quinta-feira, 16 de abril de 2020

Quando o suprimento padrão não era suficiente: a variante australiana "Bitch" do SLR

Helicóptero da Real Força Aérea Australiana desembarcando dois operadores do Regimento SAS no Vietnã, 1969. (Australian Associated Press/AAP)

Por Miles, The Firearms Blog, 16 de outubro de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 16 de abril de 2020.

Embora o fuzil de serviço L1A1 SLR (FN FAL)* tenha servido fielmente o “Digger”** australiano por um período extremamente longo, os soldados de infantaria na Guerra do Vietnã perceberam que o fuzil poderia ser “ajustado” para se adequar ao combate no qual soldados tinham que lutar dia após dia. Passando por modificações de campo que seriam contrárias às regulamentações de qualquer lugar do mundo, as tropas fizeram isso de qualquer maneira porque se encaixavam em um requisito de campo necessário.

*Nota do Tradutor: SLR significa Self-Load Rifle, literalmente Fuzil Auto-Carregável, e é a versão Imperial do FAL medida em polegados, e o seletor de tiro contendo apenas duas opções ao invés das três contidas no FAL métrico: S para Safe (Seguro) e R para Repetition (Repetição, mas na verdade semi-automático).

**NT: Digger, cavador, é o apelido do soldado australiano.


O que aconteceu foi que um armeiro de nível de unidade pegaria um SLR padrão e cortaria o cano na altura da massa de mira. Em alguns casos, um quebra-chama em forma de cone poderia ter sido adicionado ao cano exposto e, com uma coronha reduzida, aparentemente seria o L1A1-F1. Em seguida, a armadilha do gatilho seria modificado para que a arma pudesse disparar apenas de forma totalmente automática. Um carregador L2A1 de 30 tiros seria montado na arma, além de às vezes uma empunhadura frontal e até um lança-granadas XM-148. Essencialmente, o que você tinha era um fuzil unicamente automático, que criava uma enorme bola de fogo na boca do cano sempre que um carregador era gasto. Ele foi chamado, "The Bitch"*.

*NT: The Bitch pode ser traduzido como "A Megera".

Lança-granadas XM148. (Alan W.)

Lança-granadas XM148. (Alan W.)

"O pessoal do Serviço Aéreo Especial da Austrália modificou seus fuzis, cortando o cano imediatamente em frente ao bloco de gás e montando um lança-granadas XM148 de 40mm fornecido pelos EUA. Eles também limavam os seletores de tiro em seus fuzis SLR para torná-los totalmente automáticos. Essa versão automática modificada foi chamada oficialmente de "The Bitch", porque o movimento de torção do ferrolho e o peso leve do cano tornavam praticamente impossível segurar a arma no alvo. Por fim, a Austrália produziu uma versão encurtada para a guerra na selva denominada L1A1-F1. O F1 usou a menor coronha disponível e um quebra-chama encurtado, reduzindo o comprimento total do fuzil em 2,75 polegadas (6,9cm)."

Inovação e Improvisação: "A "bitch" era um SLR automático que foi construída por um dos armeiros e fazia o barulho de uma metralhadora .50... Ela era ótima porque o inimigo pensava que eles foram atingidos por uma companhia de petrechos pesados... não uma pequena patrulha". - Trooper Michael Malone, Special Air Service Regiment. (Museu Memorial de Guerra Australiano)

Museu Memorial de Guerra Australiano.

Além disso, também temos essas fotografias postadas no fórum The FAL Files, em 2014, de uma empunhadura frontal que flutuava por aí na Austrália e foi comprada no Ebay. Realmente, esta é simplesmente uma empunhadura original que foi reaproveitada com uma haste que se encaixa no cano de um L1A1.

Esta imagem é alegadamente proveniente do final do envolvimento no Vietnã, mas a fonte original não é conhecida.




Estas são algumas imagens que circulam pela Internet e são compartilhadas entre vários sites que apresentam fuzis L1A1 em diferentes estágios de modificação. Observe que a empunhadura de acima é realmente inclinada em algumas das imagens.

Special Air Service Regiment (SASR).

A fotografia acima vem de outra descrição das modificações, mas é de uma página do Facebook chamada All Things Military

"Quando desdobrados, os Troopers do SAS estavam armados com fuzis L1A1 fabricados pela RSAF em Lithgow, que são comparáveis em tamanho ao fuzil M14 americano e não são adequados para operações na selva…

Para superar isso, esses fuzis foram modificados em campo, geralmente a partir de fuzis-metralhadores L2A1 de cano pesado, com seus canos cortados imediatamente em frente ao bloco de gás e, freqüentemente, com os bipés L2A1 removidos e um lança-granadas XM148 de 40mm montado abaixo do cano. Os lança-granadas XM148 de 40mm foram obtidos das forças americanas. Para o L1A1, a falta de opção totalmente automática resultou na conversão não-oficial do L1A1 para capacidade totalmente automática, mediante simples preenchimento do seletor de tiro ou pela inserção de um 'corpo estranho' para bloquear a armadilha do gatilho.

Eles normalmente seriam equipados com carregadores de 30 tiros, tanto a versão reta feita especificamente para o L2A1 quanto a ligeiramente curva usada na conversão L4 Bren. (Como esse carregador foi projetado para alimentar para baixo, muitas vezes havia uma mola extra inserida para ajudar a alimentar para cima corretamente).

Os canos eram cortados para facilitar o manuseio no mato e para aumentar a assinatura do som e da chama quando a arma era disparada. Quando um contato era iniciado, a patrulha típica de 5 homens do SASR disparava grandes quantidades de fogo, o som e a chama dos canos cortados aumentando o efeito de 'choque e pavor', desorientando o VC ou o NVA e dando-lhes a impressão de que eles estavam em contato com uma força muito maior.

Para os Troopers, este L1A1 modificado era simplesmente chamado de "The Bitch"..."


Imagem do Memorial de Guerra Australiano em Camberra.

Observe a grande variedade de modificações em todos esses fuzis, não apenas nos L1A1. Mas particularmente predominantes são as empunhaduras frontais ligadas às coronhas.


Ainda outra referência de um resumo de um livro (Sleeping With Your Ears Open-Patrolling With The Australian SASDormindo com os ouvidos abertos - patrulhando com o SAS australiano) sobre o SASR durante a Guerra do Vietnã pode ser encontrada aqui -

"Alguns comentários feitos sobre o SLR (ou L1A1) foram bastante esclarecedores. Uma questão comum era que eles teriam seus armeiros de esquadrão reinstalando o ferrolho mantido aberto e convertendo-os em modo totalmente automático. Eles também gostavam de encurtar o cano e remover o quebra-chama. O raciocínio deles era que, como a maioria de suas patrulhas era para fins de reconhecimento, eles tentavam evitar o contato com as forças inimigas, especialmente porque geralmente operavam apenas como uma patrulha de quatro ou cinco homens. No caso de serem "esbarrados", para usar seu termo, eles abririam fogo totalmente automático, esvaziariam um carregador e tentariam romper o contato enquanto o inimigo ainda estava atordoado. A combinação de fogo totalmente automático, grandes chamas na boca do cano e relatos de abafamento de ouvidos muitas vezes fazia o inimigo pensar que havia tropeçado em um pelotão completo ou possivelmente uma companhia. Um homem fez o comentário de que, sem o quebra-chama, a chama da boca do cano cauterizaria a ferida a 15 polegadas (38cm)."

A razão para toda essa engenhoca era que os Diggers forneceriam aos homens-ponto esse fuzil modificado, de modo que, quando uma patrulha entrasse em contato na cerrada selva vietnamita, se esse homem ainda não tivesse sido morto, seu trabalho era disparar o seu carregador inteiro da sua "Bitch", levando assim os vietcongues a pensarem que a patrulha australiana tinha muito mais poder de fogo ou pelo menos mais soldados do que o inicialmente plotado.

On Patrol with the SAS: Sleeping with your ears open,
Gary McKay.

Absurdo talvez? Ao visitar o Museu Memorial de Guerra Australiano em Camberra e o Museu de Armas Portáteis de Lithgow em Lithgow, temos pelo menos dois depoimentos separados de veteranos australianos falando sobre as modificações em detalhes. E, aparentemente, a partir desses relatos, a “Bitch” realmente funcionou, e fez uma diferença tangível no campo de batalha para os soldados que a usavam.

Miles é um Fuzileiro Naval de Infantaria, interessado especificamente na história, desenvolvimento e uso de armas portáteis na região do Oriente Médio e África do Norte (Middle East and North Africa, MENA), e na Ásia Central. Ele é o administrador do site Silah Report, um site dedicado a analisar a história e as notícias sobre armas portáteis do MENA e da Ásia Central.

Leitura recomendada:

Tiro em Cobertura Rodesiano15 de abril de 2020.

FN FAL: “O Braço Direito do Mundo Livre”14 de janeiro de 2020.

Um breve comentário sobre o FN FAL21 de fevereiro de 2020.

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