terça-feira, 14 de janeiro de 2020

FN FAL: “O Braço Direito do Mundo Livre”


Por Chris Eger, Guns.com, 3 de março de 2014.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 29 de agosto de 2019.

[O blog já tratou sobre o FAL aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.]

Durante a Guerra Fria, o mundo foi dividido em OTAN, Pacto de Varsóvia e alguns neutros. Enquanto os EUA escolheram foi de M14/M16 e os soviéticos escolheram o humilde AK, o resto do mundo foi por outro caminho - o FN FAL.

O FN FAL armou a maior parte do mundo ocidental e seus aliados durante a era da Guerra Fria.

Por quê

No final da década de 1940, os países aliados ocidentais no pacto militar da OTAN estavam indo às compras atrás de um novo e moderno fuzil de batalha. Com os soviéticos e seus companheiros do bloco oriental armados com o SKS e o AK-47 com seletores de tiro, fuzis de ferrolho Enfields, Mausers e MAS da OTAN foram totalmente ultrapassados.

Fuzil MAS-36 sendo disparado por um soldado alemão no final da Segunda Guerra Mundial.

Os americanos e britânicos estavam testando rapidamente novos rifles na época, mas a gigante belga de armas FN - mal se recuperando da guerra e da ocupação nazista de suas próprias fábricas - procurou seu laborioso mestre de armas, Dieudonné Saive, para ver o que ele poderia sugerir.

Projeto

Dieudonné Joseph Saive era o Chef de Service da FN (chefe de projeto de armas) por quase duas décadas. Quando o gênio das armas de fogo John Moses Browning morreu, deixando sua pistola de 9mm bifilar incompleta, Saive a terminou, criando a famosa Browning Hi-Power. Além dessa conquista, ele tinha uma parte na pistola Baby Browning e no fuzil FN-49. Foi essa última arma, um fuzil semi-automático operado a gás, que Saive usou como base para o novo fuzil de combate com seletor de tiro da FN.

O inventor do fuzil FAL, Dieudonné Saive.

Tomando a operação a gás básica, com o bloco da culatra basculante, do seu FN-49, ele o modificou para se tornar capaz de disparar seletivamente até 700 tiros por minuto. Ao contrário dos velhos fuzis de ação de ferrolho das Guerras Mundiais que carregavam no máximo de 5 a 10 disparos, a nova arma da FN seria alimentada por carregadores tipo cofre destacáveis que podiam conter 20 cartuchos de maneira confiável. Um cano de 21 polegadas (533mm) dava à arma um comprimento total de 43 polegadas (109mm).

Protótipo do FAL no calibre .280/30, apresentado em 1947.

Embora isso possa parecer longo em comparação com os fuzis de hoje, deve-se lembrar que o típico fuzil Mauser, que a nova arma estaria substituindo, também tinha 43 polegadas. O peso chegou a 9,48 libras (4,3kg), descarregado, em grande parte devido à armação de madeira da arma e à caixa da culatra fresada (em vez da caixa da culatra estampada encontrada no AK47).

Fuzil FAL, visão explodida do desenho.

Pronto para produção em 1953, a FN chamou seu novo fuzil de Fusil Automatique Léger (francês para "Fuzil Automático Leve"). Obviamente, isso foi simplificado como FAL.

Fuzil FAL comum.

Fuzil Para-FAL. Notar a coronha esquelética rebatível.

Sistema de mira de um fuzil FN FAL.

Uso

A FN encontrou o tipo de sucesso com o FAL com a qual empresas de armas apenas sonham. Entre 1953-1988, eles fabricaram mais de 2 milhões dessas armas para clientes em todo o mundo. Isso incluiu remessas para a Alemanha, Colômbia, Chile, Irlanda, a Holanda e outros. Ao todo, seria usado por forças armadas ou forças policiais em algo como 90 países. Isso incluía não apenas o modelo padrão FAL 50.0, mas também a arma automática do grupo de combate de 13 libras (6kg) FALO* (com um cano pesado e um carregador de 30 tiros), o FAL 50.61 de coronha dobrável, e o modelo “Paraquedista” 50.62/63 com coronha dobrável e cano de 17 polegadas (436mm). Originalmente construído em torno do Kurz intermediário de 7,92×33mm, o fuzil de grande calibre era predominantemente calibrado no 7,62×51mm OTAN.

*Nota do Tradutor: Fusil Automatique Lourd (FALO), conhecido no Brasil como FAP (Fuzil Automático Pesado).

Soldados do 7º Regimento Real Australiano marcham através de Sydney com FALs, 1968.

Gurcas britânicos armados de Kukris e fuzis FAL L1A1.

Além das armas fabricadas pela FN, vários países fizeram suas próprias sob licença. Um grande mercado para armas feitas sob licença desse projeto belga foi o Brasil (Imbel) e a Argentina (FM), que fabricaram centenas de milhares dessas armas. Israel foi outro dos primeiros fabricantes do FAL, usando-o para finalmente substituir os fuzis Mauser e Enfield da época da Segunda Guerra Mundial e aumentar a produção da submetralhadora UZI fabricada localmente. O problema era que o FAL estava propenso a travamentos nas condições do deserto, o que falhou em impressionar os israelenses.

Exército britânico na Irlanda do Norte com FALs L1A1.

FAL L1A1 em Belfast, 1981.

O FALO de 13 libras é uma versão de arma de apoio do grupo de combate do FN-FAL.

Esse fato era mais conhecido pelos britânicos, que desde o início criaram seus próprios FALs semi-automáticos licenciados (fabricados pela Enfield e apelidados de L1A1) com recortes de areia no conjunto do ferrolho, pois eles eram conhecidos por estarem envolvidos em climas desérticos de tempos em tempos. Isso provou ser útil para as operadores britânicas do SAS em Omã, Áden e outros lugares em que nunca estiveram oficialmente nas décadas de 1960 e 70. Seguindo a liderança da Grã-Bretanha, a Austrália, o Canadá*, a África do Sul e a Índia fizeram a licença do FAL em suas próprias versões semi-automáticas. Essas armas viram combate nas Falklands (onde soldados britânicos armados com FALs lutaram contra soldados argentinos - armados com FALs).

*Nota do Tradutor: O Canadá adotou o FAL antes da Grã-Bretanha, em 1954, o primeiro país do mundo a adotá-lo; antes mesmo da própria Bélgica.

Fuzis L1A1 vistos aqui nas Falklands com tropas britânicas.

Fuzis FN FAL FMP com tropas do exército argentino nas Falklands, 1982.

Treinamento de infantaria do Exército da Rodésia com seus FN FALs.
Observe a empunhadura para a frente.

A Rodésia usou o FAL em sua versão semi-automática britânica/sul-africana*, pintada distintamente na chamada tinta de cocô de bebê. Hoje, essa série de manchas verdes e amarelas é muito popular entre os colecionadores, que geralmente a recriam em versões de construção doméstica. Essas armas foram a arma icônica dos 15 anos da Guerra de Mato (Bush War) naquele país.

*Nota do Tradutor: A Rodésia utilizou FALs métricos da Alemanha Ocidental e o R1 sul-africano.

Mesmo pequenos países então chamados neutros, sem cortejar inimigos, adotaram o FAL, pois certamente parecia uma boa idéia na época. Isso incluía a pequena Áustria (que o produziu localmente pela Steyr como StG58*), Costa Rica, República Dominicana e Nepal. Isso deixou o mundo não-comunista do Himalaia aos Alpes e aos Andes, todos guardados pelo fuzil de batalha da FN.

*Nota do Tradutor: O StG58 austríaco é considerado a melhor versão do FAL. Uma curiosidade é a ausência de baioneta, apenas com o uso do bocal de granada.

FAL na Rodésia.
Reencenador finlandês com a camuflagem “cocô de bebê”.

O FAL ainda aparece frequentemente em "pontos quentes" militares, como visto por este exemplo enferrujado recentemente fotografado na Libéria.

O capitão do exército dos EUA, William Summer, interroga um cavalo de aparência suspeita no Iraque com um FAL em pronto emprego, 2007.

Soldados nepaleses usando fuzis FN FAL e smartphones em 2010.

FAL na Serra Leoa, 2011.

Colecionabilidade

O FG42 comparado ao G3, à esquerda, e ao FN FAL, à direita.

O chocalho da morte do FAL foi soado pela adoção pela OTAN da munição de 5,56mm como padrão depois de 1964. Primeiro, os EUA, depois a França e a Alemanha começaram a selecionar armas mais leves e controláveis, como o M16, FAMAS e HK33, todos em 5,56 para substituir os fuzis de batalha de 7,62mm dos anos 50 e 60.*

*Nota do Tradutor: A OTAN só adotou realmente o 5,56mm como padrão nos anos 1980. O primeiro país a adotar o 5,56mm como padrão foi a França em 1978 com o FAMAS.

Um por um, o Mundo Livre mudou para armas de menor calibre. Por volta de 1989, até a FN entrou na dança e projetou o FNC de 5,56mm para substituir o FAL em sua linha de montagem.

O ator Dennis Hopper era um ávido proprietário do FAL como visto aqui com seu FAL G em Taos, Novo México, 1970.

Hoje, o FAL ainda está em serviço muito difundido em todo o mundo, mas isso ocorre com forças armadas menores, como o Camboja, Togo e Suriname*. Até membros da OTAN como a Turquia e a Grécia, há muito conhecidos por manter equipamento militar por gerações, mudaram para o 5,56.

*Nota do Tradutor: O Brasil e a Argentina ainda mantêm o FAL, sendo que a Argentina o atualizou e não manifesta o desejo de substituí-lo.

No entanto, 60 anos de serviço ao redor do mundo e uma silhueta inconfundível deram ao FAL um legado duradouro. Com a possível exceção do fuzil M14/M1A, o FAL é talvez o fuzil de batalha em 7,62x51mm mais desejado nos EUA hoje. Isso faz com que os colecionadores se apressem atrás tanto dos kits de peças e como das próprias versões originais de fábrica da arma.

Kits de peças

Kit de peças do FAL. Os armeiros de casa devem estar cientes de que as peças vêm em variedades de milímetros e polegadas.

A melhor aposta para muitos possíveis viciados no FAL é montar uma arma a partir de um kit de peças. Nesse caso, você simplesmente pega uma nova caixa da culatra semi-automática e monta legalmente sua própria arma em torno dela, no estilo Frankenstein, usando peças separadas vendidas por distribuidores.

Ao comprar os diferentes kits de peças, escolha padrões métricos ou em polegadas e atenha-se a eles ao adquirir peças. Se a última frase o deixa intrigado, lembre-se de que o FN FAL e seus variantes foram feitas tanto pelos países que usaram milímetros e centímetros (Bélgica, Brasil, Áustria) quanto pelos países que usaram polegadas (Grã-Bretanha, Austrália, Canadá etc.), então esteja ciente , você pode encontrar peças de ambos, mas elas não são necessariamente intercambiáveis.

Kit da arma DSA SA58.

É claro que, como a maioria dos variantes do FAL era métrico e muitos modelos de "polegada", como as armas australianas, foram destruídos em vez de vendidos como excedentes, as versões métricas continuarão sendo mais comuns no mercado de excedentes. Além disso, como a Imbel ainda está fabricando e exportando caixas da culatra métricos do FAL, isso pareceria o caminho lógico para os armeiros iniciantes.

FAL de propriedade civil.

Mas não importa o que você monte, consulte as seções de referência do fórum da web FAL Files antes de começar a fazer compras. Ao fazê-lo, você encontrará kits atualmente variando de US$ 400 a US$ 700. Isso, quando você adiciona o preço de uma caixa da culatra a ele, pode ou não valer a pena para você.

Armas prontas


FALs!

Se você não quer brincar de montar o seu próprio fuzil, ainda existem muitas opções para os interessados. A Century fez o que chamou de fuzil R1A1 a partir de caixas de kits de peças que muitas vezes deixavam peças em polegadas e métricas na mesma arma. Estes, como você pode imaginar, são o degrau mais baixo da cadeia alimentar semi-automática legal do FAL nos Estados Unidos e geralmente podem ser comprados por US$ 800. Outras armas fabricadas com novas caixas da culatra, mas utilizando uma mistura de peças antigas (geralmente métricas) incluem o DSA StG58 e o FN Paraquedista da Imbel/Enterprise. Qualquer um desses começa em US$ 1000 e sobe rapidamente a partir daí.

Marca do R1A1 da Century Arms.
Os FALs com marcação da FN em qualquer versão são o item mais quente.

No início dos anos 60, foram importados para os EUA cerca de 1.800 fuzis semi-automáticos FAL da série FN G da Bélgica. Essas armas são extremamente caras, geralmente mais de US$ 5.000, mas são o mais perto possível da coisa real sem um carimbo de imposto. Isso ocorre porque essas armas foram construídas com caixas da culatra de FALs com seletores de tiro regulares, apenas sem a alavanca de manejo verdadeira para acionar a arma na terceira posição.*

*Nota do Tradutor: Nos eventos internacionais, o tiro de fuzil é feito em três posições: Deitado, de Pé e Ajoelhado, sempre nessa ordem. Portanto, primeira posição, segunda posição e terceira posição.

Então, é claro, existem FALs verdadeiros registrados na NFA de Classe III que são capazes de disparar legalmente em fogo totalmente automático. Como acontece com qualquer metralhadora transferível, eles valem amplamente qualquer valor que alguém queira pagar por eles. No entanto, esteja preparado para um ponto de partida nesses itens em torno de US$ 10.000.

De qualquer maneira, o velho Dieudonné fez um bom trabalho para a FN.

Bônus:

O tradutor (centro) com um FAP no Capão do Leão/RS em janeiro de 2008.

Bibliografia recomendada:

The FN FAL Battle Rifle,
Bob Cashner.

Leitura recomendada:


FOTO: Mercenários franceses no Iraque, 2007.

Mercenários franceses (os tais "contractors") armados de fuzis FAMAS F1 posando ao lado de comandos iraquianos da 1ª Brigada de Operações Especiais, "Brigada Dourada", no Iraque, em 2007.

Bibliografia recomendada:

Le FAMAS et son histoire.
Jean Huon.

As forças armadas da Alemanha se tornaram uma completa piada

Ursula von der Leyen conversa com tropas alemãs. (Getty)

Por Ross Clark, The Espectator, 29 de agosto de 2019.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 30 de agosto de 2019.

Elas não podem cumprir seu papel como um membro da Otan, e muito menos formar o coração de uma força de defesa européia.

Não é difícil pensar em momentos em que a fraqueza militar alemã teria sido elogiada como uma boa notícia em todo o resto da Europa, mas talvez não quando a ministra alemã acusada de jogar as forças armadas de seu país no chão acabou de ser nomeada a próxima presidente da Comissão Européia.

O constrangimento mais recente da Bundeswehr (“Defesa Federal”) - todos os seus 53 helicópteros Tiger foram colocados em terra impedidos de voar neste mês devido a falhas técnicas - é apenas a mais recente de uma longa série de humilhações que surgiram do feitiço de Ursula von der Leyen como ministra da Defesa. Um país um dia temido por sua implacável eficiência militar se tornou uma piada entre as potências européias.

Se von der Leyen puder ser transposta para a cena política britânica, ela pode ser vista como um Chris Grayling teutônico - atacado por todos os lados, inclusive pelo seu próprio, por péssimo manuseio crônico da sua pasta. Para citar o colega democrata cristão Rupert Scholz, que atuou como ministro da Defesa de Helmut Kohl: “A condição da Bundeswehr é catastrófica. Toda a capacidade de defesa da república federal está sofrendo.”

Não é justo culpar todos os problemas das forças armadas alemãs em von der Leyen, que é ministra da Defesa apenas desde 2013. Por razões compreensíveis, as forças armadas alemãs estavam um pouco limitadas em seu desenvolvimento entre 1945 e 1990, quando a defesa estava em qualquer caso efetivamente contratada para potências estrangeiras. Mesmo agora, a Alemanha permanece limitada por restrições militares - sob o Tratado para o Acordo Final com Respeito à Alemanha, que devolveu a soberania do país em 1991, as forças armadas alemãs estão limitadas a 370.000 militares, dos quais não mais que 345.000 podem estar no exército e força aérea. Elas não podem ter armas nucleares. Após a Guerra Fria, os governos alemães de todas as cores não consideraram a defesa uma prioridade - relutante em ver que a Rússia poderia voltar a ser uma ameaça.

No entanto, isso não desculpa algumas das inadequações das forças armadas que vieram à tona sob a liderança de von der Leyen. Durante a sua regência, os exercícios militares alemães foram reduzidos a um objeto de riso. Em 2014, um batalhão em um exercício da OTAN na Noruega foi forçado a usar uma vassoura pintada para simular uma metralhadora pela falta de uma de verdade. Quase metade dos soldados envolvidos no exercício não puderam receber pistolas.

As coisas não melhoraram este ano, quando a Alemanha assumiu o controle da Força-Tarefa Conjunta de Alta Prontidão da OTAN, encarregada de combater a ameaça da Rússia. A Alemanha comprometeu-se a ter 44 tanques Leopard 2 e 14 veículos de infantaria blindados Marder disponíveis para a tarefa, porém, no evento só conseguiu reunir nove e três, respectivamente. Um documento divulgado revelou que os caças Eurofighter e Tornado da Luftwaffe, juntamente com seus helicópteros de transporte, só estão disponíveis para uso por uma média de quatro meses por ano - passando o resto do tempo armazenados em manutenção e reparo.

Quanto às fragatas F-125 Baden-Württemberg, que deveriam entrar em serviço há dois anos, a marinha se recusou a comissioná-las. Elas falharam em seus testes no mar após problemas com radar, revestimento à prova de chamas nos tanques de combustível e no sistema central de computadores. As fragatas também não tinham tubos de torpedo ou sonar - essenciais para enfrentar a ameaça de submarinos.

O relatório anual do ano passado pelo Comissário Parlamentar das Forças Armadas - o equivalente alemão de um relatório do comitê de seleção de defesa - confirmou a incapacidade das forças armadas de manter seu equipamento em uso, acrescentando que por um período a partir de outubro de 2017, quando um submarino do tipo 212A danificou seu leme, nenhum dos seis submarinos do país estava disponível para uso.

Este ano, o governo superou o constrangimento ao disponibilizar informações sobre a disponibilidade de equipamentos classificados, de forma que ficasse de fora do relatório. O Comissário, Dr. Hans-Peter Bartels, não ficou impressionado. Ele descreveu a Bundeswehr - o equivalente das forças armadas e do Ministério da Defesa combinados - como um "monstro burocrático", citando o exemplo do comandante de um esquadrão aéreo tático com 1.500 funcionários militares e não-militares e ativos voadores totalizando 3 bilhões de euros sob seu comando - e, no entanto, a quem era confiado gastar apenas 250 euros por ano sem obter aprovação de cima.

Não que a centralização do financiamento tenha ajudado a promover cuidado com dinheiro. Um dos escândalos colocados à porta de von der Leyen é o do Gorch Fock, um navio de treinamento naval que foi enviado para uma revisão em 2016 e que ainda não foi devolvido às suas funções. Enquanto isso, o arco de custos estimados será familiar para quem segue projetos do setor público britânico - passou de 10 milhões para 135 milhões de euros.

O que von der Leyen fez foi aumentar o orçamento militar, que subiu acentuadamente no ano passado, de 38,5 bilhões de euros para 43,5 bilhões de euros. Outros 20 bilhões de euros por ano estão planejados para 2024. Mas, mesmo nesse nível, a Alemanha não cumprirá sua obrigação como membro da OTAN de gastar 2% do PIB por ano em defesa - apenas gastará de 1,2 por cento a 1,5 por cento. É verdade que poucos dos estados membros europeus da OTAN cumprem essa obrigação, mas de todos eles você poderia esperar que a maior economia do continente estaria dando o exemplo. Desde o final da Guerra Fria, a Alemanha considerou muito fácil se isentar, ou desempenhar apenas um papel simbólico, em operações militares conjuntas ao redor do mundo - seu passado agressivo servindo como uma desculpa conveniente, como se estivesse dizendo ao mundo: agora, você não gostaria de uma Alemanha que estava flexionando seus músculos militares, gostaria?

Gastar dinheiro é uma coisa; gastá-lo bem é outra. As forças armadas alemãs nunca fizeram realmente uma transformação bem-sucedida de uma força de conscritos para uma força profissional menor. O recrutamento obrigatório foi suspenso em 2011, dois anos antes da chegada de von der Leyen como ministra da Defesa. Mas várias vezes desde então o governo brincou com a idéia de revivê-lo - mais para fins sociais do que militares. As forças armadas da Alemanha são de tamanho semelhante às da Grã-Bretanha - 173.000 funcionários em comparação com os 155.000. No entanto, nem todos estão sendo mantidos em treinamento adequado. Em 2017, 19 dos 129 pilotos de helicóptero perderam suas licenças porque não conseguiram cumprir o número necessário de horas de vôo.

Há uma questão de quão comprometida von Leyen está em manter uma força de defesa alemã independente. Em 2014, ela disse ao Der Spiegel que uma única força de defesa conjunta da UE 'seria uma conseqüência lógica de uma cooperação militar cada vez mais estreita na Europa' - uma idéia que assusta até os mais leais britânicos eurófilos como Vince Cable. Desde que foi proposta como presidente da Comissão, von der Leyen recuou nessa idéia - talvez ciente de que seu histórico de comandar as forças armadas alemãs não inspire confiança.

Em 1945, as forças armadas dos EUA enviaram uma equipe para a Alemanha com o objetivo de capturar Albert Speer antes da polícia militar - eles ficaram tão impressionados com a capacidade da máquina de armamento nazista de se recuperar de ataques a bomba que estavam desesperados para interrogá-lo. Podemos não estar mais em risco da Alemanha colocar suas forças militares em uso agressivo. Mas há poucos sinais de que ela tenha organização e competência para cumprir seu papel como membro da OTAN, e muito menos formar o coração de uma força de defesa européia.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

O primeiro salto da América do Sul

Tenente Antônio Pereira Lima, o paraquedista improvisado.

Pelo Major PMESP Sérgio Marques, Museu da Polícia Militar de São Paulo.

Transcrição e organização Filipe do A. Monteiro, 24 de novembro de 2019.

Tenente Antônio Pereira Lima, O Paraquedista Voluntário (à moda militar...). 
A História inusitada do 1º Salto da América do Sul.

Domingo, 01 de novembro 1925, véspera de feriado prolongado do “Dia de Finados”..., há exatos 94 anos, no Campo de Marte, zona norte da capital Paulista, o 2º tenente Antônio Pereira Lima entraria para a História do Paraquedismo Brasileiro e da América do Sul de uma forma surpreendente...

Negro, em uma sociedade recém-libertada da escravidão, Antônio Pereira Lima nasceu em 1899, na Capital Bandeirante, filho de Dona Idalina Maria da Conceição e do Sr. José Pereira Lima. Com 18 anos, voluntariamente, ingressou como soldado, em 07 de junho de 1917, na Força Pública Paulista (atual Polícia Militar do Estado de São Paulo). Já sargento, durante a Revolução de 1924, a “Esquecida”, naqueles terríveis dias de julho, permaneceu ao lado dos poderes legalmente constituídos. Todos os inferiores, como chamado na época o círculo dos Sargentos, preenchidos os requisitos, a título de “prêmio do Governo do Estado”, de acordo com o art. 6º da Lei 1.981, de 17 de outubro de 1924, inclusive nosso homenageado, foram promovidos em 10 de novembro de 1924. Pereira Lima conquistou a graduação de Aspirante-a-Oficial.

Concomitantemente, foram matriculados e ingressaram no Curso Especial Militar- CEM (célula da Academia de Polícia Militar do Barro Branco-APMBB). Na época a Escola de Oficiais funcionava na Rua Ribeiro de Lima, cruzamento com a Av. Tiradentes, no centro da Capital, área atualmente ocupada pelo COPOM/SP. Por força da Lei 2.051, de 31 de dezembro de 1924, que reorganizou a Força Pública do Estado, fora recriada a Aviação da Força Pública Paulista, sob a denominação “Esquadrilha de Aviação- EA”. Era a terceira fase da aviação militar Paulista. Por sinal, a primeira fase nasceu com a publicação da Lei 1395-A, de 17 de dezembro de 1913, dentre outras proposições, foi criada a Escola de Aviação Militar. Sob os auspícios da Força Pública Paulista nasceu a aviação militar Brasileira.

Em 1925 a sede da Escola era em prado próprio da Instituição, o Campo de Marte, no bairro de Santana, na zona norte da Capital. A área hoje não mais pertencente à PMESP, sendo um dos aeródromos de maior trânsito de helicópteros do Brasil. Também há no aeroporto um espaço reservado à sede do Grupamento de Radiopatrulha Aéreo- GRPae, com os seus famosos helicópteros “Águias”. Como o lendário pássaro grego “Fênix”, renasceu a Aviação Militar Paulista em 1984, após sua extinção, decorrente da derrota militar Paulista na Revolução Constitucionalista do distante ano de 1932.

Na Aviação Militar, a “5ª Arma” (ao lado da Infantaria, Cavalaria, Artilharia e Engenharia), vários Aspirantes, todos voluntários, submeteram-se, no ano de 1925, a inúmeros testes com o intuito de serem aprovados no concurso para ingresso na Esquadrilha de Aviação da Força. Dez foram os aprovados, incluso nosso personagem, o Aspirante Pereira Lima.

Com seus demais camaradas, frequentava o curso da Escola de Oficiais, no CEM. Os Oficiais-Alunos Aviadores também acumulavam as aulas teóricas e práticas na Esquadrilha. Cada curso, 6 meses de duração.

No inverno daquele ano, mais precisamente, 08 de julho de 1925, alcançaria finalmente o Oficialato, com sua promoção ao posto de 2º tenente.

Mais qual a relação do “salto improvisado” do 2º tenente Antônio Pereira Lima com a Cruz Azul?

Decorrente da Revolução de 1924, ocorrida na Capital, com a morte de policiais durante a refrega resultaram muitos órfãos e viúvas dos soldados tombados ou mesmo licenciados do serviço ativo, decorrente dos graves ferimentos sofridos. Uma comissão de Damas da Sociedade Paulistana solicitou o apoio ao coronel Pedro Dias de Campos, Comandante da Força Pública (que assumiu as responsabilidades em pleno desenvolvimento da Revolução, dela participando ao lado dos Legalistas), com o intuito de ampará-los. Com uma visão privilegiada, o coronel Pedro Dias, filho de indígenas, edificou, em 28 de julho de 1925, uma Instituição de amparo aos familiares dos soldados da Instituição, a “Cruz Azul”, ideário ainda presente em nossos dias. Os objetivos da novel Instituição beneficente eram manter os serviços de assistência permanente às famílias dos militares estaduais, escolas maternais e jardins de infância para os seus filhos.

Com a ação colocada em prática pelo Comandante Geral, os órfãos e viúvas dos combatentes tombados ou seriamente lesionados não mais ficariam desamparados!

Todavia, como é comum em obras dessa natureza, não havia recursos para a edificação de um Hospital e de um Colégio. O valoroso Comandante se valeu de rifas, quermesses, gincanas, jogos. A década de 20 do século passado o estilo musical predominante era “Fox”. Uma banda do mesmo ritmo foi criada, o “Jazz-Band” da Cruz Azul, que alegrava as festas com o “hit” do momento. Tais apresentações também arrecadavam fundos para que o sonho pudesse se materializar. E a mão-de-obra? As próprias Unidades da Força cediam policiais, que também eram pedreiros, eletricistas, encanadores etc.

Em uma de suas ações mais audaciosas, sempre com o mesmo notável objetivo, o grande Comandante teve uma ideia avançada para os padrões daqueles dias, a contratação de um paraquedista para apresentação.

O salto do paraquedista foi marcado para o dia 01 de novembro de 1925, um domingo. Em período ainda sob os auspícios da “Belle Époque”, com a sociedade eminentemente machista, o paraquedista contratado para o feito era uma mulher, uma francesa, Janette Caillé...

Aliada a grande divulgação do exótico espetáculo, pois o salto seria o primeiro de São Paulo (e da América do Sul, segundo trabalho do então Capitão Franco Olívio Marcondes), houve grande venda de ingressos para assistir ao incrível feito.

Pouco antes da realização do salto, a Cruz Azul, na Av. Tiradentes, fundava seu primeiro Grupo Maternal, com muitos berços para hospitalizar crianças carentes, iniciando seu programa assistencialista. Na sequência, as autoridades se dirigiram ao Campo de Marte.

O salto foi um sucesso! Assim escreveu, em 02 de novembro de 1925, o Jornal Correio Paulistano, com a grafia de época:

“... Merece especial referencia, dos principaes aspectos dessa tarde de aviação, o audacioso salto realizado de um aeroplano, voando em grande altura, pelo tenente Antônio Pereira Lima, que sahiu galhardamente dessa difficil prova, festejado ao ganhar o solo pelos vibrantes applausos dos assistentes.”

Mas não foi uma senhorita francesa, de nome Janette Caillé, contratada para efetuar o salto com paraquedas?

Os relatos abaixo, com as adaptações do autor, que escreve essas linhas, foram obtidos no livro clássico, de leitura obrigatória, “Asas e Glórias de São Paulo”, que conta a História da PMESP e da Aviação Militar Paulista. São seus autores:
  1. Coronel PM José Canavó Filho, hoje, eternizado no Obelisco Mausoléu do Ibirapuera; e
  2. Edilberto de Oliveira Melo, 99 anos, coronel PM mais antigo da PMESP, com inúmeros outros livros sobre a quase bicentenária Instituição de Tobias de Aguiar (O Salto da Amazônia; Raízes do Militarismo Paulista; Marcos Históricos da PM, Clarinadas da Tabatinguera, Pro Brasília e O Centenário da Aviação Militar Paulista).

No Campo de Marte, a “paraquedista furona"...

A senhorita Janette Caillé, “paraquedista francesa,” contratada pela Força Pública para efetuar o salto com paraquedas, em 01 de novembro de 1925, véspera do Feriado de Finados, no Campo de Marte, na zona norte da Capital. Ao seu lado o instrutor de vôo da Esquadrilha de Aviação da Força Pública, Orton W. Hoover. Ao fundo uma aeronave Curtiss, da Força Pública Paulista, biplace, de fabricação americana.

O já então tenente-coronel PM Antônio Pereira Lima (aposentado), em meados da década de 70 do século passado era morador do bairro de Vila Mariana. Quase octogenário, cego, casado com quem intitulava “querida noivinha, querida Norma”, bem-humorado e absolutamente temente a Deus, recebeu, em sua residência, os autores da famosa obra, que colheram relatos dos bastidores do salto, que não foram contemplados na matéria jornalística do Correio Paulistano, de 02 de novembro de 1925.

Dia 01 de Novembro de 1925. Com os ingressos vendidos, o Campo de Marte estava lotado e as Autoridades presentes! Pouco antes do horário do espetáculo, a senhorita gaulesa, por indisposição (saúde), mandou cientificar o coronel Pedro Dias de que não poderia saltar... A boa reputação e credibilidade da Força Pública estavam em xeque. A senhorita francesa colocara o coronel Pedro Dias de Campos em uma “sinuca de bico”... O que fazer?

O Comandante dirigiu-se, então, ao “Ninho das Águias da Força Pública”, no próprio Campo de Marte, na Esquadrilha de Aviação, mesmo local que se daria a proeza do salto.

Colocando os 15 Oficiais-Alunos Aviadores em linha, o coronel Pedro Dias solicitou um “voluntário” para o salto de paraquedas, que, por lógica, não apareceu. No dia anterior, pela 1ª vez tiveram contato com um paraquedas, na testagem do equipamento. Amarraram-no em um saco de areia, que fazia o papel do “homem alado”. Em seguida, jogaram-no, entretanto, o paraquedas não abriu, espatifando-se o saco no solo...

Todavia, em situações similares, sempre despontam “voluntários à moda militar...”. O Comandante Geral, coronel Pedro Dias, olhando um, olhando outro (longos segundos perfilados: suores, calafrios, movimentos peristálticos...), finalmente, parando em frente ao nosso “agraciado”, apontando a ele e dizendo: “- O Senhor saltará no lugar da faltosa...”. Pronto, estava resolvida a questão! “Santo voluntário...”, pensaram os demais aviadores na linha.

Nosso herói dirigiu-se, então, a sala reservada para vestir o macacão branco e o capacete da francesa Janette, acompanhado pelos seus irmãos de armas. Sempre muito solícitos, animavam a cobaia..., ou melhor, o paraquedista improvisado: “-Não tenha medo, coragem, Pereira Lima, não é nada, você é forte... etc.”. Os camaradas sabiam que se não fosse ele, seria um deles! Que fosse o próprio Pereira Lima, pois já estava com os paraquedas em seu corpo.

Segundo o coronel Anchieta Torres, um dos grandes pesquisadores da História da Polícia Militar, o 2º tenente Pereira Lima fora escolhido para a missão pelo coronel Pedro Dias devido a sua pequena estatura, pois o macacão branco da paraquedista francesa só serviria nele!

Decolou em uma aeronave Curtiss da Força, biplace, de fabricação americana, pilotada por Orton Hoover, ás da aviação estadunidense, que lutara na I Guerra Mundial. Era, naquela ocasião, instrutor de vôo da Esquadrilha de Aviação da Força Pública.

Ganhando altura, já com a aeronave no céu, somente o piloto, o paraquedista improvisado e D-us... É chegado o momento do clímax. Hoover fez sinal para o salto, e, com típico sotaque, declamou: “- Lims, sarr... ta, Lims sarr... ta”. Responde o corajoso tenente Pereira Lima: “- Seu Hoover, é comigo que o senhor está falando?” Hoover, devolve: “- Yes Lims, sarr...ta; my God!”

Nosso herói na asa da aeronave olha para baixo... Não devia tê-lo feito! Grudou- se desesperadamente na barra de ferro, que ligava os dois planos da asa, olhando ao piloto, negando com a cabeça, dizendo: ”- daqui não saio! Daqui ninguém me tira.”

Após algumas manobras mais radicais de Hoover, inclusive um “looping”, o tenente Pereira Lima é convencido, “pela lei da gravidade”, lançando-se no “azul do firmamento”, com a abertura do paraquedas.

Entretanto, o tirante (tira de couro) da perna estava mal colocado, pois, além de não estarem familiarizados com a amarração do instrumento, os demais Oficiais-Alunos Aviadores desejavam despachar rapidamente a “encomenda aérea.” Sofreu terrível dor em sua parte íntima. Mesmo durante aquela tarde, enxergou pequenas estrelas..., ficando “fora do ar” por instantes. Para aliviar a “pressão”, “lá”, abriu as pernas durante o plainar.

Em sua “leve aterrissagem”, perfura a capota de lona de um veículo, de placa branca, estacionado próximo da área de aterrissagem, o que amenizou sua aterrissagem.

O público acabara de descobrir que o salto fora realizado por um Oficial da Força Pública. Independentemente, foi ovacionado por ele. Talvez não tenha percebido a cor do paraquedas pelo pequeno incômodo durante o vôo..., mas transformara-se no 1º paraquedista brasileiro.

Ainda atordoado, ouvia “os bravos e os vivas” do público. Seus amigos, após aquele milagroso sucesso, carregaram-no nos ombros até às autoridades. No caminho, inúmeros cumprimentos, saudações, tapinhas nas costas. Nascia uma lenda!

Entretanto, a História ainda não estava encerrara. O epílogo não seria dos melhores. De canto de olho observou que seu chefe máximo, o Comandante Geral, não estava para muitos amigos. “O corpo fala..., até grita..., e como!” Aproximando-se do coronel Pedro Dias de Campos, que tinha aqueles olhos negros e amendoados a fitá-lo, disse ao nosso herói: “-Tenente, você saltou de perna aberta! Deveria saltar na posição de sentido! Você vai pagar o conserto da capota do meu carro, ouviu!” Finalizando a série de azares, o veículo oficial pertencia ao Coronel Pedro Dias..., mas, por gigantesca sorte, sobreviveu!

Charge do salto do Tenente Antônio Pereira Lima, o paraquedista improvisado. O tirante (tira de couro) de sua perna foi mal colocado, pois, além de não estarem familiarizados com a amarração do instrumento, os demais Oficiais-Alunos Aviadores desejavam despachar rapidamente a “encomenda aérea.” Pereira Lima sofreu terrível dor em sua parte íntima. Mesmo durante aquela tarde, enxergou pequenas estrelas..., ficando “fora do ar” por instantes. Para aliviar a “pressão”, “lá”, abriu as pernas durante o plainar.

No ano seguinte, no dia 31 de agosto de 1926, durante a Campanha de Goiás, em perseguição à Coluna Miguel Costa- Prestes, Pereira Lima, na função de copiloto da aeronave sofreu um acidente terrível na cidade de Uberaba-MG. Permaneceu por 8 (oito) dias em coma, porém, resistiu aos graves ferimentos. A sorte era seu talismã. O piloto da aeronave, tenente Edmundo da Fonseca Chantre, não teve a mesma felicidade, morrendo no local, tornando-se o primeiro mártir da Aviação Militar Paulista.

O tenente Pereira Lima participou efetivamente na Revolução de 1930, quando, por castigo, a Aviação Militar Paulista foi extinta por Getúlio Vargas. Em 1932, durante a Revolução, no 1º BCP (hoje 1º BPChq-ROTA), mais uma vez defendeu sua Força Pública, São Paulo e o Brasil.

Após 32 anos de serviço, aposentou-se em 03 de fevereiro de 1949 no posto de tenente-coronel.

Aviação Militar na Força Pública (atual, PMESP), da esquerda pra direita: 2° tenente João Negrão, aviador da Esquadrilha de Aviação da Força Pública Paulista; Orton W. Hoover, estadunidense, ás da aviação e combatente aéreo na I Guerra Mundial; 2º tenente Antônio Pereira Lima, aviador, na Esquadrilha de Aviação da Força Pública Paulista. Foi o paraquedista improvisado, 1º a realizar um salto na América do Sul; 2º sargento Raul Marcondes, mecânico de vôo.

No Hospital Cruz Azul de São Paulo, no bairro do Cambuci, que tanto auxiliou em sua construção com seu “salto improvisado”, acolheu seu último suspiro em 07 de outubro de 1978, aos 79 anos.

O tenente Antônio Pereira Lima foi homenageado como patrono da Turma Aspirantes 2018, da APMBB, formandos no último mês de dezembro.

Também foi agraciado com o nome de rua, a “Coronel Antônio Pereira Lima”, no bairro de Perus, na zona norte da Capital, logradouro oficializado através do Decreto nº 17.054, de 04 de dezembro de 1980.

Agora, veterano Sr. Antônio Pereira Lima, ao lado do Eterno, pode tranquilamente contemplar o sol, o céu e as estrelas, integralmente!!!

Fontes:

ANDRADE, Euclides. DA CÂMARA, Hely F. 1931. A Força Pública de São Paulo: São Paulo: Serviço Gráfico da PMESP, p. 200-203.

FILHO, José Canavó. MELO, Edilberto de Oliveira. Asas e Glórias de São Paulo. São Paulo: IMESP, 1978, p. 53-69;

História da Cruz Azul. Disponível no linkAcesso em: 30 out. 2019;

Jornal Correio Paulistano, São Paulo, 02 nov. 1925, p.3;

Jornal Correio Paulistano: Pensamento e Arte (Suplemento), São Paulo, 05 ago. 1956, p.9;

MARCONDES, Franco Olívio. A Aviação e o Paraquedismo. Revista Militia, São Paulo, 1954, n. 52, p. 32-34;

MELO. Edilberto de Oliveira. Clarinadas da Tabatinguera. São Paulo, 2010, p. 78-80;

SÃO PAULO (Estado). Lei n. 2.051, de 31 de dezembro de 1924. Reorganiza a Pública do Estado. Disponível no link Acesso em: 30 out. 2019;

__________________. Lei n. 1.981, de 17 de outubro de 1924. Estabelece disposições relativas aos oficiais e praças da Força Pública, que, no recente levante militar souberam sustentar e defender as instituições fundamentais da Nação e do Estado. Disponível no linkAcesso em: 30 out. 2019;

Tenente Antônio Pereira Lima. A Força Policial. São Paulo, 2.000, n. 25, p. 1-2. Disponível no linkAcesso em: 30 out. 2019;

TORRES, Anchieta. Coisas da Força Pública: Paraquedista. Revista Militia, São Paulo, 1952, n. 27, p.19-20.

Bibliografia recomendada:

Polícia Militar:
Asas e Glórias de São Paulo.
José Canavó Filho e Edilberto de Oliveira Melo.

Leitura recomendada:





GALERIA: Bawouans em combate no Laos28 de março de 2020.


A geopolítica do Brasil entre potência e influência


Por Bruno Racouchot, Communication et Influence, 22 de julho de 2016.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 19 de novembro de 2019.

Duas semanas antes da abertura dos Jogos Olímpicos, a ser realizada no Rio de Janeiro, o Brasil está jogando muito bem por sua imagem internacionalmente. Ele não apenas está enfrentando uma grande crise política e econômica dentro de suas fronteiras, agravada por um crime excepcional (10% dos homicídios cometidos no mundo estão no Brasil, tornando este país o mais violento do mundo), mas ele terá que assumir no exterior o seu papel de poder no cenário internacional. Um desafio que parece mais delicado do que nunca, dada a atualidade terrorista e o desmantelamento de uma célula salafista que preparava um ataque contra a delegação francesa nas Olimpíadas. Para entender como o Brasil pretende aparecer na esfera das relações internacionais, é útil ler a entrevista que o professor Yves Gervaise concedeu recentemente às notas CLES (Comprendre les enjeux stratégiques/Entendendo questões estratégicas) da Escola de Administração de Grenoble (Grenoble École de Management). Autor de um tratado sólido e claro, Géopolitique du Brésil (Geopolítica do Brasil, PUF, 2012), excelente conhecedor deste país que conhece desde 1967, onde lecionou e onde vive em parte, Yves Gervaise não pratica a linguagem irônica.


Assim, quando surge a questão de saber se o Brasil pode se tornar uma grande potência, Yves Gervaise responde:

"Não basta ter herdado um território imenso, dotado de riquezas naturais incomuns, ou mesmo ter sido capaz de construir uma indústria de bom nível... Não, antes de tudo, precisamos primeiro ter a vontade de ser poderoso. No entanto, poucos pensadores brasileiros consideraram seriamente um autêntico projeto geopolítico para seu país. A esse respeito, deve-se mencionar Geopolítica do Brasil, escrito pelo general Golbery do Couto e Silva, que continua sendo um trabalho de referência sobre o assunto. Mas, embora seja verdade que, em várias ocasiões, os governos brasileiros tenham tido o desejo de desempenhar um papel importante no cenário internacional, na realidade eles nunca foram realmente bem-sucedidos. Assim, com Lula, por exemplo, vimos emergir o surgimento de uma força de vontade, fortalecendo o potencial militar do país (por exemplo, consolidando a cooperação com a França no campo dos armamentos) ou envidar esforços diplomáticos para recuperar fortes laços com a África. Sem sucesso real deve-se bem constatar."


Resta a busca por um soft power (poder brando) que possa se projetar fora da imagem idealizada de um país de praias, samba, futebol, música e filles merveilleuses (garotas maravilhosas). Na verdade, diz Yves Gervaise,

"O Brasil possui um modelo social e cultural específico, enraizado em sua história e não tenho certeza de que seja reproduzível em outros lugares. Apesar do lema do país, Ordem e progresso - inspirado pelo pensador francês Auguste Comte, as relações são pouco - se é que são - fundadas no racionalismo, e sim no compartilhamento de emoções, em uma linguagem afetiva e corporal. O Brasil é uma sociedade que reage ao instinto e ao sentimento. Esses dados são imprescindíveis para integrar a compreensão da especificidade da sociedade brasileira e das relações sociais arquitetônicas. Conexões pessoais são essenciais. A imagem e, principalmente, a televisão desempenham um papel muito importante, especialmente com as famosas telenovelas, séries televisivas que focam, através do artifício sentimental, a atenção de um país onde 95% dos lares têm TV. O Brasil vive uma história relativamente recente em escala mundial, com uma cultura que vem principalmente de outros lugares, já que cruzaram e misturaram três correntes de assentamento: índia, europeia e africana. Além disso, não vamos esquecer que estamos aqui no Novo Mundo. Porque o brasileiro pertence de fato ao mundo americano, que é um mundo novo. Isso é visto cada vez mais hoje na vida cotidiana, com a perda da influência européia - especialmente a francesa - no Brasil, e a preponderância do soft power americano."


A análise de Yves Gervaise é tão precisa quanto realista. Ela se junta a Christophe-Alexandre Paillard, autor de um estudo intitulado Brésil, comprendre la crise (Brasil, entendendo a crise), publicado no Diploweb, que mencionamos em um post anterior. Como diz Yves Gervaise,

"o brasileiro é um povo alegre, dinâmico e empreendedor, que nos mostra o caminho para fluidificar humanamente as relações sociais. Essas pessoas vivem em um território rico em riquezas, onde tudo é possível. Mas, ao mesmo tempo, é um país muito difícil, onde todos os golpes são permitidos, onde é necessário poder contar com relações confiáveis, o que resulta em um uso relativamente difícil. Por trás da fachada sedutora, é na verdade um país tão perigoso quanto imprevisível. O compositor e cantor Antônio Carlos Jobim, conhecido como Tom Jobim, resumiu perfeitamente ao dizer: "O Brasil não é para principiantes""... 

Mesmo e principalmente na geopolítica, corrigir as distorções entre realidade e aparência para exercer influência continua sendo um dos principais objetivos do soft power. O exemplo brasileiro prova isso claramente. E a esse respeito, os Jogos Olímpicos serão um revelador da capacidade do Brasil de controlar ou não sua imagem no cenário internacional.

Bruno Racouchot é Diretor do Communication & Influence.

Bibliografia recomendada:

A cabeça do brasileiro,
Alberto Carlos Almeida.

Brésil:
Corrution, Trafic, Violence, Criminalité,
Vers la fin du auchemar?
Nicolas Dolo e Bruno Racouchot.

Leitura recomendada:

domingo, 12 de janeiro de 2020

A França planeja manter presença militar no Iraque como parte de uma missão da OTAN


Por Laurent Lagneau, Zone Militaire Opex360, 11 de janeiro de 2020.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 12 de janeiro de 2020.

Após a votação, apenas por deputados xiitas, de uma resolução exigindo a saída das "forças estrangeiras" do Iraque, o primeiro-ministro iraquiano [que renunciou] Adel Abdel Mahdi pediu a Washington que enviasse uma delegação para o Iraque afim de organizar a retirada das tropas americanas atualmente desdobradas em seu país.

Esta resolução, não-vinculativa, foi adotada em 5 de janeiro, dois dias depois de um ataque americano que foi fatal para o General Qassem Soleimani, o chefe de operações externas da Guarda Revolucionária Iraniana e para Abu Mehdi al-Mouhandis, número dois de Hachd al-Chaabi, uma aliança de milícias xiitas pró-Teerã.

Durante uma conversa por telefone, Abdel Mahdi realmente "solicitou que representantes fossem enviados ao Iraque para estabelecer os mecanismos necessários à implementação da decisão do Parlamento, com vistas a uma retirada segura das tropas no Iraque", afirmou o gabinete do primeiro-ministro do Iraque em 10 de janeiro.

Somente a diplomacia americana anunciou sua intenção de não dar seguimento a ela. "Nesse momento, qualquer delegação no Iraque seria responsável por discutir a melhor maneira de reconfirmar nossa parceria estratégica, não por discutir a retirada de tropas", disse a porta-voz do Departamento de Estado, Morgan Ortagus. "Nossa presença militar no Iraque visa continuar a luta contra o EI [Estado Islâmico] e, como disse o secretário de Estado, estamos determinados a proteger os americanos, os iraquianos e nossos parceiros de coalizão", ela então argumentou.

E acrescentou, sem mais detalhes, que Washington queria ter uma "discussão" com o governo iraquiano "não apenas sobre segurança, mas também sobre nossa parceria financeira, econômica e diplomática" porque "queremos ser um amigo e parceiro de um Iraque soberano, próspero e estável."

Obviamente, uma retirada do Iraque das forças americanas significaria o fim da coalizão anti-jihadista liderada pelos Estados Unidos [Operação Inherent Resolve]. Após os recentes acontecimentos no Iraque, as atividades iraquianas foram interrompidas, tendo sido suspenso o acompanhamento das forças iraquianas.

Quanto ao componente aéreo, ele é reduzido à porção mínima. Pelo menos se julgarmos pelo último relatório sobre as operações do Estado Maior das Forças Armadas [EMA] francesas. Entre os dias 3 e 9 de janeiro, os 11 Rafales envolvidos na Operação Chammal, da Jordânia e Emirados Árabes Unidos, fizeram apenas 14 operações aéreas. Ou uma atividade ainda mais reduzida em 25% em relação a dezembro.

Seja como for, para a Ministra das Forças Armadas francesas, Florence Parly, é "importante que os Estados Unidos continuem apoiando os esforços, como vêm fazendo há vários anos, na luta contra o terrorismo. "

"A luta contra o Daesh [EI ou Estado Islâmico] deve continuar", argumentou a ministra, nas ondas da France Inter, em 11 de janeiro. "Às vezes ouvimos alguns comentaristas dizerem que "a luta contra o Daesh acabou" [...]. Na realidade, todos sabemos, e a situação no Levante o demonstra, que esta organização terrorista continua [...] a ter os meios para agir de forma subterrânea e clandestina. E é por isso que a situação no Iraque é tão preocupante. E se continuar a deteriorar-se por proxies* ou potências estrangeiras interpostas, bem, isso deixará o campo aberto para o Daesh", explicou Parly.

*Nota do Tradutor: Agentes intermediários.

Quanto aos 200 militares franceses presentes no Iraque [incluindo 160 nas Forças-Tarefas Monsabert e Narvik, que treinam os soldados iraquianos, nota da redação], o ministro justificou sua manutenção por “solidariedade” entre aliados. "Quando um aliado é atacado, a resposta não consiste em ir embora", disse ela, referindo-se aos recentes ataques iranianos contra bases iraquianas que abrigam forças da coalizão, incluindo americanos.

Florence Parly, Ministra das Forças Armadas Francesas.

De qualquer forma, a estrutura e o objetivo da missão dos militares franceses em solo iraquiano podem evoluir. "Isso faz parte do pensamento que tivemos nos últimos dias", disse Parly. "A França está realmente muito presente no Iraque, para acompanhar as forças iraquianas em seu aumento de competência porque sua tarefa é complicada", com um país "confrontado por sérias dificuldades" e "eventos recentes que poderiam criar divisões que seriam extremamente prejudiciais à paz na região”, continuou ela.

Entre os caminhos sendo exploradas, Parly sugeriu que manter militares franceses no Iraque poderia ser feito como parte de uma missão da OTAN. De qualquer forma, ela levantou esse ponto em uma conversa com Jens Stoltenberg, secretário geral da Aliança Atlântica, em 10 de janeiro.

“Nós provavelmente podemos fazer mais e melhor. Uma missão da OTAN está presente no Iraque, com a mesma tarefa [de acompanhar as forças iraquianas, nota da edição]. Eu acho que esse é um dos caminhos pelos quais devemos ser ainda mais ativos ", disse a ministra.

Como lembrete, em outubro de 2018, a OTAN estabeleceu uma missão de treinamento para o benefício das forças iraquianas. Reportando-se ao Comando Aliado das Forças Conjuntas de Nápoles [JFCNP], esta NMI [NATO Mission in Iraq, Missão da OTAN no Iraque], solicitada por Bagdá, tem 500 treinadores, conselheiros e pessoal de apoio. Sua atividade foi temporariamente suspensa após o ataque americano contra o General Soleimani.

Em seu discurso após os ataques iranianos contra duas bases iraquianas que abrigam as forças da coalizão em 8 de janeiro, o presidente Trump pediu à Otan que se envolvesse mais no Oriente Médio, uma região que não é mais tão estrategicamente importante para os Estados Unidos depois que estes ganharam sua independência energética.

Posteriormente, Stoltenberg disse que concordou que a OTAN poderia "contribuir mais para a estabilidade" do Oriente Médio... Antes de especificar mais tarde o que ele quis dizer com isso.

"Eu acredito firmemente que a melhor maneira de combater o terrorismo internacional nem sempre é enviar tropas da OTAN para operações de combate em larga escala", disse o ex-primeiro-ministro norueguês a repórteres, 9 de janeiro. "Às vezes é isso que precisamos fazer, mas a melhor maneira é permitir que as forças locais lutem contra o terrorismo elas mesmas. [...] É exatamente isso que estamos fazendo no Afeganistão, é o que estamos fazendo no Iraque e, é claro, podemos examinar se podemos fazer mais nesse tipo de atividade”,  continuou ele.

"Também podemos fazer outras coisas", disse Stoltenberg, sem querer "especular" mais. “Estamos analisando opções diferentes. Isso requer um processo de tomada de decisão real na OTAN" e seus 29 estados-membros", e devemos discuti-lo com os países da região", enfatizou.