Do American Rifleman, 21 de março de 2019.
Tradução Filipe do A. Monteiro, 10 de maio de 2022.
Embora as forças armadas dos Estados Unidos tenham sido as primeiras a adotar e padronizar um fuzil de batalha semiautomático em 1936, o “U.S. Rifle, Caliber .30, M1” não dispararia um tiro com raiva até seu uso na defesa das Filipinas, a partir de dezembro de 1941.
Quando os fuzis M1 Garand silenciaram em Bataan em abril de 1942, a criação lendária de John Garand esperaria quatro meses antes de enfrentar o Eixo novamente. Desta vez seria no Teatro de Operações Europeu — nas mãos dos Rangers do Exército dos EUA.
O nascimento dos Rangers do Exército dos EUA
Sob a direção do Major-General Lucian Truscott, o Exército dos EUA se esforçou para criar sua própria versão dos famosos Comandos britânicos. Mais e mais tropas americanas estavam chegando ao Reino Unido durante a primeira metade de 1942, e, no final de junho, o 1º Batalhão Ranger havia sido organizado, com a maior quantidade de homens recrutados da 34ª Divisão de Infantaria. O treinamento começou em Carrickfergus, na Irlanda do Norte, com o apoio de comandos britânicos endurecidos pelo combate.
Os Rangers estavam equipados com muitos dos mais recentes equipamentos de combate americanos, exceto por seus M1917A1 “Kelly Helmets”, que lhes davam a aparência de tropas britânicas, pelo menos à distância. De perto, suas armas foram instantaneamente reconhecidas como algo distintamente diferente. Os fuzis padrão eram os M1, e os Fuzis Automáticos Browning foram usados como fuzis-metralhadores do grupo de combate. Oficiais americanos carregavam a pistola M1911.
Seus aliados britânicos foram rápidos em notar o grande fuzil semiautomático, e os Comandos ficaram quase instantaneamente com ciúmes do poder de fogo que o M1 oferecia. Em seu livro, Rangers At Dieppe (Rangers em Dieppe), o autor Jim DeFelice observou que: “Além de ficar impressionado com a pontaria dos americanos, o comando britânico Major Mills-Roberts gostou de sua arma, que era superior em muitos aspectos aos fuzis Enfield que os Comandos estavam usando. Na verdade, o M1 era tão popular entre os britânicos que no 3 Commando, (American Ranger) o capitão Murray deu um ao coronel Durnford-Slater como presente - e então achou educado arranajr mais [fuzis] para outros oficiais comandos”.
Os Comandos não foram os únicos britânicos que ficaram impressionados com o fuzil americano. Durante o treinamento em Carrickfergus, os Rangers foram visitados pela família real britânica. A própria rainha fez várias perguntas inteligentes a um Ranger sobre seu M1, antes de examiná-lo “como uma especialista” enquanto expressava sua admiração pelo fuzil. O fuzil M1 ainda não havia disparado um único tiro contra os alemães e já estava recebendo elogios e fazendo amigos em lugares altos.
Os M1 usados pelos Rangers em treinamento e em Dieppe em 1942 tinham características iniciais, como a alça de mira com barra de trancamento. |
A incursão de Dieppe
Instrutor britânico com alunos americanos. Os comandos britânicos e os rangers americanos compartilhavam um amor comum pela metralhadora Thompson. |
A partir de fevereiro de 1941, os comandos britânicos atacaram os ocupantes alemães e italianos da Noruega ao norte da África. Alguns raides foram altamente ambiciosos, como a Operação Flipper em novembro de 1941, a tentativa mal-sucedida de matar o general alemão Rommel no norte da África. Outros ataques, como a Operação Archery, realizada na Noruega no final de dezembro de 1941, causaram danos significativos e forçaram os alemães a enviar mais 30.000 homens para defender suas bases norueguesas. As incursões de comandos abalaram os nazistas e os lembraram de que a retribuição viria um dia.
Durante março de 1942, o Comando No. 2 encenou um ataque audacioso, a Operação Chariot, contra o porto fortemente defendido de St. Nazaire, na França. O ataque foi um sucesso, e a estrategicamente importante eclusa Normandie, capaz de abrigar o encouraçado alemão Tirpitz, foi destruída. No entanto, o custo foi alto: dos 241 Comandos enviados na missão, 173 foram mortos ou capturados.
Homens do 1º Batalhão Ranger, armados com fuzis M1, treinados com Comandos Britânicos e com a Marinha Real em operações anfíbias. Na frente do barco está uma metralhadora americana M1919 Browning. |
A razão para o ataque maciço ao porto francês de Dieppe em agosto de 1942 é difícil de descrever. Os britânicos se comprometeram a abrir uma segunda frente para tirar a pressão da União Soviética no Leste. Mais especificamente, foi assumido o compromisso de abrir uma nova frente na Europa Ocidental. Em retrospectiva, pode parecer que a operação de Dieppe arriscou demais para conseguir muito pouco. Mas lembre-se, também, que naquele momento da história, os Aliados queriam e precisavam desesperadamente contra-atacar os alemães na Europa Ocidental ocupada o mais ferozmente possível.
A Incursão de Dieppe foi originalmente planejada para abril de 1942 e recebeu o codinome de Operação Rutter. Era para ser um grande raide, incluindo uma largagem significativa de paraquedistas em um porto do Canal controlado pelos alemães, culminando em uma ocupação de curto prazo e uma destruição total das instalações portuárias e defesas alemãs. Cabeças mais frias prevaleceram e a Operação Rutter foi considerada impossível de ser apoiada e, consequentemente, foi abandonada. Mas a ideia não foi esquecida.
Rangers treinando no Reino Unido em julho de 1942. Observe o Fuzil Automático Browning e o M1 Garand. |
Em agosto, Rutter voltou à vida, transformado na Operação Jubileu. Os objetivos eram semelhantes e igualmente nebulosos. Um importante porto francês na costa do Canal deveria ser tomado e mantido por um curto período de tempo, prisioneiros seriam feitos, informações coletadas e as defesas alemãs destruídas antes de uma retirada ordenada.
Para esse fim, mais de 6.000 soldados de infantaria, a maioria deles canadenses, foram encarregados de conduzir essa invasão de curto prazo. O Regimento de Calgary da 1ª Brigada de Tanques canadense, equipado com tanques pesados Churchill, forneceria apoio no terreno. Juntando-se a eles estariam 50 Rangers americanos, recém-treinados e prontos para ver sua primeira ação. Esses Rangers levariam fuzis M1 para a praia na França.
Os desembarques iniciais começariam alguns minutos antes das 5h da manhã de 19 de agosto de 1942. Problemas significativos começaram quase imediatamente. A coordenação era mínima, a confusão era abundante e as perdas conseqüentes eram altas. Em menos de 10 horas, o ataque maciço acabou. Todas as tropas aliadas foram evacuadas ou mortas, com 1.946 deixados para trás para serem feitas prisioneiras pelos alemães.
Dos quase 6.100 homens que desembarcaram em Dieppe, 3.623 foram mortos, feridos ou capturados. Ninguém dentro do comando aliado estava preparado para perder mais de 60% da força de desembarque. A Marinha Real também sofreu, com 33 embarcações de desembarque perdidas junto com o destróier H.M.S. Berkeley. No alto, a Royal Air Force perdeu 106 aeronaves. Foi um dia amargo e miserável.
O autor Ian Fleming, o homem por trás de James Bond, trabalhou para a Inteligência Naval Britânica durante a Segunda Guerra Mundial. No início de 1942, Fleming criou a 30ª Unidade de Assalto (30 Assault Unit), uma equipe de combate única composta por especialistas em inteligência. Os membros da unidade participaram secretamente da Incursão de Dieppe em um esforço para obter uma máquina de codificação alemã Enigma e seus livros de códigos relacionados. Este foi mais um objetivo do raide que não deu certo.
First Blood at Bloody Dieppe
O 1º Batalhão Ranger existia há apenas dois meses antes da Incursão de Dieppe. Embora as contribuições de combate dos Rangers fossem pequenas, suas baixas eram proporcionalmente tão altas quanto o resto dos incursores. Cinquenta Rangers viajaram para a França, intercalados entre os comandos britânicos e a infantaria canadense. Três americanos foram mortos, três foram feitos prisioneiros e cinco ficaram feridos. Considerando que vários Rangers não conseguiram chegar à praia devido a problemas com suas embarcações de desembarque, sua taxa real de baixas foi superior a 70%. Os Rangers trocaram tiros com os alemães, atirando com seus fuzis M1, e dando o melhor que podiam.
Apesar das pesadas perdas da Incursão de Dieppe, a imprensa aliada transformou a operação em ouro de relações públicas. Rangers tornaram-se celebridades na Inglaterra, e os americanos ganharam confiança de que suas tropas poderiam levar a luta aos alemães. O mau planejamento e as conseqüentes perdas na praia de Dieppe forneceram um poderoso alerta para os comandantes aliados. Sua capacidade de abrir uma segunda frente na Europa Ocidental estava longe de ser atingida, mas houve muito aprendizado sobre os ingredientes de um assalto anfíbio bem-sucedido. Os sacrifícios feitos pelos canadenses em Dieppe não foram em vão.
Desembarques bem-sucedidos logo se seguiriam no norte da África (Operação Tocha) em novembro de 1942, na Sicília (Operação Husky) em julho de 1943 e na Itália (Operação Avalanche) em setembro de 1943.
Quando as tropas americanas e o fuzil M1 retornassem à França, eles o fariam em grande estilo e com grande sucesso. As lições aprendidas com a Operação Jubileu ajudaram a criar a Overlord. A segunda frente estava finalmente aberta, junto com o longo caminho para Berlim.
Nesta foto dramática e encenada, um cabo Ranger mostra a forma (com um fuzil M1 descarregado) que rendeu aos Rangers que serviam com os comandos britânicos elogios por sua pontaria. |
Bibliografia recomendada: