quarta-feira, 17 de julho de 2019

Retorno à Selva: Um renascimento da guerra em terreno fechado


Pelo Tenente James Lewis, 5 de janeiro de 2018.
Tradução Filipe do A. Monteiro.

A região do Indo-Pacífico está em um período de transformação sem precedentes, acelerada pela mudança na distribuição do poder econômico e político[i]. A importância do Indo-Pacífico para a segurança australiana não pode ser exagerada e o Exército deve se preparar para conduzir operações nesta região cada vez mais complexa e letal, através do espectro de conflitos. Isso significa ter uma força versátil e adaptável que é bem versada em operar em terreno fechado e habilidosa em guerra na selva.
A história operacional do Exército destaca a importância da compreensão profunda da guerra na selva para a segurança australiana. Desde os dias de Kokoda, Bornéu e Malaya, até o Vietnã, Timor Leste e as Ilhas Salomão - para a Austrália, a luta na selva tem sido a regra, não a exceção.É aqui que o Exército deve reavaliar sua atual abordagem em relação ao treinamento de guerra na selva — reaprender as lições do passado que são úteis, descartar aqueles que não são, e implementar uma abordagem do século XXI para a guerra na selva. Essa abordagem deve se concentrar em duas áreas críticas: um avanço rumo a um treinamento de selva - não apenas duro - mas realista, e treinamento de selva para todas as armas, não apenas para a infantaria.
TREINAMENTO "DURO" E REALIDADES OPERACIONAIS

O Exército tem várias oportunidades de treinamento em guerra na selva, incluindo a Ala de Treinamento na Selva - em Tully (Jungle Training Wing – Tully, JTW), a Companhia de Fuzileiros Butterworth (Rifle Company Butterworth, RCB) e Canungra. Cursos como o Curso de Operações de Selva para Oficiais Subalternos (Junior Officer’s Jungle Operations Course, JOJOC) também foram recentemente recriados, para conduzir treinamento para líderes subalternos em terreno fechado. No entanto, este treinamento é geralmente usado como uma ferramenta para endurecer os soldados, concentrando-se no desenvolvimento de tenacidade mental e física em condições árduas —não experimentar novas táticas, técnicas e procedimentos (Tactics, Techniques and Procedures, TTPs), treinar manobras de armas combinadas ou testar novos equipamentos na selva.

O Exército precisa articular claramente a intenção por trás do treinamento específico de selva— o treinamento é projetado para "endurecer" nossos soldados em um ambiente de treinamento árduo e austero? Ou, ele é projetado para efetivamente preparar nossos soldados para lutar em um cenário moderno e complexo de guerra na selva? É importante enfatizar que estas proposições não são a mesma coisa. O treinamento de guerra na selva por sua própria natureza será desafiador; no entanto, como em qualquer outro treinamento, simplesmente "deixar ralado" não aumentará a letalidade, a capacidade de sobrevivência ou a proficiência geral de combate. O treinamento deve ser inteligente, bem projetado e ter um objetivo específico e realizável, e se não for constantemente revisado e atualizado, ele rapidamente se tornará irrelevante. Além disso, se nós realmente quisermos desenvolver uma proficiência no combate de selva do século XXI, então os TTPs ensinados precisam ser baseados nas realidades operacionais atuais, não em costumes ultrapassados; os tabus que cercam o uso de equipamentos tais quais equipamentos de combate noturno, dispositivos de GPS e redes para dormir precisam ser seriamente reconsiderados; e precisamos rever nosso ambiente de treinamento.

As áreas de treinamento em Tully são na sua maioria selva secundária e são extremamente restritivas — tudo é feito em uma trilha pré-cortada. A exigência de manter essas trilhas significa que os comandantes não podem conduzir a seleção de rotas, posicionamentos noturnos, e há pouca necessidade de navegar além de passos contados. Além disso, os comandantes não podem conduzir um Desenvolvimento de Curso de Ação robusto durante o seu IMAP (Individual Military Appreciation Process, Processo de Apreciação Militar Individual), pois eles são prejudicados pelas rotas de patrulhamento pré-determinadas. A densidade da vegetação não permite de fato um bom treinamento – ela o impede.
É claro que o Exército precisa saber como lutar em terreno altamente restritivo como a selva secundária, mas o treinamento realista para essa vegetação exigiria o uso de facões para limpar as rotas através da selva, cortando os seus próprios portos noturnos e usando técnicas de navegação, como navegação estimada. Isso permitiria aos comandantes obter uma compreensão mais profunda de como a selva afeta os níveis de manobra, navegação e fadiga, e quais tarefas são realistas de se esperar dos subordinados.

TREINAMENTOS DE SELVA PARA ELEMENTOS DE APOIO
Outra questão crítica com o treinamento de guerra na selva australiano é que ele se concentra quase exclusivamente em operações de infantaria leve no nível individual, de grupo de combate e de pelotão, negligenciando outros elementos da guerra de armas combinadas. A grande maioria das sub-unidades que participam da rotação de Treinamento de Sub-Unidade (Sub-Unit Training, SUT) na JTW são companhias de fuzileiros de batalhões dentro do RAR (Royal Australian Regiment, Regimento Real Australiano). Auxiliadores críticos de combate, como artilharia e engenheiros de combate, normalmente não conduzem o SUT em Tully, nem os elementos de apoio que são essenciais para operações em qualquer ambiente, tais como elementos de transporte, suprimento e médicos. Como David Hackworth e S.L.A. Marshall argumentaram, na selva "a infantaria de 'esclarecimento' também deve continuar como a força de 'fixação,'" deixando a “finalização” para as armas pesadas que podem tanto matar homens como demolir construções de proteção.”[ii] Sem a integração efetiva da manobra de armas combinadas, será quase impossível para a infantaria sozinha "bloquear as rotas de escape prováveis, atacar as colunas em retirada, e continuar a limpeza."[iii] De fato, no Vietnã, a coordenação de apoio aéreo aproximado, fogo de morteiro e fogo de artilharia era frequentemente um componente essencial na definição das condições para a vitória, e embora não seja o fator mais crítico — era a qualidade dos líderes no terreno e a bravura de seus homens que se provaria decisiva ou não —o apoio ofensivo ainda era de grande importância. McManus resumiu isso no Vietnã quando disse que "o espírito de luta, apoiado pelo poder de fogo sufocante, poderia ser uma combinação formidável".[iv]

Além disso, relatórios de treinamento e análises da Segunda Guerra Mundial indicam que dois dos desafios mais significativos enfrentados pelos soldados australianos operando na Nova Guiné e no Timor durante a Campanha do Pacífico não foram centrados na infantaria, mas sim estavam relacionados com a incorporação de armas de apoio para auxiliar a infantaria. Um dos desafios críticos foi a coordenação de fogo indireto.

A selva impõe desafios únicos para os artilheiros: na Segunda Guerra Mundial, devido à incapacidade de observar o alvo e ajustar o fogo com precisão, bem como a vegetação altamente restritiva, os artilheiros tiveram que modificar seus métodos normais para apoiar a infantaria[v]. Técnicas inovadoras como a estimativa de distância pelo som - que envolvia um observador avançado rastejando perto do inimigo, pedindo fogos e fazendo ajustes baseados no som dos estilhaços de granada assobiando sobre a sua cabeça — tiveram que ser improvisadas. Em pelo menos um caso, "o fogo de artilharia foi pedido por um oficial de posto de observação em pé no mar com água até o pescoço para poder observar a queda de tiros a 19.000 jardas [17.300km] ao longo da costa"[vi].

Enquanto os métodos utilizados pela artilharia evoluíram significativamente desde os dias de Milne Bay e Kokoda, seria ingênuo pensar que armas de apoio como a artilharia seriam simplesmente capazes de se desdobrarem em um ambiente de selva e empregariam exatamente os mesmos TTPs que elas usam em campo aberto. Soldados — independentemente de corpo ou especialização — devem treinar para empregar seus conjuntos de habilidades em qualquer ambiente, especialmente aqueles que representam os maiores desafios.

CONCLUSÃO
Exército deve desenvolver uma nova abordagem para o desenvolvimento de perícia na selva; devemos redescobrir as lições do passado que são úteis e descartar aquelas que se tornaram irrelevantes. Finalmente, devemos adotar uma abordagem de treinamento fundamentada na experimentação, tentativa e erro e um desejo de aprender com os atuais especialistas em guerra na selva, como a Força de Defesa de Papua Nova Guiné e o Exército da Malásia, e tirar lições dos atuais conflitos em nossa região, tais como a insurgência nas Filipinas. Considerando o significado da região do Indo-Pacífico para a Austrália, o Exército deve revigorar seu treinamento de guerra na selva, com foco nas realidades operacionais e nas armas combinadas.

Sobre o Autor:
Tenente James Lewis é um oficial de Infantaria atualmente servindo na Escola de Infantaria.

Notas finais:
[i] The Defence White Paper, Strategic Outlook,  Department of Defence, available at <http://www.defence.gov.au/Whitepaper/AtAGlance/Strategic-Outlook.asp>
[ii] Hackworth, D. & Marshall, SLA.  (1966) Vietnam Primer, US Army, p.8
[iii] Hackworth, D. & Marshall, SLA, Vietnam Primer, p.8
[iv] McManus, J. (2011) Grunts: Inside the American Infantry Combat Experience, World War II Through Iraq, Random House, p.197
[v] Threlfall, A. (2014) Jungle Warriors, Allen & Unwin, p.111
[vi] Threlfall, A.  Jungle Warriors, p.113
Original: https://groundedcuriosity.com/return-to-the-jungle-a-renaissance-of-close-country-warfare/?fbclid=IwAR3TeIwE-0xmFeXJCnRBTc1YqQt8qua_z7eYN0wpyNqFbEn8I-X6lUe3uaI

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