sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

SISTEMA ANTI BALÍSTICO ARROW. Um dos mais sofisticados sistemas anti mísseis do mundo

Mockup do míssil Arrow 1
FICHA TÉCNICA ARROW 1
Motor: Propelente sólido de estágio com dois estágio.
Velocidade: 11100 km/h (mach 9)
Alcance: 90 km.
Altitude: 50 km
Comprimento: 11 m (Arrow 1).
Peso: 2800 kg.
Ogiva: 150 Kg de fragmentação direcionada
Lançadores: Contêiner com lançador vertical..
Guiagem: Dual com sistema de radar semi ativo e infravermelho na fase final.

DESCRIÇÃO
Por Carlos Junior
O Estado de Israel tem uma história curta, mas bastante tumultuada, com inúmeras guerras com seus vizinhos árabes que não reconheceram a existência do Estado Judeu e o atacaram. Com uma história altamente beligerante, é natural de se esperar que o governo de Israel, sempre tivesse o assunto "defesa" entre as principais pautas para se preocupar.
Com uma industria militar bastante criativa e com engenheiros extremamente competentes, a industria militar de Israel, mas especificamente a  Israel Aerospace Industries, mais conhecida apenas pela sigla IAI, dentre seus muitos produtos bélicos, desenvolveu um projeto de um míssil anti balístico no começo dos anos 80 do século passado com a ajuda dos Estados Unidos, que além de financiarem o promissor projeto, também participaram, com sua industria, neste caso, a Boeing para amadurecer e levar este sistema para o serviço operacional pleno.
O Arrow de primeira geração foi, na prática, um míssil de demonstração de tecnologia e desenvolvimento. Ele não chegou a entrar em serviço. Mesmo tendo um bom desempenho nos testes, com apenas uma falha, relacionada a um problema no computador de solo, o Arrow teve encerrado os trabalho nele e passaram a focar no modelo Arrow 2, este com dimensões menores e diversas melhorias que foram identificadas como viáveis no projeto inicial e que elevariam ainda mais o nível deste avançado sistema de defesa anti mísseis.

Lançamento do Arrow 2
FICHA TÉCNICA ARROW 2
Motor: Propelente sólido de estágio com dois estágio.
Velocidade: 11100 km/h (mach 9)
Alcance: 100 km.
Altitude: 50 km
Comprimento: 6,8 m.
Peso: 1300 kg.
Ogiva: 150 Kg de fragmentação direcionada
Lançadores: Contêiner com lançador vertical..
Guiagem: Dual com sistema de radar semi ativo e infravermelho na fase final.

O Arrow 2, como o míssil original, possui motorização com propelente sólido e com dois estágios que levam o míssil a desenvolver velocidade hipersônica de mach 9 (11115 km/h aproximadamente, pois isso é relativo à altitude), podendo atingir um míssil inimigo a uma altitude máxima de 50 km a uma distancia que pode chegar a 90 km.
O sistema de guiagem empregado no Arrow 2 funciona da seguinte forma: Primeiramente, um radar de terra, que faz parte da bateria do sistema, detecta, e trava o míssil inimigo que está se aproximando. Este radar é o Elta EN/M-2080 Green Pine, um radar multimodo de estado solido com varredura eletrônica ativa, cujo alcance pode chegar a 500 km. Este radar, pode rastrear e atacar  até 14 alvos simultaneamente, o que lhe garante capacidade de lidar com ataques de saturação. Os dados do alvo são alimentados no míssil Arrow 2 que é lançado para se aproximar a uma distancia de até  4 metros do míssil inimigo e nesse ponto, detonar sua ogiva de fragmentação direcionável de 150 kg. Como se pode ver, diferentemente do sistema anti míssil balístico norte americano THAAD, já apresentado aqui no WARFARE, que não tem ogiva e faz a destruição dos mísseis inimigos por impacto direto, o Arrow usa uma cabeça de guerra que detona próximo ao alvo.  A fase terminal do engajamento é feito por um buscador infravermelho produzido com antimoneto de índio (InSb). Esse sistema, também faz parte da contribuição norte americana, desta vez, sob responsabilidade da Raytheon.
Antena do radar de controle de tiro Elta N/M-2080 Green Pine.
Uma bateria do sistema Arrow 2 possui de 4 a 8 trailers laçadores verticais com 6 tubos de mísseis cada um. Os lançadores podem ser recarregados em cerca de uma hora e o sistema permite uma boa mobilidade através do reboque por caminhões. Outro ponto muito positivo que caracteriza a operação do sistema de defesa anti balístico Arrow 2, é que os lançadores, o centro de comando e o radar  Green Pine fazem o intercambio de dados e vós  através de um sistema de comunicação baseado em microondas que permite com que a comunicação ocorra distancias de até 300 km entre cada equipamento.
O centro de gerenciamento de batalham Citron Tree, desenvolvido pela Tardiran Electronics, é montado em um trailer  de onde recebe os dados do radar e dados de outras fontes para processar todas essas informações e monitorar as ameaças e gerenciar as interceptações automaticamente. Porém, é importante observar que o sistema pede autorização para um operador humano em todas as etapas da operação para evitar acidentes.
Pelo menos  3 baterias do sistema Arrow 2 estão em operação em Israel para proteger os centros urbanos de eventuais ataques de mísseis balísticos.

Teste de fogo do míssil Arrow 3
FICHA TÉCNICA ARROW 3
Motor: Propelente sólido de estágio com dois estágio.
Velocidade: 11100 km/h (mach 9)
Alcance: 2400 km.
Altitude: 100 km
Comprimento: Não informado.
Peso: Não informado.
Ogiva: Sem ogiva - Sistema hit to Kill.
Lançadores: Contêiner com lançador vertical..
Guiagem: Sensor Eletro-Óptico de alta resolução.

O próximo passo foi o Arrow 3, uma evolução do sistema que difere, principalmente, no perfil de interceptação, onde seu alcance é muito maior, operando interceptações fora da atmosfera, ou seja, no espaço, justamente na fase de maior velocidade do ataque inimigo a uma distancia máxima de 2400 km. O Arrow 3 não possui cabeça de guerra explosiva, de forma que a sua forma de destruir um míssil inimigo é a do impacto direto (hit to kill), sendo, similar ao sistema norte americano THAAD na forma de lidar com os mísseis inimigos.
Embora o Arrow 3 tenha um sistema de guiagem diferente, além de seus sistemas de comunicação e detecção, ele ainda foi projetado para operar de forma integrada ao Arrow 2, o que lhe garante um multiplicador de força dentro do contexto de defesa anti mísseis de Israel.
O sistema de guiagem do Arrow 3 usa um sensor Eletro-Óptico de alta resolução (EO) que  proporciona uma taxa de acerto (kill Ratio) de 99%. A aquisição do alvo, por sua vez, é feito por uma versão aprimorada do radar Green Pine chamado de Elta EL/M-2084 Super Green Pine, que aumenta, radicalmente, a quantidade de alvos que podem ser rastreados simultaneamente para 200!
A esquerda um míssil Arrow 2 e a direita o mais moderno Arrow 3. O controle de voo do Arrow 3 depende de suas aletas montadas na parte de baixo do corpo do míssil.
Israel é o único operador do sistema Arrow. Motivos políticos e lobby são explicações para isso. O sistema fornece uma cobertura total de todo o território de israel e parte do território dos países vizinho, dando uma boa capacidade de defesa contra mísseis balísticos. Isso é muito importante na medida em que um dos inimigos mais agressivos de israel, o Irã, usa mísseis balísticos como sua arma de dissuasão e faz ameaças Israel com uma frequência incomoda.
O Arrow 3 não possui ogiva. Nesta foto podemos ver o momento exato em que o míssil Arrow 3 impacta, diretamente, contra o míssil alvo. A destruição do alvo se dá por energia cinética (impacto direto).


As forças de tanques da Rússia tiveram um despertar muito rude na Síria


Por Sébastien Roblin, The National Interest, 13 de dezembro de 2019.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 7 de fevereiro de 2020.

Talvez o T-90 devesse ter ficado fora do deserto.

Ponto-Chave: Os mísseis TOW usados pelos rebeldes sírios fizeram buracos nos tanques da Rússia.

Os conflitos interconectados que assolam o Oriente Médio hoje representam uma terrível catástrofe humana, com conseqüências globais em espiral. Um de seus efeitos menores foi esvaziar a reputação dos principais tanques de batalha ocidentais, considerados erroneamente como invulneráveis na imaginação popular.

M1 Abrams iraquiano destruído pelos peshmerga curdos, 2017.

Os tanques M1 Abrams iraquianos não apenas falharam em impedir a captura de Mosul em 2014, mas foram capturados e se voltaram contra seus proprietários. No Iêmen, numerosos M1 sauditas foram nocauteados pelos rebeldes houthis. A Turquia, que perdeu vários M60 Patton e os atualizados tanques M60T Sabra para combatentes curdos e do ISIS, acabou desdobrando seus temíveis tanques Leopard 2A4 de fabricação alemã. O ISIS destruiu de oito a dez deles em questão de dias.

Leopard 2A turco destruído pelos peshmerga curdos, 2016.

Embora esses tanques pudessem se beneficiar de atualizações defensivas específicas em alguns casos, a verdadeira lição a ser tirada era menos sobre deficiências técnicas e mais sobre treinamento de tripulação, moral competente e emprego tático sólido, mais do que blindagens "invulneráveis". Afinal, mesmo os tanques principais de batalha mais fortemente blindados são significativamente menos bem protegidos contra ataques nas blindagens laterais, traseiras ou superiores - e rebeldes com anos de experiência em combate aprenderam como emboscar tanques de batalha principais desdobrados de maneira imprudente, principalmente usando mísseis anti-carro de longo alcance a quilômetros de distância.

Uma exceção à mancha geral de reputação tem sido o tanque T-90A da Rússia, 550 dos quais servem como o melhor tanque principal de batalha da Rússia até que os T-14 Armata entrem em pleno serviço. O T-90 foi concebido nos anos 90 como uma mistura modernizada do chassis do anterior T-72 otimizado para produção em massa e da torre de alta qualidade do T-80 (mas operacionalmente mal-sucedido). Mantendo um perfil baixo e uma tripulação de três homens (o canhão de carregamento automático 2A46M do tanque toma o lugar de um municiador humano), o T-90A de 50 toneladas é significativamente mais leve que o M1A2 e o Leopard 2 de 70 toneladas.

Quando Moscou interveio na Síria em 2015 em nome do regime sitiado de Bashar al-Assad, também transferiu cerca de trinta T-90As para o Exército Árabe Sírio (SAA), além de atualizar os T-62M e T-72. As forças armadas sírias poderiam usar desesperadamente essa infusão de blindados, pois haviam perdido mais de dois mil veículos blindados nos anos anteriores - especialmente depois que os rebeldes sírios começaram a receber mísseis TOW-2A americanos em 2014. Os T-90 foram espalhados entre a 4ª Divisão Blindada , a Brigada Águias do Deserto (composta por veteranos aposentados do SAA liderados por senhores da guerra pró-Assad) e Força Tigre, uma unidade de elite do SAA do tamanho de um batalhão especializada em operações ofensivas.


Em fevereiro de 2016, rebeldes sírios filmaram um vídeo de um míssil TOW sendo filo-guiado em direção a um tanque T-90 no nordeste de Alepo. Em um clarão ofuscante, o míssil detona. No entanto, quando a fumaça diminuiu, ficou evidente que a blindagem reativa a explosões Kontakt-5 do tanque detonara a ogiva de carga oca do míssil TOW antes do impacto, minimizando o dano. (Esse fato talvez não tenha sido apreciado pelo artilheiro do tanque, que na versão completa do vídeo saiu de uma escotilha já aberta e fugiu a pé.) No entanto, o vídeo se tornou viral.

Enquanto o T-90A ainda é superado pelos tanques principais de batalha ocidentais, ele possui vários sistemas defensivos, particularmente os versáteis mísseis anti-tanque que (todos, exceto alguns) os tanques Abrams e Leopard 2 não têm - e os mísseis anti-tanque destruíram muito mais veículos blindados nas últimas décadas do que os canhões dos tanques.

Se você olhar de frente para um T-90A, poderá notar os assustadores "olhos" na torre - um método confiável para distingui-lo dos T-72 modernizados de aparência semelhante. Na verdade, são ofuscadores infravermelhos projetados para interferir sistemas de mira laser em mísseis, e brilham com uma cor vermelha assustadora quando ativos. Os ofuscadores são apenas um componente do sistema de proteção ativa Shtora-1 do T-90, que também pode descarregar granadas de fumaça que liberam uma nuvem de aerossol que obscurece o infravermelho. O Shtora é integrado a um receptor de aviso a laser de 360 graus que aciona automaticamente as contra-medidas se o tanque for pintado por um laser inimigo - e pode até apontar a arma do tanque para a origem do ataque. A segunda linha de defesa do T-90A vem na forma de placas da blindagem reativa explosiva Kontakt-5, que foi projetada para detonar antes do impacto de um míssil, a fim de interromper o jato derretido de sua ogiva de carga oca e projetar metal adicional em seu caminho.

Ofuscadores infra-vermelhos Shtora-1.

A blindagem reativa do T-90 e o sistema de proteção ativa Shtora provaram-se uma contra-medida segura contra os mísseis guiados anti-tanque de longo alcance (anti-tank guided missile, ATGM)?

Em uma palavra, não - mas você apenas saberia disso caso seguisse muitos vídeos menos divulgados que descrevem a destruição ou captura de carros T-90 por forças rebeldes e governamentais.

ATGM Konkurs na Síria.

Jakub Janovský se dedicou a documentar e preservar as perdas registradas de blindados na Guerra Civil Síria por vários anos e recentemente divulgou um vasto arquivo de mais de 143 gigabytes de imagens de combate do conflito, que vão de atrocidades perpetradas por vários grupos a centenas de ataques de ATGM.

De acordo com Janovský, dos trinta carros transferidos para o Exército Árabe Sírio, ele sabe que cinco ou seis T-90A foram nocauteados em 2016 e 2017, principalmente por mísseis TOW-2A guiados filo-guiados. (Alguns dos tanques nocauteados, para esclarecer, podem ser recuperados com reparos pesados.) Outros quatro podem ter sido atingidos, mas não é possível determinar seu status após o ataque. Obviamente, pode haver perdas adicionais que não foram documentadas e há casos em que o tipo de tanque envolvido não pôde ser confirmado visualmente.

T-90 do Exército Árabe Sírio (SAA).

Além disso, os rebeldes da HTS (Organização para a Libertação do Levante) capturaram dois T-90 e os usaram em ação, enquanto um terceiro foi capturado pelo ISIS em novembro de 2017. Em junho de 2016, os rebeldes da Frente do Sham (Frente do Levante) eliminaram um T-90 com um TOW-2. As filmagens de drones feitas depois mostram a fumaça subindo da escotilha da torre e revelam os ofuscadores Shtora do T-90. Outro vídeo gravado em 14 de junho de 2016, em Alepo, mostra um T-90 fazendo uma curva fechada e correndo para se esconder atrás de um prédio - possivelmente ciente de um míssil TOW que está chegando. No entanto, o T-90 é atingido em sua blindagem lateral ou traseira. O tanque explode, espalhando detritos no ar, mas continua se movendo atrás da cobertura.

Outro T-90A foi atingido por um Konkurs feito na Rússia (semelhante ao TOW) ou o míssil AT-14 Kornet, mais poderoso, guiado a laser, perto de Khanassar, na Síria, ferindo o artilheiro. A equipe acabou abandonando o veículo quando um incêndio se espalhou do reparo da metralhadora para o veículo, onde começou a detonar as granadas de 125 milímetros no carregador automático de estilo carrossel. A colocação de munição no meio do tanque ao lado da tripulação, em vez de um compartimento de armazenagem separado como no M1, há muito tempo é uma vulnerabilidade dos projetos de tanques russos.

Equipamentos modernos do T-90 em evidência.

Enquanto isso, os rebeldes mantinham dois T-90 em uma fábrica de tijolos abandonada na província de Idlib. Em abril de 2017, um dos T-90A rebeldes, reforçado com sacos de areia em sua blindagem, aparentemente entrou em um frenesi ajudando as forças rebeldes a recuperarem a cidade de Maarden, segundo a mídia russa. Mais tarde, um dos T-90A foi recapturado pelo governo e o outro foi nocauteado - supostamente, por um tanque T-72 usando um sabot cinético na blindagem lateral.

Em outubro, o ISIS capturou um T-90A da 4ª Divisão Blindada perto de al-Mayadeen, no leste da Síria, quando se aventurou sozinho em uma tempestade de areia. Então, em 16 de novembro de 2017, o ISIS emboscou uma coluna blindada da Força Tigre e aparentemente explodiu uma torre do T-90A do seu chassis e deixou-a apodrecer de cabeça para baixo no deserto. A tripulação teria sido morta. No entanto, a mídia pró-Assad afirma que este foi o T-90 capturado anteriormente pelo ISIS, considerado inoperável e depois destruído para fins de propaganda.

T-90 do SAA capturado por militantes da Tahrir al-Sham (Organização pela Libertação do Levante), 2017. 

Isso não quer dizer que os sistemas defensivos do T-90 nunca funcionaram. Em um incidente notável registrado em 28 de julho de 2016, um tanque T-90 próximo às fazendas Mallah de Alepo foi atingido por um míssil TOW, mas emergiu aparentemente ileso da nuvem de poeira graças à sua blindagem reativa. Enquanto o veículo afastava-se freneticamente, a equipe do TOW o atingiu com um segundo míssil - o qual ele aparentemente sobreviveu apesar de sofrer danos.

Janovský diz que não tem conhecimento de carros T-90 tendo sido perdidos por armas de curto alcance, "uma vez que o regime raramente usava os T-90 em combate aproximado, especialmente após a captura de dois carros." O T-90 foi de fato "relativamente bem-sucedido" na opinião de Janovský, apesar das perdas devido ao "excesso de confiança e pouca coordenação com a infantaria, que tem sido um problema de longo prazo do SAA".

Visores térmicos Catherine FC da Thales.

Segundo Janovský, o recurso mais útil do T-90 provou ser seus sistemas ópticos e computador de controle de tiro superiores, comparado aos tanques russos anteriores. “Os T-90 tiveram bom desempenho quando tiveram a oportunidade de disparar contra rebeldes a longa distância ou à noite, quando os sistemas ópticos e o computador de controle de tiro modernos provaram ser uma grande vantagem.” De fato, o modelo T-90A começou a receber visores térmicos Catherine FC de fabricação francesa em meados dos anos 2000.


É claro que um pequeno número de T-90 não teria um grande impacto em uma guerra civil que se arrastava há anos. No entanto, Janovský ainda vê lições a serem tiradas da situação. "O regime também teve sorte de que os rebeldes nunca conseguiram nenhum ATGM moderno que tenha modo de ataque por cima - o qual mataria confiavelmente o T-90". Exemplos de armas de ataque por cima incluem o míssil Javelin e o TOW-2B.

Demonstração de um ATGM Javelin atacando a torre de um T-72 por cima.

“Na minha opinião, o principal problema do T-90 (e da maioria dos outros tanques modernos) é a completa falta de um Sistema de Proteção Ativa (um que atire nos mísseis), idealmente com uma cobertura de 360 graus, mas 270 graus deve ser o mínimo. Isso não significa apenas que ele é vulnerável a ser incapacitado por rojões baratos em combate urbano, mas também por mísseis anti-tanque guiados disparados de um ângulo inesperado. Quando você considera o alcance dos ATGMs atuais [tipicamente duas a cinco milhas], será bastante comum que você tenha uma oportunidade de tiro lateral contra um tanque inimigo atacante a partir de posições em frente ao local de ataque.”

T-90 em base russa na Síria.

De fato, a Rússia planeja atualizar seus T-90A - atualmente menos avançados que os T-90MS em serviço com o exército indiano - para uma variante do T-90M com novos sistemas de proteção ativa de ataque-duro [quando ataca fisicamente a ameaça], blindagem reativa atualizada e um canhão 2A82 mais poderoso. Por fim, as perdas na Síria mostram que qualquer tanque - seja T-90, M-1 ou Leopard 2 - é vulnerável em um campo de batalha no qual ATGMs de longo alcance proliferaram. Sistemas de proteção ativa e sistemas de aviso de mísseis são vitais para atenuar esse perigo - mas também o emprego tático cuidadoso, equipes treinadas com competência e cooperação aprimorada com a infantaria para minimizar a exposição a ataques de longo alcance, repelir emboscadas e fornecer olhos extras para possíveis ameaças.

Sébastien Roblin é mestre em Resolução de Conflitos pela Universidade de Georgetown e atuou como instrutor universitário do Corpo de Paz na China. Ele também trabalhou em educação, edição e reassentamento de refugiados na França e nos Estados Unidos. Atualmente, ele escreve sobre segurança e história militar para o site War Is Boring. Esta peça foi originalmente publicada em 2018 e está sendo republicada devido ao interesse do leitor.

Bibliografia recomendada:

TANKS:
100 Years of Evolution,
Richard Ogorkiewicz.

T-80 Standard Tank: The Soviet Army's Last Armored Champion,
Steven Zaloga.

Leitura recomendada:


Barry Sadler e a história por trás da Balada dos Boinas Verdes


Por Eric SOF, Spec Ops Magazine, 7 de fevereiro de 2020.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 7 de fevereiro de 2020.

A música chamada Ballad of the Green Berets (Balada dos Boinas Verdes) tornou-se um símbolo da unidade de elite do Exército dos EUA. O autor da música é Barry Sadler. Ele era um homem alistado e um Boina Verde. Durante a guerra do Vietnã, Sadler era médico das forças especiais, onde pisou em uma armadilha pungi e ficou gravemente ferido.

Ele entrou no "Hall da fama" como o autor de The Ballad of the Green Berets, que estava na lista dos mais vendidos por várias semanas. Ele era o autor e cantor.


Esquemática das armadilhas pungi.

A Vida

Barry Sadler, na íntegra Barry Allen Sadler, (nascido em 1 de novembro de 1940, Carlsbad, Novo México, EUA - faleceu em 5 de novembro de 1989, Murfreesboro, Tennessee), soldado americano, cantor, compositor e autor de ficção pop que é lembrado principalmente por sua música mais vendida, "The Ballad of the Green Berets".

Barry Sadler, ele usa as asas paraquedistas americanas e vietnamitas.
(Britannica)

Ele também escreveu uma série de romances chamados Casca, o Mercenário Eterno, que eram bastante populares. Ele era amigo da revista Soldier of Fortune (Soldado da Fortuna). O editor da revista Soldier of Fortune Magazine (SOFMAG), Robert K. Brown, um Boina Verde no Vietnã se associou a Barry, que se tornou um convidado frequente nas notórias convenções da Soldier of Fortune em Las Vegas. Ele cantou para os congressistas e, claro, a Balada das Boinas Verdes. Ele era um favorito de longa data.

A morte de Barry Sadler

Barry Sadler passou muito tempo na América Central, onde foi baleado na cabeça em 1988 sob circunstâncias misteriosas na Cidade da Guatemala. Testemunhas e a polícia disseram que ele se matou acidentalmente. Outros alegaram que ele foi vítima de uma tentativa de assalto ou assassinato. A revista Soldier of Fortune pagou por um vôo médico para trazê-lo para os Estados Unidos, mas ele morreu um ano depois, aos 49 anos de idade. Aproveite porque isso nunca envelhece. Sadler não está mais entre nós, mas sua música é eterna.

A Balada dos Boinas Verdes


Nota do Tradutor: A capa da primeira edição brasileira do livro Os Boinas Verdes: Episódios da Guerra do Vietnã, de Robin Moore, trás a famosa foto de Barry Sadler com sua boina verde. No filme Tropa de Elite, o personagem Capitão Nascimento fala que a cada 100 candidatos do BOPE que entram no curso, apenas 3 se formam; a proporção cantada por Sadler em A Balada dos Boinas Verdes.

Os Boinas Verdes:
Episódios da Guerra no Vietnã.
Robin Moore.

O pior general americano de todos os tempos: “Um general que nunca venceu uma batalha nem nunca perdeu uma corte marcial”

General James Wilkinson.

Por William Mclaughlin, War History Online, 26 de março de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 7 de fevereiro de 2020.

O título de "pior general da história dos EUA" certamente não é algo a se almejar, mas onde houve grandes nomes como Patton e Grant, é preciso que haja falhas absolutas. Infelizmente para a jovem nação dos EUA, James Wilkinson provavelmente detém firmemente o título de pior general.

Wilkinson nasceu no local perfeito para seu futuro registro, Benedict, Maryland. Wilkinson serviu como capitão nas primeiras batalhas da Guerra Revolucionária, como a Batalha por Dorchester Heights. Ele serviu como assessor de Benedict Arnold antes de se transferir como ajudante-de-ordens de Horatio Gates.

Em 1777, Gates enviou Wilkinson ao Congresso para entregar as notícias da vitória em Saratoga. Saratoga foi uma vitória americana criticamente importante, mas Wilkinson tinha vários assuntos pessoais aos quais tratava antes de divulgar a notícia. Quando ele apareceu no Congresso, ele embelezou muito seu papel na vitória crucial, de modo que recebeu grandes honras por seu papel fabricado na batalha. Essas honras incluíam a nomeação para o recém-criado Conselho de Guerra e o status honorário de General-de-Brigada.

Saratoga foi uma grande vitória para os americanos.
Wilkinson teve um pequeno papel, principalmente como mensageiro para reunir mais reforços.

Horatio Gates se cansou dos enfeites e mentiras de Wilkinson e o forçou a demitir-se em 1778. Wilkinson logo se re-engajou depois que o Congresso o nomeou numa função como responsável-geral pelas vestimentas do exército, um trabalho que Wilkinson rapidamente se entediou, demitindo-se após alguns anos.

Wilkinson, em seguida, estabeleceu-se no generalato da milícia da Pensilvânia e serviu como um deputado estadual. Ele se mudou para o Kentucky, que ainda estava sob a propriedade da Virgínia. Aqui Wilkinson realmente começou sua série de péssimos serviços aos EUA. Ele começou visitando a Louisiana, de propriedade espanhola, e trabalhou principalmente em segredo com o governador espanhol Miro. Ele conspirou para dar ao Kentucky um monopólio comercial sobre o Missouri em troca de repassar informações à Espanha e promover os interesses espanhóis.

Wilkinson então se meteu em uma pequena incursão durante a Guerra contra os Índios do Noroeste. Esses raides foram bem pequenos em escala, mas o sucesso de Wilkinson aqui o levou a ser promovido a tenente-coronel, com uma nomeação como brigadeiro-general logo em seguida. Wilkinson era conhecido como um falador língua-de-prata, tornando suas extravagantes vanglórias mais convincentes, a menos que alguém conhecesse seus truques, como Horatio Gates.

Anthony Wayne comandando a Batalha de Fallen Timbers.
Uma batalha bem-sucedida, o comando de Wayne ainda foi implacavelmente criticado por seu rival Wilkinson.

Wilkinson teve uma longa rivalidade com o general da breve Legião dos Estados Unidos, Anthony Wayne. Wayne descobriu fortes evidências da relação traidora de Wilkinson com os espanhóis. Em resposta, Wilkinson atirou inúmeras acusações e críticas em Wayne. Apesar do sólido histórico de Wayne e do trabalho em favor da corte marcial de Wilkinson, nada poderia ser feito para remover Wilkinson de sua posição. Wayne acabaria morrendo em 1796, ainda envolvido na rivalidade.

Um julgamento confuso, no qual Aaron Burr foi acusado de traição logo seguiu-se. Wilkinson foi envolvido no julgamento e quase condenado por erro de julgamento de traição, essencialmente ajudando ou conscientemente permitindo a traição. Embora não houvesse acusações contra Wilkinson, o capataz do grande júri disse o seguinte sobre Wilkinson: "o único homem que eu jamais vi que era da casca até o âmago um vilão".

As maiores batalhas de Wilkinson ocorreram durante a Guerra de 1812. Em uma campanha canadense, Wilkinson serviu em operações conjuntas em Ontário. A operação envolvendo 8.000 soldados americanos foi adiada logo no início, porque Wilkinson precisou de algumas semanas extras para preparar suas tropas. A subseqüente Batalha de Crysler's Farm foi uma vitória britânica/canadense decisiva, onde menos de 1.000 homens repeliram o ataque mal planejado de 8.000 americanos.

O desastre levaria a outra audiência. Enquanto sua própria corte marcial ainda estava sendo preparada, Wilkinson partiu em uma campanha agressiva para recuperar algum crédito para si. Com 4.000 homens, Wilkinson partiu para tomar uma guarnição britânica de 80 homens que guardava o Rio Lacolle. Depois de serem atrasados pela neve e pela lama, os homens de Wilkinson começaram o ataque.

Um exemplo de um foguete Congreve que Wilkinson e seus homens enfrentaram.
(Richard Tennant)

Os britânicos estavam defendendo uma robusta fortaleza com um sólido moinho de pedra. Eles também tinham uma nova artilharia de foguetes. Em vez de lançar um ataque completo com sua força esmagadora, Wilkinson se contentou em trocar tiros. Os foguetes eram terrivelmente imprecisos, mas ainda conseguiram ferir dezenas de americanos. Entrementes, o solo era macio demais para os americanos montarem sua artilharia mais pesada.

O tiroteio continuou por tanto tempo que as guarnições britânicas vizinhas (cerca de 420 homens no total) entraram na luta. Apesar de estarem em menor número, alguns dos reforços escaparam pelas linhas americanas e atacaram a artilharia. Feriram o comandante de artilharia e vários oficiais, causando confusão devastadora nos americanos. Eventualmente, canhoneiras britânicas navegaram rio acima e choveram fogo.

Ainda não se comprometendo a um ataque completo, Wilkinson finalmente ordenou uma retirada. Ele perdeu 41 mortos e 226 feridos ou desaparecidos. Os britânicos perderam 11 mortos e 50 feridos ou desaparecidos. A batalha desastrosa levou a outra investigação militar, além da corte marcial da batalha anterior de Crysler's Farm. Wilkinson escapou das acusações, mas foi dispensado do comando. Mais tarde, ele morreu em 1825 na Cidade do México, atuando como emissário.

As principais ações de Wilkinson certamente variaram de ineptas a completamente traidoras e egoisticamente cruéis, mas ele teve inúmeras ações menores e relações que o tornaram ainda mais desprezível para seus colegas e historiadores posteriores. Theodore Roosevelt escreveu uma vez que "em toda a nossa história, não há personagem mais desprezível" do que Wilkinson. Vários oficiais tiveram grande dificuldade em servir com ele e tentaram se transferir para evitar compartilhar o campo de batalha com Wilkinson. Parece que ele serviu egoisticamente a seus próprios interesses e se livrou de qualquer problema em que se metesse por conta da sua lábia. Um comandante militar que os Estados Unidos desejam que nunca tivessem tido.

Sobre militares estrangeiros trabalhando com as forças americanas


Por Tom Ricks, Task&Purpose, 8 de outubro de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 7 de fevereiro de 2020.

Ei, já existe um guia para trabalhar com as forças armadas dos EUA!

E é bem engraçado.

Outro dia, sugeri que seria bom ter uma lista de leitura para aliados sobre como trabalhar com as forças armadas dos EUA. O velho @DarkLaughterTBD me ultrapassou e me indicou um guia da USAID para exatamente isso, em um apêndice do manual de operações de campanha. Eu apenas olhei para ele, e ele é muito bom. Eu senti que ele era informado por algumas experiências difíceis.

Aqui estão alguns destaques sobre como trabalhar com as forças armadas dos EUA:

- Espere por reuniões, muitas delas. Mas se você tomar decisões baseadas em consenso nessas reuniões, os oficiais militares o considerarão "ineficiente e sem foco". (O guia sugere que as organizações de assistência autônoma se recusam a receber ordens. Sinto cheiro de problemas.)

- Eles quererão dados "detalhados" sobre o que você está fazendo. Mas, às vezes, relutam em compartilhar suas próprias informações, citando "segurança operacional".

- Se você não tiver planos, a organização militar o fará para você - e farão isso a partir de sua própria perspectiva. "A organização militar geralmente preencherá o vazio como bem entender."

- A principal prioridade deles será proteger sua própria força, e isso afetará suas operações, "liberdade de movimento, segurança e logística".

- Nenhuma das opções acima se aplica aos operadores especiais, que são de uma raça diferente. "Algumas diferenças significativas separam essas unidades e indivíduos do perfil militar padrão". Em outras palavras, os caras da SOF são um bando de hippies, "culturalmente conscientes" e "mais flexíveis e criativos e menos rígidos em seus pensamentos e idéias".

- Encontre o chefe de estado-maior do comandante da Força-Tarefa Conjunta. Diga a ele quem você é e o que está fazendo. Ele é, o guia nos diz, o "guardião do pórtico".

- Ao trabalhar com dados, as organizações internacionais de ajuda usarão o sistema métrico, mas as forças armadas dos EUA não, pelo menos para coisas como quantidades de água potável disponíveis. Eles gostam de galões, ok? Você tem algum problema com isso? SUMA DAQUI com seus quilolitros.

- Se você depende das forças armadas para moradia, alimentação, comunicação ou transporte, você corre o risco de ser visto como um "requisito de apoio", não um ativo.

Thomas Edwin "Tom" Ricks é um jornalista e escritor americano especializado em questões militares e de segurança nacional, escrevendo largamente sobre a cultura organizacional das forças armadas dos Estados Unidos. Suas maiores obras são Fiasco: The American Military Adventure in Iraq (Fiasco: A aventura militar americana no Iraque, 2006) e The Generals: American Military Command from World War II to Today (Os Generais: Comando militar americano da Segunda Guerra Mundial aos nossos dias, 2012). Ele foi duas vezes vencedor do Prêmio Pulitzer de Relatórios Nacionais.

Forças especiais russas mostram aos alunos da quinta série como enfrentar multidões

(Zlattv.ru)

Do jornal The Moscow Times, 29 de dezembro de 2019.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 7 de fevereiro de 2020.

Uma unidade de forças especiais (Spetsnaz) demonstrou suas habilidades de combate corpo-a-corpo a estudantes do ensino fundamental na Rússia central na semana passada, provocando indignação entre os pais, informou uma emissora de televisão local.

Os guardas do serviço prisional que usavam capacetes e escudos de proteção mostraram aos alunos da quinta série como atacar um inimigo imaginário em um auditório escolar na cidade de Zlatoust, na região de Chelyabinsk, como visto em um segmento de notícias do canal local, TV Zlat. A maioria dos pais das crianças não foi informada com antecedência da manifestação e inundou a escola com ligações depois de ver a reportagem.

Durante a exibição, o líder da unidade é visto ordenando que seus subordinados mostrem aos alunos reunidos como atacar em diferentes posições, enquanto uma faixa com a inscrição "vida pela pátria, honra a ninguém!" é vista na parede.

Críticos chamaram demonstrações semelhantes de poder militar para jovens russos de uma tentativa equivocada das autoridades de criar uma base leal de futuros eleitores.

"Acredito que demonstrações de força física contra os cidadãos não podem de forma alguma arraigar o patriotismo e o amor pela pátria", escreveu a deputada local Olga Mukhometyarova em um post de mídia social na segunda-feira.

O gabinete do prefeito de Zlatoust ligou para o diretor da escola para descobrir as circunstâncias da manifestação, informou o site de notícias Podyom da Rússia, depois que os canais nacionais publicaram segmentos sobre o vídeo.

No início deste mês, crianças em idade escolar na cidade receberam exibições de manuseio de fuzil e luta por garotos e moças usando camisetas com o logotipo do Ministério de Situações de Emergência.

Mais recentemente, as unidades policiais da república do Tartaristão recrutaram alunos do nono ano para se apresentarem como manifestantes em uma demonstração de táticas de dispersão de multidões. A polícia disse que estava investigando o incidente, que foi filmado na sexta-feira passada.

"O país inteiro está discutindo como a polícia do Tartaristão praticou dispersar comícios com crianças em idade escolar", escreveu Mukhometyarova.

"[Agora nossa] região também se destacou", acrescentou.

Nota do Tradutor: Esse tipo de comportamento não é novidade na Rússia. Com o fim da URSS em 1991, com a ideia do "patriotismo se esvaindo diante do perverso capitalismo", vários grupos russos de treinamento paramilitar para jovens foram criados - primeiro de forma natural, e depois apoiados ativamente pelo estado - emulando as antigas turmas de desportos da era soviética (que serviam de preparação militar antes dos 18 anos). O documentário à seguir mostra alguns desses grupos.

FOTO: Grupo de Artilharia da Divisão Anfíbia do Corpo de Fuzileiros Navais, 1977

Grupo de Artilharia da Divisão Anfíbia do CFN, turma de 1977.

Bibliografia recomendada:

World Special Forces Insignia.
Gordon L. Rottman.

Leitura recomendada:



quinta-feira, 6 de fevereiro de 2020

Mercenários dificilmente são máquinas de matar

Robert K. Brown, fundador da revista Soldier of Fortune, na Rodésia.

Por William Boudreau, Soldier of Fortune Magazine, 28 de janeiro de 2018.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 6 de fevereiro de 2020.

Durante meu serviço na África como diplomata de carreira americano, conheci vários mercenários que estavam envolvidos em uma missão ou outra. Nenhum deles se encaixa no estereótipo comum - matadores anti-sociais. Quando se ouve sobre atrocidades em uma ação mercenária, quase sempre são as forças opostas que as cometem. Um excelente exemplo é o Congo, após sua independência em 1960. O caos é a regra desde seu primeiro dia como nação. Moise Tshombe foi astuto o suficiente para reconhecer que precisava de mercenários para garantir a segurança de sua província de Katanga, com suas valiosas minas. Eles enfrentaram todos os que chegavam no país fragmentado, provando serem muito superiores aos esfarrapados exército nacional e grupos rebeldes. Inicialmente, eles estavam protegendo o governo provincial katanguês e depois foram contratados pelo presidente Mobutu para liderar os esforços do exército nacional para repelir os rebeldes, principalmente os Simbas, apoiados por regimes comunistas e radicais. Esses países de esquerda fizeram o possível para minar os mercenários, usando a mídia e os fóruns das Nações Unidas para denunciarem os mercenários como bárbaros. Eles descreviam o assassinato brutal de civis inocentes como atos selvagens dos mercenários estrangeiros, enquanto havia evidências sólidas de que a oposição era a autora. Ao contrário da propaganda da época, os mercenários que eu conhecia valorizavam a vida - deles e de outros. A maioria tinha serviço anterior em suas forças armadas nacionais e foi contratada por suas habilidades, disciplina e capacidade de cumprir a missão.

Major Bob MacKenzie (boina) quando era comandante de uma equipe de reconhecimento na Bósnia.
Foto cedida por Sibyl MacKenzie.

Não havia americanos entre os mercenários que conheci. Eles eram europeus de vários países, sul-africanos e rodesianos. Outro grupo que conheci foram os exilados cubanos contratados pela CIA para diversas tarefas, incluindo pilotar suas aeronaves da Organização Internacional de Manutenção Terrestre Ocidental (WIGMO). A maioria dos mercenários tinha outras ocupações quando não estava em missões; de fato, eles levaram vidas duplas. Entre eles estavam os proprietários de plantações, mecânicos de garagem, importadores/exportadores, trabalhadores da construção civil, agricultores, vendedores de seguros e assim por diante. Eu conheci esses guerreiros tomando cerveja em bares e eventos sociais em Kinshasa e no campo. Viajei para a maior parte do país, para as províncias de Katanga, Orientale, Equateur, Nord Kivu e por todo o Baixo Congo. Eu conheci mercenários em várias situações e nenhum me pareceu irresponsável e insensível. Embora não sejam mais membros de unidades militares padrão, eles se comportavam como soldados. Claro, eles chutavam o balde quando estavam de folga, eles não eram santos, afinal, mas se mantiveram sob controle. Eles me pareciam uma irmandade, cuidando um do outro.

Robert C. MacKenzie (em pé, asas no chapéu) posando com homens das unidades comando da Serra Leoa que ele estava treinando com os guardas de segurança gurca.
Andy Myers é o segundo da esquerda, ajoelhado.

Quando saía para “o mato” (the bush) - qualquer área não-urbana - para cumprir meus deveres de checar cidadãos americanos (a maioria eram missionários), visitei mercenários na área. O bem-estar dos americanos espalhados por todo o país era de minha responsabilidade como funcionário político/consular na embaixada. Eu aproveitei essas oportunidades para me encontrar com os mercenários que estavam na área. Discutimos o progresso deles na derrota dos rebeldes Simba, junto com seus feiticeiros-curandeiros, que estavam tentando estabelecer um regime comunista separado com base na província de Orientale.

Cito um incidente para ilustrar o caráter desses mercenários. Aprendi com meus contatos missionários que alguns estudantes universitários americanos estavam viajando pelo norte do Congo, viajando para o leste. Esses aventureiros estavam alheios ao perigo que havia no caminho deles. Eles pretendiam passar por uma área na província de Orientale com presença Simba conhecida; eles não sabiam que estavam entrando em uma zona de guerra. Eles não sabiam nada dos simbas e sua selvageria, que não poupava vidas. Entrei em contato com mercenários que conheci e expliquei a situação. Eles tomaram medidas imediatas, localizaram os caminhantes, insistiram na necessidade urgente de sair da área e os escoltaram pelo leste do Congo até Ruanda. Eles se preocupavam com vidas inocentes e os trouxeram para a segurança.

Como escrevi em minhas memórias, A Teetering Balance (Um Equilíbrio Instável), descrevendo nossos esforços para combater as tentativas soviéticas de conquistar uma posição na África durante a Guerra Fria, Ernesto "Che" Guevara se envolveu com grupos rebeldes no Congo. “Ansioso por se envolver em atividades revolucionárias mais uma vez, o Congo parecia um terreno fértil.” Com a benção de Fidel Castro, ele entrou no norte da província de Katanga pela Tanzânia, com cubanos negros, em abril de 1965. Seu objetivo era montar um campo de treinamento para "freedom fighters" ("combatentes da liberdade") para operar "não apenas no Congo, mas também em Angola, Moçambique e Rodésia, África do Sul e sudoeste da África.” O Coronel Michael Hoare liderou mercenários no ataque ao grupo de cubanos e simbas de Guevara. Os exilados cubanos da CIA pilotando aviões WIGMO ajudaram a atacar os rebeldes. Guevara fez o possível para inspirar zelo e disciplina entre os simbas, mas ficou frustrado com "o que ele considerava a deficiência de motivação dos rebeldes". Compelido por sucessos mercenários, ele abandonou seus esforços após sete meses para procurar circunstâncias mais promissoras para espalhar seu ardor revolucionário.

A Teetering Balance: An American diplomat's career and family.
William Boudreau.

Coronel Michael Hoare, falecido em 2 de fevereiro de 2020, aos 100 anos.

Minhas observações sobre mercenários não se limitam à operação no Congo. Alguns estavam ajudando movimentos de libertação em Angola, em sua luta pela independência de Portugal. Encontrei-me com outras pessoas nas Comores quando fui designado para Madagascar, com responsabilidade adicional pelas Comores. Ahmed Abdallah fora nomeado presidente das Comores pelo Coronel Bob Denard, que eu conhecera no Congo, e um bando de mercenários. Vários permaneceram nas ilhas e eu os encontraria nas minhas visitas. Sendo as Comores uma república islâmica, nenhuma bebida era permitida no país, exceto em alguns hotéis. Assim, os bebedouros eram limitados e eles criaram um elenco interessante de personagens. Alguns mercenários visitaram um colega diplomata e eu em Washington, DC, depois que eu deixei o Congo. Levei um belga para um jogo de futebol americano universitário e passei a maior parte do jogo explicando seus meandros. Nossos visitantes foram todos treinados para se comportarem bem dentro de casa e sociáveis com os vizinhos.

O belga Jean Schramme e o francês Bob Denard no Congo.
Schramme se mudou para o Brasil, morrendo em Rondonópolis/MT em 1988.

When Olive Leaves Beckon.
William Boudreau.

Escrevi When Olive Leaves Beckon (Quando Olive deixa Beckon) com o objetivo de retratar mercenários sob a luz apropriada. Eu afirmo que, em geral, os mercenários se misturam à sociedade quando não estão em missões. Eles não são máquinas de matar raivosas, como alguns acreditam. Eles voltam para casa e são aceitos pelos vizinhos como membros contribuintes de suas comunidades. Não defenderei um prêmio humanitário para nenhum mercenário que eu tenha conhecido. No entanto, eles abraçam a humanidade. Meu argumento é que eles eram racionais, compassivos, interessantes para conversar e desprovidos de tendências psicóticas.

A perda de meu amigo espanhol, Alfonso, foi uma tragédia pessoal. Eu o conheci no Congo quando ele estava passando de mercenário para trabalhar em importação/exportação. Ele ficou noivo de uma belga e estava ansioso por uma mudança de estilo de vida. Ele visitou nossa casa várias vezes e entreteve nossos dois filhos. Quando fiquei de folga com minha família, convidei-o para ficar em nossa casa enquanto estávamos fora. Ele ficou lá por algumas semanas até o nosso retorno. Logo depois disso, os congoleses, o massacraram, incluindo castração, e seus restos jogados no rio Congo. Dediquei When Olive Leaves Beckon à sua memória.

SOF Mag de novembro de 2013.

FOTO: Bateria feminina de Taiwan

Primeira bateria feminina de Taiwan.

Uma bateria de obus 105mm formada por 7 mulheres, o efetivo para essa peça, participou de exercícios no 23 de maio de 2018, no condado de Penghu, quando as forças de defesa de Taiwan realizaram exercícios de artilharia antes dos próximos exercícios militares de Han Kuang - o exercício anual das Forças de Defesa de Taiwan.

Uma das baterias que participavam dos exercícios de artilharia de Penghu era composto inteiramente de mulheres, praças e oficiais, sendo a primeira unidade de combate feminina na história das forças armadas de Taiwan.