sexta-feira, 6 de novembro de 2020

Exército indiano comprará mais 72.000 fuzis de assalto SIG 716 dos EUA


Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 5 de novembro de 2020.

A Índia havia adquirido o lote anterior dos fuzis sob o programa de aquisição acelerada (FTP), mais um dos programas de compras de emergência indianos.

Em meio à disputa em andamento com a China sobre a questão da fronteira, o Exército Indiano vai fazer outra encomenda de 72.000 fuzis de assalto SIG 716 dos Estados Unidos. A encomenda do segundo lote de fuzis viria depois do primeiro lote de 72 mil fuzis, já entregue ao Exército para uso pelas tropas do Comando Norte e outras áreas operacionais.

"Vamos fazer um pedido de mais 72.000 desses fuzis sob os poderes financeiros concedidos às Forças Armadas", disseram fontes do Ministério da Defesa indiano à agência de notícias ANI.

O SIG 716 G2 Patrol é um fuzil de assalto aprimorado com cano de 16 polegadas, guarda-mão M-LOK e coronha telescópica de 6 posições. As armas estão sendo fornecidas ao Exército Indiano pelas instalações da SIG Sauer em New Hampsire, EUA. O modelo G2 Patrol é calibrado em 7,62x51 mm OTAN.

Soldados indianos no estande com os novos fuzis SIG 716 G2 Patrol.

O Exército Indiano recebeu o primeiro lote de fuzis de assalto SIG Sauer para impulsionar suas operações de contraterrorismo. A Índia havia adquirido os fuzis sob o programa de aquisição acelerada (fast-track procurement, FTP). Os novos fuzis substituirão os fuzis existentes do Sistema de Armas Leves (Indian Small Arms System, INSAS) da Índia, calibrados em 5,56x45mm, e usados pelas forças indianas e fabricados localmente pelo Ordnance Factories Board.

De acordo com o plano, os 144.000 fuzis importados devem ser usados pelas tropas nas operações de contra-terrorismo e nas funções de linha de frente na Linha de Controle (Line of Control, LoC), as forças restantes seriam supridos com os fuzis AK-203, os quais serão produzidos em conjunto pela Índia e pela Rússia na fábrica de munições Amethi. O trabalho no projeto ainda não começou devido a vários problemas processuais enfrentados pelas duas partes.

Indian Small Arms System (INSAS).

O Exército Indiano  vem tentando substituir seus fuzis INSAS por muitos anos, mas as tentativas falharam devido a uma multitude de problemas, geralmente baixo controle de qualidade na produção indiana e falta de recursos para importações.

O Exército Indiano desejava inicialmente 800 mil fuzis, reduzindo a encomenda para 250 mil fuzis em 2018 - apenas um terço de sua necessidade total - devido a restrições orçamentárias e à necessidade de acelerar as entregas. Com forças armadas contando 1,3 milhão de militares, a encomenda de 800 mil fuzis teria custado US$ 2,5 bilhões. Recentemente, o Ministério da Defesa fez um pedido de 16.000 metralhadoras leves Negev de Israel para mitigar a escassez dessas armas, um problema que já se arrasta por um bom tempo.

Índia e China estão em uma posição de impasse no leste de Ladakh, já que o exército chinês (PLA) desdobrou mais de 20.000 soldados na região desde a primeira semana de maio, gerando tensão e choques entre os dois países.

Fuzis "Made in India"

Soldados indianos com fuzis AK-47 romenos em Srinagar.

Em 2017, o Exército Indiano rejeitou os fuzis de assalto Trichy 7,62x39 mm, uma cópia da família AK e produzido localmente, que deveriam substituir os fuzis AK-47 e INSAS. As autoridades disseram que as armas eram de baixa qualidade e apresentavam várias falhas e travamentos, além de um poder de fogo ineficaz.

Este foi o segundo ano consecutivo em que o Exército rejeita um armamento fabricado na Índia. Em 2016, as forças armadas recusaram o uso de armas Excalibur 5,56 mm fabricadas localmente - outra variedade de fuzis de assalto - depois de não cumprirem os padrões exigidos.
Fuzil de assalto Trichy 7,62x39mm.

As armas, construídas pela Fábrica de Fuzis de Ishapore foram rejeitadas pelo Exército depois que falharam miseravelmente nos testes de tiro em julho de 2017. Havia um “número excessivo de falhas” nas armas e foi necessário um “redesenho completo do carregador” para considerá-las seguras para uso pelo Exército, disseram as autoridades. O Exército também observou “flashes e assinatura sonora excessivos” nos fuzis durante os testes. As autoridades disseram que os fuzis apresentavam várias falhas e travamentos que chegaram a mais de 20 vezes o padrão máximo permitido.

O Conselho de Fábricas de Munição (Ordnance Factory Board, OFB), um monopólio da indústria indiana sob o DRDO (Defence Research and Development Organisation, Organização de Pesquisa e Desenvolvimento de Defesa),  vem produzindo armas leves de baixa qualidade há décadas; e mesmo se mostrando incapaz de suprir a demanda de munição. Isto forçou o ministério da defesa indiano a realizar compras de emergência de fuzis e munições de fabricante estrangeiros, onerando sobremaneira o orçamento da defesa.

A adoção do INSAS em 1990 foi uma decisão problemática e, longe de solucionar a padronização indiana, apenas aumentou a diversidade de material (aumentando a dor de cabeça dos intendentes). Ainda usando os obsoletos fuzis Lee-Enfield ferrolhados quase até o século XXI, a Índia teve que adquirir 100.000 fuzis AKM de 7,62x39 mm da Rússia, Hungria, Romênia e Israel de 1990 a 1992 como compras de emergência enquanto a produção local tropeçava, e as entregas dos novos fuzis INSAS apenas começaram em 1997.

INSAS.

O batismo de fogo do INSAS na Guerra de Kargil (1999) não apresentou bons resultados. Os fuzis foram usados nas altas elevações do Himalaia e houve reclamações de engripamento, carregadores rachando devido ao frio e o fuzil entrando no modo automático quando colocado no modo de rajadas de três tiros. Havia também um problema de óleo espirrando no olho do operador. Também foram relatados alguns feridos durante treinamentos de tiro. Uma nova versão foi adotada em 2001 mas pouca coisa mudou.

Segundo o livro Military Industry and Regional Defense Policy: India, Iraq and Israel, de Timothy D. Hoyt (2006):

"No início dos anos 80, o DRDO assumiu o compromisso de desenvolver uma nova série de armas portáteis de 5,56 mm para as forças armadas indianas chamada INSAS. Tanto a Heckler & Koch da Alemanha quanto a Steyr da Áustria se ofereceram para suprir as necessidades imediatas da Índia e transferir tecnologia no valor de US$ 4,5 milhões gratuitamente. Essas ofertas foram recusadas e o DRDO passou a década seguinte, e aproximadamente 2 bilhões (cerca de US$ 100 milhões em 1990), reinventando uma família de armas portáteis baseada fortemente nas tecnologias Steyr e H&K. Enquanto isso, a Índia importou fuzis AK-47 de antigos países do Pacto de Varsóvia para atender aos requisitos. O INSAS finalmente entrou em serviço no final dos anos 90."

No mesmo período, a polícia e demais forças paramilitares indianas compraram 100 mil fuzis AK búlgaros (vários modelos AR-M). Um AK-47 búlgaro com seu distinto acabamento de plástico preto custava apenas 22.000 rúpias indianas em 2011. Isto era significativamente mais barato do que o AK russo feito em Izhmash e 5.000 rúpias a menos do que o fuzil INSAS. O fabricante búlgaro Arsenal executava três turnos por dia para atender à encomenda de emergência indiana.

Em novembro de 2014, o CRPF solicitou a retirada do INSAS como seu fuzil padrão devido a problemas de confiabilidade. O diretor-geral da CRPF, Dilip Trivedi, disse que o INSAS emperrava com mais frequência em comparação ao AK-47 e o X-95; com a substituição ocorrendo em abril de 2015. No início de 2017, foi anunciado que os fuzis INSAS seriam retirados de serviço e substituídos por fuzis calibrados em 7,62x51 mm OTAN.

Comando policial Pradesh com um AK-47 búlgaro.

O Exército Indiano ainda conta com um estoque de 450 mil fuzis AK de várias procedências. Aquisições de modernos fuzis bullpup também foram feitas com modelos Steyr AUG, Tavor TAR-21 e FN F2000. Tentativas de produzir o TAR-21 localmente foram anunciadas em 2016, com a IMI declarando que estava estabelecendo uma joint venture 49:51 com o Punj Lloyd para fabricar componentes de fuzis na Índia.

O SIG 716 na Índia

Soldados indianos armados com os fuzis SIG 716 em exercício conjunto com os franceses.

O novo fuzil de projeto alemão e fabricação americana é conhecido por sua qualidade e uma boa aquisição apesar dos problemas de aquisições de emergência originadas pelo mau planejamento indiano. Devido à urgência a compra foi "da prateleira" e teve que abandonar a iniciativa "Make in India" de fabricação local, enquanto evita a maldição tradicional de compras gradativas e "tapa buraco" provisórias do passado.

Com o primeiro lote de 10.000 fuzis SIG 716 entregue ao Comando Norte do Exército Indiano dezembro de 2019, seguido pelo segundo lote encomendado em julho de 2020 mas acelerados em setembro devido às tensões com a China, o novo fuzil é um excelente substituto ao problemático INSAS.

“A importância global deste contrato para a SIG Sauer é de longo alcance com base no tamanho, localização e força econômica da Índia no mercado global”, disse Ron Cohen, presidente e CEO da SIG Sauer, Inc. “Estamos muito orgulhosos, e honrados que o SIG 716 foi escolhido para uso pelas forças de combate do Exército Indiano, e estamos ansiosos para desenvolver uma forte parceria com o Ministério da Defesa da Índia.”

“Esta foi a primeira grande aquisição de armas de fogo do governo indiano em décadas, e a missão explícita para esta licitação era modernizar os soldados de infantaria do Exército Indiano com o melhor fuzil disponível”, disse Cohen em fevereiro passado. “Concorremos em um concurso público com fabricantes de armas portáteis de todo o mundo. O fuzil SIG 716 passou por um processo abrangente e exaustivo de testes e avaliação, onde superou a concorrência e foi escolhido por atender a todos os critérios, como o melhor fuzil para modernizar o Exército Indiano.”

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