terça-feira, 7 de abril de 2020

Certos “aspectos culturais” das forças especiais dos EUA explicariam problemas de disciplina


Por Laurent Lagneau, Zone Militaire OPEX360, 29 de janeiro de 2020.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 7 de abril de 2020.

Nos últimos anos, as forças especiais americanas enfrentaram vários escândalos de alto nível e casos disciplinares. O caso do antigo ex-SEAL da Marinha Edward Gallagher é um exemplo. Acusado de, entre outras coisas, ter cometido um crime de guerra por alguns de seus companheiros, ele foi finalmente condenado por ter sua foto tirada ao lado do cadáver de um jihadista morto no Iraque. Mas o presidente Trump assumiu a causa desse oficial marinheiro, a ponto de forçar a renúncia de Richard Spencer, então secretário da Marinha.

"Transformamos nossos caras em máquinas de matar e depois os julgamos quando matam", indignou-se o chefe da Casa Branca, quando  concedeu seu perdão a Ed Gallagher e a outros dois oficiais das forças especiais americanas.

Precisamente, é aqui que provavelmente está o problema... Em julho, o Almirante Collin Green, chefe do Comando de Guerra Especial Naval (Naval Special Warfare Command), disse estar preocupado com um "problema de ordem e disciplina" dentro de suas tropas. E de considerar que tal tinha de ser resolvido "rapidamente". E o General Richard Clarke, chefe do Comando de Operações Especiais dos EUA (US Special Operations CommandUSSOCOM) havia solicitado um relatório para remediá-lo.


A comissão reunida para elaborar esse "exame crítico", composto por oficiais ainda em serviço ativo ou aposentados, acaba de apresentar suas conclusões [.pdf]. Como resultado, acredita-se que esses problemas disciplinares sejam o resultado do envolvimento excessivo das forças especiais americanos desde 2001 em operações de contraterrorismo e contra-insurgência.

"Descobrimos que certos aspectos de nossa cultura às vezes estabelecem as condições para um comportamento inadequado", disse o General Clarke. No entanto, ele acrescentou: "Temos uma cultura proativa e orientada para a ação. É essa cultura que faz todo o nosso valor", mas" quase 20 anos de conflito permanente desequilibraram essa cultura em favor do uso da força e do sucesso das missões, em detrimento do treinamento", resumiu o General Clarke.

"Em alguns casos, esse desequilíbrio criou condições para a conduta inaceitável devido à falta de liderança, disciplina e responsabilidade", acrescentou o General Clarke.

Além do mais, fazer parte de uma unidade de elite pode "subir à cabeça" dos mais jovens. "O tratamento que os candidatos a operações especiais recebem durante sua seleção e treinamento também promove "um sentimento perigoso", sublinha o relatório, que também lamenta a importância excessiva dada ao treinamento físico" em detrimento do treinamento profissional e de aculturação específicos ao serviço”.


A falta de treinamento de enquadramento também é um problema. De fato, as unidades do USSOCOM colocariam "muita ênfase na experiência de combate para medir o valor" de seus líderes.

"Os desdobramentos operacionais, em particular nos locais onde o combate é possível, são avaliadas acima de tudo e percebidos como a expressão máxima da competência", observa o relatório, que lamenta que outras qualidades não sejam melhor consideradas.

Além disso, "a apreciação insuficiente dos líderes subalternos, uma abordagem desequilibrada do treinamento militar profissional e os requisitos não-codificados para oficiais enfraqueceram as práticas de liderança, disciplina e responsabilidade", é estimado no documento, que, além disso, não fala da possível influência das síndromes de estresse pós-traumático nesses casos de quebra da disciplina.


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