sexta-feira, 9 de setembro de 2022

FOTO: Cachorros táticos do RAID


Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 9 de setembro de 2022.

Foto de comunicação social mostrando operadores e cães do RAID posando juntos, 12 de setembro de 2019. Os europeus fazem uso intensivo de cachorros táticos em suas operações, chamados "cães de assalto" no sistema francês (chien d'assaut).

Na foto estão estão 3 pastores belgas Malinois do RAID, com Leïko à esquerda especializada na busca de explosivos, assim como Meska no centro e Jackady à direita, um dos cães de assalto da unidade. Ao garantir uma certa eficiência e utilidade, o cão é essencial dentro do grupo.

O RAID (Recherche, Assistance, Intervention, Dissuasion / Busca, Assistência Intervenção, Dissuasão) é a unidade de intervenção especial da Polícia Nacional francesa, o equivalente ao famoso GIGN fundado em 1985. Sua primeira missão foi um resgate de reféns no tribunal de Nantes pouco tempo depois, em dezembro de 1985.

Bibliografia recomendada:

European Counter-Terrorist Units 1972-2017,
Leigh Neville e Adam Hook.

Leitura recomendada:




FOTO: Sniper na chuva16 de setembro de 2020.


quinta-feira, 8 de setembro de 2022

O Fiat-Ansaldo CV-35 no desfile da vitória do Talibã

Talibãs desfilando em cima de um tankette italiano CV-35 em Kandahar,
31 de agosto de 2022.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 8 de setembro de 2022.

Um tankette Carro Veloce CV-35 (L3/35), de fabricação italiana, usado pelo Talibã em um desfile em Kandahar, 31 de agosto de 2022. O tankette carrega, além dos militantes, a nova bandeira branca nacional, a antiga bandeira do Talibã. A foto foi postada por Lukas Muller  (@aaf_lukas) no Twitter hoje, quinta-feira dia 8 de setembro.

O desfile de 31 de agosto celebrava a vitória sobre os Estados Unidos e a Coalizão, marcando o primeiro aniversário da retirada dos ocidentais e da criação do Emirado Islâmico do Afeganistão, liderado pelo Talibã.

A bandeira nacional do Emirado Islâmico do Afeganistão é a bandeira branca simbolizando pureza e fé, e consiste em um campo branco com um Shahada preto. Significando "o testemunho", este é um juramento islâmico, um dos Cinco Pilares do Islã e parte do Adhan. Lê-se:

"Testemunho que não há deus senão Alá (Deus), e testemunho que Muhammad (Maomé) é o mensageiro de Alá."

Essa bandeira adotada em 15 de agosto de 2021 com a vitória do Talibã na guerra de 2001-2021. Desde a Guerra Anglo-Afegã de 1919, também conhecida como Guerra da Independência, o Afeganistão usou cerca de 19 bandeiras nacionais, mais do que qualquer outro país nesse período. A bandeira nacional teve as cores preta, vermelha e verde na maioria das vezes durante o período; como foi o caso da agora extinta República Islâmica do Afeganistão (2004-2021).

T-62M do emirado islâmico durante o desfile,
também com a bandeira branca.

O CV-35 é um veículo leve sob lagartas dos anos 1930, e é notável por sua capacidade fora de estradas e sobrepujando obstáculos em terreno acidentado; lembrando que o Afeganistão é um país montanhoso com poucas estradas. No entanto, já era totalmente obsoleto em 1940. O Afeganistão adquiriu o tankette italiano na segunda metade da década de 1930. Dado que o veículo da Fiat-Ansaldo foi homologado no Regio Esercito italiano em 1936, acredita-se que os CV-35 afegãos foram entregues à partir de 1937 e permaneceram em serviço por muitas décadas.

Outra foto do velho guerreiro durante o desfile.

Depois da Segunda Guerra Mundial, o Exército Real Afegão modernizou os seus tankettes com ajuda soviética; seu novo patrono e que teria efeitos cataclísmicos no país. Ligeiro, porém mal protegido por meros 15mm de blindagem máxima, o tankette era muito vulnerável. Uma das melhorias feitas foi justamente a substituição das duas metralhadoras de 8mm Fiat 14/35 por duas metralhadoras pesadas KPV de 14,5mm soviéticas. Os outros veículos mantendo o seu armamento original foram usados em serviço de policiamento e vigilância por milícias locais.

A aparição de um veículo tão antigo no desfile da vitória talibã é algo notável e marcante. O Museu de Cabul mantinha um CV-35 em bom estado até aonde se tem notícia, o que indica uma viatura com mais de 75 anos de construção ainda preservada.

O CV-35 nos trópicos

Desfile dos Fiat-Ansaldo CV-35 brasileiros.
Fuzileiros navais ladeiam a avenida.

O Brasil também adquiriu o CV-35 na década de 1930. Tal qual como o Afeganistão, a capacidade em terreno acidentado e baixo preço do veículo. E tal qual como o Afeganistão, foi o segundo veículo nacional depois do lendário Renault FT-17. O Brasil comprou 23 tankettes em 1938, formando o Esquadrão de Auto-Metralhadoras.

Dentro desse esquadrão havia 18 viaturas armadas com metralhadoras duplas Madsen de 7mm, com os outros 5 veículos sendo de comando e armados com uma metralhadora pesada Breda 13,2mm cada um. Desta forma, o esquadrão possuía quatro pelotões de cinco carros cada; todos devidamente marcados por naipes de cartas do baralho. O Esquadrão de Auto-Metralhadoras (designação francesa dos tanquetes) foi filmado pelos ingleses pelo British Pathé quando fazia funções de vigilância no saliente nordestino, em 1942, em prol do esforço de guerra aliado na campanha do Atlântico.


Leitura recomendada:

A primeira mulher piloto do Afeganistão agora está lutando para voar pelas forças armadas dos EUA6 de julho de 2022.

GALERIA: Monumento aos soldados soviéticos mortos no Afeganistão23 de julho de 2022.

GALERIA: Graduação no ANASOC13 de abril de 2020.

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O Tanque está morto: conclusão precipitada?12 de agosto de 2022.

Como a China vê a retirada dos EUA do Afeganistão21 de maio de 2021.

GALERIA: Posto-rádio da Milícia Bolivariana da Venezuela em Caracas


Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 8 de setembro de 2022.

Soldados armados da Milícia Bolivariana da Venezuela estabelecem uma operação de rádio no topo de um arranha-céu durante o exercício "Escudo Bolivariano 2020" em Caracas, Venezuela, em 15 de fevereiro de 2020.

A Venezuela possui vários arranha-céus, com a maioria concentrada na capital Caracas, e essas plataformas elevadas permitem pontos de controle estratégico em uma hipotética defesa da capital bolivariana. A Milícia Bolivariana, identificada pelo camuflado rajado e os gorros de aba larga, está armada com fuzis FN FAL que atualmente são a primeira linha da milícia. Os regulares da Força Armada Nacional Bolivariana (FANB) foram emitidos o fuzil AK-103, com o FAL passando para a segunda linha.





Bibliografia recomendada:

The FN FAL Battle Rifle,
Bob Cashner.

Leitura recomendada:

quarta-feira, 7 de setembro de 2022

FOTO: Mercenário do Grupo Wagner na Líbia

Mercenário russo Wagner na Líbia, 8 de maio de 2021.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 7 de setembro de 2022.

Um PMC russo do Grupo Wagner na Líbia, 8 de maio de 2021. O mercenário carrega um fuzil sniper Steyr SSG 08 e um fuzil AKM. O AKM é o AK-47 modernizado, e o mercenário Wagner realizou modificação no seu, com uma empunhadura angulada e um quebra-chama personalizado.

O Grupo Wagner, uma Companhia Militar Privada (Private Military Company, PMC) russa, serve como braço armado indireto de Moscou e atualmente tem presença marcante na África, especialmente na Líbia, República Centro-Africana e no Moçambique. O Grupo Wagner também foi empregado na Síria e atualmente serve também na Ucrânia. O Grupo Wagner recebeu os holofotes e o escrutínio internacional, e foram tópico de discussão dos planejadores estratégicos americanos.

Esta PMC foi imortalizada num filme e em três estátuas na Ucrânia, Síria e República Centro-Africana, respectivamente.

Bibliografia recomendada:

The "Wagner Group":
Africa's Chaos in an Economic Boom.
Intel Africa.

Leitura recomendada:


VÍDEO: Desfile Cívico-Militar de 7 de setembro de 2022 em Brasília

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 7 de setembro de 2022.

Hoje celebra-se o dia da Pátria, completando 200 anos da independência do Brasil de Portugal. Para o bem e para o mal, é uma data significativa. O canal oficial da Marinha do Brasil (MB) publicou o desfile cívico-militar em sua integralidade no Youtube.

"Amigos, as Cortes Portuguesas querem escravizar-nos e perseguir-nos. A partir de hoje as nossas relações estão quebradas. Nenhum vínculo unir-nos mais. Tirem suas braçadeiras, soldados. Viva independência, à liberdade e à separação do Brasil. Para o meu sangue, minha honra, meu Deus, eu juro dar ao Brasil a liberdade. Independência ou morte!"

- Dom Pedro I, 7 de setembro de 1822.

Independência ou Morte (1888),
óleo sobre tela do pintor paraibano Pedro Américo,
atualmente no Museu Paulista.

Leitura recomendada:

A geopolítica do Brasil entre potência e influência13 de janeiro de 2020.

Os Processos Políticos nos Partidos Militares do Brasil, 21 de janeiro de 2020.

ENTREVISTA: A formação do Exército Nacional, com Frank D. McCann10 de junho de 2021.

COMENTÁRIO: Pseudopotência, 1º de julho de 2020.

Eleições Não Importam, Instituições Sim, 8 de janeiro de 2020.

Carteira de reservista do Exército Brasileiro no Estado Novo4 de julho de 2022.

terça-feira, 6 de setembro de 2022

Fuzileiros navais sul-coreanos resgatando bombeiros presos pela enchente do Super Tufão Hinnamnor em Pohang

Fuzileiros navais sul-coreanos resgatando bombeiros presos pela enchente do Super Tufão Hinnamnor em Pohang, 6 de setembro de 2022.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 6 de setembro de 2022.

Fuzileiros navais sul-coreanos resgatando bombeiros presos pela enchente do Super Tufão Hinnamnor em Pohang. Eles usaram carros lagarta anfíbios (CLAnf) para chegar aos bombeiros, que estavam presos na siderúrgica POSCO. No serviço coreano, o CLAnf é designado KAAV7A1.

KAAV7A1 desdobrado para resgatar bombeiros presos por inundação no local do incêndio na siderúrgica POSCO.

No início dessa terça-feira, 6 de setembro, os fuzileiros resgataram 27 civis, incluindo bombeiros presos no local do incêndio na siderúrgica POSCO. Os fuzileiros navais também estão empregando barcos infláveis e coordenando com o Exército, a Força Aérea e helicópteros civis para ajudar na operação de resgate.

Até agora, 2 pessoas morreram e 10 estão desaparecidas como resultado do tufão. Alguns vídeos curtos foram propagados na internet, e podem ser vistas aqui e aqui.








Bibliografia recomendada:

AMTRACKS:
US Amphibious Assault Vehicles,
Steven Zaloga e Terry Hadler.

Leitura recomendada:

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

FOTO: Operador especial polonês tatuado com as Meninas Superpoderosas

Operador GISW polonês, 2022.

Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 2 de setembro de 2022.

Operador do GISW (Grupa Interwencyjna Służby WięziennejGrupo de Intervenção do Serviço Prisional), forças especiais da polícia prisional polonesa, com o braço tatuado com as Meninas Superpoderosas.


As Meninas Superpoderosas (The Powerpuff Girls) é uma série de desenho animado criada e escrita por Craig McCracken, e dirigida junto com Genndy Tartakovsky, e que segue as três meninas superpoderosas Florzinha, Lindinha e Docinho. Elas foram criadas pelo Professor Utônio, que acidentalmente deixou derrubar o Elemento X na poção da "Garotinha Perfeita" (uma mistura de açúcar, tempero e tudo o que há de bom). Sendo assim, o Elemento X deu a elas superpoderes, e entre uma brincadeira e outra, elas têm que salvar a cidade fictícia norte-americana de Townsville de diversos monstros; este nome significando "vila-cidadezinha", para ser o nome mais genérico possível.

Os episódios geralmente começam com o narrador dizendo "A cidade de Townsville... está sendo atacada!". A série estreou em 18 de novembro de 1998 pelo Cartoon Network nos Estados Unidos e foi um sucesso mundial, inclusive no Brasil.

Abertura em português brasileiro


Leitura recomendada:

A estratégia da Polônia, 5 de junho de 2021.

quarta-feira, 31 de agosto de 2022

GALERIA: Exercício venezuelano com blindados e infantaria


Por Filipe do A. Monteiro, Warfare Blog, 31 de agosto de 2022.

Imagens do exercício venezuelano de 23 de março de 2022, perante o comandante da Dirección Regional de Medios Terrestres Central (Direção Regional de Meios Terrestres Central), o General-de-Divisão (GD) Carlos Rafael Serrano Duque. Os militares do 414º Batalhão Blindado "Bravos de Apure" operaram blindados T-72B1, BMP-3 e AMX-30V, pintados com decorativos nas cores da bandeira venezuelana.

O elemento de infantaria do batalha também realizou exercícios de tiro ao lado da Milícia Bolivariana, no que foi chamado pomposamente de Método Táctico de Resistencia Revolucionaria (Método Tático de Resistência Revolucionária). Os militares estão armados com fuzis AK-103, o AK-74M de exportação.

Antigamente chamado Exército Nacional da Venezuela, o atual Exército Bolivariano da Venezuela é projetado para operar junto dos milicianos seguindo a doutrina socialista de guerra popular. Os milicianos são armados com equipamento de segunda linha, como o FN FAL e o fuzil ferrolhado Mosin-Nagant, mas fornecem grandes números de soldados rapidamente, aumentando o elemento "massa" enquanto ancorado no exército principal. O número oficial de efetivos da Milícia Nacional Bolivariana é de 300 mil homens e mulheres, com uma mão-de-obra potencial de 3.2 milhões de pessoas. O Exército Bolivariano, a parte principal da Força Armada Nacional Bolivariana (FANB), sempre faz questão de mostrar mulheres servindo ao lado dos homens como parte da doutrina socialista de igualdade entre os sexos.

Oficiais observando os T-72 na pista de condução.

Tanquistas do sexo feminino e masculino com os capacetes acolchoados de modelo russo.

BMP-3.

414 "Bravos de Apure" está localizado no Quartel A. Mérida em Maracay, no Estado Aragua; seu lema é "Primeiro em Carabobo - Glória Eterna". Ele é parte da 41ª Brigada Blindada venezuelana, comandada pelo GD Héctor José Cadernas Daal, que opera os T-72 e AMX-30 (recém-repotenciados). O hino do 414 "Bravos de Apure", Pátria Querida, inicia com as palavras "Ao rumor de clarins guerreiros" e compara os blindados a "corcéis de aço".

Pátria Querida: O hino dos "Bravos de Apure"


A infantaria progredindo no exercício de tiro.

Atiradora, usando brinco, disparando ajoelhada.

Estojo do cartucho sendo ejetado.

O GD Carlos Rafael Serrano Duque, diretor central dos meios terrestres, falando com os tanquistas e infantes.

Leitura recomendada:

Selva de Aço: A História do AK-103 Venezuelano, 13 de fevereiro de 2021.

A Rússia espera resolver o atraso com a FAN e lançar uma fábrica de fuzis em 2022, 5 de janeiro de 2022.

Militares da Venezuela: principais questões a saber, 4 de setembro de 2021.

Venezuela: “A Democracia Sequestrada”, 2 de fevereiro de 2022.

A crise sem fim da Venezuela, 2 de outubro de 2021.

GALERIA: Ativação do Comando de Operações Especiais venezuelano, 30 de agosto de 2020.

GALERIA: Operação anti-drogas na Venezuela, 20 de dezembro de 2021.

FOTO: Sniper com baioneta calada, 9 de dezembro de 2020.

domingo, 28 de agosto de 2022

Primeira Guerra Mundial: Quando os cambojanos lutaram pela França

Por Christophe Gargiulo, Cambodge Mag, 11 de novembro de 2021.

Tradução Filipe do A. Monteiro, 28 de agosto de 2022.

Em 11 de novembro de 1918, foi assinado o armistício que pôs fim à guerra de 14-18. A Primeira Guerra Mundial, que custou mais de 18 milhões de vidas, contou com a participação de milhares de voluntários do império colonial francês. Entre eles também estavam os cambojanos.

Jovens voluntários cambojanos.
Eles estão posando diante de um monumento erguido em 1906 para celebrar a transferência de Battambang e Siem Reap para o Camboja.

As Lágrimas de Prey Veng

Manchete do Le Miroir de junho de 1916.
"Os Tirailleurs Anamitas vieram lutar!"

As nuvens escuras e altas sobre a vila de Chong Ampil em Prey Veng devem ter sido mais do que um presságio de chuva naquela tarde de 31 de outubro de 1918. Chak Neang Van estava sentado na frente de sua casa ouvindo os sons distantes da vida no campo em um de seus três pequenos arrozais. O agricultor de 66 anos era cego e ele e sua esposa viviam uma existência difícil e miserável na zona rural do Camboja na época. Enquanto Chak Neang Van ouvia a vida daquele dia passar lentamente, ele ouviu algumas pessoas se aproximando e depois parando na frente de sua casa. Aos passos elegantes dos homens que o visitavam, o velho pensou consigo mesmo que deviam ser importantes. Mas o que eles poderiam querer dele, o pobre fazendeiro da província de Prey Veng? Era o residente francês da província trazendo uma carta do residente do Camboja, Monsiêur Baudoin. Chak Neang Van soube então que as notícias só podiam ser ruins. O residente francês então leu o conteúdo da carta em tom solene:

"Senhor, lamento anunciar a morte de seu filho, o soldado de infantaria voluntário Nuon, morto em 28 de junho na frente da Alsácia. O comandante geral do 33º corpo menciona o soldado Nuon com os seguintes termos: 'Um soldado de infantaria corajoso que permaneceu com grande bravura em seu posto de observação sob bombardeios extremamente violentos.'”

Combatente indochinês.

Morto no cumprimento do dever

Soldados cambojanos em uma trincheira na França.

O residente continua a ler a missiva oficial: “ A Croix de Guerre foi concedida a este bravo soldado e será enviada a você como sinal de gratidão pelo sacrifício de sua família. Seu corpo foi enterrado no cemitério da vila de Stossweier, na Alsácia. Desejo renovar-vos nesta ocasião o sentimento de gratidão do Protetorado pelo sacrifício do vosso filho, que serviu fielmente à França e contribuiu para as grandes vitórias dos últimos meses com os seus camaradas cambojanos."

Como Nuon, filho único de uma família de agricultores do Camboja, se viu ao lado de milhares de outros soldados indochineses em guerra contra um agressor, do qual provavelmente nunca tinha ouvido falar, em um país estrangeiro localizado a vários milhares de quilômetros do reino?

A Participação Indochinesa

Tirailleur cambojano com a boina de caçador em Saigon, na Cochinchina.

Muitos cambojanos mobilizados durante a Primeira Guerra Mundial foram colocados para trabalhar atrás das linhas de frente, como os milhares de indochineses que trabalhavam nas fábricas de armas francesas. Em 1915, grandes cartazes apareceram em cidades e aldeias cambojanas ordenando a mobilização da população indochinesa para a guerra. Mas não foi até fevereiro de 1916 que o monarca cambojano Sisowath lançou um apelo por decreto real para participar desta famosa " Grande Guerra ". O apelo dizia:

"É com imenso orgulho que autorizamos nossos súditos a se voluntariarem para servir na França, no exército, nos arsenais e nas fábricas."

Camboja - Phnom-Penh.
"Estátua de Sua Majestade Sisowath inaugurada em 23 de fevereiro de 1909."

Pelo mundo livre

Tirailleurs indochinois fotografados na França.

Como muitos outros soldados voluntários das distantes colônias do império colonial francês, os cambojanos souberam apenas vagamente que essa guerra ameaçava a arruinar o mundo, inclusive seu país. Essa catástrofe só poderia ser evitada com uma mobilização massiva capaz de “defender a segurança do mundo contra a barbárie dos alemães e participar da batalha contra o mal que ameaça o mundo e todos os povos livres”.

Batalhões de combatentes indochineses na Ásia.

Provavelmente desconhecendo o poder destrutivo das armas modernas e o horror desta "Grande Guerra", muitos optaram por se voluntariar para uma viagem para a Europa por causa das condições atraentes e dos salários oferecidos. Uma razão que os historiadores favorecem em detrimento do compromisso com uma causa nobre e justa. O que parece lógico, nenhum voluntário cambojano provavelmente suspeitou das origens puramente geopolíticas do conflito que também foi uma guerra entre primos. As condições de contratação consistiam em um montante fixo de 80 piastras por soldado ou 20 por soldado auxiliar na assinatura do contrato, sem impostos para suas famílias, uma pensão de 3 piastras por mês para eles enquanto estivessem no exterior, um salário na França e promoção por mérito.

Recrutas

Grupo de Tirailleurs cambojanos em Phnom Penh, no Camboja.

Em janeiro de 1916, o Governador-Geral da Indochina anunciou a necessidade de 7.000 homens de reserva (sete batalhões) e soldados ativos da Indochina, 12.000 voluntários, 10.000 trabalhadores qualificados (enfermeiros qualificados, intérpretes) e 20.000 trabalhadores não-qualificados. O Camboja foi chamado a fornecer 1.000 infantes voluntários e 2.500 trabalhadores para a França. Em 7 de abril de 1916, o número de voluntários alistados (trabalhadores e soldados) totalizava apenas 1.015 recrutas. Não estava à altura das expectativas dos franceses. O rei Sisowath teve que instar seus funcionários a redobrarem seus esforços para engajar os efetivos necessários, promovendo ainda mais a campanha de recrutamento, estabelecendo escritórios especiais com bandeiras e cartazes em cada sangkat provincial.

Entre os recrutas estavam cinco príncipes, incluindo três netos de Norodom e mais dois netos de Sisowath. Havia cerca de 15 batalhões indochineses, com uma proporção de um cambojano em 10. A maioria dos voluntários da Indochina veio de Annam e Cochinchina. A maioria dos cambojanos foi matriculada no 20º Batalhão Indochinês. Na chegada à França, este batalhão foi desmembrado. Uma parte foi para Montpellier, outra para Béziers, uma para Narbonne e, finalmente, uma para Perpignan. Mas em vez de enfrentar o inimigo, muitos soldados ficaram surpresos ao se verem designados para trabalhos agrícolas, reparando linhas de trem e em fábricas de armamentos.

"Como distraímos as tropas do Extremo Oriente.
O teatro dos anamitas."

Elogios

Entrega de medalhas aos tirailleurs indochineses, Grande Guerra de 1914-18.

No entanto, os cambojanos eram frequentemente elogiados. Em um relatório enviado à sua hierarquia, o capitão Gilles da 1ª Companhia do 23º Batalhão Indochinês orgulhosamente se gabava dos cambojanos sob seu comando:

"Comprei, com meu próprio dinheiro, três bolas e agora tenho um excelente time de futebol cambojano que venceu várias partidas contra os franceses. Recentemente, a pedido deles e graças a doações, formei um grupo de música que oferece as maiores esperanças."

Uma segunda carta, enviada pelo capitão ao rei Sisowath (mais tarde ele seria punido por enviar tal carta diretamente ao rei), continuou na mesma linha: "Estou feliz por poder enviar meus cumprimentos e parabéns pelo desempenho dos cambojanos. Dedicado, disciplinado, limpo, inteligente, esses são seus súditos. Corajosos e persistentes, à noite, depois de um dia terrível, estudam francês, música ou futebol. Várias partidas foram disputadas e ainda não fomos derrotados."

"A Linguagem das Trincheiras."
As várias gírias dos poilus.

Indochineses na Frente Ocidental.
Os capacetes têm a âncora das tropas coloniais.

A carta também incluía um pedido ao rei Sisowath para enviar a partitura do hino nacional do Camboja "para estudo e para o dia em que, cobertos de glória, eles retornarão a Phnom Penh para lhe prestar seus respeitos". Ele também pediu ao rei que as "senhoras de Phnom Penh" fizessem uma bandeira nacional, que poderia ser transportada pelas tropas que retornavam.

Outros relatos confirmam que os cambojanos eram conhecidos por seu bom comportamento e deixaram uma "excelente impressão e uma memória muito boa por onde passavam". Um relatório até observou que eles foram particularmente elogiados por seu "ar de soldado feroz, boa atitude e manuseio hábil de armas".

Cruz de Cavaleiro da Ordem Real do Camboja.
Fundada em 8 de fevereiro de 1864 pelo, Rei Norodom I, para recompensar os serviços civis e militares.

Tirailleurs cambojanos diante da cidadela de Siem Reap, no Camboja.

De volta ao Camboja, a campanha para recrutar mais voluntários não teve muito sucesso. A administração francesa enfrentou uma crescente rebelião camponesa em todo o país, provocada por aumentos substanciais nos impostos sobre a população local para apoiar o esforço de guerra francês. Além disso, rumores de que todos os voluntários cambojanos enviados para a França haviam sido mortos se espalharam rapidamente. Em uma circular de novembro de 1916 aos residentes franceses, Baudoin escreveu:

"Fui informado por várias fontes que certas correspondências enviadas ao Camboja por voluntários autóctones que servem na França contêm comentários que podem afetar suas famílias ou criar um espírito cívico desfavorável. Não importa se essas reflexões foram inspiradas por um sentimento de descontentamento ou por uma verdadeira desmoralização, elas representam, em todo caso, uma opinião que deve ser examinada de perto no futuro."

Ele então pedirá aos habitantes que investiguem a natureza e o conteúdo dessas observações, que confisquem essas cartas por causa de sua “ natureza subversiva ” e as enviem a ele. Para elevar o moral dos voluntários no exterior, o serviço postal permitiu que as famílias enviassem gratuitamente pacotes para seus entes queridos (até 1kg).

"Distribuição de cartas."
Acampamento indochinês de Augoulême, na França, em 1918.

A Benevolência de Opiáceos

Refeição na Frente Ocidental.

Tal gesto de “benevolência” teve consequências interessantes, como atesta o superior residente que se alertou e advertiu os aprendizes exportadores: "Os trabalhadores indochineses receberam pacotes contendo ópio que estão revendendo — por favor, informe a população indochinesa que a exportação de ópio para a França é proibida, está em vigor uma vigilância apertada e os infratores estão sujeitos a penalidades pesadas."

Depois que a guerra terminou, toda a disciplina pela qual os cambojanos eram anteriormente elogiados pareceu evaporar. Os franceses expressaram preocupação com a falta de disciplina dos soldados que retornaram, que simplesmente abandonaram sua unidade após a chegada a Saigon para retornar diretamente às suas casas sem respeitar as formalidades de desmobilização. Os franceses então diziam a si mesmos que os cambojanos, depois de receberem seus emolumentos, já não se importavam muito com as ordens de seu superior.

Tirailleurs Indochineses na sala de estudo, na França.

Para recompensar aqueles que retornaram da Grande Guerra e ajudá-los a se reinstalar, foram disponibilizadas concessões de terras em Banam (Prey Veng), Popokvil e Kandal. O residente francês destinará 20.000 piastras do orçamento de 1920 para facilitar seu reassentamento. Para aqueles que não retornaram, um memorial deveria ser construído.

Memorial

Monumento aos Mortos Cambojanos.
O monumento incluía duas estátuas, representando um cambojano e um francês. Os antigos diziam que este oficial cambojano era TA (avô) MEN.

Em 1919, o prefeito de Phnom Penh anunciou um concurso para a construção de um monumento memorial chamado "Aos que morreram pela França", dedicado aos franceses, cambojanos e asiáticos residentes do Camboja que morreram pela causa francesa. Curiosamente, apenas cidadãos franceses foram convidados a apresentar propostas. Sete anos após o fim da guerra, em 14 de fevereiro de 1925, o monumento foi finalmente inaugurado, e a memória daqueles que “tombaram pela França” pôde então ser devidamente homenageada.

Inauguração do Monumento aos Mortos de 1914-18, chamado Rou Pi, na capital Phnom Penh, em 1925.
A inauguração conta com 
um grupo de Chams muçulmanos.

E o que resta deste monumento localizado na grande ilha de trânsito em frente à atual Embaixada da França? Foi demolido durante o período do Khmer Vermelho e alguns fragmentos aqui e ali adornam as entradas de alguns edifícios públicos. Portanto, não resta muito no Camboja para nos lembrar do soldado de infantaria Nuon e seus compatriotas que morreram nas trincheiras europeias em apoio ao império colonial.

O memorial de guerra cambojano, localizado não muito longe da Embaixada da França, antes de ser destruído em 1975 pelo Khmer Vermelho.

Notas: Fonds du supérieur résident, dossiers 4246, 4594, 4605, 7727, 7745, 7753, 10 378, 10 421, 15 345 e Revue indochinoise, 1917. PP Post & Collection Delcampe.

Bibliografia recomendada:

Les Linh Tap:
Histoire des militaires indochinois de la France (1859-1960)
.

Leitura recomendada: