domingo, 5 de janeiro de 2020

Relatório Pós-Ação de participação na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército Brasileiro


Pelo Major Gary P. Corn, Advogado do Exército dos EUA, 1º de novembro de 2006.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 13 de junho de 2018.

Relatório Pós-Ação (After Action Review/AAR) de participação na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército Brasileiro.

Introdução

Em 2005 fui o primeiro membro do Corpo Jurídico do Exército dos EUA (U.S. Army Judge Advocate General's Corps - JAG Corps) a participar de uma escola de comando e estado-maior estrangeira (command and general staff college - CGSC). Este artigo apresenta um resumo de minha participação na Escola de Comando e Estado Maior do Exército Brasileiro (ECEME). Por meio de uma série única de eventos, fui selecionado e participei da ECEME do Exército Brasileiro, um equivalente de 10 meses do CGSC, onde estudei operações em nível de brigada e divisão através das lentes de uma força militar estrangeira. Essa rara oportunidade não só me proporcionou uma experiência de desenvolvimento profissional única e valiosa, mas serviu como uma ferramenta de engajamento extraordinária e eficaz - tanto legal como força militar-para-força militar - com o Exército Brasileiro e os demais estudantes estrangeiros que participaram do curso. A participação neste programa era consistente com o objetivo do Roteiro de Transformação de Idioma da Defesa do Secretário de Defesa (Secretary of Defense's Defense Language Transformation Roadmap/DLTR) (1) de incorporar a educação da área regional na Educação e Desenvolvimento Militar Profissional (Professional Military Education and Development) e deveria servir como modelo para os futuros esforços do Corpo JAG de se integrar nesse processo de transformação.
 
Antecedentes

Nos termos do Regulamento do Exército (Army Regulation/AR) 350-1, (2) participei e completei um curso de dez meses de instrução na ECEME através do programa da Escola de Outras Nações do Exército dos EUA (U.S. Army's School of Other Nations/SON). A ECEME, a instituição de ensino superior do Exército Brasileiro, está localizada na Praia Vermelha, na seção de Urea do Rio de Janeiro, aos pés do famoso Pão de Açúcar. A ECEME realiza um curso de dois anos para oficiais de estado-maior para majores e tenentes-coronéis - o Curso de Comando e Estado-Maior (CCEM) - e um curso de um ano para coronéis - o Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército, que é um curso do nível da Escola de Guerra do Exército (Army War College). Além disso, a ECEME abriga o Centro de Estudos Estratégicos do Exército Brasileiro. (3)

Atualmente, o Exército dos EUA seleciona de um a três oficiais do Exército para participar da ECEME a cada ano. Além disso, o Exército dos EUA atribui um tenente-coronel à ECEME como instrutor de intercâmbio. Para os oficiais do Exército Brasileiro, a seleção para participar da ECEME é altamente competitiva, e a presença é um pré-requisito para a promoção a oficial general. Oficiais militares dos Estados Unidos que participam da ECEME podem ter certeza de que estão frequentando a escola com os futuros formadores e líderes do Exército Brasileiro.

Seleção

Fui selecionado para participar da ECEME através do programa SON, conforme estabelecido no AR 350-1. Devido à natureza única da atribuição e às circunstâncias incomuns que facilitaram a seleção de um advogado (judge advocate), no entanto, não fui selecionado estritamente por meio de procedimentos estabelecidos.

O SON e Procedimentos de Seleção Normal

O Quartel-General, Departamento do Exército, Chefe do Estado-Maior Adjunto, G-3/5/7 (Departamento de Operações Militares do Exército - Planos Estratégicos e Políticas) (Headquarters, Department of the Army, Deputy Chief of Staff, G-3/5/7, Department of the Army Military Operations - Strategic Plans and Policy/HQDA, DCS, G-3/5/7 (DAMO-SS)) é o proponente do programa SON. O objetivo do programa é "desenvolver relacionamentos mais próximos entre o Exército dos EUA/Exército Estrangeiro colocando os oficiais elegíveis da Escola de Serviço Intermédio dos EUA (U.S. Army Intermediate Service College) em escolas de comando e estado-maior estrangeiras e em escolas de guerra ou de defesa nacional que sejam credenciadas como equivalentes à [Escola de Serviço Intermediário] e [à Escola de Serviço Superior]." (4)

De acordo com as provisões do AR 350-1, a mensagem anual do Comando de Recursos Humanos que anuncia o comitê de seleção da Escola de Serviço Superior (Senior Service College) conterá uma lista das escolas estrangeiras para as quais a diretoria seleciona estudantes qualificados. (5) Os oficiais selecionados "devem ser representantes destacados do Exército dos EUA e dos Estados Unidos e desejam participar." (6) Enquanto algumas das escolas estrangeiras elegíveis são listadas como serviço irrelevante (branch immaterial), a consideração prioritária é dada aos oficiais da especialidade de oficiais de área estrangeira (foreign area officer/FAO) e, historicamente, apenas FAOs, oficiais das armas de combate ou de apoio ao combate foram selecionados. (7) Os oficiais elegíveis submetem uma carta de desejo ao seu conselho da Escola de Serviço Superior, o qual então seleciona os candidatos.

Minha Seleção como Advogado

Porque o conselho de seleção de advogados do CGSC se reúne separadamente do comitê de categoria competitiva do Exército, e porque, por tradição, apenas FAOs e oficiais de armas de combate participaram no SON, minha seleção exigiu uma estreita coordenação com o Gabinete de Pessoal, Planos e Treinamento do Corpo JAG (Personnel, Plans, and Training Office/PP&TO) e com os gerentes do programa SON junto ao Vice-Chefe de Estado-Maior Adjunto para Operações (Deputy Chief of Staff for Operations, G-3). Eu expressei interesse em participar do programa SON para o PP&TO e os gerentes do programa a partir do verão de 2003. No final de 2004, o Juiz-Advogado Geral (Judge Advocate General) aprovou um plano conceitual submetido por meio do PP&TO para permitir que advogados concorressem e frequentassem escolas estrangeiras, incluindo equivalentes da CGSC. Coincidentemente, o G-3 informou ao PP&TO, no início de janeiro de 2005, que uma vaga havia sido inesperadamente reaberta para o curso da CGSC brasileira, a ser iniciado no início de fevereiro daquele ano. Como a vaga não foi antecipada, o G-3 não havia identificado nenhum oficial FAO ou de armas de combate para participar. Com o apoio da minha cadeia de comando e aprovação do Juiz-Advogado Geral, a PP&TO coordenou-se com o G-3 e garantiu minha seleção para participar do curso. (8) Eu rapidamente processei minha designação na Procuradoria dos EUA (U.S. Attorney's office) e me apresentei para o curso em 7 de fevereiro de 2005. Enquanto participava do curso, fui designado para o Destacamento de Estudantes do Exército dos EUA (U.S. Army Student Detachment), Fort Jackson, Carolina do Sul, com o posto na ECEME e ligado ao Adido Militar do Exército dos EUA (U.S. Army Military Attaché) em Brasília para fins administrativos.

O Curso da ECEME

A ECEME é o equivalente brasileiro da CGSC em Ft. Leavenworth, e após a formatura, os alunos recebem o Código 4 de Educação Militar (Military Education Level, MEL, Code 4). (9) Como o curso é ministrado em uma língua estrangeira, os oficiais têm direito a um pagamento por incentivo de idioma, desde que tenham um Teste de Proficiência em Idioma de Defesa atual (Defense Language Proficiency Test). (10) Oficiais têm uma obrigação de serviço ativo de dois anos para participação no SON, que é calculado a partir da data de conclusão do curso. (11)

História

A ECEME marcou o seu centenário durante o meu ano de curso. A primeira escola de comando e estado-maior do Exército Brasileiro foi estabelecido por um decreto real [errata: oficial] em 2 de outubro de 1905. (12) Inicialmente influenciado pela doutrina militar alemã, o Exército Brasileiro voltou-se para os franceses após a derrota dos alemães na Primeira Guerra Mundial. A influência francesa continuou até a decisão do Brasil de se juntar ao esforço aliado na Segunda Guerra Mundial e de engajar a Força Expedicionária Brasileira, uma força-tarefa divisional que lutou ao lado do Exército dos EUA no teatro italiano sob o comando do Quinto Exército dos EUA (U.S. Fifth Army). (13) A escola foi instalada em sua localização atual na década de 1940, e a doutrina militar dos EUA cresceu em influência. (14) Embora nas últimas décadas o Brasil tenha se distanciado de seus laços prévios com as forças armadas americanas, sua doutrina básica tática, operacional, estratégica e de liderança está fortemente baseada na doutrina dos EUA, ainda que um pouco desatualizada.

Estrutura do Curso e Corpo Discente

Para os oficiais do Exército Brasileiro, o CCEM é um curso de dois anos, subdividido nos seguintes cursos distintos, porém integrados, em serviços específicos:

1. O Curso de Comando e Estado-Maior (CCEM) é o principal Curso de Comando e Estado-Maior da ECEME. O objetivo do curso é desenvolver e preparar oficiais das armas de combate (15) e de material bélico para servir em brigadas e estados-maiores superiores, bem como para comandar. O curso é aberto a capitães antigos até tenentes-coronéis e tem a duração de dois anos. O primeiro ano do curso se concentra em operações defensivas e ofensivas em nível de brigada e divisão, história militar, estratégia e liderança. O segundo ano concentra-se em corpos e operações de nível superior.

2. O Curso de Chefia e Estado-Maior para Oficial Intendente (CCEM/Int) não é diferente daquele do CCEM. Oficiais de intendência e de transporte participam do CCEM junto com os oficiais de armas de combate durante os dois anos completos, com certos aspectos de seu curso direcionados a questões específicas de logística.

3. O Curso de Chefia e Estado-Maior para Médicos (CCEM/Med) é um curso distinto com alguns blocos integrados ao CCEM, focados em questões específicas do corpo médico. A maioria dos oficiais participa por um ano, com um pequeno número que participa por dois anos.

4. O Curso de Comando e Estado-Maior para Oficiais de Nações Amigas (CCEM/ONA), o curso que frequentei, destina-se a desenvolver e preparar oficiais estrangeiros convidados para servir na brigada e estados-maiores superiores, facilitar o intercâmbio de conhecimento e experiência, e fortalecer as relações de cooperação com os países representados. Oficiais estrangeiros participam do primeiro ano do CCEM junto com seus pares brasileiros, participando plenamente de quase todos os aspectos do curso. Adicionalmente, conforme descrito mais detalhadamente abaixo, a ECEME organiza uma série de atividades e eventos específicos para os oficiais estrangeiros.

Aproximadamente 120 oficiais brasileiros participam dos dois anos do curso. Durante 2005, onze oficiais estrangeiros compareceram ao CCEM/ONA. Além de mim, havia oficiais de Angola, Argentina, República Popular da China, Chile, Equador, Guatemala, Peru, Paraguai, Uruguai e Venezuela.

Currículo e Requisitos do Curso

Como observado, o primeiro ano do CCEM concentra-se principalmente nas operações de nível de brigada e divisão, dividindo o ano acadêmico quase igualmente entre a ofensiva e a defesa. Quase todo o trabalho é concluído em um ambiente de grupo pequeno; alunos sendo divididos em grupos de aproximadamente quinze oficiais, com quatro grupos para uma sala de aula. Oficiais estrangeiros são integrados equilibradamente aos pequenos grupos, e os grupos são periodicamente reorganizados para maximizar as trocas experienciais e o treinamento de dinâmica de grupo.

Para os oficiais estrangeiros, há um pré-curso durante o mês de janeiro que se concentra apenas no treinamento de idiomas e é realizado em uma instalação diferente no Rio de Janeiro. Como eu não fui aprovado para participar do curso até o final de janeiro de 2005, não participei deste pré-curso. Geralmente, é uma boa oportunidade para iniciar os requisitos de processamento no Consulado dos EUA e na ECEME, o qual pode ser trabalhoso e para se aclimatar e começar a procurar por habitação adequada. Após o pré-curso, os oficiais estrangeiros receberam uma orientação de um dia na ECEME antes do início do curso em 15 de fevereiro de 2005.

A escola segue um rígido dia de trabalho de 07h30 às 16:30, com exceção das sextas-feiras, que terminam ao 12:00. Geralmente, da última hora para uma hora e meia de um a dois dias por semana foi reservada para treinamento físico pessoal. Havia também uma série de períodos por semana reservados para pesquisa e estudo, mas os estudantes geralmente não tinham permissão para deixar as salas de aula durante esses períodos.

Após aproximadamente uma semana de orientação, o curso começou com quatro dias de exercícios de dinâmica de grupo não testáveis, o que foi uma boa oportunidade para conhecer e interagir com os colegas de turma. Curiosamente, esta segunda semana terminou com o único bloco de treinamento jurídico ministrado durante todo o curso - um bloco de quatro horas de instrução sobre o direito internacional humanitário de um professor externo. Esta instrução superficial refletiu uma fraqueza geral na integração da instrução e questões legais no currículo do curso.

As duas semanas seguintes englobaram o primeiro bloco testável de instrução - Geoestratégia. Foram apresentadas quarenta e duas horas de instrução sobre várias teorias da estratégia de defesa geopolítica e nacional, seguidas de um exame escrito de quatro horas. Por causa das sensibilidades percebidas no cenário de teste apresentado aos estudantes brasileiros, os estudantes estrangeiros receberam um exame diferente, um que foi dado aos estudantes brasileiros de um ano anterior, e foi permitido algum tempo adicional para concluir o exame.

As próximas treze semanas focaram nas operações defensivas de brigada e divisão, apresentadas através do estudo de vários cenários. Um grupo de processo de análise e planejamento de missão precedeu cada cenário. O primeiro cenário apresentado incluiu as respostas aos problemas utilizados, de fato, como a fase inicial do processo de ensino. Cada problema sucessivo exigiu uma análise e planejamento independente do estudante com maiores pressões de tempo. Para concluir este período, os alunos receberam um exame individual e coletivo de dois dias, que exigiu que os estudantes recebessem uma missão, realizassem uma análise da missão, planejassem planos defensivos da brigada e da divisão, tomassem decisões corretivas no meio da batalha, e apresentassem planos gráficos e escritos e respostas a uma série de perguntas. Os estudantes estrangeiros fizeram o mesmo exame que os estudantes brasileiros, mas foram permitidos mais trinta minutos em cada sessão individual.

Após o exame, toda a turma recebeu mais um conjunto de problemas em preparação para um exercício de terreno de uma semana conduzido em torno da cidade de Uberlândia, no estado de Minas Gerais. Novos grupos pequenos foram designados para este exercício, e os grupos foram solicitados a desenvolver planos de brigada e divisão para uma defesa e submetê-los antes da partida para o exercício. O exercício do terreno foi então usado para ratificar e corrigir os planos com o benefício de um reconhecimento de terreno.

Como o Brasil é atravessado por muitos rios grandes, sua doutrina é dominada pela idéia de defesas estáticas ancoradas nos rios como grandes obstáculos; o exercício não foi diferente. O exercício foi muito bem planejado e organizado, com vários pontos de observação espalhados por dez quilômetros de ambos os lados do rio Paranaíba, ao norte da cidade. Durante os vários dias do exercício, os grupos de trabalho foram transportados em ônibus e caminhões em um cronograma de rotação para os vários pontos de observação para conduzir a análise do terreno em profundidade e o planejamento da missão. Embora o trabalho substantivo do exercício tenha sido dificultado por algumas das idiossincrasias do Exército Brasileiro, foi uma excelente oportunidade para observar os oficiais brasileiros trabalharem em um ambiente de semi-campo, interagir com o batalhão de infantaria motorizado de apoio, e testar conhecimento e compreensão de doutrinas e táticas, a fim de contribuir com uma perspectiva dos EUA para o planejamento.

Depois de nove dias de férias no meio do curso, os estudantes retornaram à ECEME para iniciar um processo quase idêntico para aprender operações ofensivas. Novamente, ao final de aproximadamente dez semanas de estudo de operações ofensivas em nível de brigada e divisão, os alunos receberam um exame de três dias de duração. Imediatamente depois, nós recebemos um novo conjunto de problemas e uma ordem de operações de corpo para começar a desenvolver planos para o próximo exercício de terreno. Em seguida, voamos para Cascavel, no estado do Paraná, para um exercício de terreno de uma semana, semelhante ao exercício no final da fase de operações defensivas do curso, usando o tempo no terreno para estudar os conceitos aprendidos em sala de aula e ratificar e retificar os planos que cada grupo desenvolveu. Novamente, o planejamento logístico e a execução deste exercício foram excelentes, mas a instrução substantiva e o aprendizado foram prejudicados pelo foco excessivo na orientação do terreno e outros aspectos mais adequados aos oficiais de nível inferior.

Um aspecto muito positivo da semana em Cascavel foi uma visita programada à represa de Itaipu e a Ciudad del Este no Paraguai. Além dessas viagens, os estudantes estrangeiros também foram conduzidos a uma excursão de jangada pelas imensas Cataratas do Iguaçu.

A usina hidrelétrica de Itaipu é o maior empreendimento do gênero em operação no mundo. (16) Construída de 1975 a 1991, em um desenvolvimento binacional no rio Paraná, Itaipu representa os esforços e realizações de dois países vizinhos, o Brasil e o Paraguai. As dezoito unidades geradoras da usina somam uma capacidade de produção total de 12.600 MW (megawatts) e uma produção confiável de setenta e cinco milhões de MW por hora por ano. Essa produção fornece noventa e oito por cento de todas as necessidades energéticas do Paraguai e cerca de quinze por cento das do Brasil. É uma instalação e operação extremamente impressionante e, obviamente, fundamental para a infraestrutura de energia dos dois países.

A Ciudad del Este, no Paraguai, fica no centro da região conhecida como tríplice fronteira, uma área de fronteiras compartilhadas entre o Paraguai, o Brasil e a Argentina. (17) Embora sujeitos a disputas, muitos citam essa área como um ponto de convergência entre o crime organizado, o narcotráfico e o terrorismo islâmico. (18) Há pouca dúvida de que esta região, particularmente no Paraguai, está aflita com crimes internacionais como lavagem de dinheiro, contrabando de armas, fraude de migração e tráfico de drogas devido à corrupção e uma falta palpável de controle do governo. De significado adicional é a presença de uma comunidade islâmica de imigrantes que representa uma fatia da população urbana na área da tríplice fronteira, principalmente Ciudad del Este e Foz do Iguaçu, estimada em cerca de 30.000. Embora essa seja uma área frequentemente negligenciada, é de importância crítica para a segurança nacional dos EUA. Mesmo uma breve visita a Ciudad del Este confirmou o estado geral da ilegalidade e a existência de condições propícias à exploração por organizações criminosas e possivelmente terroristas.

Este exercício de terreno nos levou até o final de outubro. O mês restante do curso foi dedicado à conclusão dos requisitos de redação, estudo da história militar, instrução sobre liderança e viagens patrocinadas para os oficiais estrangeiros.

Os requisitos de redação para o curso eram exigentes. Além de ter que entregar uma resenha de livro em português, cada aluno era exigido a escrever um longo artigo acadêmico. Para os brasileiros, a exigência é escrever uma tese ou dissertação, para a qual são dados os dois anos completos do curso e recebem uma pós-graduação reconhecida. Os estudantes estrangeiros são exigidos a escrever uma monografia, ou dissertação, de pelo menos oitenta páginas, a serem preenchidas dentro dos dez meses do curso. Meu tema foi uma análise comparativa do Corpo JAG do Exército dos EUA com a estrutura legal militar do Exército Brasileiro. Embora a escola autorizasse os estudantes estrangeiros a enviar o trabalho em inglês ou espanhol, apresentei o meu em inglês e português como cortesia e para maximizar sua utilidade.

Programas Específicos para os Estudantes Estrangeiros

Além dos requisitos normais do curso, a ECEME incorporou várias atividades específicas para os estudantes estrangeiros. Estes incluíram uma série de viagens de estudos de campo a unidades e instituições militares e a grandes centros industriais, bem como um programa de viagens para as famílias.

1. Viagens de Estudo: Ao longo do ano, a ECEME planejou, financiou e executou uma série de viagens de estudo para estudantes estrangeiros.

a. Uma viagem de quatro dias e meio a São Paulo, durante a qual visitamos o seguinte: a Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende a caminho de São Paulo; Daimler Chrysler do Brasil em São Paulo; o Comando Militar do Sudeste, em São Paulo; o fabricante brasileiro de aeronaves EMBRAER (Empresa Brasileira de Aeronáutica) em São Paulo; Instituto Nacional de Pesquisa Espacial (Instituto Nacional de Pesquisas Aeroespaciais) em São José dos Campos; o quartel-general e guarnição do 6º Batalhão de Infantaria Leve (6º Batalhão de Infantaria Leve - Aeromóvel); e o Comando de Aviação do Exercito em Taubaté.

b. Uma viagem de quatro dias a Brasília, a capital do Brasil, para visitar o Comando Militar do Planalto, o equivalente funcional do Distrito Militar de Washington, e o 11º Comando Militar Regional (Comando da 11ª Região Militar), responsável pelo distrito federal e os estados de Goiás e Tocantins, e a cidade histórica de Salvador na Bahia. (19)

c. Uma série de passeios de um dia a escolas e organizações militares na área do Rio de Janeiro, como a Escola de Artilharia de Costa e Anti-Aérea, a Escola de Material Bélico e o histórico 32º Batalhão de Infantaria Motorizada.

Todas essas viagens proporcionaram excelentes oportunidades para observar o Exército Brasileiro de perto e trabalhando, visitar unidades históricas como o 6º Batalhão de Infantaria Leve que participou da Força Expedicionária Brasileira na Segunda Guerra Mundial, e ver alguns dos destaques do setor industrial brasileiro. Elas também proporcionaram uma excelente oportunidade para interagir em um nível social e profissional, e assim aprofundar as amizades, com os outros dez oficiais estrangeiros presentes no curso e os oficiais brasileiros que nos acompanharam.

2. Programa Familiar: Além das viagens de estudo, a ECEME organizou uma série de viagens de fim de semana para vários locais históricos e turísticos a uma curta distância de carro do Rio de Janeiro. Essas viagens foram excelentes oportunidades para as famílias dos estudantes estrangeiros e alguns facilitadores brasileiros, interagirem e cimentarem laços e amizades. Como minha esposa é brasileira e tenho uma familiaridade geral com o Rio de Janeiro e as áreas vizinhas, participei ativamente da assistência nessas viagens e convidei vários outros oficiais estrangeiros para passeios adicionais nos fins de semana na região, todas elas fortalecendo meus contatos com esses oficiais e suas famílias.

Oportunidades de Engajamento

Um dos aspectos mais valiosos do meu tempo no Brasil foi a excepcional oportunidade de engajamento legal e de força militar-para-força militar. Eu não apenas representei o Exército dos Estados Unidos todos os dias de aula, mas aproveitei todas as oportunidades para inserir questões jurídicas operacionais em todos os aspectos do curso. Tornou-se rapidamente evidente que esta perspectiva é extremamente deficiente na mentalidade militar brasileira e, portanto, no currículo da ECEME. Em geral, no entanto, os estudantes e instrutores brasileiros reconhecem essa deficiência, querem vê-la corrigida e apreciam muito minha perspectiva, experiência e percepções. Esse reconhecimento me deu a oportunidade de oferecer meu ponto de vista quase diariamente em sala de aula e ter amplo acompanhamento nas discussões. Além desse compromisso geral muito importante, tive várias oportunidades específicas, que estão detalhadas abaixo.

1. Patrocínio: Cada oficial estrangeiro tinha pelo menos um patrocinador no curso. Tive a sorte de ter dois patrocinadores - um oficial de artilharia e um médico do exército. O programa de patrocínio levou rapidamente a relacionamentos próximos e à oportunidade de muitas discussões francas e abertas sobre a política dos EUA, o Exército dos EUA e o papel dos advogados nas forças armadas dos EUA.

2. Oportunidades de Representação: Cada oficial estrangeiro foi exigido a fazer uma apresentação a toda a ECEME no dia dos respectivos dias de independência nacional. Os oficiais estrangeiros também participaram de uma Dança das Nações, onde cada estudante internacional colocou uma mesa e exibiu itens, informações e comida de nossos respectivos países.

3. Briefings Jurídicos Específicos: Fui solicitado a fornecer vários briefings sobre o Corpo JAG, seu papel no Exército dos EUA e a relação entre os militares dos EUA e o judiciário dos EUA. Especificamente, apresentei um breve resumo de duas horas aos alunos do Curso de Política, Estratégia e Alta Administração do Exército sobre a relação entre os militares dos EUA e o judiciário (ou seja, Contencioso Federal [Federal litigation]). Esta é uma área problemática para o Exército Brasileiro devido às peculiaridades do sistema jurídico brasileiro e à história do papel do exército nos assuntos internos no Brasil.

Além disso, às custas do Exército Brasileiro, fui levado ao Gabinete do Comandante do Exército para fornecer um resumo similar aos oficiais superiores do quartel-general do Exército, juntamente com uma classe de novos oficiais no nascente ramo de apoio legal do Exército Brasileiro. O resumo foi muito bem sucedido e permitiu-me estabelecer contatos importantes com alguns dos poucos advogados militares da força.

Finalmente, fui convidado para ser um orador no 28º Seminário sobre Direito Penal Militar, organizado pelo Comando Militar do Leste (CML), com uma platéia de estudantes universitários, acadêmicos e oficiais militares dos diferentes serviços. O CML é um dos comandos regionais mais importantes e influentes do Exército Brasileiro, com um dos escritórios jurídicos mais robustos e uma prática ativa de direito penal. Este resumo foi muito bem recebido e novamente me proporcionou a oportunidade de fazer contatos significativos com advogados militares.

4. Operação Aerotransportada: O Exército Brasileiro convidou todos os estudantes estrangeiros qualificados em paraquedismo para participarem de um curso de reciclagem aerotransportada e saltar com a Brigada de Infantaria Pára-quedista baseada no Rio de Janeiro. Por solicitação especial, obtive permissão do Departamento do Exército para participar desse treinamento. Participei de um treinamento de reciclagem no Centro de Instrução Pára-quedista do Exército Brasileiro (Centro de Instrução Pára-quedista General Penha Brasil) em 16 de novembro de 2005, saltei (depois de arranhões e atrasos típicos) em 20 de novembro de 2005, juntamente com cinco dos outros estudantes estrangeiros e vários outros estudantes que frequentavam o equivalente brasileiro do Curso de Carreira de Capitão, e fui premiado com as Asas Paraquedistas brasileiras em uma cerimônia especial em 23 de novembro de 2005. Esta grande experiência permitiu o engajamento força militar-para-força militar e a construção de relacionamentos e serviu para reforçar o exemplo do espírito (ethos) do soldado-advogado do Corpo JAG do Exército dos EUA.

5. Apoio do Escritório do Adido de Defesa/Grupo Militar (Defense Attaché Office/Military Group, DAO / MILGROUP): Conforme mencionado acima, eu estava ligado ao escritório do Adido do Exército em Brasília enquanto participava do curso, com apoio administrativo fornecido pelo Consulado dos EUA no Rio de Janeiro e pelo Adido de Defesa Assistente (Assistant Defense Attaché). Existe uma pequena, mas ativa, comunidade militar dos EUA no Rio, muitos dos quais são estudantes. Não é incomum que o DAO ou o Grupo MIL se baseiem em estudantes no país para ajudar em diferentes missões e requisitos, e o grupo como um todo opera muito em equipe. Parte da assistência que forneci incluiu o seguinte: acompanhar o Vice-Cônsul Geral (Deputy Consul General) na celebração das Forças Armadas do Brasil do Dia da Vitória na Europa [8 de maio]; servindo na equipe de acompanhamento para uma visita do comandante do Comando Sul dos EUA (U.S. Southern Command); organizar uma visita e palestra no ECEME pelo comandante do Exército Sul dos Estados Unidos (United States Army South); e servindo como tradutor de português para o comandante do Comando Sul durante a 1ª Conferência de Defesa do Cone Sul em Buenos Aires, Argentina.

Essas atividades, assim como a interação semanal com a equipe do consulado e a comunidade do DAO e do Grupo MIL, foram um desenvolvimento profissional muito positivo, dando grandes percepções sobre esse aspecto importante das operações militares dos EUA.

Conclusão

“As operações militares do pós 11/9 reforçam a realidade de que o Departamento de Defesa precisa de uma capacidade orgânica significativamente aprimorada em idiomas e dialetos emergentes, maior competência e habilidades de área regional nesses idiomas e dialetos e uma capacidade de expansão para expandir rapidamente suas capacidades de linguagem em curto prazo." (20) Esse reconhecimento crítico, baseado no pressuposto bem fundamentado de que "o conhecimento de idiomas estrangeiros e de áreas estrangeiras é fundamental para sustentar coalizões, buscar estabilidade regional e conduzir missões multinacionais especialmente em operações pós-conflito e outras operações que não o combate, segurança, humanitárias, de construção nacional e de estabilidade" (21) não é de modo algum inaplicável ao Corpo JAG. Pelo contrário, experiências recentes demonstram que os advogados estão desempenhando um papel cada vez maior no espectro total das operações militares, tanto nas fases de planejamento como de execução.

Mais e mais comandantes estão entrando em contato com seus juízes-advogados para realizar funções não tradicionais, especialmente nas fases de pós-conflito, na fase de construção de nação de nossas operações e, muitas vezes, assumindo-as como o principal elemento de planejamento e execução. Tendo um corpo qualificado em idiomas, os juízes-advogados especializados em tribunais regionais só servirão para aumentar a utilidade geral, a capacidade e o valor multiplicador de força do Corpo. Não existe um mecanismo melhor para atingir este objetivo do que integrar os juízes-advogados nos programas de ensino estrangeiro.

Através da minha participação na ECEME, eu exponencialmente fortaleci minhas habilidades em espanhol e português. Ganhei experiências inestimáveis e percepções não apenas sobre as forças armadas, sociedade, estrutura governamental e política do Brasil, mas também sobre vários outros países latino-americanos e a região como um todo. Desenvolvi contatos importantes nas forças armadas de vários países da América Latina, bem como em Angola e na República Popular da China. Também estabeleci contatos úteis dentro de nossa própria comunidade de Oficiais de Área Estrangeira e obtive informações valiosas sobre o Adido de Defesa, Grupo Militar e a organização e operações do Departamento de Estado.

Este foi um investimento valioso tanto para o Exército quanto para o Corpo JAG, e deve ser replicado no futuro. Além do treinamento e da experiência, a integração dos juízes-advogados nos programas de ensino estrangeiro pode servir como excelente ferramenta de recrutamento e retenção, e apoia os objetivos específicos do Roteiro de Transformação de Idioma de Defesa do DOD. Para informações adicionais, juízes-advogados interessados devem entrar em contato com o PP&TO.

Bibliografia recomendada:

Soldados da Pátria: História do Exército Brasileiro 1889-1937.

Notas

(1) O DLTR é uma importante iniciativa para desenvolver idiomas estrangeiros e a expertise cultural entre membros militares e civis do Departamento de Defesa (Department of Defense, DOD). A iniciativa reflete uma prioridade de longa data do Secretário de Defesa para alcançar os seguintes três grandes objetivos: criar idioma fundacional e conhecimento cultural nas fileiras de oficiais, civis e graduados para as forças ativas e de reserva; criar a capacidade de impulsionar recursos lingüísticos e culturais além dos recursos internos; e estabelecer um quadro de especialistas em idiomas com níveis avançados de proficiência. O DLTR também visa melhorar as habilidades lingüísticas do corpo de oficiais em geral, bem como considerar a habilidade de linguagem na promoção de oficiais generais. Ver Comunicado de Imprensa, Departamento de Defesa dos EUA, Gabinete do Subsecretário de Defesa (Assuntos Públicos) [News Release, U.S. Dep't of Defense, Office of the Assistant Secretary of Defense (Public Affairs)], DOD anuncia plano para melhorar o conhecimento em idiomas estrangeiros [DOD Announces Plan to Improve Foreign Language Expertise] (Mar. 30, 2005), disponível em http://www.defenselink.mil/releases/2005/nr20050330-2342.html; ver também DEPT DE DEFESA DOS EUA,GUIA DE TRANSFORMAÇÃO DE IDIOMA DA DEFESA [U.S. DEPT OF DEFENSE, DEFENSE LANGUAGE TRANSFORMATION ROADMAP] (Jan. 2005), disponível em http://www.defenselink.mil/news/Mar2005/d20050330roadmap.pdf [doravante DLTR].

(2) DEPARTAMENTO DE EXÉRCITO DOS EUA, REG. 350-1, FORMAÇÃO E EDUCAÇÃO DO EXÉRCITO [U.S. DEP'T OF ARMY, REG. 350-1, ARMY TRAINING AND EDUCATION] para. 3-34 (9 Abr. 2003). O Regulamento do Exército 350-1 [Army Regulation 350-1] foi substituído pelo DEPARTAMENTO DE EXÉRCITO DOS EUA, REG. 350-1, TREINAMENTO DO EXÉRCITO E DESENVOLVIMENTO DE LÍDERES [U.S. DEP'T OF ARMY, REG. 350-1, ARMY TRAINING AND LEADER DEVELOPMENT] (13 Jan. 2006) [doravante AR 350-1]. O programa da Escola de Outras Nações do Exército dos EUA (SON) é abordado no parágrafo 3-39 e no Apêndice D do novo regulamento. AR 350-1, infra para. 3-39 e ap. D.

(3) Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), http://www.eceme.ensino.eb.br (última visita Set. 25, 2006) [doravante ECEME].

(4) AR 350-1, supra nota 2, para. 3-39a. A versão anterior do AR 350-1 declarou o objetivo do programa SON de uma maneira ligeiramente diferente. "O objetivo do programa SON é desenvolver relações mais próximas entre o Exército dos EUA e exércitos estrangeiros, colocando oficiais do Exército dos EUA selecionados por conselho em escolas de comando e estado-maior estrangeiras e em escolas de guerra ou de defesa nacional que tenham sido credenciadas como equivalentes ao Curso de Comando e Oficial de Estado-Maior Geral [Command and General Staff Officer Course] para o MEL Código 4 e a Escola de Guerra do Exército dos EUA [U.S. Army War College] para o MEL Código 1." Id. para. 3-34a.

(5) Id. para. 3-39c.

(6) Id. app. D-2.

(7) Ver id. tbl. D-2.

(8) Esta seleção de curto prazo foi ajudada pelo fato de que eu já tinha notação no nível de falante nativo no Teste de Proficiência em Idioma de Defesa (DLPT).

(9) Sob o regulamento atual, a seleção para escolas estrangeiras nível MEL-4 ocorre durante as rotações de designação normais após os oficiais concluírem a Educação de Nível Intermediário[Intermediate-Level Education]. Id. para. 3-39c.

(10) Id. para. 3-39e.

(11) Id. app. D-4b, tbl. D-2.

(12) ECEME, supra nota 3.

(13) Os brasileiros também enviaram um esquadrão de P-47 Thunderbolts que foi comandado pelo então tenente-coronel Nero Moura, que mais tarde serviu como general de brigada e Ministro da Aviação. Ele também era tio-avô da minha esposa. Segundo todos os relatos, as forças brasileiras lutaram valentemente ao longo da guerra.

(14) ECEME, supra nota 3.

(15) As cinco armas de combate do Exército Brasileiro são Infantaria, Cavalaria (Blindados), Artilharia, Engenheira e Comunicações.

(16) Ver Itaipu Binacional, http://www.itaipu.gov.br/ (última visita Out. 25, 2006).

(17) Ver Postura Declaração do General Bantz J. Craddock, Comandante do Exército dos Estados Unidos, Comando Sul dos Estados Unidos, perante o Comitê de Serviços Armados da 109ª Casa do Congresso, aos 2, 20 [Posture Statement of General Bantz J. Craddock, United States Army Commander, United States Southern Command, Before the 109th Congress House Armed Services Committee at 2, 20] (Mar. 16, 2006), disponível em http://www.house.gov/hasc/3-16-06SOUTHCOMTestimony.pdf.

(18) Ver, por exemplo., Jessica Stem, O Inimigo Protéico, NEGÓCIOS ESTRANGEIROS [The Protean Enemy, FOREIGN AFFAIRS] (Julho/Ago. 2003); Coronel (Ref.) William W. Mendel, Ciudad del Este e os Novos Centros de Gravidade do Paraguai, COMBINED ARMS CTR MIL. REV. [Paraguay's Ciudad del Este and the New Centers of Gravity, COMBINED ARMS CTR MIL. REV.] (Mar./Abr. 2002), disponível em http://usacac.leavenworth.army.mil/CA/milreview/English/MarApr02/mendel.htm.

(19) A viagem para Salvador foi um substituto de última hora para a viagem originalmente planejada para visitar Manaus, a bacia amazônica, e o Comando Militar da Amazônia, que infelizmente foi cancelado devido à falta de recursos aéreos previstos.

(20) DLTR, supra nota 1.

(21) Id. at 3.

Major Gary P. Corn, Advogado, Exército dos EUA. Atualmente designado como Chefe, Direito Operacional, I Corpo, Fort Lewis, Washington. LL.M. 2002, Escola do Jurídica Geral, Exército dos EUA; J.D. 1993, Universidade George Washington; BA. 1987, Universidade Bucknell.


Por que a equipe comando do Grupo Alfa da Rússia é verdadeiramente assustadora

Operadores do Grupo Alfa.

Por Darien Cavanaugh, Special Ops Magazine, 17 de março de 2019.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 02 de janeiro de 2020.

A Rússia e a milícia islâmica libanesa Hezbollah tornaram-se aliados próximos na guerra civil na Síria, com os dois apoiando o regime do presidente sírio Bashar al-Assad no conflito. O relacionamento deles nem sempre foi tão amigável. Quando membros do Hezbollah seqüestraram quatro diplomatas russos em 1985, matando um deles, a Rússia enviou o Grupo Alfa da KGB para lidar com a situação.

O Grupo Alfa é parte rede de espiões, equipe de contraterrorismo e equipe de comandos de propósito geral - e totalmente aterrorizante.

Primeiro ganhou notoriedade por liderar o ataque ao palácio presidencial de Cabul durante as fases iniciais da invasão russa do Afeganistão em 1979. Ao longo das décadas de 1980 e 1990, seus membros participaram de várias derrubadas notórias de terroristas, insurgentes e seqüestradores.

Quando a KGB e partes das forças armadas soviéticas tentaram um golpe em 1990, os membros do Grupo Alfa foram encarregados de tomar o parlamento em Moscou e neutralizar o então presidente Boris Yeltsin.

O Grupo Alfa sobreviveu ao colapso da União Soviética e atualmente opera sob os auspícios do FSB, o sucessor do KGB. No entanto, seu confronto com o Hezbollah durante a crise dos reféns no Líbano continua sendo uma das operações mais discutidas e surpreendentemente brutais.

A KGB criou o Grupo Alfa - ou Spetsgruppa A - em 1974, em resposta aos ataques do Setembro Negro nas Olimpíadas de Munique, dois anos antes.

Oito terroristas ligados à Frente de Libertação da Palestina se infiltraram na Vila Olímpica, mataram dois atletas israelenses e fizeram vários outros reféns. A polícia da Alemanha Ocidental fracassou numa tentativa de resgate no aeroporto da OTAN horas depois. Outros nove israelenses morreram lá, junto com cinco dos terroristas e um policial alemão ocidental.

O Grupo Alfa formou-se na seqüência do fiasco. Mas o grupo rapidamente assumiu um papel mais amplo do que o mero contraterrorismo.

Comandos do Grupo Alfa da KGB no Afeganistão com capacetes de titânio suíços PSH-77, anos 80.

Quando a União Soviética invadiu o Afeganistão em 1979, o Grupo Alfa e o Grupo Zênite da KGB, outra unidade de forças especiais, lideraram um contingente de 700 soldados no ataque ao Palácio Tajbeg em Cabul*, de acordo com David Cox em seu livro Close Protection: The Politics of Guarding Russia's Rulers (Proteção Aproximada: A política de guardar os governantes da Rússia).

*Nota do Tradutor: O Alfa participou da Operação Tempestade-333 (quando os destacamentos Alfa e Zênite apoiaram o 154º Destacamento Independente das Spetsnaz - conhecido como "Batalhão Muçulmano" - do GRU em uma missão para derrubar e matar o presidente afegão Hafizullah Amin, em seu palácio de Tajbeg em Cabul.

Os comandos entraram no país sob os auspícios da proteção da embaixada russa. O ataque ao palácio de Tajbeg em 27 de dezembro de 1979 foi a primeira fase da invasão soviética. O presidente afegão Hafizullah Amin estava dando uma festa no palácio naquela noite. Inúmeros convidados civis e residentes do palácio, incluindo mulheres e crianças, estavam presentes quando o ataque começou.

Um membro das forças especiais que participou do ataque disse à BBC em 2009 que os oficiais encarregados ordenaram que os soldados matassem todos no edifício.

(1) Operador do “Batalhão Muçulmano”; Operação “Tempestade-333”, Cabul, 1979. (2) Operador do 411º Destacamento, Vale de Panjishir, 1985. (3) Sargento, 173° Destacamento, província de Kandahar, 1987. (4) Medalha afegã por bravura.
(Ilustração de Johnny Shumate / Osprey Publishing)

"Eu era um soldado soviético", lembra Rustam Tursunkulov. “Fomos treinados para aceitar ordens sem questionar. Eu estava nas forças especiais - é o pior trabalho.”

Uma afegã chamado Najiba estava dentro do palácio quando os soviéticos chegaram. Ela tinha apenas 11 anos na época. "As coisas que vi", disse Najiba à BBC. “Meu Deus - pessoas no chão. Eu vi uma pessoa... como uma cena de um filme de pesadelo. Cadáveres. Muitos."

"Por favor, tente entender que, quando há uma batalha, é difícil saber que há crianças lá", explicou Tursunkulov. "Em qualquer exército, deve haver alguém que faça as tarefas mais severas e terríveis. Infelizmente, não são soldados, mas políticos que fazem guerras."

O Palácio Tajbeg como quartel-general do 40º Exército Soviético em 1987.

O filho de 11 anos de Amin foi morto no ataque ao palácio, e o próprio Amin morreu durante a ação ou logo depois - talvez executado. Segundo Tursunkulov, os corpos de todos os mortos no palácio foram embrulhados em tapetes e enterrados nas proximidades sem cerimônia.

O Grupo Alfa continuou a liderar os esforços da KGB em contraterrorismo e contrainteligência doméstica até os anos 80. A unidade mirou agentes e operadores da CIA, e liderou a operação contra os seqüestradores do vôo 6833 da Aeroflot em Tbilisi, na Geórgia, em 1983. Eles mataram três dos seqüestradores e capturaram o restante, mas perderam cinco reféns.

Foi o envolvimento do grupo em uma crise de reféns em 1985 no Líbano que deu ao Grupo Alfa uma reputação internacional como uma unidade contra-terror cruel - mas eficaz.

Em 20 de setembro de 1985, a Organização de Libertação Islâmica, parte do Hezbollah, sequestrou quatro diplomatas russos em Beirute. Uma mensagem dos terroristas "alertou que os quatro prisioneiros soviéticos seriam executados, um a um, a menos que Moscou pressionasse milicianos pró-Síria a cessar o bombardeio de artilharia de posições mantidas pelas milícias fundamentalistas pró-Irã na cidade portuária de Trípoli, no norte do Líbano", de acordo com relatório contemporâneo de Jack McKinney, do Daily News da Filadélfia.

Moscou inicialmente tentou abrir canais de comunicação na esperança de negociar a libertação de reféns. Mas depois que os captores executaram um dos russos, Moscou enviou o Grupo Alfa.

Os reféns restantes foram libertados dentro de algumas semanas, o que surpreendeu os jornalistas, considerando que muitos reféns tomados no Líbano foram mantidos por meses ou até anos.

O General de Brigada Ghazi Kanaan, que era o chefe de inteligência das forças sírias no Líbano na época, foi originalmente creditado por orquestrar a libertação dos russos. Esse relato foi divulgado para jornalistas de outros países.

"Jornalistas ocidentais relataram que os seqüestradores foram forçados a libertar os reféns porque uma busca bloco-a-bloco por milicianos pró-Síria estava chegando perto deles", escreveu McKinney.

No entanto, de acordo com fontes israelenses citadas no Daily News, foi na verdade a KGB que negociou a libertação. E no livro Hezbollah: The Global Footprint of Lebanon's Party of God*, Matthew Levitt esclarece que não eram apenas seus agentes KGB comuns. Era o Grupo Alfa.

*NT: o título em português ficaria Hezbollah: A pegada global do Partido de Deus no Líbano.

"Em uma recontagem", escreve Levitt, "a KGB sequestrou um parente do chefe da organização que tomava reféns, cortou a orelha do parente e o enviou para sua família. Em outro, a unidade Alfa sequestrou um dos irmãos do seqüestrador e enviou dois dedos para sua família, em envelopes separados.

“Ainda outra versão tem os agentes soviéticos sequestrando uma dúzia de xiitas, um dos quais era parente de um líder do Hezbollah. O parente foi castrado e baleado na cabeça, seus testículos enfiados na boca e seu corpo enviado ao Hezbollah com uma carta prometendo um destino semelhante para os outros 11 cativos xiitas, se os três reféns soviéticos não fossem libertados.”

Embora os detalhes das várias "recontagens" sejam diferentes, o efeito é praticamente o mesmo. Dado o fato do Grupo Alfa ter sido despachado para Beirute, e de que os reféns foram libertados tão rapidamente quando outros países, incluindo os Estados Unidos, falharam em facilitar respostas tão prontas dos seqüestradores no Líbano, parece razoável que fosse o Grupo Alfa, em vez de uma busca síria que levou à liberação rápida.

Operadores do Grupo Alfa em treinamento de CQB, o distintivo da unidade é visível.

A Rússia tem uma política de longa data de atacar membros da família de terroristas. Os relatórios das ações alegadas do Grupo Alfa em Beirute são consistentes com essa tradição.

A saga de Beirute é sem dúvida a mais sensacional das operações do Grupo Alfa. Mas a unidade continuou a desempenhar um papel proeminente nos esforços militares, de inteligência e contraterrorismo soviéticos e russos.

Um destacamento lituano do Grupo Alfa tentou reprimir o movimento de secessão no país em janeiro de 1991, matando 14 civis e ferindo centenas mais quando eles tomaram a torre de televisão de Vilnius.

Mais tarde, no mesmo ano, comandos do Grupo Alfa assaltaram o parlamento russo durante um golpe contra o presidente soviético Mikhail Gorbachov. Eles foram instruídos a capturar o presidente da Federação Russa Boris Yeltsin - ou matá-lo, caso parecesse que ele poderia escapar.
Vinte comandos do Grupo Alfa recusaram a ordem, adiando a missão por tempo suficiente para o golpe entrar em colapso.

Operadores do Grupo Alfa durante o cerco ao parlamento russo, em agosto de 1991.

Mais recentemente, a unidade de contraterrorismo esteve envolvida no fim da crise dos reféns na escola de Beslan, na Ossétia do Norte, em 2004. Durante a batalha entre o Grupo Alfa e dezenas de terroristas, 330 pessoas morreram, incluindo 186 crianças.

Os comandos do Grupo Alfa foram criticados pelo uso imprudente de força excessiva em Beslan, observa Glenn Peter Hastedt em Spies, Wiretaps and Secret Operations. O presidente russo, Vladimir Putin, defendeu seus operadores especiais, dizendo que eles não planejavam invadir a escola e o fizeram apenas depois de relatos de que os terroristas começaram a executar as crianças do lado de dentro.

Também houve relatos do Grupo Alfa lutando na guerra civil na Ucrânia.

Texto postado no Special Ops Magazine pelo membro Eric SOF, ele foi inicialmente postado por Darien Cavanaugh no site War is Boring em 2016.

sábado, 4 de janeiro de 2020

Poderia haver uma reinicialização da Guerra Fria na América Latina?

O Ministro da Defesa russo, Sergei Shoigu (segundo da direita) e seu colega venezuelano, Vladimir Padrino Lopez (segundo da esquerda), realizam uma reunião em Moscou. (Vadim Savitsky/ TASS via Getty Images)

Por Scott Stewart, Stratfor, 26 de novembro de 2019.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 26 de novembro de 2019.

Destaques

- A Rússia está trabalhando com ex-aliados soviéticos na América Latina para minar a influência dos EUA e distrair Washington das atividades de Moscou em outros lugares.

- Ao fazer isso, Moscou está usando propaganda online para alimentar a retórica antigovernamental que agora alimenta protestos no Equador, Chile, Bolívia e Colômbia.

- A Rússia provavelmente adotará táticas semelhantes para enfraquecer outros governos aliados dos EUA na América Latina, colocando empresas e organizações ocidentais que operam na região cada vez mais em risco.


A América do Sul está novamente em chamas. Uma onda de protestos anti-governamentais devastou as ruas do Equador, Chile, Bolívia e Colômbia nos últimos meses. Esse caos, é claro, não é novo na região. Entre as décadas de 1960 e 1990, grupos terroristas e insurgentes instigaram uma série de cruéis batalhas por procuração da Guerra Fria. Mas nesta iteração, que estou chamando de "Guerra Fria 2.0" na América Latina, não são grupos armados de aliados em jogo, mas tensões sociais já existentes que Moscou está habilmente armando para sabotar estruturas de poder ocidentais na região.

De fato, com ameaças à periferia da Rússia mais assustadoras do que nunca, pode-se argumentar que a Guerra Fria nunca terminou realmente para Moscou. Mas, independentemente das ações atuais da Rússia na América Latina constituírem uma segunda Guerra Fria, ou se elas são apenas um revigoramento da luta original, é aparente que muitos dos mesmos atores estão ativamente envolvidos no desassossego no quintal de Washington - e em grande parte, pelas mesmas razões.

O quadro geral

Os esforços dos EUA para conter a influência da Rússia em suas fronteiras obrigaram Moscou a reafirmar seu peso geopolítico em todo o mundo. Na América Latina, isso pode ser evidenciado pelas tentativas da Rússia de proteger o governo venezuelano do movimento de oposição apoiado pelos EUA, enquanto trabalha para desmantelar mais governos aliados do Ocidente em outros lugares da região.

O legado soviético na América Latina

Soldados cubanos e oficiais soviéticos num terraço de Luanda, capital de Angola, nos anos 80.

Na tentativa de estabelecer uma utopia comunista global, a União Soviética incentivou a exportação de sua revolução para o exterior para "libertar" trabalhadores em todo o mundo. Mas como os Estados Unidos e seus aliados se uniram para conter a expansão comunista, a União Soviética começou a se sentir ameaçada pelas estruturas da aliança que a cercavam, bem como pela presença de tropas e armas dos EUA em sua periferia. Em resposta, os soviéticos abraçaram a Revolução Cubana e tentaram colocar mísseis nucleares em Cuba - uma aposta que acabou levando à Crise dos Mísseis de Cuba. Mas mesmo depois que os soviéticos removeram seus mísseis de Cuba, eles continuaram a usar a ilha como cabeça de praia no Hemisfério Ocidental, para expandir sua influência do Canadá até o Chile - apoiando partidos comunistas nas Américas, ao mesmo tempo em que treinavam, financiavam e armaram uma série de grupos terroristas e insurgentes marxistas em toda a região.

Os esforços de Moscou na América do Sul e Central, em particular, foram em grande parte conduzidos através de seus aliados cubanos endurecidos em batalha, como evidenciado pelo infeliz ataque do revolucionário Ernesto "Che" Guevara à Bolívia no final da década de 1960. Os soviéticos viam essas atividades como uma maneira de não apenas expandir o comunismo mundial, mas também combater os esforços anticomunistas dos EUA em outros lugares. Ao criar problemas no próprio quintal de Washington, as ações soviéticas também ajudaram a distrair os Estados Unidos e seus recursos desses outros esforços. A crescente influência comunista na região envolveu o governo dos EUA em uma série de esforços que envolveram eventos de alto nível, como o golpe de 1954 na Guatemala; a fracassada invasão da Baía dos Porcos, em 1961, em Cuba; o golpe de 1973 no Chile; e apoio aos Contras nicaraguenses nos anos 80.

Atividades atuais da Rússia

Pulando para o presente, no entanto, e a ameaça dos EUA à influência russa apenas se tornou mais aguda. O tampão de segurança periférica que outrora protegeu a Rússia da Europa diminuiu significativamente após o colapso da União Soviética em 1991. Ex-membros do Pacto de Varsóvia, como Bulgária, Polônia, Hungria, República Tcheca, Eslováquia e Romênia, tornaram-se membros da OTAN, tal qual os antigos estados bálticos ocupados pelos soviéticos da Letônia, Estônia e Lituânia.

Medos crescentes de aprisionamento na Rússia finalmente pavimentaram o caminho para a ascensão do presidente Vladimir Putin em 2000. Mas, apesar das promessas de Putin de restaurar o poder passado do país, o tampão estratégico da Rússia continuou machucando. A queda dos líderes pró-russos na Ucrânia após os protestos de Maidan em 2014 e a Revolução Laranja de 2005, em particular, apenas aumentaram o mal-estar russo. Para ajudar a compensar a perda de uma fronteira tão crucial, Putin anexou a Crimeia e invadiu o sudeste da Ucrânia. Mas a Rússia ainda sente, sem dúvida, a dor de ter perdido a profundidade estratégica do Pacto de Varsóvia e do Bloco Soviético que há muito protegia o ventre macio do país.

Guerrilheiros marxistas das FARC, anos 90.

Em vez de armar grupos marxistas com armas, desta vez Moscou está armando manifestantes anti-governamentais com retórica para combater os interesses dos EUA na América Latina.

O domínio das terras fronteiriças está agora obrigando a Rússia a recorrer aos seus velhos truques na América Latina. Isso incluiu, nomeadamente, a sustentação do regime fracassado de Nicolás Maduro na Venezuela no ano passado, com a ajuda dos parceiros cubanos de Moscou. Cuba é um importante parceiro de segurança dos regimes venezuelanos desde que o ex-presidente venezuelano Hugo Chávez chegou ao poder em 1999. A vasta rede de operadores e ativos de inteligência cubanos que se infiltrou na sociedade venezuelana desde então informou o regime de Maduro sobre ameaças em potencial, mantendo a oposição dividida e brigando por trivialidades. Enquanto isso, o apoio financeiro, militar e de inteligência técnica da Rússia - para não mencionar a proteção rigorosa dos prestadores de serviços militares russos ("contractors") - também foi crítico para o regime de Maduro nos últimos anos. Na verdade, eu chegaria ao ponto de dizer que Maduro teria sido deposto há muito tempo, se não fosse pela ajuda da Rússia e de Cuba.

Histórias da Guerra Civil de El Salvador: A batalha pela memória.

Mas as atividades da Rússia e de seus parceiros cubanos na América Latina não se limitam à Venezuela. Em 13 de novembro, autoridades prenderam quatro cubanos na Bolívia por supostamente financiarem protestos contra o governo em apoio ao ex-presidente socialista do país, Evo Morales. Aliado do regime de Maduro, apoiado pela Rússia, Morales foi forçado a procurar refúgio no México após sua vitória em uma eleição aparentemente fraudada, que provocou protestos generalizados. Nas últimas semanas, a Organização dos Estados Americanos (OEA) também acusou Cuba e Venezuela de ajudarem a instigar os protestos anti-governamentais no Equador, Chile e Colômbia. Assim como os soviéticos financiaram os esforços paramilitares cubanos na América Latina durante a primeira Guerra Fria, fica claro que a Rússia ainda está financiando esses esforços, já que Cuba e Venezuela estão com falta aguda de dinheiro e não podem realizar essas operações sozinhos.

Usando a angústia social para obter ganhos políticos

Os soviéticos e russos tiveram ampla experiência no uso de protestos para minar o lugar de seus oponentes ocidentais no poder. Nos Estados Unidos, há evidências da mão de Moscou nos protestos anti-guerra da década de 1960 e nos protestos anti-nucleares da década de 1980, bem como no movimento de fraturamento anti-hidráulico e no Occupy Movement (Movimento de Ocupação) nos anos mais recentes. E, claro, há a intervenção da Rússia no referendo do Brexit de 2016, seguido pelas eleições presidenciais dos EUA no mesmo ano.

A equipe do Exército da Nicarágua nos Jogos Internacionais do Exército Russo de 2015, na base de Alabino, nas cercanias de Moscou. (Evgeny Biyatov/ RIA Novosti)

De fato, ao longo das décadas, a Rússia tornou-se cada vez mais hábil em explorar sentimentos e questões sociais muito reais para alcançar seus próprios objetivos políticos. Em concerto com seus aliados cubanos e venezuelanos, a Rússia se mostrou hábil em ampliar a tensão ao longo de linhas de falha social muito reais nesses países. A Rússia não está simplesmente fabricando questões que sustentam a agitação do nada; ao contrário, está simplesmente fornecendo a "faísca" para acender as queixas econômicas e sociais subjacentes que silenciosamente vêm se formando logo abaixo da superfície nesses países há anos.

A Rússia também agora tem uma vasta experiência usando as mídias sociais para dispersar a desinformação na internet, assim como fez antes da votação do Brexit no Reino Unido e da eleição presidencial dos EUA em 2016. Nos últimos anos, Moscou também desdobrou campanhas de propaganda online semelhantes na Alemanha, Ucrânia e Estados Bálticos. E há sinais de que ela está tentando fazer o mesmo antes das próximas eleições nos EUA em 2020. Assim, podemos esperar que essas ferramentas de desinformação sejam usadas em outros lugares da região para apoiar aliados socialistas e se oporem a governos democráticos e mais orientados para o livre mercado, ou de outra forma aliada com os Estados Unidos.

A equipe do Exército Venezuelano no biatlo de tanques nos Jogos Internacionais do Exército Russo, 2015. (Evgeny Biyatov/ RIA Novosti)

Partes interessadas estrangeiras na mira

Dada a tendência socialista, anarquista e anticapitalista de muitos dos movimentos anti-governamentais, os manifestantes, como era de esperar, já começaram a visar interesses comerciais na região. Mais de 100 lojas pertencentes à subsidiária do Walmart no Chile, por exemplo, foram saqueadas e queimadas em meio a crescentes manifestações anti-capitalistas no país. À medida que os protestos continuam em todo o continente, as empresas dos EUA e da Europa que operam nesses países provavelmente continuarão a ser alvo, incluindo empresas potencialmente de mineração e energia, hotéis, bancos e escritórios de companhias aéreas. As instalações diplomáticas dos EUA e as organizações não-governamentais (ONGs) que operam na região também poderiam ser visadas. Várias empresas e ONGs já retiraram seu pessoal da Bolívia após o recente aviso de viagem do Departamento de Estado dos EUA, que também instou os cidadãos americanos que moram no país a saírem.

Nicolás Maduro e Vladimir Putin em Caracas, 2019.

Dado o imperativo da Rússia de minar a crescente influência dos EUA mais perto de casa, bem como globalmente, Moscou fará tudo o que estiver ao seu alcance para garantir que os protestos continuem em frente à porta de Washington. Portanto, empresas e organizações na América do Sul precisarão acompanhar de perto a dinâmica da agitação na América Latina, à medida que ela evolui e potencialmente aumenta nas próximas semanas. Caso contrário, eles poderão se encontrar em breve no fogo cruzado de outra batalha por procuração de uma Guerra Fria.

Bibliografia recomendada:

A KGB e a Desinformação Soviética: A visão de um agente interno.
Ladislav Bittman.

A Verdade Sufocada: A história que a esquerda não quer que o Brasil conheça.
Coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra.

A Obsessão Antiamericana: Causas e Inconseqüências.
Jean-François Revel.

Estado-maior taiwanês decimado por um acidente de helicóptero


Por Laurent Lagneau, Zone Militaire Opex360, 2 de janeiro de 2020.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 2 de janeiro de 2020.

Em 2 de janeiro, o General Shen Yi-ming, chefe do estado-maior das forças taiwanesas, deveria iniciar uma visita de inspeção antes do Ano Novo Lunar, indo para a base de Dong'ao, localizada no distrito de Yilan [nordeste da ilha]. Infelizmente, seu helicóptero UH-60M Black Hawk, que transportava vários oficiais de alta patente, não chegou ao seu destino.

Tendo decolado pouco antes das 8 horas da base de Songshan, perto de Taipei, a aeronave supostamente tentou um pouso de emergência alguns minutos depois, enquanto sobrevoava uma área montanhosa na região de Pinglin.

Equipes de resgate chegaram ao local e conseguiram libertar cinco sobreviventes dos destroços do Black Hawk. Mas o acidente matou 8 pessoas, incluindo os generais Shen Yi-ming, Yu Chin-wen [chefe do Departamento de Guerra Política] e Hung Hung-chun [chefe de inteligência militar].

O General Shen assumiu o cargo de chefe de gabinete das forças taiwanesas em julho de 2019, depois de assumir o comando da RoCAF (Força Aérea da República da China).

"Hoje é um dia triste. Vários excelentes generais e soldados de nossas forças armadas morreram neste acidente. […] O chefe de estado-maior Shen Yi-ming era um general excepcional e competente, e um líder amado por todos. Seu desaparecimento nos deixa imensamente tristes”, disse Tsai Ing-wen, presidente de Taiwan. "Meus pêsames mais profundos vão para os soldados excepcionais que desapareceram hoje neste acidente, bem como para suas famílias", acrescentou. E garantir que as autoridades taiwanesas “façam de tudo [...] para ajudar suas famílias neste momento de luto e para determinar as causas do acidente."

O acidente ocorreu enquanto a China exerce uma pressão militar e diplomática crescente sobre Taiwan, considerada uma província rebelde.

Além disso, para seu primeiro desdobramento após sua entrada em serviço, o CNS Shandong, o novo porta-aviões chinês, navegou para o Estreito de Taiwan do sul para o norte, com sua escolta, em 26 de dezembro, alguns dias da eleição presidencial de Taiwan.

"É responsabilidade e dever das duas margens do estreito manter a paz e a estabilidade e trabalhar pelo bem-estar das populações", reagiu então Taipei. E uma alta autoridade da ilha disse que era uma "manobra de intimidação" que visa "os eleitores de Taiwan ainda indecisos."

É por isso que as Forças Especiais do Irã ainda usam boinas verdes


Por Eric SOF, Spec Ops Magazine, 9 de setembro de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 3 de janeiro de 2020.

Ao olhar para a 65ª Brigada de Forças Especiais Aerotransportadas do Irã, você pode notar algumas semelhanças impressionantes - as divisas amarelas dos graduados parecem muito com as divisas amarelas do antigo uniforme verde do Exército, por exemplo. Antes da Revolução Iraniana, as insígnias de suas unidades pareciam muito com o brasão De Oppresso Liber, que simboliza as Forças Especiais do Exército dos Estados Unidos.

A boina verde distintiva usada pelos iranianos pode não ter a mesma tonalidade de verde usada pelas Forças Especiais do Exército dos EUA de hoje, mas os operadores especiais iranianos vestem verde por um motivo - eles foram treinados pelos americanos.

Boinas verdes americanos no Irã do Xá


Na década de 1960, os Estados Unidos enviaram ao Irã quatro destacamentos operacionais de operadores das Forças Especiais do Exército para treinar as forças militares imperiais do Xá. As Equipes de Treinamento Móvel (Mobile Training Teams) passaram dois anos como Grupo Consultivo de Assistência Militar no Irã (Military Assistance Advisory Group Iran). Antes que eles pudessem chegar ao Irã, os soldados tiveram que passar no curso de Oficial de Forças Especiais (Special Forces Officer) em Fort Bragg, e então aprenderem farsi no Instituto de Idiomas de Defesa (Defense Language Institute) de Monterey, na Califórnia. Só então eles seriam enviados ao Irã para treinar as Forças Especiais Iranianas.

Faz muito tempo que a 65ª foi parte das Forças Especiais Imperiais Iranianas. Agora chamada 65ª Brigada NOHED (que é apenas um acrônimo farsi para "forças especiais aerotransportadas"), a missão da unidade é muito semelhante àquelas para as quais as Forças Especiais dos EUA os treinaram na década de 1960. Eles realizam resgate de reféns, operações psicológicas, guerra irregular e treinam para missões de combate ao terrorismo dentro e fora da República Islâmica.

Brevê iraniano ao lado do americano.

Dentro das forças armadas iranianas, a unidade é conhecida como "fantasmas poderosos". O apelido deriva de uma missão dada à 65ª em meados dos anos 90. Eles foram encarregados de tomar edifícios em torno de Teerã das forças armadas regulares - e conseguiram fazê-lo em menos de duas horas.

Desde o seu confronto inicial com as Forças Especiais dos EUA, a 65ª Brigada de Forças Especiais Aerotransportadas do Irã sobreviveu à Revolução Iraniana de 1979, então eles sobreviveram à brutal Guerra Irã-Iraque na década de 1980, e agora aconselham o Corpo da Guarda Revolucionária Iraniana enquanto lutam pelo regime de Assad dominado pelo Irã na Síria contra uma rebelião fraturada.

Membros do NOHED operando uma metralhadora nas terras altas do Curdistão iraniano durante a Guerra Irã-Iraque dos anos 80. (Foto: Wiki)

O legado do treinamento duro, mas completo, com os boinas verdes americanos continua no Irã. O treinamento atual inclui resistência e sobrevivência em guerra no deserto, na selva e nas montanhas, entre outras escolas, como o treinamento de pára-quedas e queda livre, assim como seus antigos aliados americanos ensinaram há muito tempo.

Nota do Tradutor: Em 1953, 10 oficiais do Exército Imperial Iraniano foram enviados à França para treinamento paraquedista. Retornando ao Irã, eles estabeleceram a Unidade Paraquedista (واحد چتربازی) em 1955, que evoluiu para o Batalhão Paraquedista (گردان چتربازی) em 1959. Por essa razão, a boina iraniana é usada “à francesa”, tal qual no Brasil, com o distintivo no lado direito.