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quinta-feira, 27 de junho de 2024

RAYTHEON AIM-9X SIDEWINDER - O herdeiro do mais famoso míssil ar ar da história.


AIM-9X
FICHA TECNICA 
Comprimento: 3,02 m.
Envergadura: 0,45 m.
Peso: 85 kg.
Alcance: 16 km.
Velocidade: mach 2,8
Propulsão: Propelente sólido MK36
Ogiva: Tipo WAU-17/B com 9,4 kg, com explosão de fragmentação anular.
Sistema de guiagem: Buscador Infravermelho com grande ângulo de busca (90º)
Plataformas de lançamento: F-15, F-16, F/A-18, F-22, e F-35.

DESCRIÇÃO
Por Carlos Junior

Quando se pensa em um míssil ar ar de curto alcance, a primeira imagem que se vem à cabeça (pelo menos para quem conhece um pouquinho de aviação de caça) é o míssil AIM-9 Sidewinder montado na ponta da asa de algum caça como um F-5E Tiger II ou em um cabide sob a asa de um F-15 ou F-16. Trata-se de um projeto desenvolvido no final dos anos 40 e que entrou em serviço na segunda metade da década de 50 do século passado. A saga do Sidewinder já conta com quase 70 anos de desenvolvimento distribuídos em muitas versões com capacidades e funções diferentes. Houve uma versão antiaérea chamada de MIM-72 Chaparral, que era lançada de um veículo blindado. Uma outra versão anti-radar, AGM-122 Sidearm, lançada de de helicópteros de combate Apache, Cobra ou de aeronaves  caça AV-8B Harrier II.
Independente da versatilidade do projeto, as versões que dominam a maior parte da história desse projeto, foram as de combate aéreo.
Míssil AIM-9M Sidewinder. Esta versão foi substituída pelo atual AIM-9C. Alguns componentes do modelo M foram aproveitados no X, sendo o motor foguete e a espoleta de aproximação a laser, alguns destes itens.

Depois da queda da cortina de ferro, com o colapso da União Soviética, em 1989, algumas tecnologias que não eram conhecidas pelo ocidente foram expostas e se descobriu que os mísseis de curto alcance R-73 empregados em aviões de combate soviéticos, tinham capacidades muito (e reforço, muito) superior aos AIM-9L/M usados pelos aviões de combate norte americanos e da OTAN. O R-73 opera com seu sensor de busca integrado a um visor montado no capacete do piloto do caça, e quer podia ser travado no alvo em ângulos elevados (45º) além da linha de visada (capacidade off boresight), o que garantia a possibilidade de ser lançado com alta probabilidade de abate contra um avião inimigo manobrando forte sem que o avião lançador estivesse alinhado com o alvo. Para se ter uma ideia, o AIM-9M, míssil que era operado pelos aviões de combate norte americanos naquela época, tinha um ângulo de rastreio de apenas 27,5º. Para fechar a conta, o R-73 usa vetoração de empuxo, o que permite manobrar violentamente e superar a capacidade de manobra de todos os modelos de aviões de combate. Não importa o quão manobrável seja o caça alvo. Contra o R-73 ele estará em desvantagem, devido a essa alta capacidade de manobra do míssil.
Essa superioridade do R-73 frente ao míssil AIM-9 Sidewinder foi o gatilho para se buscar um novo míssil ar ar, ou integrar todas essas habilidades à uma nova versão do Sidewinder.
A escolha recaiu sobre uma nova versão do Sidewinder, que foi batizado de AIM-9X e em 1994, foi dado a duas empresas, a Hughes Missile Systems Company e a Rayheon, contratos de desenvolvimento para que competissem entre si para que a melhor proposta fosse escolhida e produzida em série.  Esse procedimento de concorrência é uma característica bastante comum nas forças armadas norte americanas.
O vencedor foi a Hughes, porém, a Raytheon acabou adquirindo a Hughes posteriormente e passou a comandar projeto do AIM-9X que foi escolhido e adquirido pela USAF (Força Aérea dos Estados Unidos) e a US Navy (Marinha dos Estados Unidos).
O AIM-9X entrou em serviço na USAF (Força Aérea dos Estados Unidos) e na USN (Marinha dos Estados Unidos). Aqui temos um F/A-18F Super Hornet da USN com um AIM-9X na ponta da asa e um míssil anti-radar AGM-88F HARM no cabide sob a asa.

O míssil AIM-9X difere, externamente, das versões anteriores por usar superfícies de controle bem menores. Seu sensor de busca foi projetado para poder ser acomodado em um bico menor. Os canards do míssil, diferente dos AIM-9 anteriores, são fixos, enquanto as barbatanas traseiras são inteiramente moveis, não dispondo dos rollerons encontrados nos modelos anteriores. Esse conjunto, somando com a vetoração de empuxo do míssil, permite manobrar muito mais rapidamente que as versões anteriores. O míssil possui redução da envergadura total do míssil. Tudo isso visando melhorar muito a aerodinâmica do míssil.
O sensor de busca infravermelha consegue rastrear o alvo em ângulos de 90º fora da linha de visada. Este sensor pode operar de forma integrada ao radar do avião lançador, para se direcionar automaticamente para o contato radar. Também pode ser operado de forma integrada ao capacete JHMCS permitindo que o alvo seja selecionado pelo piloto apenas olhando para o alvo, como no R-73 russo, porém, com considerável maior ângulo de aquisição. Embora tenha sido informado que o buscador infravermelho usado no AIM-9X seja capaz de diferenciar o alvo real de iscas tipo flares, já ocorreram situações de combate reais recentes onde o AIM-9X tenha sido ludibriado por iscas flares de origem russas. Uma teoria sobre isso, diz que o sistema foi testado e calibrado para lidar com as iscas que os americanos usam. 
O sensor infravermelho do AIM-9X é capaz de rastrear um alvo que esteja a 90º de sua frente. Isso garante que ele possa engajar este alvo sem que a aeronave lançadora precise manobrar fortemente para se alinhar com o alvo, como era o caso dos mísseis anteriores

O motor do AIM-9X é o MK-36, mesmo usado no modelo M, porém, com introdução de vetoração de empuxo, como mencionado anteriormente, útil enquanto o motor ainda estiver queimando. Sua capacidade de manobra, graças à essa habilidade de vetorar o fluxo de saída dos gases da queima do motor, é de 60 Gs. A titulo de comparação, o AIM-9M, empregado nos caças norte americanos nos anos 90 do século passado, chegavam à 30 Gs, no máximo.
O alcance do míssil é de cerca de 16 km. Porem, se lançado contra um alvo vindo de frente, somando-se a energia inercial após o término da queima do combustível, pode-se presumir que ele consiga, nessa situação, ser lançado há cerca de 30 km contra seu alvo.
Aqui podemos ver uma foto destacando o sistema de vetoração de empuxo do AIM-9X. Observem, também, que as superfícies de controle traseiro são totalmente moveis.

A ogiva do AIM-9X é do tipo WAU-17/B com 9,4 kg alto explosivo e fragmentação anular, o que aumenta sua letalidade de forma significativa. A ogiva não depende de impacto direto para explodir. Na verdade, a detonação dessa ogiva ocorre através de uma espoleta de aproximação a laser DSU-15B/B.

O sistema de espoleta de aproximação a laser DSU-15B/B

A versão AIM-9X Block II entrou em serviço a partir de 2015 e recebeu a capacidade de travamento do alvo após o lançamento (LOAL) e um sistema de link de dados para receber atualização de dados de posicionamento do alvo. Essa versão é a que é empregada nos caças de 5º geração norte americanos F-22 e F-35. Além disso, o AIM-9X Block II pode ser lançado da superfície, através da bateria antiaérea do sistema NASAMS 3, correspondendo a arma de curto alcance para este sistema multimísseis que, normalmente emprega o AIM-120 AMRAAM  de médio alcance. 
Lançamento de um míssil AIM-9X II de um lançador do sistema NASAMS 3. Este sistema permite empregar, também, o míssil de médio alcance AIM-120 AMRAAM.

Atualmente, todos os caças de primeira linha norte americanos, F-15, F-16, F/A-18C/D/E/F, F-22 e F-35 estão homologados para emprego do AIM-9X. Muitos países, usuários de modelos de aeronaves de combate dos Estados Unidos, notadamente o F-16, F-35 e as variantes do F-18 Hornet, já empregam o AIM-9X em suas aeronaves, podendo ser considerado um sucesso comercial no mercado de exportação.
Caça F-22A Raptor em um lançamento de teste do AIM-9X II. Os caças de 5º geração F-22 e F-35 foram os últimos caças norte americanos a receberem a integração do míssil AIM-9X.

Míssil AIM-9X instalado no cabide externo de um F-35A Lightining II.


                  

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

O grande desfile militar dos 75 anos do Exército Popular da Coréia do Norte


Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 9 de fevereiro de 2023.

Um grande desfile militar foi realizado na Praça Kim Il Sung, na capital Pyongyang, em 8 de fevereiro para comemorar o 75º aniversário de fundação do Exército Popular da Coréia, as forças armadas revolucionárias da República Popular Democrática da Coréia.

A cerimônia ocorreu à noite, com a presença do "Líder Supremo da Coréia do Norte" Kim Jong-un e sua entourage, marcando a quarta aparição pública da filha de 10 anos do grande líder, Kim Ju-ae.

O desfile demonstrou as típicas formações em massa de soldados marchando em uníssono com fuzis Kalashnikov com baionetas caladas, e com passos firmes e gritos de guerra vigorosos. Além das demonstrações de tropas especiais com equipamentos de combate invernal, snipers em trajes ghillie e outras forças especiais, o principal evento foi a exibição da maior quantidade de mísseis intercontinentais balístico (ICBM) com capacidades nucleares. Além da quantidade e tamanhos enormes desses novos mísseis, o maior e mais avançado deles foi exibido: o Hwasong-17.


Hwasong-17 tem capacidade para atingir qualquer ponto no território dos Estados Unidos e é o carro-chefe do programa de defesa norte-coreano. Outra novidade foi que alguns ICBM parecem ser projetados para usarem combustível sólido, o que os tornaria muito mais rápidos para pronto-lançamento em comparação aos modelos de combustível líquido. No ano passado, os norte-coreanos realizaram um recorde de lançamentos, inclusive lançando um míssil sobre o Japão; causando apreensão nos países limítrofes.

Conforme notado pelos analistas, esses mísseis são tão importantes para ethos norte-coreano que a esposa do líder supremo foi vista usando um pingente com a forma do Hwasong-17. Em novembro o ano passado, Kim Jon-un supervisionou o lançamento do novo ICBM acompanhado da filha para estabelecer uma ideia de continuidade do regime, como uma possível sucessora, e para mostrar que o regime norte-coreano não tem intenção de abandonar o seu programa nuclear.

Kim Jon-un e Kim Ju-ae diante de um míssil Hwasong-17,
19 de novembro de 2022.

Seguem algumas imagens do desfile:




























segunda-feira, 11 de julho de 2022

Parlamentares dos EUA pretendem integrar sistemas de defesa de Israel e 9 Estados árabes contra o Irã

O comandante da Guarda Revolucionária Iraniana, Major-General Hossein Salami (à direita) passa por um sistema de defesa aérea Khordad-3 durante uma visita a uma exposição no museu da Revolução Islâmica e Defesa Sagrada, na capital Teerã, em 21 de setembro de 2019.
(Atta Kenare/ AFP)

Por Jacob Magid, The Times of Israel, 10 de junho de 2022.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 11 de julho de 2022.

Projetos de lei bipartidários na Câmara e no Senado veriam Israel trabalhar com países como Iraque, Arábia Saudita, Omã, Kuwait e Catar – embora não esteja claro se eles estão a bordo.

Grupos bipartidários de legisladores dos EUA na Câmara e no Senado apresentaram legislação na quinta-feira destinada a criar um sistema integrado de defesa aérea para aumentar a cooperação entre Israel e Estados árabes vizinhos contra o Irã.

A Lei Dissuadir as Forças Inimigas e Habilitar as Defesas Nacionais (Deterring Enemy Forces and Enabling National Defenses, DEFEND) é o mais recente esforço nos EUA para reforçar os acordos de normalização dos Acordos de Abraham que o governo Trump intermediou entre Israel, Emirados Árabes Unidos, Bahrein e Marrocos em 2020.

A legislação autorizaria o Departamento de Defesa dos EUA a cooperar com Israel, Egito, Jordânia, Iraque e todo o Conselho de Cooperação do Golfo – Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Catar, Omã e Kuwait – para desenvolver e implementar uma arquitetura integrada de defesa aérea e antimísseis para se defender das ameaças iranianas.

Com exceção do Egito, Jordânia e – mais recentemente – Emirados Árabes Unidos e Bahrein, Israel não tem vínculos formais com os demais países listados na legislação norte-americana. Com alguns deles, mantém relações discretas que cresceram nos últimos anos para cooperar contra o Irã, mas o parlamento do Iraque aprovou no mês passado uma legislação que criminaliza a normalização dos laços com o Estado judeu.

Não ficou claro se algum dos países listados está a bordo de tal esforço ou se eles foram consultados pelos legisladores antes da divulgação da legislação.

A ideia de um sistema de defesa aérea conjunto entre Israel e seus vizinhos árabes não é nova, porém, e foi levantada durante a Cúpula do Negev de ministros das Relações Exteriores de Israel, EUA, Emirados Árabes Unidos, Bahrein, Marrocos e Egito em março passado. Também foi discutido em conversas entre os EUA e a Arábia Saudita que Washington espera que culmine em Riad tomando medidas para normalizar os laços com Israel.

A legislação também exigirá que o Departamento de Defesa emita um relatório ao Congresso sobre a viabilidade de estabelecer tal sistema de defesa aérea para combater os programas de mísseis balísticos, drones e foguetes do Irã dentro de 180 dias após sua aprovação.

O projeto de lei está sendo apresentado no Senado pelos democratas Jacky Rosen e Cory Booker e pelos republicanos Joni Ernst e James Lankford. Na Câmara, está sendo apresentado pelos democratas Brad Schneider, David Trone e Jimmy Panetta e pelos republicanos McMorris Rodgers, Ann Wagner e Don Bacon. Todos os co-patrocinadores são membros do Abraham Accords Congressional Caucus que foi estabelecido no início deste ano.

“O Irã está na linha de uma jarda em busca de uma arma nuclear e está ameaçando nossos aliados na região de várias outras maneiras. Fortalecer nossos aliados construindo a unidade e aprimorando as capacidades de segurança compartilhadas é fundamental para enfrentar as ameaças iranianas à região”, disse Schneider em comunicado.

“A liderança americana no desenvolvimento de defesa integrada aérea e antimísseis, forneceria segurança, estabilidade e defesa unificada essenciais à região. A Lei DEFEND é um excelente exemplo do importante trabalho bipartidário e bicameral que o Congresso deve priorizar em nossa busca pela paz e estabilidade regionais”, acrescentou.

segunda-feira, 7 de março de 2022

300 tiros disparados, 280 tanques russos destruídos: mísseis americanos em mãos ucranianas

Guerra Ucrânia-Rússia: O Javelin geralmente atinge seu alvo por cima, onde a blindagem é fraca.

Por Debanish Achom, NDTV, 4 de março de 2022.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 7 de março de 2022.

Mísseis Javelin na Ucrânia: Pelo menos 280 veículos blindados russos foram destruídos com o míssil Javelin americano, de 300 tiros disparados, segundo um relatório.

Nova Délhi: Os militares ucranianos que combatem a força de invasão russa muito maior conseguiram matar centenas de tanques e veículos blindados russos usando um míssil antitanque portátil fornecido pelos EUA, de acordo com um jornalista americano que acompanha a guerra na nação do leste europeu.

Pelo menos 280 veículos blindados russos foram destruídos com o míssil Javelin americano, de 300 tiros disparados, disse o jornalista Jack Murphy em um artigo citando um oficial de Operações Especiais dos EUA.

Essa é uma taxa de abate de 93%.

O Javelin, feito em conjunto pela Raytheon Missiles and Defence, e Lockheed Martin, segue uma trajetória de vôo que atinge alvos de cima, onde a blindagem é relativamente mais fraca. Quase toda blindagem de tanque é mais grossa nas laterais, mas a parte superior é conhecida por ser mais fraca, e é aí que o míssil Javelin atinge.

O Javelin também pode ser disparado em um modo de trajetória de vôo reta, se necessário.

“A primeira remessa de lanças chegou (na Ucrânia) em 2018, os sistemas de armas junto com um bloco de treinamento e sustentação (chamado de Total Package Approach) totalizando algo em torno de US$ 75 milhões”, escreveu Murphy no artigo.

Um único soldado pode transportar e operar o Javelin, embora mais mãos sejam necessárias para transportar tubos de lançamento extras.

"Como os russos souberam que a Ucrânia agora tinha Javelins, seus tanques T-72 no Donbas se tornaram menos agressivos e se afastaram ainda mais das linhas de frente", disse ele, citando o oficial militar americano.

Um único soldado pode transportar e operar o Javelin, embora mais mãos sejam necessárias para transportar tubos de lançamento extras.

Quando as colunas blindadas russas entraram em áreas urbanas na Ucrânia, seus tanques se tornaram mais vulneráveis a ataques de Javelins se não tivessem apoio de infantaria. As forças ucranianas equipadas com Javelins se esconderiam e se moveriam mais rápido, pois não tinham chance em uma luta direta tanque contra tanque em campo aberto por causa do grande número que os russos têm.

"No entanto, o número de tanques mortos por soldados ucranianos, com o Javelin ou outras armas antitanque, é difícil de levar a sério. Aparecendo principalmente nas mídias sociais, esses números provavelmente serão exagerados pelos ucranianos e minimizados pelos russos. A habitual névoa de guerra torna ainda mais difícil determinar números precisos", escreveu Murphy.

Três dias após o início da invasão russa na Ucrânia, o presidente dos EUA, Joe Biden, instruiu o Departamento de Estado dos EUA a liberar até US$ 350 milhões adicionais em armas dos estoques americanos para a Ucrânia, que pedia o antitanque Javelin e anti- mísseis Stinger de aeronaves.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Guerra na Ucrânia: Santa Javelin e o míssil que se tornou um símbolo da resistência da Ucrânia

Santa Javelin, em homenagem ao lançador de foguetes fabricado nos EUA (à direita) está se tornando um símbolo de resistência contra a invasão da Rússia. - Copyright Santa Javelin (esquerda), Serviço de Imprensa do Ministério da Defesa da Ucrânia via AP (direita).

Por David Walsh, Euronews Next, 28 de fevereiro de 2022.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 28 de fevereiro de 2022.

Para as pessoas de fé, Maria Madalena é um ícone de redenção; a personificação do mantra de que não importa o quão longe você caia, sempre há esperança de uma segunda chance. Para o povo da Ucrânia, uma imagem re-imaginada dela portando uma arma em particular se tornou um poderoso símbolo de resistência.

Tendo começado como um meme, a Santa Javelin da Ucrânia, como agora é conhecida, está se tornando uma visão cada vez mais familiar nas mídias sociais e em outros lugares.

Em sua iteração mais recente, a auréola que circunda sua cabeça não é o ouro radiante que você esperaria de séculos de iconografia religiosa, mas sim o azul e o amarelo da bandeira ucraniana. Suas vestes esvoaçantes são verdes, uma reminiscência dos uniformes cáqui do exército. Em vez de se unirem em oração, suas mãos embalam um lançador de mísseis antitanque FGM-148 Javelin.

A arma de fabricação americana está sendo amplamente vista como fundamental para a defesa da Ucrânia contra a invasão em curso da Rússia - e foi levada ao coração dos temerosos ucranianos presos dentro do país sitiado e da diáspora que assiste horrorizada fora de suas fronteiras.

Entre os últimos está Christian Borys, um comerciante ucraniano-canadense e ex-jornalista que trabalhou na Ucrânia de 2014 a 2018. Ele abraçou o meme original pela primeira vez depois de vê-lo meses atrás, enquanto as tensões geopolíticas ferviam.

"Um amigo meu que está na indústria de defesa ucraniana me disse que fez alguns adesivos desse meme e os enviou para alguns amigos em toda a Europa e era apenas um símbolo de apoio à Ucrânia", disse ele ao Euronews Next.

"Porque todo mundo sabia que a Ucrânia estava sendo abandona nas trevas".

Quando ficou claro que as hostilidades eram iminentes, o germe de uma ideia se enraizou.

"Eu queria apenas ter os adesivos", disse Borys. "Eu queria colocá-los no meu carro. Eu queria dá-los a alguns amigos. Eu queria usá-los para arrecadar um pouco de dinheiro. Você sabe, se eu fizer alguns adesivos, posso fazer um pouco de dinheiro e colocá-lo em prol da Ucrânia".

E arrecadar dinheiro ele fez.

Criando uma loja de mercadorias para arrecadação de fundos chamada St Javelin (Santa Javelin) uma semana antes da invasão, Borys até agora arrecadou mais de US$ 400.000 (€ 358.000 / R$ 2.055.520,00) para a Help us Help ("Ajude-nos a Ajudar"), uma instituição de caridade ucraniana registrada no Canadá, vendendo itens com a imagem da santa.

"Embora eu não seja mais jornalista... eu ainda seguia tudo e ainda era amigo de pessoas cujo trabalho é seguir essas coisas, então eles estavam tocando alarmes em outubro, novembro, dezembro", disse ele.

"Comecei na quarta-feira passada e foi porque estava cada vez mais claro que um ataque era iminente".

Imprimindo apenas 100 adesivos do ídolo que carregava mísseis, a operação cresceu rapidamente depois que o meme redesenhado foi compartilhado nos stories da conta do Instagram da campanha, esgotando nas primeiras 24 horas. Uma nova tiragem de 1.000 adesivos se esgotou com a mesma rapidez.

"Por que o Javelin [adesivo] é tão popular?" perguntou Borys. "É apenas um símbolo de apoio, honestamente. Eu realmente achei que isso chamou a atenção das pessoas, procurando maneiras de apoiar a Ucrânia.

"A Rússia destruiu completamente sua reputação com isso. Ele [Putin] realmente causou danos irreversíveis à Rússia e à reputação russa. E acho que grande parte do que você está vendo agora é que as pessoas realmente, genuinamente, entendem o que a Rússia fez é uma ação completamente não-provocada e injustificada.

"Eles [as pessoas que compram os adesivos] só querem ajudar a Ucrânia o máximo possível. É como ver uma criança ser espancada por um valentão. E você fica tipo 'não, eu quero ajudar essa pessoa o máximo que puder.'"

O míssil Javelin: a melhor esperança da Ucrânia?

A característica mais proeminente do desenho do adesivo é o próprio lançador de mísseis Javelin ("Dardo"). Então, por que é tão significativo e por que capturou a imaginação do público sitiado?

Longe de ser uma arma maravilhosa, o Javelin está sendo elogiado por muitos ucranianos como uma ferramenta inestimável para os defensores que retardam o avanço das forças terrestres russas em seu território.

Desdobrado nos últimos 20 anos nas forças armadas dos EUA e 20 países aliados, o exército ucraniano agora tem mais mísseis Javelin do que alguns membros da OTAN, afirmou o ministro da Defesa russo, Sergey Shoigu, em uma reunião do Conselho de Segurança da Rússia na segunda-feira.

Os EUA forneceram à Ucrânia 300 mísseis no final de janeiro, tendo enviado mais 180 projéteis e 30 lançadores em outubro de 2021.

No sábado, o presidente Joe Biden anunciou mais US$ 350 milhões (€ 310 milhões / R$ 1.798.580.000,00) em assistência militar aos ucranianos, incluindo mais Javelins.

"O Javelin provavelmente é bastante eficaz contra a maioria dos veículos blindados russos, e provavelmente é mais capaz contra blindados pesados (como tanques) do que qualquer outro sistema de mísseis disponível para a Ucrânia que possa ser carregado por um soldado individual", segundo disse Scott Boston, analista sênior de defesa na RAND Corporationao Euronews Next.

"A ogiva do Javelin é excelente e o míssil pode ser configurado para voar em um perfil de ataque de mergulho, de modo que atinja o teto menos protegido do veículo alvo. O míssil é guiado e travado em um alvo específico pelo atirador, então mesmo que o alvo esteja se movendo, o Javelin tem chance de acertá-lo".

Soldados ucranianos usam um lançador com mísseis Javelin americanos durante exercícios militares na região do Donetsk, Ucrânia, quinta-feira, 23 de dezembro de 2021.
(AP/Serviço de Imprensa do Ministério da Defesa da Ucrânia)

Talvez sua característica mais útil seja o sistema dispare-e-esqueça (fire-and-forget), o que significa que os soldados que o usam podem apontar e atirar antes de correrem para se proteger, ao contrário das armas antitanque guiadas tradicionais. Ele também tem um alcance de até 4km, dando vantagem aos soldados de infantaria sobre os velozes veículos blindados.

A eficácia da arma, no entanto, é limitada por vários fatores, incluindo restrições topológicas e geográficas. Grande parte do centro e leste da Ucrânia é plana, então há opções limitadas para ocultar seu uso.

Outra é que é uma arma de infantaria que precisa ser usada ao lado de “uma equipe de armas combinadas que inclui tanques, outros veículos blindados, artilharia e aeronaves”, acrescentou Boston.

É também um equipamento caro que custa US$ 80.000 (€ 71.000 / R$ 411.104,00), tornando seu uso generalizado a longo prazo proibitivo em termos de custo.

"O Javelin é muito, muito caro para uma arma de infantaria", disse Boston. "Isso não é um grande problema para a Ucrânia, porque eles conseguiram os seus de graça, é claro, mas isso significa que eles nunca iriam receber tantos deles quanto eles gostariam. Eles são úteis para muitos coisas, então você tem que ser seletivo em quais alvos você as usa".

A importância das armas antitanque na guerra - que até agora testemunhou intensos combates em grandes centros urbanos da Ucrânia, onde os habitantes foram abrigados em estações de metrô e porões - foi ainda mais enfatizada por doações de dardos e armas similares de países estrangeiros, incluindo membros da OTAN.

A Alemanha, por exemplo, anunciou no sábado, em uma reviravolta surpresa na política externa, que enviaria 1.000 armas antitanque e 500 mísseis Stinger para a Ucrânia. O chanceler Olaf Scholz seguiu no domingo anunciando ainda mais que a Alemanha aumentaria permanentemente seus gastos com defesa acima do limite de 2% do PIB exigido pela OTAN.

"Outra arma importante fornecida à Ucrânia nas semanas anteriores à invasão foi a NLAW (Next Generation Antitank Weapon / Arma Antitanque de Próxima Geração), enviada pelo Reino Unido", disse Boston.

"Esta foi uma escolha inspirada, na minha opinião".

"A arma é fácil de usar e evidentemente pode ser disparada de dentro de prédios. Também parece ter sido enviada em números muito maiores, o que faz sentido porque é um sistema menos complexo, além de ter alcance menor que o Javelin".

Javelin e NLAW.