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sábado, 21 de maio de 2022

Uma teoria econômica da guerra: o exemplo sírio além da religião e da etnia


Por Hippolyte Boucher, The Tseconomist, 5 de dezembro de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 21 de maio de 2022.

Quando olhamos para o Oriente Médio hoje, pensamos diretamente em conflitos inter-religiosos, inter-étnicos e politicamente motivados desencadeados por algum evento. Tomemos, por exemplo, a guerra civil síria e as primeiras manifestações da primavera árabe lá, que aconteceram na cidade de Daraa.


Isso levanta a questão: podemos criar uma teoria geral da guerra que funcione para todos os conflitos, em vez de pensar na guerra como uma série de circunstâncias individuais? Por um lado, o jornalismo tende a apresentar a guerra como uma única linha do tempo dentro de um contexto, implicando que existem relações causais diretas entre os eventos. Por outro lado, historiadores e cientistas políticos apresentaram diferentes teorias unificadoras da guerra: poderia ser parte de um processo de barganha entre Estados ou facções dentro de um Estado (modelo de "Barganha", James D. Fearon); guerras podem ocorrer simplesmente porque ninguém pode detê-las (teoria da “Anarquia”, Kenneth Waltz); outros pesquisadores apresentam as guerras como eventos únicos que não podem realmente ser teorizados e dependem da cultura dos beligerantes (Why Wars Happen, Jeremy Black). Este é realmente um refinamento claro da abordagem do jornalista.

Recentemente, tem havido uma tendência interessante entre os teóricos da guerra e da guerra civil de usar funções de utilidade, colaborando cada vez mais com economistas para criar micromodelos estilizados. Eles usam problemas de utilidade esperada, informação e comprometimento, como seleção adversa, risco moral e teoria da barganha. Essa abordagem é muito elegante, mas também é bastante difícil de testar. Como devemos, como jovens economistas, teorizar a guerra? Podemos validar essa teoria usando o conflito sírio?

O objetivo de um belicista

Síria: composição étnica.

Tomando uma perspectiva de economia de guerra moderna, deve ser que o iniciador de uma guerra tenha um interesse econômico, político ou social em iniciá-la, e que o outro protagonista se beneficie de revidar. Ambos também devem recompensar seus apoiadores, ou pelo menos poupá-los de uma perda muito alta. Na realidade, as guerras não são apenas extremamente caras em termos de vida humana e liquidez, mas também em termos de infraestrutura, capital humano, comércio e reputação internacional. No entanto, as guerras ainda acontecem.

A partir do relatório do Banco Mundial de 2017, The toll of war, the economic and social consequences of the conflict in Syria, World Bank (O preço da guerra, as consequências econômicas e sociais do conflito na Síria, Banco Mundial), sobre as consequências do conflito sírio, sabemos que um terço do total de edifícios residenciais da Síria foi destruído, que metade da sua população foi deslocada e que cerca de 450.000 pessoas foram mortas. Mais importante ainda, o PIB nominal da Síria contraiu 61% desde 2011.


Suponhamos que os agentes ou facções que participam da guerra sejam racionais. Então, para que uma guerra comece, deve ser que um dos protagonistas espere pelo menos algum benefício a longo prazo dela. Essa suposição de racionalidade é muito plausível porque começar uma guerra não é uma decisão de um homem só, mesmo nos regimes mais despóticos. Aqui, o importante é que as expectativas dos agentes que entram na guerra são positivas, mas também se baseiam apenas nas informações de que dispõem. Esta informação obviamente não é perfeita e muitas vezes é muito otimista. Isso explica por que países e facções iniciam guerras que não podem vencer, ou guerras que os deixam em pior situação a longo prazo.

Tomemos, por exemplo, a invasão do Kuwait por Saddam Hussein em agosto de 1990 e a conseqüente operação Tempestade do Deserto em janeiro de 1991: depois de dois conflitos com o Irã, as finanças do Iraque estavam esgotadas, então Saddam decidiu invadir o Kuwait para reivindicar suas vastas reservas de petróleo e levantar o ânimo dos iraquianos para proteger seu regime. Ele subestimou completamente a probabilidade de uma intervenção apoiada pelas Nações Unidas contra ele. A invasão destruiu a reputação do Iraque e levou a enormes perdas militares. É considerada a principal razão pela qual Saddam perdeu o poder nos anos seguintes, o que acabou levando à sua eliminação em 2003.

Os fatores por trás do conflito: recursos, informação e queixas


As facções se envolvem em uma guerra porque, com base em suas informações atuais, podem obter algo a longo prazo. O tamanho do exército e o poder de fogo são fatores importantes que entram em jogo nessas decisões. Se uma facção não tem como derrotar outra, ela pode não se rebelar, iniciar uma insurgência ou um conflito de baixa intensidade. Este é o caso do Talibã no Afeganistão, do ISIS na Síria e no Iraque, agora que seu exército permanente foi mais ou menos derrotado. Quanto aos outros fatores, há grandes diferenças de opinião entre os economistas de guerra. Paul Collier é famoso por defender um modelo de ganância em oposição a um modelo de queixa. Ele argumenta que, em última análise, qualquer grupo que se envolva em guerras é motivado por duas variáveis econômicas principais, sendo a primeira a presença de recursos naturais em uma região específica: esses recursos são vitais e ao mesmo tempo indivisíveis, pois apenas um grupo pode controlá-los. A segunda é a marginalização econômica, ou mais precisamente, perdas econômicas percebidas e falta de oportunidades.

Novamente, tomemos a Síria como exemplo. As cidades dominadas pelos alauítas, que estão principalmente na parte ocidental do país, desenvolveram-se consideravelmente em comparação com o leste, apesar de muitos campos de petróleo e depósitos de gás estarem localizados lá. Outra grande questão é a água: o Tigre e o Eufrates nascem na Turquia e são vitais para as áreas menos desenvolvidas da Síria, localizadas a jusante. Isso também é verdade para o Iraque, que fica ainda mais a jusante. A montante, no entanto, é controlada pela Turquia e pelo regime de Assad, que construiu barragens e bombeou a maior parte da água para si. Por último, mas não menos importante, a população da Síria passou de 3 milhões em 1950 para 22,5 milhões em 2011, com seus jovens (com menos de 25 anos) representando 56% de sua população total. Um terço dos jovens sírios em idade ativa está desempregado, e esse número é ainda maior para os altamente qualificados. Deste ponto de vista, o conflito sírio não parece ser causado por diferenças ideológicas ou ódio racial e religioso entre curdos e árabes, ou sunitas e alauítas, mas principalmente pela extrema marginalização econômica e desigualdade entre as regiões dominadas pelos alauítas e o resto, e entre os velhos e os jovens.


A teoria de Collier é muito útil e foi testada com sucesso usando a insurgência do Talibã desde 2001 ou a guerra civil do Sri Lanka de 1983 a 2009. No entanto, essa teoria pode ser muito simples. David Keen, um de seus oponentes mais ferrenhos, acredita que para modelar um conflito, líderes e apoiadores devem ter utilidades diferentes e que a ganância e as queixas podem ser combinadas e se alimentarem mutuamente. Ele pega o caso da segunda guerra civil do Sudão (1983-2005) e argumenta que os líderes do Norte provocaram o ressentimento e o ódio das milícias árabes para que cometessem crimes no Sul e, no final, o despovoassem. Essas exações ocorreram precisamente na atual fronteira entre o Norte e o Sul do Sudão, onde estão localizados todos os campos de petróleo do Sudão. Assim, os interesses dos líderes eram tanto ideológicos quanto práticos, demonstrados por atacar o Sul cristão e pagão e controlar importantes recursos naturais, respectivamente. Quanto às milícias, elas fizeram mais do que compartilhar a ideologia de seus líderes. É por isso que eles foram capazes de cometer atrocidades que a privação econômica nunca poderia desculpar. Da mesma forma, o uso sistemático de estupro e tortura por milícias islâmicas (sunitas e xiitas) no conflito iraquiano-sírio não pode ser motivado apenas pela ganância.

Apesar de ser um campo jovem, a economia de guerra, assim como a economia política ou de identidade, está se mostrando muito útil porque suas teorias podem ser testadas. É tão útil que outras ciências sociais estão copiando seus métodos e modelos. Esta não é apenas uma tendência: em todos os tipos de ciências sociais, a economia está desempenhando um papel cada vez mais importante. Na minha opinião, está se tornando a ciência social quantitativa padrão porque coloca tanta ênfase no lado empírico quanto na teoria, e porque as teorias são testadas. Não é mais aceito em economia “falar por falar” e projetar uma boa teoria sem “testar na prática” provando ou refutando seriamente com a ajuda de dados.

Leitura recomendada:

Israel tenta derrubar seu próprio drone por engano

Um drone militar israelense em 8 de junho de 2018.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 21 de maio de 2022.

As sirenes soaram na Alta Galiléia, perto da fronteira libanesa, com moradores correndo para abrigos. Israel lançou seus foguetes de defesa apenas para descobrir que estava atirando em seu próprio drone, conforme revelou o exército israelense dois dias atrás, em 19 de maio desse ano.

"Devido a um erro de identificação, a Matriz de Defesa Aérea das FDI lançou interceptadores que causaram os alarmes ouvidos no norte de Israel", disse o Exército israelense em comunicado. Isso ocorre dias depois que um drone do Hezbollah foi abatido enquanto viajava do Líbano para Israel. A Matriz de Defesa Aérea mencionada é o famoso Domo de Ferro, o sistema de defesa anti-mísseis de Israel.
O Líbano e Israel estão tecnicamente em estado de guerra, e Israel lançou uma guerra devastadora contra seu vizinho do norte em 2006, matando 1.200 pessoas - entre civis e terroristas - durante um período de 34 dias. A confrontação terminou com um cessar-fogo mediado pela ONU. No mês passado, um foguete disparado contra o norte de Israel partindo do Líbano caiu em uma área aberta perto do Kibutz Matzuva, perto da fronteira, sem causar danos ou ferimentos. Em resposta, os militares israelenses bombardearam alvos no Líbano com dezenas de obuses de artilharia, e o porta-voz das FDI, Ran Kochav, disse que facções palestinas no Líbano são consideradas responsáveis.

Houve vários casos de lançamento de foguetes do Líbano para Israel nos últimos anos, com a maioria atribuída a facções palestinas no país, não ao grupo terrorista libanês Hezbollah. No entanto, é improvável que terroristas no sul do Líbano consigam disparar foguetes sem pelo menos a aprovação tácita do grupo terrorista apoiado pelo Irã, que mantém um controle rígido sobre a área.

Um posto militar das FDI na fronteira entre Israel e Líbano, 20 de julho de 2021.

Bibliografia recomendada:

quinta-feira, 5 de maio de 2022

As ruínas da cidade síria de Homs

Destruição: Esta vista aérea mostra a destruição no bairro de al-Khalidiyah, em Homs, que viu alguns dos combates mais pesados enquanto as forças do governo tentam expulsar os rebeldes.

Nota do Warfare: As atuais cenas horripilantes de destruição vistas nas cidades ucranianas são um lembrete ao confortável ocidente dos resultados destrutivos do combate de alto poder de fogo. O mesmo padrão de destruição ocorrido na Ucrânia foi realizado primeiro na Síria, conforme a doutrina russa de poder de fogo massivo.

As guerras modernas serão travadas em cidades, onde as pessoas vivem e trabalham, e a recente invasão russa à Ucrânia relembrou o público de que este tipo de ocorrência é possível até mesmo na sofisticada Europa. A geração atual do Ocidente está há 3 gerações separada de uma guerra "próxima de casa", desde que os alemães se renderam em 8 de maio de 1945. Guerras de repente tornaram-se ocorrências estranhas, provenientes apenas de sociedades incivilizadas e atrasadas, que carecem da sofisticação da internet e do voto democrático.


Por Matt Blake, Daily Mail, 29 de julho de 2013.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 5 de maio de 2022.

Terra arrasada: imagens aéreas horripilantes mostram a escala total da destruição da cidade síria de Homs.

Forças sírias dizem ter capturado o distrito de Khaldiyeh, em Homs, um reduto rebelde desde o início da guerra, mas o Observatório Sírio para os Direitos Humanos diz que ainda há combates dispersos nas áreas do sul do bairro. A TV síria transmitiu imagens de tropas perambulando por ruas desertas e agitando bandeiras em frente a prédios marcados por bombas.

Destruído: Os sons de tráfego intenso, mercados movimentados e crianças brincando nas ruas foram substituídos pelo rugido de jatos de combate, bombas explodindo e tiros.

Casa após casa, quarteirão após quarteirão, é uma cena da mais terrível devastação. Nenhum edifício escapou do ataque de incontáveis morteiros, bombas e balas na selvagem guerra civil da Síria. Os únicos sinais de vida em Homs são ervas daninhas fora de controle. A terceira maior cidade da Síria – e lar de 650.000 pessoas antes de dezenas de milhares fugirem ou serem mortas – agora parece ter sido lançada de volta à Idade da Pedra.

A imagem mostra o distrito estratégico de Khalidiya, na cidade, que as tropas leais ao presidente Bashar al-Assad acabaram de retomar após semanas de combates ferozes com os rebeldes. A contra-ofensiva, que também viu o governo obter ganhos em torno da capital Damasco, foi apoiada por guerrilheiros libaneses do Hezbollah. Pelo menos 100.000 pessoas foram mortas no conflito sírio, que começou com protestos pacíficos contra o governo de Assad em março de 2011. Quase dois milhões de refugiados fugiram.

Cascas de casas: A Mesquita Khaled bin Walid está marcada e marcada por estilhaços cuspidos na cidade pelas explosões diárias que atingem a cidade. Além da mesquita, as conchas de prédios e casas dão à cidade a aparência de um deserto pós-apocalíptico.

Trágico: A outrora gloriosa Mesquita Khalid Ibn al-Walid, no fortemente disputado bairro norte de Khaldiyeh, Homs, está em ruínas após ser atingida por bombas durante o longo bombardeio da cidade.

Machucada e batida: Do lado de fora, a Mesquita Khalid Ibn al-Walid não parece muito melhor.

Tropas do governo lançaram uma ofensiva abrangente para retomar áreas controladas por rebeldes de Homs, a terceira maior cidade da Síria, há um mês. Mesmo que pequenos bolsões de resistência permaneçam, a queda de Khaldiyeh para as tropas do regime parecia uma conclusão inevitável, e sua captura seria o segundo grande revés para os rebeldes na Síria central em poucos meses.

No início de junho, as forças do regime capturaram a cidade estratégica de Qusair, na província de Homs, perto da fronteira com o Líbano. As tropas também capturaram a cidade de Talkalakh, outra cidade fronteiriça da província. A província de Homs é a maior da Síria e vai da fronteira libanesa no oeste até a fronteira com o Iraque e a Jordânia no leste. A cidade de Homs tem valor estratégico porque serve como uma encruzilhada: a estrada principal de Damasco ao norte, bem como a região costeira, que é um reduto da seita alauíta do presidente Bashar Assad, passa por Homs. Khaldiyeh tinha uma população de cerca de 80.000 habitantes, mas apenas cerca de 2.000 permanecem lá hoje, pois os moradores fugiram da violência, dizem ativistas. Os fortes combates nos últimos dois anos causaram grandes danos, com alguns edifícios reduzidos a escombros.


Em uma reportagem na segunda-feira, a TV estatal síria disse que "o exército sírio restaurou a segurança e a estabilidade em todo o bairro de Khaldiyeh em Homs". Um repórter de TV sírio incorporado com tropas na área deu uma reportagem ao vivo em frente a prédios danificados. Ele entrevistou um oficial do exército que disse que as tropas travaram uma dura batalha contra os rebeldes que mineravam prédios e lutavam em túneis subterrâneos. "A partir desta manhã, nossas forças armadas em cooperação com as Forças de Defesa Nacional (paramilitares pró-governo) assumiram o controle de Khaldiyeh e agora estão limpando o bairro", disse o oficial, cercado por cerca de uma dúzia de soldados e agentes de segurança à paisana.

"O destino dos terroristas estará sob nossos pés", disse ele, afirmando que todos os Homs serão em breve "limpos" de rebeldes. O Observatório disse que as tropas são apoiadas por membros do grupo libanês Hezbollah. O Hezbollah, que não reconheceu se seus membros estão lutando em Khaldiyeh, desempenhou um papel importante em uma batalha no mês passado em Qusair, nos arredores de Homs, e perdeu dezenas de homens lá.

Cidade fantasma: Muitas das estradas em Homs estão completamente vazias, dando a esta cidade outrora grande a aparência de uma cidade fantasma, habitada apenas por milhares de almas que morreram aqui.

Comovente: Uma cadeira vazia entre as conchas dos edifícios é um lembrete assustador da vida que costumava encher as ruas de Homs. Eles agora estão vazios e desolados.

Sem trégua: jovens sírios inspecionam o local da explosão de um carro-bomba em uma rotatória nos arredores de Homs.

O diretor do Observatório, Rami Abdul-Rahman, disse que as tropas do governo capturaram a maior parte do bairro, além de alguns combates em suas áreas ao sul. Outro ativista da oposição, que falou sob condição de anonimato devido à sensibilidade do assunto, disse que a batalha em Khaldiyeh "está quase no fim". Ele reconheceu que as tropas estão quase no controle total da área.

Na cidade de Aleppo, no norte, várias facções rebeldes, incluindo a Jabhat al-Nusra, ou Frente Nusra, ligada à Al Qaeda, atacaram postos do exército em dois bairros em uma ofensiva intitulada "amputação de infiéis", disse o Observatório. Ele disse que os rebeldes capturaram vários prédios nos bairros de Dahret Abed Rabbo e Lairamoun, e que oito soldados do governo foram mortos.

Fogo e fumaça: Fumaça e chamas elevam-se no bairro Khalidiyah de Homs após um ataque das forças sírias.
Ainda lutando: soldados sírios disparam suas armas enquanto os combates continuam a ocorrer em bolsões da cidade.

Rodando pelos escombros:
Um tanque do governo patrulha o bairro sob uma mortalha de fumaça.

Os rebeldes estiveram na ofensiva na província de Aleppo e capturaram na semana passada a cidade estratégica de Khan el-Assal. Ativistas e a mídia estatal disseram que dezenas de soldados foram mortos ali após sua captura. O Conselho Nacional Sírio, apoiado pelo Ocidente, condenou os assassinatos.

Na região sul de Quneitra, à beira das Colinas de Golã ocupadas por Israel, tropas do governo capturaram a cidade de Mashara na noite de domingo após intensos combates, disse o Observatório.

Vitória? Soldados sírios posam para uma foto segurando a bandeira síria no bairro de al-Khalidiya, que eles afirmam ter tomado.

sábado, 2 de abril de 2022

FOTO: Treinamento iraquiano com o tanque T-55

Tanque de batalha principal T-55 iraquiano durante um exercício no Campo de Taji, no Iraque, 24 de janeiro de 2007.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 2 de abril de 2022.

Soldados iraquianos do 3º Batalhão, da 3ª Brigada, da 9ª Divisão do Exército Iraquiano, muitos dos quais são recém-formados em treinamento básico, praticam a evacuação da tripulação e exercícios de rolagem durante a parte de condução de tanques de um exercício em Campo de Taji, no centro do Iraque, em 24 de janeiro de 2007.

Em 1958, o Iraque encomendou 250 carros T-54 da União Soviética, que foram entregues entre 1959 e 1965. Mais 50 T-54 foram encomendados em 1967 da União Soviética e entregues em 1968. O Iraque enviou uma força expedicionária com 700 tanques T-54 para enfrentar Israel na frente síria na Guerra do Yom Kippur, perdendo entre 80 e 120 T-54 em ação. Após a guerra, 300 T-55 foram encomendados em 1973 da União Soviética e entregues entre 1974 e 1975. Em 1980, 50 T-54 e T-55 foram encomendados da Alemanha Oriental; os veículos estavam anteriormente em serviço na Alemanha Oriental e foram entregues no ano seguinte. Mais 400 T-54/55 foram encomendados em 1980 da Polônia e entregues entre 1981 e 1982 (os veículos provavelmente estavam anteriormente em serviço polonês). 250 T-55 foram encomendados em 1981 do Egito e entregues entre 1981 e 1983, tendo sido retirados do serviço egípcio. Mais 150 TR-580 (versão romena do T-55) foram encomendados em 1981 da Romênia e entregues entre 1981 e 1984 (os veículos foram entregues via Egito). Outros 400 T-55 foram encomendados em 1981 da União Soviética e entregues entre 1982 e 1985; os veículos eram da linha de produção da Checoslováquia. Cerca de 200 T-54/55 foram atualizados para o padrão T-72Z.

O Iraque também adquiriu 250-1300 Tipo 59 entregues pela China de 1982 a 1987 e cerca de 1500 Tipos 69-I e 69-II entregues de 1983 a 1987.

1.500 T-54, T-55 e TR-580 estavam em serviço com o Exército Iraquiano em 1990 e 500 em 1995, 2000 e 2002. 406 T-54/55 estavam em serviço com o Exército Iraquiano em 2003, todos sendo destruídos ou sucateados, exceto por 4 T-55 que agora estão em serviço com o Novo Exército Iraquiano. Veículos foram recuperados e 76 T-55 estavam em serviço com o Novo Exército Iraquiano em 2004. Em 2005, 4 VT-55A foram encomendados da Hungria e entregues no mesmo ano como ajuda; os veículos estavam anteriormente em serviço húngaro. O Iraque também recebeu 2 JVBT-55A da Hungria em 2005.

O Exército Iraquiano adquiriu tanques M1A1 Abrams e T-90 nos últimos anos, mas o velho T-55 ainda é bastante numeroso na região, servindo em segunda linha. Muitos exemplares foram capturados pelo Estado Islâmico em 2014, e ainda se encontram em uso nas batalhas que ocorrem pelo Oriente Médio.

Bibliografia recomendada:

Soviet T-55 Main Battle Tank.
James Kinnear e Stephen L. Sewell.

Leitura recomendada:

sexta-feira, 25 de março de 2022

FOTO: A Filha do General

Formandos de um curso de oficiais da Força de Defesa de Israel, 1º de agosto de 1957.
A primeira à direita é Yael Dayan, filha do General Moshe Dayan.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 25 de março de 2022.

Yael Dayan nasceu em Nahalal, atual Israel, durante a era do Mandato Britânico da Palestina em 12 de fevereiro de 1939. Ela era filha do famoso general israelense Moshe Dayan e neta do sionista Shmuel Dayan, ambos pais fundadores do Estado de Israel.

Yael está portando um fuzil Mauser durante a cerimônia, armamento típico da Força de Defesa de Israel de 1948 até a padronização com o FAL nos início dos anos 50, relegando o fuzil a funções cerimoniais. Os israelenses conseguiram muitos fuzis Mauser da FN Herstal, o blog tratou desse assunto aqui.

Na Guerra dos Seis Dias (1967), a Tenente Yael Dayan serviu na unidade de comunicação social do estado-maior da divisão de Arik Sharon e escreveu um diário da sua guerra no Sinai contra os egípcios. Ela publicou cinco romances, bem como uma biografia de seu pai chamada My Father, His Daughter (Meu Pai, Sua Filha). Ela escreveu um livro de memórias da Guerra dos Seis Dias chamado Israel Journal: June 1967 (Diário de Israel: junho de 1967), também intitulado como A Soldier's Diary e traduzido no Brasil como "Diário de um Soldado".

Yael Dayan ao lado do seu pai Moshe Dayan nos dias que antecederam a ofensiva do Sinai, 1967.
O General Moshe Dayan era então o Ministro da Defesa.

Embora ela mesma não tenha entrado em combate, pois esta não era a sua função, ela esteve próxima da ação e observou as operações de perto, ao lado dos militares que comandavam as ações. De particular importância foi a tomada da fortaleza de Umm Qatef em Abu Agheila, a noz dura que ancorava o sistema de defesa egípcio. O exército de Nasser então passou à debandada em pânico em direção ao Canal de Suez, uma catástrofe militar para o Cairo. A tão a
lardeada "Força Shazly", que deveria ter atuado como reserva estratégica, deu as costas e fugiu para o Egito africano ao invés de contra-atacar o rompimento em Umm Qatef-Abu Agheila.

Os egípcios tinham 80 tanques T-34 defendendo a fortificação, e tanques Sherman e Centurion espalhados pelo Sinai. Havia também os pesados tanques IS-3, que eram impermeáveis na blindagem frontal. O Egito ainda possuía os então novíssimos T-55, muito mais modernos que os tanques israelenses. Ainda assim, a manobra e violência da ação dos israelenses nocauteou os árabes. O exército egípcio no Sinai esfacelou-se, com grandes números de soldados zanzando pelo deserto e sendo feitos prisioneiros pelos israelenses. Yael descreve a situação em Nakhl, no centro do deserto do Sinai:

"Nakhl é uma região esquecida por Deus, não obstante possuir abundância de água. Vocês precisavam provar a água! É malcheirosa, enjoativamente adocicada e oleosa. Arik e Dov conheciam Nakhl de trás pra frente pois tinham estado lá na última guerra [1956]. Poucas casas, um acampamento militar, uma colina ou duas em volta, e a estrada para o Passo de Mitla e o Canal que ali faz uma esquina em ângulo reto. Na vez passada, tomáramos a localidade em poucos minutos, antes de avançar para Mitla.

[...]

De súbito, fomos informados pelo rádio de que a Fôrça Aérea ia dar-nos apoio. Paramos o jipe na ladeira e galgamos a parte lateral da colina. Pudemos, então, divisar seis tanques Centuriões egípcios na estrada. Pareciam maciços e bem protegidos, em meio aos demais veículos. Seria tolice expormo-nos, em carros de meia esteira ou jipes, aos canhões dos pesados Centuriões.

[...]

A Fôrça Aérea surgiu no céu azul. Quatro Super Mystères voaram baixo, despejando bombas incendiárias sôbre os tanques [egípcios]. Estávamos todos muito nervosos, com exceção de Dov que, com a maior calma, ficou de pé e filmou tôda a cena, com uma câmera Canon 8 mm. 'Como nas manobras', comentou alguém.

Os aviões mergulharam duas ou três vêzes. Esperei que nos reconhecessem. Seus ataques eram por demais precisos para nos arriscarmos a não ser identificados. Achávamo-nos bem próximos aos alvos. No seu quarto círculo, acenaram Shalon para nós, pendendo as asas. Poucos dias depois, encontrei-me com um dos pilotos - Arik, meu colega de classe em Nahalal. 'Eu sabia que um dia nós dois iríamos trabalhar juntos', disse-me. Quando êles se afastaram pelo nordeste, embarcamos no jipe e dirigimo-nos a tôda velocidade para a estrada abaixo. Aproximamo-nos arriscadamente dos tanques que se incendiavam. Munições explodiam em tôdas as direções.

[...]

De repente, escutamos tiroteio atrás de nós. Alguns dos nossos soldados começaram a trocar disparos de armas de fogo portáteis com soldados egípcios escondidos num arbusto a poucas jardas de distância. Devemos ter tido sorte, pois apenas dez minutos antes passáramos por êsses mesmos arbustos, erguendo uma nuvem protetora de poeira à nossa volta. Arik optou por permitir que seguíssemos a infantaria blindada em sua operação de limpeza até Nakhl. Veículos de meia esteira, jipes russos, tanques incendiavam-se e vomitavam fumaça para onde quer que se olhasse. Viam-se canhões e transportes de tropas blindadas atirados em tôdas as direções e posições. Centenas de soldados egípcios avançavam precipitadamente em direção a Nakhl. Posteriormente, revelaram-nos que imaginavam achar-se em área ainda sob seu domínio. Nossos soldados conclamavam-nos a se renderem. Alguns o fizeram. Outros responderam com um disparo ou uma saraivada - ou fugiram. À minha frente, vi um jovem soldado de um dos nossos veículos de meia esteira matar um egípcio, depois correr para trás do carro blindado e vomitar, logo em seguida refazendo-se e indo juntar-se à sua divisão.

Eu agarrava com firmeza uma metralhadora portátil Uzi. Dov estava ao volante, Katz atrás da metralhadora dianteira e Itzik apontava um canhão automático. Nenhum de nós chegou a disparar. Outros se encarregavam disso, e nos limitamos à observação. Cadáveres estiravam-se pelo caminho, e saltávamos do carro para retirar-lhes as armas. Os adversários de tocaia nos arbustos foram mortos. Grupos de soldados inimigos fugiam nas mais diversas direções. Alguns escaparam. No entanto, não pude afastar o pensamento de que isso era mais uma caçada que um combate. Eu não ia atirar. Os homens nos jipes achavam-se armados e, se fôssemos alvejados diretamente, êles responderiam ao tiroteio. Todavia, minha minha arma permanecia carregada e engatilhada. Meus óculos contra o vento de nada valiam e meus olhos doíam. Além da canícula do meio-dia, havia o calor irradiado pelos veículos em chamas, um inferno em miniatura, odioso e medonho.

Chegamos a Nakhl à tardinha. Ali encontramos mais destruição, destruição total, como sòmente sucede um embate de tanques contra tanques. Era o Vale da Morte do Exército egípcio. Cêrca de cento e cinqüenta tanques foram contados no percursos de Temed a Nakhl. Ninguém contou os veículos, a artilharia pesada, os canhões anti-aéreos leves, os tratores pesados que rebocavam os canhões, os caminhões de munições, todos êles em posições insólitas ou formando pilhas, de modo que muitaas vêzes os destroços assumiam semelhança bizarra com peças de escultura moderna."

- Yael Dayan, Diário de um soldado, pg. 131, 132, 133-135, 1967 (trad. 1970).

Post-script: Suspense militar

O título deste artigo é uma homenagem ao filme A Filha do General (The General's Daughter, 1999), um filme de investigação militar onde o investigador Paul Brenner (John Travolta) ao lado de sua parceira Sara Sunhill (Madeleine Stowe) investigam a misteriosa morte da oficial de guerra psicológica Capitã Elisabeth Campbell (Leslie Stefanson), filha do comandante da base: o General Joe Campbell (James Cromwell).

Outros personagens marcantes sendo o Coronel Bob Moore (James Woods), o oficial comandante e mentor da Capitã Elisabeth Campbell, e o Coronel George Fowler (Clarence Williams III), o leal segundo em comando do General Campbell. Além da investigação e da discussão sobre mulheres no exército em uma época onde este era um conceito novo, o filme ainda apresenta a estética esverdeada dos antigos uniformes BDU americanos.

Recomendação do Warfare.


A Filha do General ainda gerou um filme de suspense e investigações militares, Violação de Conduta (Basic, 2003), dessa vez com John Travolta contracenando com a futura rainha Hipólita, Connie Nielsen, como a investigadora Capitão Júlia Osborne e com o titã Samuel L. Jackson interpretando o implacável Sargento Nathan West.

Leitura recomendada:

domingo, 20 de março de 2022

Uzi começou como um menino que brincava com armas

Uzi Gal com a Uzi (esquerda) e a MP40.

Por Nati Gabbay, The Times of Israel, 4 de março de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 20 de março de 2022.

Enquanto estava preso em uma notória prisão britânica, esse jovem surgiu com o projeto de uma submetralhadora que ganharia popularidade em todo o mundo. Esta é a história inacreditável de Uzi Gal.

O inventor da submetralhadora homônima usada em todo o mundo teve uma paixão por armas de fogo ao longo da vida.

Quando jovem, ele pegou uma pistola para fazer experimentos e, quando preso em uma prisão britânica por contrabando de armas, inventou a submetralhadora que eventualmente armaria o mundo.

Uma menorá de Hanukkah feito de submetralhadoras Uzi antigas.
(
A Coleção Dan Hadani, 1979)

Esta é a história inacreditável de Uzi Gal.

Conheça Gotthard Glas, a criança com um hobby perigoso: armas.

Quando tinha dez anos, Gotthard Glas queimou a mão. Como? Ele decidiu ver uma uma espingarda velha de cano longo para reaproveitá-la como uma arma pessoal. É o que acontece quando a casa da família em que você cresceu em Munique está cheia de pistolas, espadas e outras armas antigas.

Soldado das FDI com sua Uzi.
(
A Coleção Dan Hadani, 1974)

De: “Submetralhadora Uzi: Planos de Aula”, que as FDI distribuiu aos comandantes em 1970.

Quando a criança se tornou adolescente morando no Kibutz Yagur, tendo se mudado em 1936 para a Palestina Obrigatória, sua grande paixão por armas voltou. Ouviu dizer que o professor de geografia da escola distrital possuía uma pequena pistola italiana de pólvora negra. Vendeu seu álbum de selos, comprou a arma e começou a trabalhar em seu sonho: transformá-la em uma máquina de guerra bem oleada.

Infelizmente, um professor da escola o pegou trabalhando na arma e seus planos foram frustrados mais uma vez. Glas não desistiu: aos 15 anos inventou um arco que dispara flechas automaticamente, uma “submetralhadora arco e flecha” se preferir.

Um soldado da IDF reza no Muro das Lamentações enquanto carrega uma Uzi.
(Yaacov Elbaz. A Coleção Dan Hadani na Biblioteca Nacional, 11 de junho de 1969)

Primeiro Ministro Yitzchak Shamir atirando com uma Uzi, 16 de dezembro de 1986.
(Nati Henrik, GPO)

Quando Glas se juntou à força de combate do Palmach do pré-Estado Yishuv, ele encontrou a ocupação perfeita: desenvolvimento de armas e gravação de armas. Assim como em seus dias de escola, ele foi pego mais uma vez – e condenado pelos britânicos a sete anos de prisão. Para sua alegria, foi perdoado depois de pouco mais de dois anos no Presídio de Acre. Adivinha o que ele fez para passar o tempo na cadeia: ele projetou uma submetralhadora.

Em 1949, ainda cadete no curso de formação de oficiais e depois de conhecer intimamente todas as armas que as FDI tinham para oferecer, o jovem, que entretanto se tornara Uziel Glas (e mais tarde seria conhecido pelo nome de Uzi Gal) escolheu escrever uma carta aos seus comandantes:

“Para: O Comandante da Escola de Oficiais, Tenente-Coronel Meir Zorea.

De: Cadete Uziel Glas 120946.

Data: 20 de outubro de 1949″

A longa carta contém uma descrição detalhada de seu sonho da submetralhadora perfeita.

Cinco anos e meio depois, em 27 de abril de 1955, na tradicional Parada do Dia da Independência das FDI, o exército apresentou a nova metralhadora, que tinha o nome Uzi. A propósito, Guthard/Uziel/Uzi Glas/Gal não queria que a submetralhadora levasse seu nome, mas a decisão estava fora de suas mãos.

Ministro da Defesa Itzhak Rabin com soldado das FDI.
(Danny lev, 
A Coleção Dan Hadani, 1989)

De: "Submetralhadora Uzi: Planos de aula", que as FDI distribuiu aos comandantes em 1970.

“Uma arma inovadora para as FDI”.
Artigo publicado no jornal “Zemanim”, 27 de abril de 1955.

Dentro de alguns anos, a Uzi não foi usada exclusivamente pelas FDI. Tornou-se um sucesso fenomenal em todo o mundo.

Todo o Estado de Israel encontrou esse jovem despretensioso quando ele recebeu a Menção do Chefe do Estado-Maior em 1955 e recebeu o “Prêmio de Segurança” de David Ben-Gurion.

Quando perguntado sobre sua invenção, ele simplesmente respondeu: “Cumpri meu dever no exército como um cozinheiro faz e simplesmente como todos os outros”.

A Uzi, a arma preferida de Chuck Norris!

Ao escrever o artigo, fiz uso do volume 17 de “IDF: Encyclopedia of Army and Security” (צה”ל בחילו – אנציקלופדיה לבא וביטחון), e do artigo de Eli Eshed “Sixty Years of the Uzi Submachine Gun”.

Sobre o autor:

Nati Gabbay é Diretora de Conteúdo Digital da Biblioteca Nacional de Israel.

Bibliografia recomendada:

The Uzi Submachine Gun.
Chris McNab.

Leitura recomendada:

GALERIA: A Uzi iraniana, 3 de março de 2020.