Manobra do Batalhão Naval, 1928. |
Pelo Tenente FN Artilheiro (AT) Manoel Caetano da Silva, 1961.
Transcrição Filipe do A. Monteiro, 14 de outubro de 2015.
A linguagem da época foi mantida.
A revolução de 1924 no Estado de São Paulo, foi um acontecimento de muita gravidade, que preocupou sèriamente a Nação, e levou o Brasil a temer pela sorte do grande Estado. O que mais depôs contra os paulistas naquela eventualidade, e que contribuiu para que a revolução fôsse debelada mais depressa, foi a notícia que se espalhou por todo o País, que, o que eles queriam, era separarem-se do Brasil.
São Paulo, que todos dizem e reconhecem ser uma nação, pela pujança do seu progresso admirável e pelo idealismo e valor dos seus filhos, desejaria ser, realmente, independente? Não cremos que fôsse êsse o pensamento que norteava as idéias do seu povo, e que levava-o à luta. Os paulistas não eram ingênuos, sabiam da impossibilidade de realizarem tão incomum quão impatriótico propósito, e mesmo que alimentassem essa aspiração para a sua terra, o Brasil não permitiria que a levassem a efeito.
Artilharia do Batalhão Naval durante manobras na então longínqua Barra da Tijuca, 1928. |
Artilharia do Batalhão Naval durante manobras na então longínqua Barra da Tijuca, 1928. |
A Fôrça Pública de São Paulo, numerosa, bem treinada e bem armada, que Ruy Barbosa dissera, ao vê-la em manobras, ser um exército, encarnava a esperança de vitória daquele povo que recorria às armas não por suas ambições de grandeza, mas buscava nas trincheiras soluções para problemas de ordem social, econômico e político, que, conforme admitiam os seus líderes, o govêrno da República descurava ou não tinha pressa em resolvê-los.
Foi uma luta fratricida que durou poucos dias. A Fôrça Pública, coadjuvada por fracos elementos militares, bateu-se valentemente com fôrças regulares que tinham a apoiá-las o resto da Nação.
A derrota chegou depressa e era inevitável, porque São Paulo não lutava por nenhum ideal conspícuo que merecesse a ajuda dos seus irmãos. A Fôrça Pública batia-se por uma causa que significava agredir o Brasil e não defender São Paulo que não estava sendo acometido por nenhum inimigo.
Um contingente de fuzileiros navais, pequeno mas capaz, seguiu para São Paulo a fim de ajudar as fôrças legalistas na sua ação contra os revoltosos em armas. Era uma fôrça mista, que compreendia as armas de artilharia e infantaria, e não ultrapassava uma companhia.
O Encouraçado Minas Gerais transportou os fuzileiros até o pôrto de Santos onde desembarcaram incorporados a grande número de marinheiros do navio. Era Comandante da Fôrça da Marinha o Capitão-de-Fragata Anatoqles, Imediato do Minas Gerais.
Os fuzileiros seguiram de trem para o teatro da luta onde iriam demonstrar as superiores qualidades militares que foram apanágios dos seus antepassados, e fariam dêles os modernos representantes de uma estirpe de bravos que se confirmaria e haveria de multiplicar-se através dos tempos.
Renault FT-17 e tanquistas da Companhia de Carros de Assalto do Exército Brasileiro em uma avenida paulista durante os combates, 1924. |
- (Não poderemos narrar convenientemente o que foi aquela epopéia porque não dispomos de elementos suficientes. Alguns fuzileiros dos que tomaram parte na mesma, junto aos quais buscamos informes, pouco nos adiantaram. Alegaram êles que já haviam se esquecido de quase tudo. Não tiveram a preocupação de tomar notas porque jamais pensariam que os seus apontamentos poderiam ser publicados).
Os Oficiais da Armada que auxiliaram o Comandante Anatoqles na direção da Fôrça da Marinha, são hoje, todos, altos dignatários da Armada. Foram êles: (salvo êrro ou omissão) Capitão-Tenente Nelson Noronha de Carvalho, Comandante da artilharia dos fuzileiros, e Sub-Chefe Tenente Suzano. Já no fim da campanha o Capitão Noronha foi substituído pelo Capitão-Tenente Helvécio Coelho Rodrigues. Porta-Bandeira da Fôrça da Marinha, Tenente Paraguaçu. Comandante do contingente de marinheiros, Tenente Lauro de Araújo.
Rebelde paulista com fuzil-metralhador Madsen no bairro do Cambuci, 1924. |
Partindo de Santos, o comboio chegou a São Bernardo à noite, onde fez uma pequena parada. Desta estação continuou viagem para o Ipiranga alcançando esta cidade pela madrugada. Os fuzileiros desembarcaram a sua artilharia. Patrulhas avançadas de reconhecimento constituídas de marinheiros entraram em ação, e tomaram contato com o inimigo. Seguiu-se um tiroteio terrível no qual diversos marinheiros foram feridos. Depois dêste choque inicial, encetou a Fôrça da Marinha uma marcha penosa em demanda do centro da capital paulista. Os canhões dos fuzileiros dificultavam a marcha, porque rodavam em terreno desconhecido, à noite, e eram importunados pelos revoltosos. Ao ralar do dia, haviam atingido um ponto perto dos Campos Elíseos; dirigiram-se para lá e ocuparam um prédio próximo ao palácio do govêrno. No referido prédio estabeleceram o Q.G. da Fôrça da Marinha. O Capitão Nascimento dispôs a artilharia ao sopé de um morro que havia nas proximidades e abriu fogo contra objetivos considerados importantes, como entroncamentos e estações ferroviárias, quartéis e pontos de concentração de revoltosos. Um pouco distante do local onde estava colocada a artilharia dos fuzileiros, havia um quartel que parecia abandonado; dêste quartel abriram fogo com metralhadoras pesadas contra os fuzileiros; êles viraram as bôcas dos seus canhões para lá, e em poucos minutos silenciaram as metralhadoras e arrasaram o quartel. Alguns fuzileiros saíram feridos da refrega.
Os canhões de campanha dos fuzileiros, os formidáveis 75 m/m Armstrong, em 1924 eram dos melhores que existiam. Os shrapnell, granadas que usavam carregadas com balins, eram próprias para serem atiradas contra pessoal, e o efeito era devastador.
General Isidoro Dias Lopes, comandante dos rebelados, 1924. |
Depois da luta que se travou nas proximidades do palácio do govêrno, o Capitão Noronha foi substituído no comando da artilharia dos fuzileiros pelo Capitão Helvécio Coelho.
Os canhões dos fuzileiros atiraram muito, atiraram talvez demais, tanto que alguns deles dêles ficaram pràticamente imprestáveis.
Durante todo o desenrolar das operações militares, os fuzileiros ao lado dos marinheiros demonstraram espírito de luta, coragem e desprendimento. Morreram marinheiros e fuzileiros.
Os Oficiais da Armada, que comandaram a Fôrça da Marinha o fizeram com precisão admirável e acêrto absoluto.
Nos combates que travaram com os revolucionários, foram feridos gravemente os soldados José Benício Alves, Heliodoro José dos Santos e José Bezerra Sobrinho, que obtiveram promoção a Cabo. O primeiro é hoje Vice-Almirante (CFN) da R. Rm., o segundo morreu como 1º Tenente da R. Rm. e o terceiro deu baixa. Todos pertenciam à Sexta Companhia, de Artilharia.
Dois soldados morreram; dois outros desapareceram sem que jamais se soubesse que fim tiveram e um dêstes era corneteiro, tinha o apelido de "Porão".
- Tenente Fuzileiro Naval AT Manoel Caetano da Silva, Histórias de Fuzileiros Navais Brasileiros, 1961, pg. 87-89.
Histórias de Fuzileiros Navais Brasileiros. Ten (FN) AT Manoel Caetano da Silva, 1961. |
Imagem do antigo CR na contra-capa do livro. |
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