroteio atrás de nós. Alguns dos nossos soldados começaram a trocar disparos de armas de fogo portáteis com soldados egípcios escondidos num arbusto a poucas jardas de distância. Devemos ter tido sorte, pois apenas dez minutos antes passáramos por êsses mesmos arbustos, erguendo uma nuvem protetora de poeira à nossa volta. Arik optou por permitir que seguíssemos a infantaria blindada em sua operação de limpeza até Nakhl. Veículos de meia esteira, jipes russos, tanques incendiavam-se e vomitavam fumaça para onde quer que se olhasse. Viam-se canhões e transportes de tropas blindadas atirados em tôdas as direções e posições. Centenas de soldados egípcios avançavam precipitadamente em direção a Nakhl. Posteriormente, revelaram-nos que imaginavam achar-se em área ainda sob seu domínio. Nossos soldados conclamavam-nos a se renderem. Alguns o fizeram. Outros responderam com um disparo ou uma saraivada - ou fugiram. À minha frente, vi um jovem soldado de um dos nossos veículos de meia esteira matar um egípcio, depois correr para trás do carro blindado e vomitar, logo em seguida refazendo-se e indo juntar-se à sua divisão.

Eu agarrava com firmeza uma metralhadora portátil Uzi. Dov estava ao volante, Katz atrás da metralhadora dianteira e Itzik apontava um canhão automático. Nenhum de nós chegou a disparar. Outros se encarregavam disso, e nos limitamos à observação. Cadáveres estiravam-se pelo caminho, e saltávamos do carro para retirar-lhes as armas. Os adversários de tocaia nos arbustos foram mortos. Grupos de soldados inimigos fugiam nas mais diversas direções. Alguns escaparam. No entanto, não pude afastar o pensamento de que isso era mais uma caçada que um combate. Eu não ia atirar. Os homens nos jipes achavam-se armados e, se fôssemos alvejados diretamente, êles responderiam ao tiroteio. Todavia, minha minha arma permanecia carregada e engatilhada. Meus óculos contra o vento de nada valiam e meus olhos doíam. Além da canícula do meio-dia, havia o calor irradiado pelos veículos em chamas, um inferno em miniatura, odioso e medonho.

Chegamos a Nakhl à tardinha. Ali encontramos mais destruição, destruição total, como sòmente sucede um embate de tanques contra tanques. Era o Vale da Morte do Exército egípcio. Cêrca de cento e cinqüenta tanques foram contados no percursos de Temed a Nakhl. Ninguém contou os veículos, a artilharia pesada, os canhões anti-aéreos leves, os tratores pesados que rebocavam os canhões, os caminhões de munições, todos êles em posições insólitas ou formando pilhas, de modo que muitaas vêzes os destroços assumiam semelhança bizarra com peças de escultura moderna."

- Yael Dayan, Diário de um soldado, pg. 131, 132, 133-135, 1967 (trad. 1970).

Post-script: Suspense militar

O título deste artigo é uma homenagem ao filme A Filha do General (The General's Daughter, 1999), um filme de investigação militar onde o investigador Paul Brenner (John Travolta) ao lado de sua parceira Sara Sunhill (Madeleine Stowe) investigam a misteriosa morte da oficial de guerra psicológica Capitã Elisabeth Campbell (Leslie Stefanson), filha do comandante da base: o General Joe Campbell (James Cromwell).

Outros personagens marcantes sendo o Coronel Bob Moore (James Woods), o oficial comandante e mentor da Capitã Elisabeth Campbell, e o Coronel George Fowler (Clarence Williams III), o leal segundo em comando do General Campbell. Além da investigação e da discussão sobre mulheres no exército em uma época onde este era um conceito novo, o filme ainda apresenta a estética esverdeada dos antigos uniformes BDU americanos.

Recomendação do Warfare.


A Filha do General ainda gerou um filme de suspense e investigações militares, Violação de Conduta (Basic, 2003), dessa vez com John Travolta contracenando com a futura rainha Hipólita, Connie Nielsen, como a investigadora Capitão Júlia Osborne e com o titã Samuel L. Jackson interpretando o implacável Sargento Nathan West.

Leitura recomendada:

domingo, 20 de março de 2022

Uzi começou como um menino que brincava com armas

Uzi Gal com a Uzi (esquerda) e a MP40.

Por Nati Gabbay, The Times of Israel, 4 de março de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 20 de março de 2022.

Enquanto estava preso em uma notória prisão britânica, esse jovem surgiu com o projeto de uma submetralhadora que ganharia popularidade em todo o mundo. Esta é a história inacreditável de Uzi Gal.

O inventor da submetralhadora homônima usada em todo o mundo teve uma paixão por armas de fogo ao longo da vida.

Quando jovem, ele pegou uma pistola para fazer experimentos e, quando preso em uma prisão britânica por contrabando de armas, inventou a submetralhadora que eventualmente armaria o mundo.

Uma menorá de Hanukkah feito de submetralhadoras Uzi antigas.
(
A Coleção Dan Hadani, 1979)

Esta é a história inacreditável de Uzi Gal.

Conheça Gotthard Glas, a criança com um hobby perigoso: armas.

Quando tinha dez anos, Gotthard Glas queimou a mão. Como? Ele decidiu ver uma uma espingarda velha de cano longo para reaproveitá-la como uma arma pessoal. É o que acontece quando a casa da família em que você cresceu em Munique está cheia de pistolas, espadas e outras armas antigas.

Soldado das FDI com sua Uzi.
(
A Coleção Dan Hadani, 1974)

De: “Submetralhadora Uzi: Planos de Aula”, que as FDI distribuiu aos comandantes em 1970.

Quando a criança se tornou adolescente morando no Kibutz Yagur, tendo se mudado em 1936 para a Palestina Obrigatória, sua grande paixão por armas voltou. Ouviu dizer que o professor de geografia da escola distrital possuía uma pequena pistola italiana de pólvora negra. Vendeu seu álbum de selos, comprou a arma e começou a trabalhar em seu sonho: transformá-la em uma máquina de guerra bem oleada.

Infelizmente, um professor da escola o pegou trabalhando na arma e seus planos foram frustrados mais uma vez. Glas não desistiu: aos 15 anos inventou um arco que dispara flechas automaticamente, uma “submetralhadora arco e flecha” se preferir.

Um soldado da IDF reza no Muro das Lamentações enquanto carrega uma Uzi.
(Yaacov Elbaz. A Coleção Dan Hadani na Biblioteca Nacional, 11 de junho de 1969)

Primeiro Ministro Yitzchak Shamir atirando com uma Uzi, 16 de dezembro de 1986.
(Nati Henrik, GPO)

Quando Glas se juntou à força de combate do Palmach do pré-Estado Yishuv, ele encontrou a ocupação perfeita: desenvolvimento de armas e gravação de armas. Assim como em seus dias de escola, ele foi pego mais uma vez – e condenado pelos britânicos a sete anos de prisão. Para sua alegria, foi perdoado depois de pouco mais de dois anos no Presídio de Acre. Adivinha o que ele fez para passar o tempo na cadeia: ele projetou uma submetralhadora.

Em 1949, ainda cadete no curso de formação de oficiais e depois de conhecer intimamente todas as armas que as FDI tinham para oferecer, o jovem, que entretanto se tornara Uziel Glas (e mais tarde seria conhecido pelo nome de Uzi Gal) escolheu escrever uma carta aos seus comandantes:

“Para: O Comandante da Escola de Oficiais, Tenente-Coronel Meir Zorea.

De: Cadete Uziel Glas 120946.

Data: 20 de outubro de 1949″

A longa carta contém uma descrição detalhada de seu sonho da submetralhadora perfeita.

Cinco anos e meio depois, em 27 de abril de 1955, na tradicional Parada do Dia da Independência das FDI, o exército apresentou a nova metralhadora, que tinha o nome Uzi. A propósito, Guthard/Uziel/Uzi Glas/Gal não queria que a submetralhadora levasse seu nome, mas a decisão estava fora de suas mãos.

Ministro da Defesa Itzhak Rabin com soldado das FDI.
(Danny lev, 
A Coleção Dan Hadani, 1989)

De: "Submetralhadora Uzi: Planos de aula", que as FDI distribuiu aos comandantes em 1970.

“Uma arma inovadora para as FDI”.
Artigo publicado no jornal “Zemanim”, 27 de abril de 1955.

Dentro de alguns anos, a Uzi não foi usada exclusivamente pelas FDI. Tornou-se um sucesso fenomenal em todo o mundo.

Todo o Estado de Israel encontrou esse jovem despretensioso quando ele recebeu a Menção do Chefe do Estado-Maior em 1955 e recebeu o “Prêmio de Segurança” de David Ben-Gurion.

Quando perguntado sobre sua invenção, ele simplesmente respondeu: “Cumpri meu dever no exército como um cozinheiro faz e simplesmente como todos os outros”.

A Uzi, a arma preferida de Chuck Norris!

Ao escrever o artigo, fiz uso do volume 17 de “IDF: Encyclopedia of Army and Security” (צה”ל בחילו – אנציקלופדיה לבא וביטחון), e do artigo de Eli Eshed “Sixty Years of the Uzi Submachine Gun”.

Sobre o autor:

Nati Gabbay é Diretora de Conteúdo Digital da Biblioteca Nacional de Israel.

Bibliografia recomendada:

The Uzi Submachine Gun.
Chris McNab.

Leitura recomendada:

GALERIA: A Uzi iraniana, 3 de março de 2020.

Por que a Turquia se preocupa com Mossul?

Um combatente curdo Peshmerga mira com a intenção de atirar durante uma batalha com militantes do Estado Islâmico na vila de Topzawa perto de Bashiqa, no Iraque, 24 de outubro de 2016.
(Reuters)

Por Kadir Ustun, Al-Jazeera, 24 de novembro de 2016.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 20 de novembro de 2022.

A Turquia está procurando proteger seus interesses econômicos e políticos no norte do Iraque enquanto luta contra o PKK e o Estado Islâmico.

Muitos comentaristas parecem perplexos com a disposição da Turquia de fazer parte da operação em andamento em Mossul.

Há uma série de interesses concretos que impulsionam a abordagem da Turquia: limitar a área de operações do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) e sua ramificação síria, o YPG; apoiar as forças curdas Peshmerga contra o Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL); proteger os turcomenos; prevenção e gestão de potenciais fluxos de refugiados; e ajudando Mosul a permanecer estável no período pós-EIIL.

A disputa entre Ancara e Bagdá parece emanar do desejo de Bagdá de reduzir a influência turca, sunita e curda em Mossul quando o EIIL for expulso da cidade.

O ex-primeiro-ministro turco Ahmet Davutoglu fala à Al-Jazeera.


Forças turcas no norte do Iraque

A presença militar turca no norte do Iraque, particularmente em Bashiqa, está diretamente ligada à rápida ascensão do Estado Islâmico no verão de 2014. A maioria dos observadores ficaram surpresos com o quão repentina e completa foi a queda de Mossul para o Estado Islâmico, e ficaram chocados com a captura rápida de grandes extensões de terra no Iraque e na Síria. Quando a cidade caiu nas mãos do EIIL, houve sérias preocupações por parte da comunidade internacional de que os militantes pudessem até marchar para Bagdá.

A Turquia há muito cultiva fortes laços econômicos e políticos com o Governo Regional Curdo (KRG), bem como com vários grupos sunitas e turcomanos no Iraque, o que a tornou uma das principais partes interessadas, especialmente no norte do Iraque. Amplos investimentos turcos na região foram diretamente ameaçados pela ascensão do EIIL.

Em junho de 2014, quando capturou Mossul e declarou seu “califado”, o EIIL sequestrou 49 funcionários diplomáticos turcos na cidade, incluindo o cônsul turco. Os esforços de resgate de meses impediram uma ação militar direta da Turquia contra o EIIL até que os reféns foram finalmente libertados em setembro de 2014.

Assim que liberou os reféns turcos, o ISIL cercou a pequena cidade de Kobane, na fronteira sírio-turca, levando novas ondas de refugiados para a Turquia. Em um ato de coordenação militar sem precedentes, a Turquia permitiu que as forças curdas Peshmerga viajassem por seu território para evitar a queda da cidade para o Estado Islâmico. Esta operação lançou as bases para uma cooperação militar mais profunda com o KRG no Iraque.

"A Turquia há muito mantém seu compromisso com a integridade e a unidade do Iraque, já que a possível divisão do país apenas aprofundaria os conflitos e pioraria as perspectivas humanitárias para a região. No entanto, dada a autonomia do KRG e o colapso do pacto político no país desde a invasão dos EUA, para alguns observadores, a integridade do Iraque é agora uma ficção."

Na época, a Turquia estava buscando um processo de reconciliação com o PKK, um esforço apoiado pelo presidente do KRG, Massoud Barzani. A Turquia há muito suspeitava das ambições do Partido da União Democrática (PYD), ligado ao PKK, de criar zonas autônomas de fato no norte da Síria e se opunha à ajuda militar dos EUA aos militantes do YPG.

Apesar das objeções turcas, os EUA continuaram a apoiar o YPG e fecharam os olhos para a criação de cantões autônomos de fato no norte da Síria. Isso continua sendo um ponto sensível nas relações EUA-Turquia, principalmente após o colapso do processo de reconciliação e a retomada dos combates entre a Turquia e o PKK em julho de 2015.

Dois interesses importantes

A recente Operação Escudo do Eufrates da Turquia na Síria visa afastar o EIIL de suas fronteiras e, ao mesmo tempo, frustrar as ambições do PYD de conectar seus cantões. Se o PYD o fizesse, criaria efetivamente um Estado do PKK ao longo da fronteira turca.

Portanto, a insistência da Turquia em sua presença militar em Mossul é guiada por um conjunto de interesses e postura militar semelhantes aos do norte da Síria.

Embora o PKK não tenha o tipo de recursos e legitimidade que o KRG desfruta, sua presença e esforços para ganhar legitimidade como baluarte contra o EIIL são uma grande preocupação para a Turquia. Assim, contrabalançar e limitar as atividades do PKK enquanto apoia o KRG são dois importantes interesses turcos no Iraque.

Carros M60A3 das 5ª e 20ª Brigadas Blindadas na fronteira com a Síria, abrindo fogo contra posições dos YPG, 2016.

A base de Bashiqa foi estabelecida como campo de treinamento militar em março de 2015 após a queda de Mossul e a decisão da Turquia de apoiar o KRG contra o ISIL. O ministro da Defesa turco, Ismet Yilmaz, visitou Bagdá e prometeu apoio ao exército iraquiano e às forças Peshmerga na forma de “equipamento e treinamento” para retomar Mossul do Estado Islâmico.

A Turquia sustenta há muito tempo que a base Bashiqa foi estabelecida com o conhecimento e a aprovação do governo iraquiano.

De fato, o ministro da Defesa iraquiano, Khaled al-Obaidi, é visto em um vídeo ao visitar o acampamento militar. Isso foi certamente em um momento em que o governo iraquiano se sentiu mais ameaçado por uma maior expansão do EIIL e procurou qualquer ajuda que pudesse obter.

Desde então, a coalizão internacional anti-EIIL – da qual a Turquia é membro – parece ter feito alguns progressos na luta contra o EIIL. Como resultado direto, Bagdá ficou mais confortável em sua postura e voltou a atacar a presença turca no norte do Iraque.

A mudança de postura de Bagdá em relação à Turquia

Em dezembro de 2015, o governo iraquiano deu à Turquia um ultimato para retirar suas forças militares de Bashiqa e ameaçou ir ao Conselho de Segurança das Nações Unidas. A Turquia anunciou que nenhuma tropa adicional seria enviada, mas se recusou a retirar suas forças, uma decisão bem-vinda pelo KRG. Ancara assegurou a Bagdá que as tropas turcas estavam lá para treinar as forças locais Peshmerga contra o EIIL e respeitava a integridade territorial do Iraque.

A Batalha por Mossul: Bagdá e curdos em desacordo sobre o mapa pós-EIIL


Quando o prazo de Bagdá terminou sem a retirada turca, o primeiro-ministro iraquiano Haider al-Abadi pediu à OTAN que “use sua autoridade para instar a Turquia a se retirar imediatamente do território iraquiano”. Na época, a postura de Abadi contra a Turquia era provavelmente um reflexo da pressão russa sobre o Iraque após a derrubada de um jato russo pela Turquia em novembro de 2015.

Mais recentemente, em outubro de 2016, o primeiro-ministro iraquiano ameaçou novamente ir à ONU devido à presença de soldados turcos em Bashiqa, o que, segundo ele, constitui uma violação da soberania nacional iraquiana.

Suas palavras provocaram uma forte repreensão do presidente turco Recep Tayyip Erdogan, que reiterou a disposição da Turquia de lutar ativamente na iminente operação da coalizão para libertar Mossul. A Turquia prometeu ficar para apoiar a luta contra o ISIL em grande parte por causa de suas fortes relações com grupos árabes sunitas e turcomenos, bem como com o KRG.

Sob Nouri al-Maliki, o governo anterior de Bagdá havia seguido políticas sectárias. Essas políticas e numerosos massacres contra sunitas levaram ao colapso das relações sunitas-xiitas e a um aumento dramático nas tensões sectárias no país. A Turquia tem sido cautelosa com a repetição do mesmo cenário na operação em andamento em Mossul, bem como na Mossul pós-EIIL.

Combatentes do Peshmerga e do YPG em Kobane, 13 de fevereiro de 2015.

A Turquia há muito mantém seu compromisso com a integridade e a unidade do Iraque, já que a possível divisão do país apenas aprofundaria os conflitos e pioraria as perspectivas humanitárias para a região.

No entanto, dada a autonomia que o KRG goza e o colapso do pacto político no país desde a invasão dos EUA, para alguns observadores, a integridade do Iraque é agora uma ficção.

A Turquia está procurando proteger seus interesses econômicos e políticos em relação ao governo do KRG enquanto luta contra o PKK e o EIIL, que continuam a atacar a Turquia.

Em circunstâncias normais, a presença turca no Iraque provavelmente teria violado a soberania do país. Atualmente, porém, a disfunção e o colapso do sistema político iraquiano parecem ter tornado esse ponto discutível.

Kadir Ustun é o Diretor Executivo da Fundação SETA em Washington DC.

Leitura recomendada:





COMENTÁRIO: A Lição Curda, 30 de junho de 2021.

quinta-feira, 17 de março de 2022

GALERIA: Forças especiais chinesas e sauditas no exercício Espada Azul

Comandos fuzileiros navais da China (azul) e Arábia Saudita durante um exercício em 2019.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 17 de março de 2022.

Comandos fuzileiros navais da China, Jiaolong ("Dragões do Mar"), com o famoso uniforme azul, e da Arábia Saudita durante um exercício conjunto em 17 de novembro de 2019, na Arábia Saudita.

O exercício Espada Azul 2019 visou “desenvolver competências na luta contra o terrorismo marítimo e a pirataria”. O exercício marítimo ocorreu na base naval do Rei Faisal, em Jeddah, localizada no Mar Vermelho, durando três semanas.

Os chineses estão portando o novo fuzil QBZ-191, que substituirá o QBZ-95, e abandonará o desenho bullpup em prol de um formato tradicional.

As forças navais sauditas, representadas pelas Forças Especiais da Frota Ocidental com sede em Jeddah, participaram do exercício junto com suas contrapartes das Forças Especiais da Marinha Chinesa.

A Marinha Real Saudita mantém duas brigadas de fuzileiros navais de 1.500 homens, compostas por três batalhões cada. As brigadas são designadas para a Frota Ocidental com sede em Jeddah e a Frota Oriental com sede em Jubail. As brigadas estão levemente equipadas com veículos blindados 200 Pegaso BMR e Humvees. Os fuzileiros sauditas possuem uma unidade especial.




domingo, 13 de março de 2022

FOTO: Professora iraniana com o M1 Garand na época do Xá


Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 13 de março de 2022.

Uma jovem rural iraniana com um M1 Garand, emitido ao Exército Real Iraniano do Xá Mohammad Reza Pahlavi pelos Estados Unidos. A foto pessoal foi postada pelo seu filho sob o nome u/mohajaf no site Reddit com a seguinte informação:

"Minha mãe em um breve treinamento militar antes de obter sua licença como professora, 1970, Shiraz, Irã."

Nos comentários, Mohajaf disse que elas, as recrutas, estavam entre a primeira geração de mulheres modernas e liberadas das pequenas vilas, e tornar-se professora era um sonho que se realiza para elas. Ele continua dizendo que cerca de 9 anos depois, com a mudança de regime para um sistema "teocrático retrógrado com leis Sharia semi-estritas", a sua mãe teve que usar hijab completo enquanto ensinava.

Bibliografia recomendada:

O Mundo Muçulmano.
Peter Demant.

Os Iranianos.
Samy Adghirui.

Leitura recomendada:

Uma opinião persa sobre o M1 Garand, 20 de fevereiro de 2022.

quarta-feira, 9 de março de 2022

Fúria Americana: A verdade sobre as mortes russas na Síria

Sírios em combate em Deir ez-Zor.
(Foto de arquivo)

Por Christoph Reuter, Der Spiegel, 2 de março de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 9 de março de 2022.

Centenas de soldados russos supostamente morreram em ataques aéreos dos EUA no início de fevereiro. Relatórios do Der Spiegel mostram que os eventos provavelmente foram muito diferentes.

Quando se trata de xingar, o homem não se conteve. "Filho da puta" é o palavrão mais suave que sai da boca do membro da milícia enquanto ele reclama furiosamente sobre o inferno criado pelo ataque aéreo americano de horas de duração a sudeste da cidade de Deir ez-Zor. Mesmo enquanto a fumaça continua subindo de SUV queimados ao redor deles, ele e cinco outros homens vieram para remover o corpo estilhaçado de um de seus companheiros combatentes das brasas incandescentes de um prédio bombardeado.

A cena vem de um vídeo de dois minutos do campo de batalha que um dos combatentes fez na tarde de 8 de fevereiro, horas após a tempestade de fogo, e fornecido ao DER SPIEGEL e ao Eufrates Post, um site de notícias que faz cobertura da região. É a primeira documentação fotográfica de uma das batalhas mais misteriosas ainda nesta guerra cada vez mais complexa.

Inicialmente, os militares dos Estados Unidos anunciaram em 8 de fevereiro que haviam atacado "forças pró-regime" de Bashar al-Assad a sudeste da cidade de Deir ez-Zor, para evitar um ataque a uma base pertencente às Forças Democráticas Sírias (FDS) lideradas pelos curdos, que são aliados dos americanos. Os EUA disseram que as forças pró-Assad atacaram a base das FDS com tanques e morteiros. Os EUA revidaram em resposta, alegando ter matado "mais de 100" dos combatentes no que foi descrito como um ato de legítima defesa.

As seguintes cenas de vídeo do local após o ataque aéreo americano em Deir ez-Zor:


Mas quem eram exatamente esses atacantes? E o que realmente aconteceu naquela noite nas pequenas aldeias meio desertas na margem leste do rio Eufrates? As bombas americanas dizimaram as tropas russas? Poderia o ataque ser um presságio de escaramuças entre americanos e russos?

Abaixo: A primeira tentativa de cruzamento da ponte.
Acima: A segunda tentativa de cruzamento da ponte. 

Uma equipe de jornalistas do DER SPIEGEL passou duas semanas entrevistando testemunhas e participantes da batalha. A equipe também conversou com um membro da equipe do único hospital em Deir ez-Zor, bem como com um funcionário do aeroporto militar local, na tentativa de obter uma imagem clara do que aconteceu durante a batalha de três dias.

Os relatos se corroboram amplamente entre si e a imagem dos eventos que surge é uma contradição com o que foi noticiado na mídia russa e internacional.

Às 5 da manhã de 7 de fevereiro, cerca de 250 combatentes ao sul de Deir ez-Zor tentaram cruzar a margem oeste do Eufrates para o leste usando uma ponte de pontão militar. Eles incluíam membros das milícias de duas tribos, os Bekara e os Albo Hamad, que lutam pelo regime de Assad com apoio iraniano, soldados da 4ª Divisão, bem como combatentes afegãos e iraquianos das brigadas Fatimyoun e Zainabiyoun, que estão sob o comando iraniano. Um soldado da 4ª Divisão contou que as unidades passaram uma semana reunidas na propriedade do aeroporto militar. Testemunhas dizem que nenhum mercenário russo participou da tentativa de travessia.

Os americanos e os russos concordaram no ano passado em fazer do rio Eufrates uma linha de "desconflito". As tropas de Assad e seus aliados estão a oeste do rio, enquanto o lado leste é controlado pelas FDS sob a proteção dos americanos. O lado leste abriga uma cadeia de campos produtivos de gás natural geralmente conhecidos como o campo Conoco.

Como tal, os americanos nas margens orientais viram o avanço como um ataque e dispararam uma série de tiros de advertência em direção à ponte. Ninguém ficou ferido e os atacantes se retiraram.

Mas eles não desistiram. Muito depois do anoitecer, cerca de duas vezes mais homens dos mesmos grupos cruzaram outra ponte improvisada alguns quilômetros ao norte, perto do aeroporto militar de Deir ez-Zor. Eles dirigiram sem as luzes acesas para evitar que os drones americanos os detectassem. Desta vez, sem serem detectados, eles chegaram à vila de Marrat, no lado leste. Quando avançaram mais ao sul por volta das 22h, em direção à base das FDS em Khusham, os americanos, cujas forças especiais também estavam estacionadas lá, mais uma vez abriram fogo. E desta vez não eram tiros de advertência. Os EUA disseram em uma declaração dada à CNN que depois de "20 a 30 tiros de artilharia e tanques caíram a 500 metros" do posto de comando das FDS, as forças da coalizão "atacaram os agressores com uma combinação de ataques aéreos e de artilharia".

Isso estava colocando as coisas suavemente. Porque mais ou menos na mesma hora naquela noite, outro grupo de membros da milícia tribal síria e combatentes xiitas veio da aldeia de Tabiya, ao sul, e também atacou a base das FDS. E os americanos contra-atacaram com todo o seu arsenal destrutivo. Eles desdobraram drones equipados com foguetes, helicópteros de combate, aeronaves pesadas AC 130, apelidadas de "barcos canhoneiros", para disparar contra alvos no solo, foguetes e artilharia terrestre.

Eles atacaram durante a noite, seguidos por um ataque na manhã seguinte a um grupo com uma milícia tribal em Tabiya que veio apenas para recuperar os corpos. E em 9 de fevereiro, eles mais uma vez atacaram uma unidade dos mesmos combatentes que surgiram no lado leste do rio.

Uma versão diferente dos eventos

Foi principalmente o segundo ataque noturno da aldeia de Tabiya que desencadeou o paroxismo americano, disseram dois homens pertencentes à milícia al-Baqir da tribo Bekara. Porque além da linha de desconflito, havia também um segundo acordo que permitia a permanência de até 400 combatentes pró-Assad, que permaneceram no lado leste do Eufrates após a batalha de 2017 contra o Estado Islâmico. Pelo menos enquanto não fossem mais de 400 deles e permanecessem em paz. Mas exatamente isso não era mais o caso.

Entre os estacionados em Tabiya estava um pequeno contingente de mercenários russos. Mas as duas fontes da milícia disseram que não participaram dos combates. Ainda assim, eles disseram, 10 a 20 deles de fato perderam suas vidas. Eles disseram que um total de mais de 200 dos agressores morreram, incluindo cerca de 80 soldados sírios da 4ª Divisão, cerca de 100 iraquianos e afegãos e cerca de 70 combatentes tribais, principalmente da milícia al-Baqir.

Tudo aconteceu à noite, e a situação ficou extremamente complicada quando os combatentes de Tabiya entraram na briga. Um funcionário do único grande hospital em Deir ez-Zor diria mais tarde que cerca de uma dúzia de corpos russos foram entregues. Enquanto isso, um funcionário do aeroporto testemunhou a entrega dos corpos em duas picapes Toyota para uma aeronave de transporte russa que então vôou para Qamishli, um aeroporto perto da fronteira com a Síria, no norte.

Mercenários do Grupo Wagner na Síria.

Nos dias que se seguiram, as identidades dos russos mortos seriam reveladas - primeiro de seis e, finalmente, nove. Oito foram verificados pela Equipe de Inteligência de Conflitos, plataforma investigativa russa, e outro foi divulgado pela rádio Echo Moscou. Todos eram funcionários da empresa mercenária privada Evro Polis, muitas vezes referida pelo nome de guerra de seu chefe: "Wagner".

Ao mesmo tempo, no entanto, uma versão completamente diferente dos eventos ganhou força - disseminada inicialmente por nacionalistas russos como Igor "Strelkov" Girkin e depois por outros associados à unidade Wagner. De acordo com esses relatos, muitos mais russos foram mortos na batalha - 100, 200, 300 ou até 600. Uma unidade inteira, dizia-se, foi exterminada e o Kremlin queria encobri-la. Gravações de supostos combatentes apareceram aparentemente confirmando essas perdas horríveis.

Era uma versão que soava tão plausível que até agências de notícias ocidentais como Reuters e Bloomberg a pegaram. O fato de que o governo em Moscou a princípio não quis confirmar nenhuma morte e depois falou de cinco "cidadãos russos" mortos e depois, de forma nebulosa, de "dezenas de feridos", alguns dos quais morreram, só parecia tornar o versão dos eventos parecem mais credíveis. Afinal, geralmente tem sido o caso que, quando algo na guerra síria é negado pelo Kremlin, ou quando os russos o admitem pouco a pouco, provavelmente está correto. Além disso, as perdas russas na Síria são constantemente minimizadas.

"A má sorte de estar no lugar errado na hora errada"

As relações entre os mercenários russos na Síria - acredita-se que existam mais de 2.000 deles - e o governo em Moscou estão tensas há algum tempo. Os combatentes alegam que estão sendo usados como bucha de canhão, estão sendo mantidos em silêncio e são mal pagos. Para eles agora acusar o Kremlin de tentar encobrir o fato de que os russos foram mortos - pelos americanos, de todas as pessoas - atinge o governo do presidente Vladimir Putin em um ponto fraco: sua credibilidade.

As únicas fontes verificáveis para a dizimação de centenas de russos são as fotos e vídeos que circulam na internet ou de fontes russas que são repassadas aos jornalistas ocidentais. Alguns deles mostram imagens do leste da Ucrânia que mais tarde foram adulteradas ou até mesmo a versão demo de um vídeo game que Putin mostrou pessoalmente ao diretor de Hollywood Oliver Stone como suposta prova de um ataque russo a um comboio do EI.

A situação no terreno entre Khusham e Tabiya, na margem oriental do Eufrates, descrita por meia dúzia de testemunhas e pessoas que participaram nos acontecimentos, não confirma a participação dos mercenários russos no ataque ou mesmo que eles se tenham juntado aos combates. Ahmad Ramadan, o jornalista que fundou o Eufrates Post e desde então emigrou para a Turquia, vem de Tabiya. Um de seus contatos luta pela milícia al-Baqir e gravou o vídeo no local dos bombardeios. "Se tivesse sido um ataque russo, com muitos russos mortos, teríamos relatado sobre isso", disse ele. "Mas não foi. Os russos em Tabiya tiveram o azar de estar no lugar errado na hora errada."