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quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

Vega Strategic Services: as PMC russas como parte da guerra de informação?

Por Sergey Sukhankin, The Jamestown Foundation, 10 de abril de 2019.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 9 de fevereiro de 2021.

A agência russa de investigação Equipe de Inteligência de Conflitos (Conflict Intelligence Team, CIT) publicou um relatório, em 28 de março, informando que, além dos exércitos militares privados, a Rússia criou agora uma Companhia Militar Privada (Private Military Company, PMC) de um novo tipo. Especificamente, o relatório examina a Vega Strategic Services Ltd. (Vega), “uma PMC 'clássica' russo-ucraniana”, que atualmente opera na Síria e apóia o presidente Bashar al-Assad. Conforme observado no relatório, “ao contrário da ‘PMC Wagner’, [Vega] não conduz operações militares formais; seu objetivo principal está focado no treinamento de forças locais, bem como a proteção de vários objetos - semelhante a missões realizadas por PMC ocidentais... Dados os laços estreitos entre a milícia Liwa al-Quds e as forças russas na Síria, pode-se argumentar que o Vega está agindo com a permissão das autoridades russas ”(Citeam.org, 28 de março). A Liwa al-Quds (também conhecida como Brigada de Jerusalém) é uma milícia predominantemente palestina e luta como parte das forças do governo pró-Síria na Guerra Civil Síria.

O relatório investigativo baseia-se em três fontes principais de informação. Em primeiro lugar, refere-se ao ex-correspondente da ANNA News, Oleg Blokhin, que postou imagens de instrutores do Vega, na Síria, onde estavam evidentemente treinando combatentes Liwa al-Quds.

A segunda fonte por trás do relatório da CIT é um perfil abrangente de dois membros do Vega, ambos cidadãos ucranianos. Anatoly Smolin, um dos alegados fundadores desta PMC, após se aposentar da KGB soviética, seguiu carreira no Ministério de Assuntos Internos da Ucrânia. Em 1997, ele passou a prestar serviços de segurança privada. Em 2004, Smolin fundou as empresas de segurança Alfa-Shchit e Kolchuga; enquanto, em 2011, organizou a Vega Strategic Services. Imagens recuperadas pela CIT parecem mostrar Smolin treinando militantes da Liwa al-Quds na Síria. O outro perfil apresentado é de Dmitry Dzhinikashvili, que, de acordo com o relatório, não só foi empregado do Vega entre 2012 e 2014, mas também serviu por um breve período no Slavonic Corps Limited, uma PMC russa de vida curta organizado por ex-membros do Moran Security Group, Vadim Gusev e Evgeny Sidorov. O Slavonic Corps foi destruído na Síria em 2013. Os investigadores relacionaram a suposta presença de Dzinikashvili na Síria com uma foto de Palmira publicada na rede de mídia social online Vkontakte.

O terceiro elemento da investigação do relatório da CIT é baseado em uma entrevista com Andrey Kebkalo, um dos fundadores do Omega Consulting Group PMC, que supostamente abriu uma filial em Burkina Faso (o quarto maior produtor de ouro da África) (ver EDM, outubro 17, 2018). Na entrevista, Kebkalo reconheceu seu papel na criação do Vega e corroborou o papel de Smolin nesta PMC.


O relatório gerou uma reação imediata e extremamente dura do Serviço de Segurança da Ucrânia (SSU). Em seu comentário, o chefe do SSU, Vasyl Hrytsak, afirmou: “Membros do sindicato terrorista dos serviços especiais russos sob o nome de ‘PMC Wagner’ não têm cidadania. Nos últimos anos, o SSU trouxe à luz centenas de mercenários deste destacamento da [isto é, apoiado pela] Diretoria do Estado-Maior das Forças Armadas Russas (GU) [inteligência militar russa, ainda freqüentemente referida por seus antiga sigla GRU], entre os quais pessoas da Ucrânia, Bielo-Rússia, Moldávia, Cazaquistão, Sérvia e outros países. A única coisa que os une é a prontidão para matar qualquer um e em qualquer lugar do mundo por ordem do Kremlin e por seu dinheiro. Nenhuma falsificação russa pode esconder essa verdade do mundo.” O serviço de imprensa do SSU corroborou o fato de que Smolin e Dzhinikashvili são de fato cidadãos ucranianos, que, no entanto, deixaram o país após 2014 e começaram a cooperar ativamente com a inteligência militar russa e outros serviços especiais. O SSU também confirmou que o Vega, embora criada por Smolin em 2011, não se dedicava à prestação de serviços de segurança privada. Em sua análise final, o SSU chamou o relatório produzido pela CIT de “notícia falsa”, afirmando que “ainda é o Grupo Wagner que treina forças pró-Assad” (Ssu.gov.ua, 28 de março).

Em sua resposta, o investigador-chefe da CIT, Ruslan Leviev, expressou sua surpresa com a reação do SSU e criticou-o por uma "abordagem não profissional". Ele também apontou que o Vega não é de forma alguma uma iniciativa conjunta (russo-ucraniana), como foi afirmado pelo SSU. Em um comentário relacionado, Leviev afirmou que, “quando estamos falando de uma PMC russo-ucraniana, não queremos dizer que ela foi criada ou formada com a participação de autoridades estatais ucranianas. Estamos dizendo que foi organizada por cidadãos ucranianos e foi posicionada como uma PMC ucraniana desde o início... Isso não significa que é um projeto conjunto desses dois estados, é apenas um negócio privado” (Currenttime.tv, 29 de março).

Apesar das narrativas concorrentes do SSU e da CIT, alguns aspectos relativos ao Vega são de fato bastante confusos. Por exemplo, não é de todo evidente por que os meios de comunicação russos abertamente pró-Kremlin têm dado tanta atenção a esta PMC em particular, enquanto outras empresas desse tipo (o Grupo Wagner ou Patriot, por exemplo) permaneceram tabu na imprensa russa. Especificamente, um artigo intitulado “Damasco está hospedando a 60ª Exposição Internacional de Produtos Industriais”, publicado no ano passado na Federalnoye Agentstvo Novostey (Riafan.ru), relata, “o lado russo participou ativamente durante o fórum. Ou seja, pode-se ver o Vega Strategic Services Ltd., que foi criada em 2012, no Chipre, por veteranos e ex-membros de formações marítimas, militares e policiais especiais da Ucrânia, Rússia e Grécia ”(Riafan.ru, 30 de julho de 2018). Uma atenção particular deve se concentrar na fonte da publicação: O Federalnoye Agentstvo Novostey é um meio de comunicação apoiado por Moscou intimamente relacionado com a notória "Fábrica de Trolls" com sede em São Petersburgo, financiada por Yevgeny Prigozhin (conhecido como "Chef" de Vladimir Putin). Outro veículo de informação antiocidental ultraconservador, a Tsargrad TV (pertencente ao “oligarca ortodoxo” Konstantin Malofeev, que foi sancionado pela Comissão Europeia por financiar o separatismo na Ucrânia) também divulgou um artigo complementar que confirma as informações anteriores (Tsargrad.tv, 9 de fevereiro de 2019).

Comentando esses desenvolvimentos, Yevgeny Shabaev, o ataman (chefe) da comunidade cossaca de Khovrino, afirmou que conhece o Vega como uma empresa com recursos limitados e dificilmente compatível com as tarefas freqüentemente desempenhadas por contratados militares russos. Ele acrescentou que toda a história com o Vega não passa de um exemplo de uma operação de contra-informação (contra-propaganda) realizada por meios de informação próximos ao Kremlin. Esta campanha de contra-propaganda, argumentou Shabaev, visa desacreditar outros meios de comunicação que cobrem o Grupo Wagner (Rtvi.com, 12 de fevereiro).

Bibliografia recomendada:


Leitura recomendada:



Os condutores da estratégia russa16 de julho de 2020.



quarta-feira, 11 de março de 2020

O identidade da Stasi do Putin foi encontrada em arquivo alemão

Um cartão de identificação com foto emitido para um jovem Vladimir V. Putin pela Stasi. (BStU)

Por Palko Karasz, The New York, 12 de dezembro de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 11 de março de 2020.
(Noticiado no Soldier of Fortune hoje)

LONDRES - O tempo de Vladimir V. Putin como agente de inteligência soviético na Alemanha Oriental está amplamente envolto em segredo. Ele alegou, por exemplo, ter dispersado sozinho manifestantes do lado de fora do escritório do KGB (Komitet Gosudarstvennoy Bezopasnosti/ Comitê de Segurança do Estado), em Dresden em 1989, nos últimos dias do governo comunista.

Agora, a publicação do tablóide alemão Bild de um cartão de identificação com foto emitido a um jovem Sr. Putin pela Stasi, a polícia secreta da Alemanha Oriental, retira o véu de uma parte de seu mandato em Dresden, causando uma onda de excitação nas mídias sociais e levantando questões sobre sua presença na antiga República Democrática Alemã.

O cartão de identificação de Putin também foi liberado na quarta-feira pelo Comissário Federal para os Registros do Serviço de Segurança do Estado da antiga Alemanha Oriental. Impresso em papel verde no estilo de passaporte, o cartão traz uma foto em preto e branco de um jovem oficial de inteligência identificado como Major Putin, que teria 33 anos na época. 

Foi emitido no último dia de 1985 e possui selos de validação para cada trimestre, exceto um - o último trimestre de 1986. O documento também traz o que parece ser a assinatura de Putin.

O edifício da Stasi ficava a poucos passos de distância da vila onde o K.G.B. tinha seus escritórios.

"Isso não prova que ele trabalhou para a Stasi", disse por telefone na quarta-feira Douglas Selvage, que trabalha nos arquivos da Stasi.

Carimbos de validação no documento da Stasi do Sr. Putin. (BStU)

O que a identidade comprova, disse Selvage, especialista nas relações entre o K.G.B. e a Stasi, é que Putin, como outros oficiais da agência de segurança soviética, teve acesso à sede da Stasi em Dresden, provavelmente por recrutar moradores para o seu trabalho de inteligência.

O porta-voz do Kremlin, Dimitri S. Peskov, disse na terça-feira: "Meu palpite é que, na era soviética, o K.G.B. e a Stasi eram parceiros e, por esse motivo, não se deve descartar que eles possam ter trocado documentos e passes de identificação.”

Ao contrário de outros serviços de inteligência, onde as informações são compartimentadas com base na necessidade de conhecimento, oficiais do K.G.B. poderiam ter acesso à maior parte da inteligência da Stasi. Os agentes soviéticos tinham acesso semelhante à inteligência em todas as nações do Pacto de Varsóvia, disse Selvage.

Ele disse que os pesquisadores encontraram identificações semelhantes em arquivos de outros distritos da antiga Alemanha Oriental e, às vezes, até fotos de passaporte - identificadas apenas com as palavras "amigo" ou "K.G.B." atrás.

O arquivo da Stasi divulgou fotos e documentos relacionados ao tempo de Putin na Alemanha várias vezes. Mas depois de um pedido em novembro da Bild, os arquivistas examinaram mais de perto os arquivos pessoais de oficiais do K.G.B. em Dresden, e encontraram o documento, que nunca havia sido liberado, disse Dagmar Hovestädt, porta-voz do arquivo da Stasi, por telefone na quarta-feira.

"Todo ano, existem centenas de pedidos para ver os registros da Stasi sobre Putin", acrescentou Selvage, mas pouco se sabe sobre seu trabalho.

Os arquivos do K.G.B. relativos aos anos de serviço de Putin ainda são secretos e poucos registros relevantes foram descobertos no arquivo da Stasi. O K.G.B. existiu até 1991 e foi sucedido pelo FSB (Federal'naya sluzhba bezopasnosti Rossiyskoy Federatsii / Serviço Federal de Segurança) como principal agência de segurança doméstica da Rússia.

Bibliografia recomendada:

A KGB e a Desinformação Soviética: a visão de um agente interno.
Ladislav Bittman.

Leitura recomendada:





quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Mercenários dificilmente são máquinas de matar

Robert K. Brown, fundador da revista Soldier of Fortune, na Rodésia.

Por William Boudreau, Soldier of Fortune Magazine, 28 de janeiro de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 6 de fevereiro de 2020.

Durante meu serviço na África como diplomata de carreira americano, conheci vários mercenários que estavam envolvidos em uma missão ou outra. Nenhum deles se encaixa no estereótipo comum - matadores anti-sociais. Quando se ouve sobre atrocidades em uma ação mercenária, quase sempre são as forças opostas que as cometem. Um excelente exemplo é o Congo, após sua independência em 1960. O caos é a regra desde seu primeiro dia como nação. Moise Tshombe foi astuto o suficiente para reconhecer que precisava de mercenários para garantir a segurança de sua província de Katanga, com suas valiosas minas. Eles enfrentaram todos os que chegavam no país fragmentado, provando serem muito superiores aos esfarrapados exército nacional e grupos rebeldes. Inicialmente, eles estavam protegendo o governo provincial katanguês e depois foram contratados pelo presidente Mobutu para liderar os esforços do exército nacional para repelir os rebeldes, principalmente os Simbas, apoiados por regimes comunistas e radicais. Esses países de esquerda fizeram o possível para minar os mercenários, usando a mídia e os fóruns das Nações Unidas para denunciarem os mercenários como bárbaros. Eles descreviam o assassinato brutal de civis inocentes como atos selvagens dos mercenários estrangeiros, enquanto havia evidências sólidas de que a oposição era a autora. Ao contrário da propaganda da época, os mercenários que eu conhecia valorizavam a vida - deles e de outros. A maioria tinha serviço anterior em suas forças armadas nacionais e foi contratada por suas habilidades, disciplina e capacidade de cumprir a missão.

Major Bob MacKenzie (boina) quando era comandante de uma equipe de reconhecimento na Bósnia.
Foto cedida por Sibyl MacKenzie.

Não havia americanos entre os mercenários que conheci. Eles eram europeus de vários países, sul-africanos e rodesianos. Outro grupo que conheci foram os exilados cubanos contratados pela CIA para diversas tarefas, incluindo pilotar suas aeronaves da Organização Internacional de Manutenção Terrestre Ocidental (WIGMO). A maioria dos mercenários tinha outras ocupações quando não estava em missões; de fato, eles levaram vidas duplas. Entre eles estavam os proprietários de plantações, mecânicos de garagem, importadores/exportadores, trabalhadores da construção civil, agricultores, vendedores de seguros e assim por diante. Eu conheci esses guerreiros tomando cerveja em bares e eventos sociais em Kinshasa e no campo. Viajei para a maior parte do país, para as províncias de Katanga, Orientale, Equateur, Nord Kivu e por todo o Baixo Congo. Eu conheci mercenários em várias situações e nenhum me pareceu irresponsável e insensível. Embora não sejam mais membros de unidades militares padrão, eles se comportavam como soldados. Claro, eles chutavam o balde quando estavam de folga, eles não eram santos, afinal, mas se mantiveram sob controle. Eles me pareciam uma irmandade, cuidando um do outro.

Robert C. MacKenzie (em pé, asas no chapéu) posando com homens das unidades comando da Serra Leoa que ele estava treinando com os guardas de segurança gurca.
Andy Myers é o segundo da esquerda, ajoelhado.

Quando saía para “o mato” (the bush) - qualquer área não-urbana - para cumprir meus deveres de checar cidadãos americanos (a maioria eram missionários), visitei mercenários na área. O bem-estar dos americanos espalhados por todo o país era de minha responsabilidade como funcionário político/consular na embaixada. Eu aproveitei essas oportunidades para me encontrar com os mercenários que estavam na área. Discutimos o progresso deles na derrota dos rebeldes Simba, junto com seus feiticeiros-curandeiros, que estavam tentando estabelecer um regime comunista separado com base na província de Orientale.

Cito um incidente para ilustrar o caráter desses mercenários. Aprendi com meus contatos missionários que alguns estudantes universitários americanos estavam viajando pelo norte do Congo, viajando para o leste. Esses aventureiros estavam alheios ao perigo que havia no caminho deles. Eles pretendiam passar por uma área na província de Orientale com presença Simba conhecida; eles não sabiam que estavam entrando em uma zona de guerra. Eles não sabiam nada dos simbas e sua selvageria, que não poupava vidas. Entrei em contato com mercenários que conheci e expliquei a situação. Eles tomaram medidas imediatas, localizaram os caminhantes, insistiram na necessidade urgente de sair da área e os escoltaram pelo leste do Congo até Ruanda. Eles se preocupavam com vidas inocentes e os trouxeram para a segurança.

Como escrevi em minhas memórias, A Teetering Balance (Um Equilíbrio Instável), descrevendo nossos esforços para combater as tentativas soviéticas de conquistar uma posição na África durante a Guerra Fria, Ernesto "Che" Guevara se envolveu com grupos rebeldes no Congo. “Ansioso por se envolver em atividades revolucionárias mais uma vez, o Congo parecia um terreno fértil.” Com a benção de Fidel Castro, ele entrou no norte da província de Katanga pela Tanzânia, com cubanos negros, em abril de 1965. Seu objetivo era montar um campo de treinamento para "freedom fighters" ("combatentes da liberdade") para operar "não apenas no Congo, mas também em Angola, Moçambique e Rodésia, África do Sul e sudoeste da África.” O Coronel Michael Hoare liderou mercenários no ataque ao grupo de cubanos e simbas de Guevara. Os exilados cubanos da CIA pilotando aviões WIGMO ajudaram a atacar os rebeldes. Guevara fez o possível para inspirar zelo e disciplina entre os simbas, mas ficou frustrado com "o que ele considerava a deficiência de motivação dos rebeldes". Compelido por sucessos mercenários, ele abandonou seus esforços após sete meses para procurar circunstâncias mais promissoras para espalhar seu ardor revolucionário.

A Teetering Balance: An American diplomat's career and family.
William Boudreau.

Coronel Michael Hoare, falecido em 2 de fevereiro de 2020, aos 100 anos.

Minhas observações sobre mercenários não se limitam à operação no Congo. Alguns estavam ajudando movimentos de libertação em Angola, em sua luta pela independência de Portugal. Encontrei-me com outras pessoas nas Comores quando fui designado para Madagascar, com responsabilidade adicional pelas Comores. Ahmed Abdallah fora nomeado presidente das Comores pelo Coronel Bob Denard, que eu conhecera no Congo, e um bando de mercenários. Vários permaneceram nas ilhas e eu os encontraria nas minhas visitas. Sendo as Comores uma república islâmica, nenhuma bebida era permitida no país, exceto em alguns hotéis. Assim, os bebedouros eram limitados e eles criaram um elenco interessante de personagens. Alguns mercenários visitaram um colega diplomata e eu em Washington, DC, depois que eu deixei o Congo. Levei um belga para um jogo de futebol americano universitário e passei a maior parte do jogo explicando seus meandros. Nossos visitantes foram todos treinados para se comportarem bem dentro de casa e sociáveis com os vizinhos.

O belga Jean Schramme e o francês Bob Denard no Congo.
Schramme se mudou para o Brasil, morrendo em Rondonópolis/MT em 1988.

When Olive Leaves Beckon.
William Boudreau.

Escrevi When Olive Leaves Beckon (Quando Olive deixa Beckon) com o objetivo de retratar mercenários sob a luz apropriada. Eu afirmo que, em geral, os mercenários se misturam à sociedade quando não estão em missões. Eles não são máquinas de matar raivosas, como alguns acreditam. Eles voltam para casa e são aceitos pelos vizinhos como membros contribuintes de suas comunidades. Não defenderei um prêmio humanitário para nenhum mercenário que eu tenha conhecido. No entanto, eles abraçam a humanidade. Meu argumento é que eles eram racionais, compassivos, interessantes para conversar e desprovidos de tendências psicóticas.

A perda de meu amigo espanhol, Alfonso, foi uma tragédia pessoal. Eu o conheci no Congo quando ele estava passando de mercenário para trabalhar em importação/exportação. Ele ficou noivo de uma belga e estava ansioso por uma mudança de estilo de vida. Ele visitou nossa casa várias vezes e entreteve nossos dois filhos. Quando fiquei de folga com minha família, convidei-o para ficar em nossa casa enquanto estávamos fora. Ele ficou lá por algumas semanas até o nosso retorno. Logo depois disso, os congoleses, o massacraram, incluindo castração, e seus restos jogados no rio Congo. Dediquei When Olive Leaves Beckon à sua memória.

SOF Mag de novembro de 2013.

domingo, 2 de fevereiro de 2020

PERFIL: Akihiko Saito, o samurai contractor

Akihiko Saito na Legião Estrangeira Francesa, anos 1980.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 2 de janeiro de 2020.

Adjudant-Chef Akihiko Saito, veterano da 1ª Brigada Aerotransportada, das Forças de Defesa do Japão, e do 2e Régiment Étranger de Parachutistes (2e REP), da Legião Estrangeira Francesa.

Ele serviu em uniforme por mais de duas décadas, primeiro como paraquedista por 2 anos em seu país natal, o Japão, e depois como paraquedista da Legião Estrangeira Francesa no 2e REP. Com 21 anos de serviço, de junho de 1983 a dezembro de 2004, passou também pelo 3e REI (Régiment Étranger d'Infanterie) na Guiana Francesa e no 6e REG (6e Régiment Étranger de Génie, dissolvido em 1999), assim como no 4e RE (Régiment d'Instruction de la Légion), atingido o respeitadíssimo posto de Adjudant-Chef (sem equivalente no Brasil).

Sem vergonha de sua herança guerreira, ele era conhecido por gritar regularmente "Banzai" em batalha, de acordo com o relato de alguns de seus colegas legionários na página Fireforce Ventures. Saito, então com 44 anos, chegou ao Iraque como mercenário ("contractor") da Hart Security Ltd, uma Companhia Militar Privada (Private Military Company, PMC).

Seus camaradas da PMC eram em grande parte compostos por veteranos das Forças de Defesa e polícia da África do Sul; o que certamente trouxe afinidade entre eles, pois Saito havia servido com o 2e REP na África.

Em 9 de maio de 2005, em uma cidade chamada Hit, a noroeste de Ramadi, sua esquadra de 4 homens, acompanhada por 12 iraquianos, escoltava um comboio de rotina quando foram atingidos por uma emboscada maciça e bem coordenada envolvendo vários IEDs e armas pesadas. Um tiroteio maciço iniciou-se durando a noite toda, enquanto Saito e os outros contractors lutavam por suas vidas com problemas das comunicações. Um dos mercenários, ferido, conseguiu alcançar um posto dos fuzileiros navais americanos, alertando-os sobre a situação. Os reforços americanos chegaram ao amanhecer, depois que a pequena escolta havia lutado até a exaustão da munição.

Saito foi capturado (possivelmente vivo) por insurgentes sob a bandeira da Irmandade Ansar al-Sunna, tendo sido incapacitado por um grande ferimento na nuca. O ferimento era fatal e Saito morreu pouco depois, sendo executado pelos insurgentes. Seu irmão, Hironobu Saito, confirmou tratar-se de Akihiko no vídeo divulgado pelo grupo Ansar al-Sunna.

Apesar das tendências pacifistas do Japão, ele foi elogiado como um "youhei" (mercenário), uma espada contratada, alguém que encarnava o espírito samurai japonês na vida e na morte. Uma notícia sobre a morte de Saito publicada pelo Japan Times, de 11 de maio de 2005, foi intitulada "Sequestro revela guerreiro japonês". Nela, o analista militar Kazuhisa Ogawa afirma que os funcionários de segurança contratados por empresas de segurança estrangeiras tinham altos salários garantidos, especialmente quando suas tarefas ocorriam em um país perigoso como o Iraque. Saito, nascido em Tóquio, foi contratado pela empresa britânica Hart Security que, ao contrário das empresas de segurança japonesas, mantém seus contratados equipados com armas de fogo. Ogawa apontou que as PMC, em alguns casos, têm suas provisões e capacidades aproximando-se daquelas de um verdadeiro exército.

Bibliografia recomendada:

A Legião Estrangeira.
Douglas Boyd.