quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Sobre homens alemães uniformizados: a Alemanha deveria reintroduzir o serviço nacional?


Por Katja Hoyer, Zeitgeist, 8 de agosto de 2024.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 8 de agosto de 2024.

À luz da guerra na Ucrânia, muitos países europeus estão debatendo se devem reintroduzir alguma forma de Serviço Nacional. Os leitores britânicos se lembrarão de que houve uma tentativa sem entusiasmo de um debate público sobre isso na campanha Tory que antecedeu a eleição geral. Curiosamente, ninguém levou isso particularmente a sério. O recrutamento não é algo muito britânico de se fazer. O Reino Unido tem uma longa e orgulhosa tradição militar, mas é baseada em voluntários. O recrutamento aconteceu apenas no contexto das duas Guerras Mundiais e mesmo assim com relutância.

Na Alemanha, a ideia do Serviço Nacional tem uma tradição muito diferente. É uma intrinsecamente ligada à história nacional de maneiras que vão desde ser uma alavanca de unificação no século XIX até atuar como um instrumento de ideologia no século XX. Discussões sobre a reintrodução do recrutamento são levadas muito a sério.

O Ministro da Defesa Boris Pistorius – de longe o político mais popular da Alemanha – propôs um tipo de meio termo no qual um questionário é enviado a todos os homens de 18 anos. Com base nas respostas, 40.000 fariam um exame médico. Então, 10.000 seriam escolhidos para o Serviço Nacional. As mulheres não seriam recrutadas, pois isso exigiria uma mudança na constituição, o que é um processo longo e difícil. No entanto, elas podem se inscrever voluntariamente.

Uma pesquisa na Grã-Bretanha mostrou que menos de um terço das pessoas apoiaria a reintrodução do serviço militar obrigatório por 12 meses após sua abolição em 1963. A Alemanha só suspendeu o recrutamento em 2011, e a maioria das pesquisas indica que há uma pequena maioria a favor de sua reintrodução.

Dado esse debate interessante, eu estava ansioso para ouvir o que o ex-ministro da Defesa alemão Karl-Theodor zu Guttenberg tinha a dizer sobre isso. Ele estava no evento em Brandemburgo no último final de semana sobre o qual escrevi no meu artigo anterior. Foi durante seu mandato e por sua iniciativa que o recrutamento foi suspenso. No último sábado, ele argumentou muito fortemente que ele deveria ser reintroduzido.

Seus argumentos eram os mesmos de sempre. Uma reintrodução pode ajudar a lidar com a crise de recrutamento na Bundeswehr, o exército alemão. Isso daria aos jovens uma chance de retribuir à sociedade que pagou por sua educação. E, falando de sua própria experiência como um "pirralho mimado" — ele usou uma frase alemã próxima a essa tradução — ele sentiu que não lhe faria mal dormir em um quarto com outras sete pessoas e ouvir o que fazer.

Por que ele suspendeu isso em 2011, então, alguém na plateia quis saber. Guttenberg argumentou que o orçamento de defesa havia sido cortado pela administração Merkel e ele teve que trabalhar com o que lhe foi dado. De qualquer forma, o período de serviço havia sido diluído para apenas 6 meses e o processo de recrutamento foi tão sem entusiasmo que apenas 16% dos jovens acabaram fazendo o treinamento básico.

Posso certamente testemunhar o último. Quando terminei a escola, o recrutamento ainda estava em vigor e, dos meus amigos homens, apenas aqueles que realmente queriam fazê-lo concluíram o treinamento básico. Alguns fizeram a alternativa civil, um tipo de serviço social para o qual você poderia fazer qualquer coisa, desde trabalhar em um asilo de idosos até reintroduzir veados na natureza. Mas, novamente, apenas aqueles que queriam fazer isso, o fizeram.

A maioria dos meus amigos simplesmente tentou reprovar no exame médico. Um comeu seis ovos, reprovando assim nos indicadores renais no teste de urina. Outro fumou maconha antes, reprovando no teste de drogas. Todos voltaram aliviados quando lhes disseram que não eram adequados para a Bundeswehr.

Ironicamente, um dos garotos que queria ir, querendo se tornar um piloto de caça, foi informado no médico que sua visão não era boa o suficiente. Então, eles o classificaram como Nível 2, o que limitou as áreas onde ele poderia ser colocado. Ele optou pelo serviço civil no final.

Dada toda essa esquiva no início dos anos 2000, por que Guttenberg achou que daria certo dessa vez, outra pessoa perguntou. Ele disse que teria que ser tornado atraente com mais opções de aprendizado e estudo pela Bundeswehr. "Então você está tentando vender a Bundeswehr para jovens fingindo que não é serviço militar que você quer que eles façam?", pressionou a pessoa que fez a pergunta.

É um ponto justo. Já há muitas pessoas que usam a Bundeswehr como um meio de estudar em vez de se juntar a ela por um longo prazo. Como resultado, ela já tem um corpo de oficiais que é desproporcionalmente grande em comparação com os praças. É difícil ver como esse problema seria resolvido.

Os jovens também parecem ser tão hostis à ideia do Serviço Nacional quanto eram na minha época. Pesquisas mostram que 60% dos jovens – ou seja, aqueles que seriam afetados diretamente – são contra a ideia.

Tivemos um exemplo disso na sala no sábado. Um jovem levantou a mão e disse a Guttenberg que não devia nada à sociedade e não via por que deveria "desperdiçar um ano" de sua vida em algo que não queria fazer.

Muitas pessoas mais velhas disseram em particular depois que sentiam que era exatamente esse tipo de atitude que fazia com que os jovens fossem obrigados a fazer algo que não queriam. Para mim, esse foi um exemplo interessante do conflito entre direitos individuais e coesão social ali mesmo em um velho celeiro em Brandemburgo.

Depois da palestra de Guttenberg, falei com muitas pessoas no evento sobre isso em um ambiente mais casual. Como esperado, a grande maioria das pessoas da minha idade e mais velhas apoiaram a ideia de reintroduzir o recrutamento (apesar do ceticismo generalizado sobre se ele poderia ser financiado).

Curiosamente, para a maioria, isso não era tanto sobre defesa e prontidão para a guerra, mas sobre coesão social. As pessoas achavam que era bom para os jovens (e possivelmente mulheres) passarem tempo com pessoas de diferentes classes sociais, diferentes regiões e diferentes origens, longe de suas famílias, amigos e zonas de conforto. Era para ser uma experiência de formação de caráter e de nação.

Fascinante, pensei, já que estávamos em um evento que era sobre a Europa e muitas pessoas presentes eram ardentes proponentes da UE. No entanto, eles querem que os bávaros e os renanos rastejem pela lama juntos e se unam enquanto seus colegas franceses fazem o mesmo em seu próprio exército?

Também foi interessante porque, como historiador, não pude deixar de pensar em como esse era exatamente o papel que o serviço militar desempenhou durante e após a unificação alemã no século XIX. Foi introduzido pela primeira vez em grande escala durante as Guerras Napoleônicas, que são conhecidas como as "Guerras de Libertação" em alemão. A ideia de que pessoas de diferentes estados alemães lutaram juntas a partir de 1813 para expulsar os franceses de seus territórios pairou nas mentes dos nacionalistas alemães por um século e ainda estava sendo evocada em 1914, quando a Primeira Guerra Mundial começou.

Não vou aborrecê-lo com os detalhes do recrutamento depois que a Alemanha foi fundada em 1871 (se estiver interessado, há um pouco sobre seus efeitos em Blood and Iron). Basta dizer que o primeiro chanceler alemão Otto von Bismarck estava profundamente ciente do poder galvanizador que o serviço militar tinha sobre as coortes de jovens que deveriam se sentir alemães pela primeira vez. Servir lado a lado por longos períodos de tempo ajudou a superar algumas das vastas diferenças sociais, regionais e religiosas que dividiam as gerações mais velhas.

Após a Primeira Guerra Mundial, o Tratado de Versalhes proibiu o recrutamento na Alemanha para garantir que a República de Weimar tivesse capacidades militares limitadas. O problema com isso foi que ajudou a gerar profundo ressentimento nos círculos militares, bem como terceirizou uma proporção significativa dos veteranos endurecidos pela batalha e da próxima geração, muitos dos quais sentiam que tinham perdido algo, para organizações paramilitares.

Os nazistas reintroduziram o recrutamento em 1935, quebrando descaradamente o Tratado de Versalhes no processo. Em suas mãos, o serviço militar e trabalhista, juntamente com a Juventude Hitlerista, que eventualmente foi compulsória para meninos, tornou-se um instrumento de doutrinação.

Após a Segunda Guerra Mundial, houve uma lacuna na qual a Alemanha foi desmilitarizada. Mas uma vez que os dois estados alemães foram estabelecidos e se tornaram a fronteira da Guerra Fria, tanto a Alemanha Oriental quanto a Ocidental reintroduziram o recrutamento – a Ocidental em 1956, a Oriental em 1962. Berlim Ocidental, no entanto, ainda era legalmente uma cidade ocupada, então não fazia parte da Alemanha Ocidental. Isso significava que os jovens não podiam ser recrutados de lá e, como resultado, muitos alemães ocidentais que queriam evitar o recrutamento se mudaram para lá.

Mesmo com este breve resumo, fica claro o quão importante é este debate na Alemanha. Se os homens alemães devem ou não ser forçados a passar um ano de suas vidas em idade de formação fazendo algo que o estado quer que eles façam é uma questão extremamente carregada e cheia de ressonância histórica na Alemanha. Faça isso sem o consentimento das pessoas e você pode acabar criando mais tensão social do que alivia. Não faça nada e a Alemanha não será capaz de se defender. Esse é um dilema não muito distante do problema que os prussianos tiveram quando Napoleão invadiu há mais de 200 anos.

Acho que Pistorius provavelmente está certo em explorar modelos híbridos. Parece haver apoio público suficiente para isso e permitirá que o estado veja se as medidas têm o efeito desejado. Por outro lado, a incapacidade da Alemanha de colocar seu exército em forma é preocupante em um mundo que não é o que era em 2011, há um grau de urgência envolvido em termos de defesa e dissuasão.

Peço desculpas se você estava lendo isso, esperando pacientemente por uma conclusão definitiva. Em vez disso, devo deixá-lo — na questão do recrutamento alemão, assim como em muitos outros assuntos — com a desculpa padrão do historiador: é complicado.

quinta-feira, 25 de julho de 2024

SHOT FAIR BRASIL 2024 - E o Warfare Blog esteve na maior feira de armas de fogo do Brasil!


Por Carlos Junior
Há alguns poucos meses atrás, fui informado, com muita felicidade, que a maior feira de armas de fogo do país, a Shot Fair Brasil, seria realizado pela primeira vez a cidade de São Paulo, o que facilitou muito minha participação. Esta foi a 4º edição da feira, que até então, estava ocorrendo na cidade de Joinville, Santa Catarina, em seu  Centro de Convenções e Exposições Expoville. 
Em parceria com o portal  ASSUNTOS MILITARES, eu estive presente no Shot Fair Brasil 2024!
Aqui em São Paulo, o evento foi organizado dentro do distrito Anhembi, uma das maiores áreas de exposições da cidade (e do Brasil) e que mesmo com um estacionamento gigantesco, ainda sim lotou! 

Os destaques ficaram por conta da loja MAHRTE que trouxe diversos produtos de vestimentas, acessórios táticos e um acervo de armas sensacional. Neste ultimo item, estavam expostos fuzis russos Kalashnikov AK-101 (cal 5,56x45mm), AK-308 (cal 308 Win), AK-102 (um AKSU em calibre 5,56x45mm) e uma carabina Carabina KR-9 SBR  (um AK em calibre 9 mm Luger). Outras marcas presentes no estande da Mahrte foram os fuzis da família AR-556 da Ruger, apresentados em diversas versões e em calibre 5,56x45 mm. Também não faltaram excelentes surpresas entre as armas curtas. Os destaques foram uma rara pistola russa Baiakal MP-446 em calibre 9 mm e a nova pistola regulamentar do Exército dos Estados Unidos, a Sig Sauer M-17, em calibre 9 mm que está substituindo as famosas Beretta M-9 (também presentes na feira).
A pistola  Baiakal MP-446 Viking, de fabricação russa foi uma surpresa na Shot Fair 2024. A arma é bastante dura, com suas teclas em posições diferentes das armas ocidentais. Seu acabamento me pareceu espartano também.

A nova pistola Sig Sauer M-17 do Exército dos Estados Unidos. A empunhadura deste modelo é extremamente confortável.

O fuzil Kalashnikov AK-101, configurado para operar com o calibre 5,56x45mm e seus irmãos em calibre 308 Win e 9 mm Luger foram uma grata surpresa na feira.

Parte do balcão de armas curtas da loja Mahrte.

Pistola Glock 21 em calibre 45 ACP

Fuzis Kalashnikov e Rugers (os ARs) no estande da Mahrte

O Estande da Taurus e CBC, como de costume, estavam compartilhando o mesmo local, uma vez que a CBC é proprietária da marca Taurus, era o maior estande da feira. O grande acervo de produtos das duas empresas precisa de grande espaço para poder acomodar todo o portfólio deles.
Parte das armas curtas da Taurus. Em primeiro plano a pistola TX22, reconhecidamente uma das melhores pistolas em calibre 22 LR do mercado.


Com as dificuldades para os civis possuírem armas de fogo trazida de volta com o governo ptista, o calibre 380ACP voltou a ser uma opção. Assim, a Taurus trouxe de volta sua PT938, umas excelente pistola que fez boa fama durantes os anos de produção.


Um dos destaques no estande da Taurus foi o fuzil T10 em calibre 308 Win. Baseado na plataforma  AR-10, projeto da Armalite que antecedeu o AR-15, a Taurus incorporou todas as modernidades encontradas na plataforma AR atual.

Revolver Taurus 44H Raging Bull dual tone em, calibre 44 Magnum.


A "parede" do lado da CBC no estande da Taurus estava completo com os produtos da empresa. As carabinas de pressão da família Nitro, Jade, e o acervo de carabinas de repetição em calibre 22 LR e em 22 WMR estavam disponíveis. Me chamou a atenção a pequena carabina em calibre 22 WMR com sistema de repetição por alavanca (Lever action) Rio Bravo 22WMR.

Uma das maiores novidades da CBC foram as novas carabinas R95 em sistema Lever Action, nos calibre 30-30 WIN, 444 Mallin, 45-70 GOV e 357 Magnum, mas na plataforma Marlin, com ejeção do estojo pela lateral da arma, permitindo maior facilidade em instalação de lunetas, algo mais complicado nos modelos Puma, cuja plataforma é a Winchester.

As munições para armas longas militares da CBC

Fuzil CBC Ranger 308, com funcionamento ação de ferrolho (bolt action) com cano bull de 24 polegadas para tiros de precisão.

A Glock montou um belo estande na feira com a apresentação de todos os seus modelos. A Glock tem muitos admiradores, notadamente o pessoal profissional, que faz opção pelo emprego das armas da marca devido a grande confiabilidade e robustez de suas armas.
Estande da Glock chamou bastante a atenção dos visitantes. Esta empresa é muito popular entre os aficionados de armas brasileiros.

Glock 17 MOS de 5º geração, a versão mais recente da famosa marca austríaca.

Outra empresa nacional presente foi a Fire Eagle Armory, que produz carabinas e fuzis na plataforma AR com uma qualidade superior e reconhecida no mercado. Mais uma grande empresa da região sul do Brasil que consolida sua posição no mercado de armas de fogo.

Fuzil Semi Automático Fire Eagle  FE-115S com acabamento TAM em calibre 5,56 x45 mm.

Estande da Fire Eagle Armory

Novo fuzil de precisão Fire Eagle Reaper, operado por ação de ferrolho, que será produzido nos calibres 7,62x51 mm, 6,5 mm Creedmoor e no 308 Winchester e que será uma nova família de armas com versões para caça, esporte e tática.

A empresa InfiRay, uma empresa chinesa especializada em equipamentos de imageamento térmico,  esteve presente na feira com sua linha de visores de imagem térmica, extremamente interessantes.
Equipamentos de visão térmica da InfiRay

Além da loja Mahrte mencionada no inicio deste artigo, outra grande loja de armas que estava expondo seus produtos e serviços foi a Prime Guns. Eles apresentaram armas de ar comprimido, de airsoft e um bom arsenal de armas de fogo importadas.

Armas de Airsoft e de pressão no estande da Prime Guns

Armas de pressão na Prime Guns


O acervo de armas de fogo da Prime Guns  estava com pistolas Beretta, Mossberg, dentre outras.


Fabricantes de equipamentos para recarga de munições também não faltaram à este importante evento do tiro nacional.

A famosa cuteleira Zakharov foi umas das empresas de laminas presentes na Shot Fair. 2024


O espaço para palestras contou com apresentação de conteúdo para atiradores e aficionados por armas de fogo, assim como políticos que apoiam essa pauta no Brasil.


                     
              


                         

sexta-feira, 19 de julho de 2024

BOEING EA-18G GROWLER. O punho eletrônico da US Navy

Boeing E/A-18G Growler

FICHA TÉCNICA
Velocidade de cruzeiro: mach 1
Velocidade máxima: mach 1,8
Razão de subida: 13682 m/min.
Potência: 0,93.
Carga de asa: 92,8 lb/pé².
Fator de carga: 7,5 Gs, podendo atingir 10 Gs por pequenos espaços de tempo.
Taxa de giro instantânea: n.d.
Razão de rolamento: n.d.warfare blog
Teto de Serviço: 15940 m. 
Raio de ação/ alcance: 1,574km com dois mísseis AIM-120, três pods ALQ-99, dois mísseis AGM-88 HARM e dois tanques externos de 480 galões/3.330km 
Alcance do radar: Raytheon AN/ APG-79 com 160 km (RCS 5m2).
Empuxo: 2 motores F-414 GE-400 com 10.000kgf de potência com pós combustor.
DIMENSÕES
Comprimento: 18,5 m.
Envergadura: 13,68 m.
Altura: 4,87 m.

DESCRIÇÃO
Por Sergio Santana

AS ORIGENS DO "GROWLER"
O projeto da aeronave que resultou no Northrop Grumman EA-18G “Growler” (“Resmungador”), iniciou-se no final dos anos 1990, culminando com uma demonstração de voo bem sucedida de um F-18F Super Hornet – designado “F-1” – em 15 de novembro de 2001, como prova de conceito para o programa “Airborne Electronic Attack” (Ataque Eletrônico Aerotransportado), que visava a substituir o Grumman EA-6B “Prowler” como futuro vetor de guerra eletrônica a bordo dos porta-aviões da US Navy. 
Dois anos depois, a instituição concedeu um contrato de desenvolvimento do EA-18G para a Boeing, que seria a contratante principal, devendo construir a fuselagem dianteira, as asas e fazer a montagem final, enquanto a Northrop Grumman, como subcontratada, faria as seções central e traseira da fuselagem, bem como os componentes do sistema de combate eletrônico. 
O primeiro exemplar de teste do EA-18G entrou em produção em 22 de outubro de 2004, e a primeira aeronave de teste, conhecida como EA-1, foi lançada em 3 de agosto de 2006, antes de fazer seu voo inaugural em 15 de agosto de 2006.
No mês seguinte foi transportado para a Estação Aeronaval de Patuxent River em 22 de setembro de 2006. O segundo exemplar, EA-2, voou pela primeira vez em 10 de novembro de 2006, e foi entregue à Patuxent River em 29 de novembro de 2006. Ambas as aeronaves foram atribuídas ao VX-23 ‘Salty Dogs’. Os EA-1 e EA-2 eram F/A-18Fs “F-134” e “F-135”, retirados da linha de produção de St. Louis e modificados para a configuração EA-18G. Como não foram construídos inicialmente como Growlers, a Marinha norte-americana designou essas duas aeronaves de teste como NEA-18G. A primeira aeronave operacional foi entregue à Estação Aeronaval de Whidbey Island em junho de 2008 e a avaliação operacional começou em outubro do mesmo ano a bordo do USS John C Stennis.
Baseado na versão F/A-18F Super Hornet, o Growler traz uma capacidade de combate aéreo que o antigo EA-6B Prowler, não tinha.

CARACTERÍSTICAS TECNICAS DO "GROWLER"
Tendo como missões o ataque eletrônico e supressão das defesas aéreas inimigas, especialmente no início e nos estágios iniciais das hostilidades em curso, o Growler é equipado com um conjunto exclusivo de dispositivos projetados para as suas tarefas:

Northrop Grumman AN/ALQ-218(V)2: carregado nas pontas das asas e à frente do cockpit do Growler (onde ficava o canhão M61 Vulcan), é um sistema de sensor receptor de alerta de radar passivo aerotransportado/medidas de apoio à guerra eletrônica/inteligência eletrônica (RWR/ESM/ELINT) projetado para consciência situacional e coleta de inteligência de sinais. O AN/ALQ-218 detecta, identifica, localiza e analisa fontes de emissão de radiofrequência.

EDO Corporation AN/ALQ-99: carregado em até três unidades sob as asas e linha central do Growler, o AN/ALQ-99 foi “herdado” do “Prowler”, sendo formado por um receptor, antenas, transmissores de interferência e equipamento excitador. O sistema é capaz de interceptar, processar automaticamente e bloquear sinais de radiofrequência recebidos Os receptores do sistema também podem ser usados para detectar, identificar e direcionar esses sinais, fornecendo inteligência de sinais (SIGINT) de forma automática ou manual. O AN/ALQ-99 tem uma potência máxima de 10,8 kW em suas versões mais antigas e de 6,8 kW em suas versões mais recentes e usa uma turbina de ar comprimido para fornecer sua própria energia. O AN/ALQ-99 é capaz de bloquear frequências de 64 MHz a 20 GHz. As faixas de frequência de interferência são definidas em 10 bandas: Banda 1: 64 - 150 MHz; Banda 2: 150 - 270 MHz; Banda 3: 270 - 500 MHz; Banda 4: 0,5 - 1 GHz; Banda 5/6: 1 - 1,25 GHz; Banda 7: 2,5 - 4 GHz; Banda 8: 4 - 7,8 GHz; Banda 9: 7,8 - 11 GHz; Banda 10: 11 - 20 GHz.

Raytheon AN/ALQ-227: é um conjunto de contramedidas de comunicação AN/ALQ-227 é um dispositivo instalado internamente no Growler projetado para interceptar, processar e bloquear sinais, e também para determinar onde eles se originaram. 
Aqui, um tripulante verifica um pod AN/ALQ-99: 

Além destes equipamentos específicos, e sendo um derivado do Super Hornet, o Growler possui o radar AESA Raytheon AN/APG-79, com alcance de detecção de 150 km contra um alvo de 1m2, possuindo modos ar-ar (incluindo busca e rastreamento aéreos) e  e ar-superfície (incluindo busca marítima e indicação e rastreamento de alvos móveis no solo). 
Completando o pacote de equipamentos eletrônicos, o Growler possui o sistema de dispensador de contramedida BAe Systems AN/ALE-47, integrado com os receptores de aviso de radar da aeronave, receptores de alerta de mísseis e outros sensores de guerra eletrônica. Quando os sensores da aeronave detectam uma ameaça, o sistema de dispensador de contramedida lança automaticamente contramedidas de chaff e flare, no momento ideal para derrotar os mísseis a caminho da aeronave. O AN/ALE-47 consiste em uma unidade de controle de cockpit, unidades sequenciadoras e os dispensadores de contramedida, As unidades sequenciadoras controlam os dispensadores e são automaticamente capazes de detectar erros de ignição e corrigi-los. Cada dispensador pode conter cinco tipos diferentes de contramedidas para um total de 30. Todo o sistema pode acomodar até 32 dispensadores em aeronaves como o Growler.
O painel do piloto do Growler segue o mesmo padrão do F/A-18F Super Hornet. Já, abaixo, podemos ver o painel do Oficial de Guerra Eletrônica (EWO).

Todos esses sistemas são gerenciados por um segundo tripulante, denominado “EWO”, sigla em inglês para “Oficial de Guerra Eletrônica”, que dispõe de telas LCD e touchscreen de 8x10 polegadas e 5x5 polegadas. Assim como o piloto, o EWO tem um sistema de pontaria montado no capacete, que possibilita a ambos dispararem as armas da aeronave, enquanto executam manobras evasivas de alta aceleração sem receio de ultrapassar os limites da aeronave, cujas superfície de controle são atuadas por FBW. Como é típico da sua geração, os comandos principais para operar a aeronave estão concentrados na coluna de controle e nos manetes de potência, dentro da filosofia HOTAS.   
Por falar em armas, ao contrário do Prowler, o Growler pode ser armado para autodefesa, com mísseis Raytheon AIM-120 AMRAAM, enquanto que para as missões de ataque a aeronave pode ser armada com mísseis anti-radiação Northrop Grumman AGM-88 HARM e mesmo a bomba planadora Raytheon AGM-154 JSOW. 
Nessa foto, é visível um míssil anti-radiação AGM-88E HARM, no cabide externo da asa. Para auto defesa, o Growler, também, é armado com mísseis de médio alcance AIM-120 AMRAAM.

OS "BLOCKS" DO GROWLER
O EA-18G é fabricado em dois “Blocks”: o Block 1 é equipado com até três pods AN/ALQ-99, os dispositivos AN/ALQ-218(V)2 e AN/ALQ-227. O Block 2 Growler está equipado com o radar AN/APG-79, e os dispositivos AN/ALQ-218(V)2 AN/ALE-47. Deve ser lembrado que as aeronaves do Bloco 2 têm a capacidade de transferir dados de alvo para outros meios aéreos, terrestres ou de plataformas de ataque de superfície através do Link 16.

ENTRADA EM SERVIÇO E O CLIENTE ESTRANGEIRO
Em 5 de agosto de 2009, Growlers EA-18G de VAQ-129 e VAQ-132 completaram seu primeiro pouso em porta-aviões a bordo do USS Harry S. Truman. O primeiro esquadrão EA-18G foi o VAQ-132 ‘Scorpions’, que atingiu status operacional em outubro de 2009. O primeiro cruzeiro operacional do Growler foi anunciado em fevereiro de 2011, com ele tendo sido empregado em combate pela primeira vez no mesmo ano durante a Operação ‘Odyssey Dawn’, reforçando a zona de exclusão aérea da ONU sobre a Líbia.  
Até o momento, o único operador do EA-18G Growler é a Real Força Aérea Australiana, que em 2008 anunciou a compraria até seis EA-18Gs (quantidade dobrada em 2013), que integravam o pacote de 24 F/A-18F Super Hornets.
A Austrália recebeu o primeiro de doze Growlers em 29 de julho de 2015, com entrega dos jatos restantes prevista para 2017. Seguindo as missões da Operação ‘Odyssey Dawn’ da Marinha dos EUA em 2011 sobre a Líbia, a Real Força Aérea Australiana decidiu adicionar o pod Raytheon ATFLIR nos seus Growler, melhorando a capacidade de identificação visual dos alvos detectados.
Operados pelo 6º Esquadrão, baseado em Amberley, os Growler australianos também são armados com o míssil  ar-ar de curto alcance Raytheon AIM-9X Sidewinder.
A Real Força Aérea Australiana (RAAF) é o único usuário estrangeiro do EA-18G Growler, com 12 unidades (um esquadrão).

A Marinha dos Estados Unidos possuem, atualmente, 152 EA-18G Growler em serviço.

Graças a configuração de "caça", o EA-18G pode se defender bem caso precise lutar para voltar para casa.

Esquema em 3 vistas do EA-18G Growler

 
           
Sergio Santana Bacharel em Ciências Aeronáuticas (Universidade do Sul de Santa Catarina – UNISUL), pós-graduado em Engenharia de Manutenção Aeronáutica (Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG). Colaborador de Conteúdo da Shephard Media. Colaborador das publicações Air Forces Monthly, Combat Aircraft e Aviation News. Autor e co-autor de livros sobre aeronaves de Vigilância/Reconhecimento/Inteligência, navios militares, helicópteros de combate e operações aéreas   


                       


quinta-feira, 27 de junho de 2024

RAYTHEON AIM-9X SIDEWINDER - O herdeiro do mais famoso míssil ar ar da história.


AIM-9X
FICHA TECNICA 
Comprimento: 3,02 m.
Envergadura: 0,45 m.
Peso: 85 kg.
Alcance: 16 km.
Velocidade: mach 2,8
Propulsão: Propelente sólido MK36
Ogiva: Tipo WAU-17/B com 9,4 kg, com explosão de fragmentação anular.
Sistema de guiagem: Buscador Infravermelho com grande ângulo de busca (90º)
Plataformas de lançamento: F-15, F-16, F/A-18, F-22, e F-35.

DESCRIÇÃO
Por Carlos Junior

Quando se pensa em um míssil ar ar de curto alcance, a primeira imagem que se vem à cabeça (pelo menos para quem conhece um pouquinho de aviação de caça) é o míssil AIM-9 Sidewinder montado na ponta da asa de algum caça como um F-5E Tiger II ou em um cabide sob a asa de um F-15 ou F-16. Trata-se de um projeto desenvolvido no final dos anos 40 e que entrou em serviço na segunda metade da década de 50 do século passado. A saga do Sidewinder já conta com quase 70 anos de desenvolvimento distribuídos em muitas versões com capacidades e funções diferentes. Houve uma versão antiaérea chamada de MIM-72 Chaparral, que era lançada de um veículo blindado. Uma outra versão anti-radar, AGM-122 Sidearm, lançada de de helicópteros de combate Apache, Cobra ou de aeronaves  caça AV-8B Harrier II.
Independente da versatilidade do projeto, as versões que dominam a maior parte da história desse projeto, foram as de combate aéreo.
Míssil AIM-9M Sidewinder. Esta versão foi substituída pelo atual AIM-9C. Alguns componentes do modelo M foram aproveitados no X, sendo o motor foguete e a espoleta de aproximação a laser, alguns destes itens.

Depois da queda da cortina de ferro, com o colapso da União Soviética, em 1989, algumas tecnologias que não eram conhecidas pelo ocidente foram expostas e se descobriu que os mísseis de curto alcance R-73 empregados em aviões de combate soviéticos, tinham capacidades muito (e reforço, muito) superior aos AIM-9L/M usados pelos aviões de combate norte americanos e da OTAN. O R-73 opera com seu sensor de busca integrado a um visor montado no capacete do piloto do caça, e quer podia ser travado no alvo em ângulos elevados (45º) além da linha de visada (capacidade off boresight), o que garantia a possibilidade de ser lançado com alta probabilidade de abate contra um avião inimigo manobrando forte sem que o avião lançador estivesse alinhado com o alvo. Para se ter uma ideia, o AIM-9M, míssil que era operado pelos aviões de combate norte americanos naquela época, tinha um ângulo de rastreio de apenas 27,5º. Para fechar a conta, o R-73 usa vetoração de empuxo, o que permite manobrar violentamente e superar a capacidade de manobra de todos os modelos de aviões de combate. Não importa o quão manobrável seja o caça alvo. Contra o R-73 ele estará em desvantagem, devido a essa alta capacidade de manobra do míssil.
Essa superioridade do R-73 frente ao míssil AIM-9 Sidewinder foi o gatilho para se buscar um novo míssil ar ar, ou integrar todas essas habilidades à uma nova versão do Sidewinder.
A escolha recaiu sobre uma nova versão do Sidewinder, que foi batizado de AIM-9X e em 1994, foi dado a duas empresas, a Hughes Missile Systems Company e a Rayheon, contratos de desenvolvimento para que competissem entre si para que a melhor proposta fosse escolhida e produzida em série.  Esse procedimento de concorrência é uma característica bastante comum nas forças armadas norte americanas.
O vencedor foi a Hughes, porém, a Raytheon acabou adquirindo a Hughes posteriormente e passou a comandar projeto do AIM-9X que foi escolhido e adquirido pela USAF (Força Aérea dos Estados Unidos) e a US Navy (Marinha dos Estados Unidos).
O AIM-9X entrou em serviço na USAF (Força Aérea dos Estados Unidos) e na USN (Marinha dos Estados Unidos). Aqui temos um F/A-18F Super Hornet da USN com um AIM-9X na ponta da asa e um míssil anti-radar AGM-88F HARM no cabide sob a asa.

O míssil AIM-9X difere, externamente, das versões anteriores por usar superfícies de controle bem menores. Seu sensor de busca foi projetado para poder ser acomodado em um bico menor. Os canards do míssil, diferente dos AIM-9 anteriores, são fixos, enquanto as barbatanas traseiras são inteiramente moveis, não dispondo dos rollerons encontrados nos modelos anteriores. Esse conjunto, somando com a vetoração de empuxo do míssil, permite manobrar muito mais rapidamente que as versões anteriores. O míssil possui redução da envergadura total do míssil. Tudo isso visando melhorar muito a aerodinâmica do míssil.
O sensor de busca infravermelha consegue rastrear o alvo em ângulos de 90º fora da linha de visada. Este sensor pode operar de forma integrada ao radar do avião lançador, para se direcionar automaticamente para o contato radar. Também pode ser operado de forma integrada ao capacete JHMCS permitindo que o alvo seja selecionado pelo piloto apenas olhando para o alvo, como no R-73 russo, porém, com considerável maior ângulo de aquisição. Embora tenha sido informado que o buscador infravermelho usado no AIM-9X seja capaz de diferenciar o alvo real de iscas tipo flares, já ocorreram situações de combate reais recentes onde o AIM-9X tenha sido ludibriado por iscas flares de origem russas. Uma teoria sobre isso, diz que o sistema foi testado e calibrado para lidar com as iscas que os americanos usam. 
O sensor infravermelho do AIM-9X é capaz de rastrear um alvo que esteja a 90º de sua frente. Isso garante que ele possa engajar este alvo sem que a aeronave lançadora precise manobrar fortemente para se alinhar com o alvo, como era o caso dos mísseis anteriores

O motor do AIM-9X é o MK-36, mesmo usado no modelo M, porém, com introdução de vetoração de empuxo, como mencionado anteriormente, útil enquanto o motor ainda estiver queimando. Sua capacidade de manobra, graças à essa habilidade de vetorar o fluxo de saída dos gases da queima do motor, é de 60 Gs. A titulo de comparação, o AIM-9M, empregado nos caças norte americanos nos anos 90 do século passado, chegavam à 30 Gs, no máximo.
O alcance do míssil é de cerca de 16 km. Porem, se lançado contra um alvo vindo de frente, somando-se a energia inercial após o término da queima do combustível, pode-se presumir que ele consiga, nessa situação, ser lançado há cerca de 30 km contra seu alvo.
Aqui podemos ver uma foto destacando o sistema de vetoração de empuxo do AIM-9X. Observem, também, que as superfícies de controle traseiro são totalmente moveis.

A ogiva do AIM-9X é do tipo WAU-17/B com 9,4 kg alto explosivo e fragmentação anular, o que aumenta sua letalidade de forma significativa. A ogiva não depende de impacto direto para explodir. Na verdade, a detonação dessa ogiva ocorre através de uma espoleta de aproximação a laser DSU-15B/B.

O sistema de espoleta de aproximação a laser DSU-15B/B

A versão AIM-9X Block II entrou em serviço a partir de 2015 e recebeu a capacidade de travamento do alvo após o lançamento (LOAL) e um sistema de link de dados para receber atualização de dados de posicionamento do alvo. Essa versão é a que é empregada nos caças de 5º geração norte americanos F-22 e F-35. Além disso, o AIM-9X Block II pode ser lançado da superfície, através da bateria antiaérea do sistema NASAMS 3, correspondendo a arma de curto alcance para este sistema multimísseis que, normalmente emprega o AIM-120 AMRAAM  de médio alcance. 
Lançamento de um míssil AIM-9X II de um lançador do sistema NASAMS 3. Este sistema permite empregar, também, o míssil de médio alcance AIM-120 AMRAAM.

Atualmente, todos os caças de primeira linha norte americanos, F-15, F-16, F/A-18C/D/E/F, F-22 e F-35 estão homologados para emprego do AIM-9X. Muitos países, usuários de modelos de aeronaves de combate dos Estados Unidos, notadamente o F-16, F-35 e as variantes do F-18 Hornet, já empregam o AIM-9X em suas aeronaves, podendo ser considerado um sucesso comercial no mercado de exportação.
Caça F-22A Raptor em um lançamento de teste do AIM-9X II. Os caças de 5º geração F-22 e F-35 foram os últimos caças norte americanos a receberem a integração do míssil AIM-9X.

Míssil AIM-9X instalado no cabide externo de um F-35A Lightining II.