domingo, 26 de janeiro de 2020

Paraquedistas: a arma secreta da Rússia em uma invasão no Báltico


Por Karol Ulc, The National Interest, 22 de janeiro de 2020.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 26 de janeiro de 2020.

É para isso que o ocidente deve se preparar?

Ponto-Chave: A Rússia poderia absorver os estados bálticos em questão de dias.

Em fevereiro de 2016, a influente RAND Corporation - um think tank* estreitamente alinhado com a Força Aérea dos EUA - publicou um documento no qual advertia que uma invasão russa dos Estados Bálticos poderia chegar às capitais da Letônia e Estônia em menos de três dias, mesmo com uma semana de aviso.

Nota do Tradutor: Um "think tank" é um corpo de especialistas suprindo conselhos e ideias sobre problemas especifícos, como política ou economia.

Demonstração de sambo da VDV.

Mas isso poderia subestimar a rapidez com que a Rússia poderia invadir a região, caso o Kremlin enviasse a maior parte de suas forças aéreas e aproveitasse o elemento surpresa. É possível que uma vitória russa possa ocorrer dentro de horas, não dias.

Como se desenrolaria tal invasão? Uma barragem de mísseis e ataques aéreos ao amanhecer, aleijando as defesas dos Estados Bálticos, precederiam uma operação aerotransportada em larga escala apoiada por uma invasão terrestre em pequena escala na Lituânia a partir do enclave da Rússia em Kaliningrado.

Antes que a aliança pudesse entender - e muito menos reagir - ao que estava acontecendo, terminaria.

Impossível? Vamos dar uma olhada nas cifras.

Paraquedistas da 83ª Brigada Aerotransportada se preparando para exercícios de salto em 2017.

A Estônia possui 5.300 tropas terrestres em serviço ativo em 2016, de acordo com o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos. A Letônia possui 4.450 tropas terrestres ativas e a Lituânia possui 6.000, o que dá aos Estados Bálticos um total de 15.750 soldados.

Certamente, esses números não incluem pessoal da marinha e da força aérea, que são relativamente pequenos em tamanho. Também não conta reservistas, forças paramilitares e tropas aliadas da OTAN que circulam regularmente pela região. A Estônia pode convocar 12.000 membros paramilitares da Liga de Defesa da Estônia, e a Lituânia possui 11.300 combatentes da milícia, segundo o IISS*.

*Nota do Tradutor: International Institute for Strategic Studies (Instituto Internacional de Estudos Estratégicos), um think tank britânico.

No entanto, é improvável que todas essas tropas estejam disponíveis de uma só vez, e o mesmo vale para reservistas. Também não podemos assumir que todas as forças terrestres ativas dos Estados Bálticos estarão disponíveis durante um ataque surpresa - devido à provável interrupção da capacidade de comunicação dos governos bálticos durante as horas iniciais de um conflito.

As Tropas Aerotransportadas Russas* sozinhas consistem em quatro divisões e seis brigadas/regimentos, totalizando mais de 45.000 homens. Esses soldados estão melhor equipados e treinados do que seus possíveis oponentes e poderão contar com a superioridade aérea russa por pelo menos vários dias.

*Nota do Tradutor: As Tropas Aerotransportadas Russas (VDV) são uma Força separada dentro das forças armadas russas. Criadas na década de 1930 como parte da Força Aérea Vermelha (VVS), a VDV terminou se manteve como a maior força paraquedista do mundo por toda a Guerra Fria. As forças aerotransportadas russas são bem conhecidas por sua mobilidade, utilizando uma grande quantidade de veículos projetados especificamente para o aerotransporte; portanto, são totalmente mecanizadas e tradicionalmente possuem um maior complemento de armamento pesado do que a maioria das forças aerotransportadas contemporâneas. O dia 2 de agosto é o Dia do Paraquedista na Rússia; conhecido como 'Dia D', é um feriado nacional.


No entanto, a Rússia não é capaz de enviar toda essa força de uma só vez, mesmo que quisesse. O gargalo é a aviação de transporte. Um estudo realizado pela autora sobre as aeronaves de transporte ativas da Rússia, suas capacidades de transporte e taxas de disponibilidade revela que, em teoria, as forças armadas russas - quando trabalham na capacidade máxima - podem mover metade de seus paraquedistas... na melhor das hipóteses.

A Rússia normalmente depende de aviões de transporte Ilyushin Il-76 de quatro motores para lançar seus paraquedistas de boina azul durante exercícios de treinamento. No entanto, não podemos excluir a possibilidade de tropas aerotransportadas russas voarem em batalha a bordo de outros tipos de aeronaves - pelo menos em direção a aeródromos capturados.

Aviões Ilyushin Il-76 embarcando paraquedistas.

O que não significa que a Rússia realizará uma operação aerotransportada dessa maneira caso vá à guerra. Mas é dentro do campo das possibilidades que a Rússia poderia, pelo menos, atacar com uma força aerotransportada de cerca de 10.000 homens, caso desdobre quase toda a sua frota de 91 aeronaves Il-76.

O Exército Russo seria operacionalmente capaz de conduzir uma operação aerotransportada tão grande? Bem, suas forças aerotransportadas certamente treinam para fazer exatamente isso.


Em um exercício de outubro de 2015, a Rússia levou 10.000 paraquedistas no Distrito Militar Central a um estado de prontidão para combate dentro de 24 horas antes de transportá-los pelo ar. Em 2016, a Rússia realizou nada menos que 18 grandes exercícios que incluíam ou eram exclusivamente conduzidos pelas forças aerotransportadas.

O maior exercício aerotransportado de 2016 envolveu mais de 30.000 soldados do Distrito Militar Ocidental da Rússia entre 22 e 24 de março. O exercício incluiu 3.800 veículos militares e mais de 100 helicópteros de ataque e aviões de guerra. No entanto, nem todos os soldados deste exercício foram aero-lançados.

Além disso, o enclave de Kaliningrado possui uma presença militar formidável composta por duas brigadas de fuzileiros motorizados e uma única brigada de infantaria naval - um total de cerca de 14.000 soldados apoiados por uma brigada de artilharia. Se o Kremlin reforçar ainda mais suas forças, poderá convocar pelo menos mais 14 batalhões do Distrito Militar Ocidental da Rússia - incluindo quatro batalhões de tanques.

Mesmo que não incluíssemos baixas causadas pelos ataques preliminares, o Exército Russo começaria o conflito com uma enorme vantagem numérica em termos de soldados e qualidade dos equipamentos, enquanto operando com superioridade aérea.

A superioridade aérea russa é crucial para um ataque surpresa bem-sucedido - mas a vantagem do Kremlin aqui é praticamente garantida no curto prazo. Caso a Suécia e a Finlândia se mantiverem neutras, e nenhum dos dois são membros da OTAN, o acesso da aliança ocidental ao espaço aéreo sobre os Bálticos seria severamente limitado nas primeiras horas, senão dias, após o início de uma invasão.

Lançamento de blindados, 2012.

Independentemente disso, o fator decisivo seria a surpresa e a eficácia dos ataques preliminares, que, se bem-sucedidos, poderiam lançar as forças regulares dos Estados Bálticos em desordem.

Para dar um exemplo, a guarnição do Batalhão de Infantaria Kuperjanov da Estônia, localizada em Võru, fica a apenas 80 quilômetros da base russa em Pskov. O alcance dos foguetes 9M528 disparados do BM-30 Smerch é de 88,5km.


O estudo da RAND também assumiu que a Suécia permitiria à OTAN usar seu território como base para os aviões de combate da aliança. Tal medida colocaria instantaneamente a Suécia sob a ameaça de retaliação, incluindo a opção nuclear. A aliança não deve tomar a cooperação sueca como garantida.

A apreensão do elemento surpresa pela Rússia também seria crítica para impedir que os Estados Bálticos mobilizassem seus paramilitares e reservas. E com as defesas destruídas, as vias de comunicação e a infraestrutura chave derrubadas ou sob controle russo, os governos da região estariam sob uma tremenda pressão para se render - potencialmente poucas horas após os primeiros mísseis e paraquedistas pousarem em solo báltico.

E a Polônia? Se durante as primeiras horas de uma operação a Rússia não atacasse o território polonês, Varsóvia deveria cumprir suas responsabilidades sob a Carta da OTAN? Deveria lançar um contra-ataque por conta própria?


A Polônia deveria atacar Kaliningrado e enfrentar a possibilidade de um ataque russo à sua infraestrutura? Ou talvez até um ataque nuclear? Tais medidas também levariam a uma parada do petróleo e gás russos, dos quais a Polônia é muito dependente.

Um dia, ou três, de hesitação seria tudo o que a Rússia precisa para trazer suas unidades regulares do exército para as capitais do Báltico e solidificar sua presença.

A OTAN poderia evitar esse desastre? Sim - através da dissuasão. A capacidade da aliança de retaliar e ter vontade política para fazê-lo é essencial para forçar a Rússia a pesar qualquer ação agressiva com muito cuidado.

O cenário apresentado é puramente ficcional? Esperançosamente.

É improvável que a Rússia empreenda uma ação militar direta e agressiva contra um Estado membro da OTAN. No entanto, como os eventos dos últimos anos provam, mesmo os cenários mais improváveis podem se tornar realidade.

Bibliografia recomendada:

Nenhum comentário:

Postar um comentário